A
semente da ‘espiral positiva’ germinou seis anos depois, com o Acordo de Paris
Uma
ideia que ajudou a mudar o mundo nasceu, como algumas canções da bossa-nova, em
guardanapos de papel. Era o ano de 2009 e almoçavam, em Brasília, a secretária
nacional de Mudança Climática, Suzana
Kahn Ribeiro, e o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. O assunto: o que o Brasil
poderia sugerir na COP 15,
a Conferência do Clima de
Copenhague? Suzana rabiscou um esquema no guardanapo. Nascia a
“espiral positiva”.
A ideia era simples. Suzana e Carlos achavam que o Brasil deveria propor, unilateralmente, a redução de suas emissões de carbono. Mais: fixar metas concretas. Ainda mais: expor-se ao escrutínio internacional, abrindo seus números. Houve resistências dentro do governo, cujo discurso – recorrente entre os caramurus à esquerda e à direita – era cheio de “não podemos abrir mão de nossa soberania” e “eles devastaram suas próprias florestas, não se metam com a nossa”.
A
“espiral positiva” era, antes de tudo, um desejo, um “wishful thinking”:
inspirados pelo exemplo do Brasil, vários países tomariam atitudes semelhantes,
numa competição virtuosa. A ideia venceu as resistências internas – entre elas,
a da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ganhou a adesão do
Itamaraty, com seu timaço de negociadores com experiência em meio ambiente (a
coluna voltará ao assunto em breve).
No
plano externo, o sucesso não foi imediato. Os brasileiros ganharam aplausos em
Copenhague, mas não adesões. A semente germinaria seis anos depois. O Acordo de Paris, assinado em 2015, era
precisamente a ideia do Brasil – países propondo voluntariamente metas de
redução de carbono, com métricas críveis.
O
que mudou em seis anos? “Ficaram claros os incentivos para uma economia de
baixo carbono. Não se trata apenas de salvar o planeta, mas também de ganhar
dinheiro”, diz Suzana Kahn Ribeiro, atualmente professora na Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Ela discorre sobre o assunto no
minipodcast da semana.
As
oportunidades são inúmeras. Segundo Suzana, a China, que já foi refratária a
metas de emissões, cresceu o olho sobre o mercado de energia renovável. Países
nórdicos investem em madeira certificada: do lado certo da força, ganham a
concorrência com nações que devastam florestas. Acessam, de quebra, o
bilionário mercado de títulos verdes. O lado certo da força, diga-se, acaba de
ser demarcado com sabre de luz pelo Obi-Wan da vez – o presidente americano Joe
Biden.
Se
há uma razão para que os brasileiros se orgulhem de seu país, é a liderança que
já exercemos na área mais estratégica do planeta – a que garante a própria
sobrevivência da esfera azul que habitamos. Além de inspirar, em alguma medida,
o Acordo de Paris, o Brasil foi o berço do moderno combate à mudança climática
– na Rio 92, marco positivo do governo Collor.
Perdemos,
no entanto, essa primazia – e, com ela, oportunidades de enriquecimento e
projeção internacional. “É possível que, depois da pandemia, o mundo se
reconstrua como uma economia moderna”, diz Suzana. “Conectar-se com esse futuro
é uma chance enorme.” O tema começa a entrar em pauta entre os pré-candidatos
de oposição para 2022. Do governo atual, pelo que diz e faz, não se deve
esperar nada.
O Brasil conhece bem o caminho para reconquistar alguma relevância no mundo. Já houve um tempo em que nossas ideias, rabiscadas em guardanapos de papel, faziam o planeta cantar – ou ajudavam a salvá-lo, inspirando boas práticas.
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