Editoriais
Teto de gastos é esperança contra a bomba fiscal
O Globo
A
ruptura do teto de gastos no Orçamento deste ano serviu para acomodar todo tipo
de despesa, algumas defensáveis (como a expansão do Bolsa Família para criar o
Auxílio Brasil), outras sem nenhum nexo (caso das emendas do relator, base do
orçamento secreto). Não foi, porém, suficiente para conter as pressões sobre o
governo no ano eleitoral. Num cálculo feito com os números previstos para este
ano com base nos disponíveis até março, o economista Marcos Mendes estimou em
meros R$ 3 bilhões a folga disponível em relação ao teto, estipulado em R$ 1,68
trilhão no Orçamento. Isso significa que, novamente, o equilíbrio fiscal está
ameaçado.
As
pressões vêm de todos os lados, na forma tanto de novas despesas quanto de
isenções de impostos. No ambiente permeável aos lobbies em Brasília, leva mais
quem conta com a simpatia do Planalto ou tem acesso aos demais centros de poder
(leia-se Congresso e ministérios). Cada demanda pode até fazer sentido em si, e
o impacto individual pode parecer pequeno diante da imensidão orçamentária. Mas
a soma de tudo é implacável.
Só em auxílios não previstos no Orçamento que tramitam no Congresso ou estão à espera de sanção presidencial, a conta feita por Mendes chega a R$ 25,5 bilhões. O piso salarial a enfermeiros e agentes de saúde custará R$ 4,5 bilhões. O alívio ao setor cultural trazido pelas leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo deverá sair por R$ 7 bilhões. Além de R$ 2,5 bilhões em transferências, o setor de eventos levará isenções fiscais de R$ 2,6 bilhões. O subsídio ao transporte público, R$ 5 bilhões. Ajuda às Santas Casas e instituições beneficentes, outros R$ 2 bilhões. À agricultura familiar, mais R$ 3 bilhões. Não entraram nessa conta o aumento linear prometido ao funcionalismo, outros R$ 6 bilhões, nem os R$ 5 bilhões de auxílio-gás e vale-combustível. De bilhão em bilhão, o dinheiro escorre do caixa.
Em
matéria de renúncia fiscal, o resultado é ainda mais desfavorável ao governo,
pois a maioria das isenções já está em vigor. O setor cultural está longe de
ser o único beneficiado. A redução de IPI para a indústria custará R$ 10
bilhões aos cofres públicos. O corte de tributos sobre combustíveis, outros R$
15 bilhões. A desoneração da folha de pagamento de 17 setores, R$ 6 bilhões.
Benefícios fiscais aos taxistas, R$ 2 bilhões. À indústria de semicondutores e
equipamentos de informática, meio bilhão. O aumento do limite de faturamento
para microempreendedores individuais, mais R$ 3 bilhões. Somando tudo, Mendes
estima as novas renúncias fiscais em quase R$ 40 bilhões, ou 0,4% do PIB
(estimam-se em R$ 367 bilhões os subsídios tributários já regulares, ou 3,8% do
PIB).
Nada
disso seria uma questão relevante se o país gerasse recursos para pagar tudo.
Não é o caso. O impulso recente na arrecadação que tem animado Brasília a
conceder toda sorte de benesse é resultado de uma conjuntura muito específica:
a alta das commodities no mercado internacional com a recuperação da pandemia e
a inflação no mercado interno que aumenta vários impostos. Há, diz Mendes, uma
relação inequívoca entre a receita do governo federal e o preço das
exportações. No período entre 2004 e 2013, quando houve uma explosão no mercado
internacional de commodities, a despesa do governo cresceu ininterruptamente.
Assim que a maré virou, começaram a faltar recursos para cobrir o buraco, o
Brasil passou a acumular sucessivos déficits, e a dívida pública explodiu.
Há
duas diferenças agora. Primeiro, a reforma da Previdência e o congelamento
salarial do setor público durante a pandemia seguraram as despesas. Se fosse
seguir a tendência desde 2010, o gasto total do governo com pessoal,
aposentadorias, pensões, abonos e auxílios teria chegado perto de R$ 1,4
trilhão neste ano. Em vez disso, ficará em R$ 1,22 trilhão. Para o segundo
semestre e o início do ano que vem, contudo, já estão praticamente contratados
aumentos do funcionalismo federal que se espalharão pelos outros setores do
Estado a ponto de reduzir boa parte desse ganho fiscal.
A
segunda diferença é que agora o país dispõe do teto de gastos como ferramenta
de contenção das despesas. É o único mecanismo com que podemos contar, ainda
que enfraquecido, para evitar o pior quando vier o refluxo da onda favorável.
Entre 2013 e 2016, ano de implantação do teto, os gastos subiram de pouco mais
de 17% para quase 20% do PIB. Depois do pico inesperado da pandemia (quando
passaram de 26%), voltaram a cair a 18,2% (excluindo os precatórios parcelados,
ou 18,6% com eles). Nas palavras de Mendes: “O estrago não é maior porque o
teto ainda está segurando as pontas. Se for mais afrouxado neste governo, ou
ruir no próximo, as condições fiscais se deteriorarão bastante”.
O
país não pode correr o risco de voltar a acumular déficits, sob pena de a
dívida pública voltar a dar um salto, minando a confiança do mercado e fazendo
ressurgir a incerteza que marcou o período hiperinflacionário. Para estabilizar
a dívida, levando em conta que o país não consegue crescer mais de 1,5% ao ano
de modo sustentável, o ajuste fiscal necessário seria da ordem de 2,5 a 3,3
pontos percentuais do PIB (entre R$ 245 bilhões e R$ 318 bilhões). Será esse o
principal desafio do próximo presidente da República, quem quer que seja. É
preciso preservar o teto de gastos até que a bomba fiscal seja desarmada — ou
então ela explodirá.
Clube do retrocesso
Folha de S. Paulo
Le Pen integra o grupo que no Ocidente
desafia o Estado democrático de Direito
O eleitor francês decide neste domingo
(24) quem
presidirá a república pelos próximos cinco anos, se o atual mandatário, o
centrista Emmanuel Macron, ou a desafiante, a ultranacionalista Marine Le Pen.
Repete-se o confronto do segundo turno do
pleito de 2017. Daquela feita, a súbita ascensão de Macron dialogava
criticamente com o resultado de dois escrutínios ocorridos no ano anterior: o
que definiu a saída do Reino Unido da União Europeia e o que conduziu Donald
Trump à Casa Branca.
A surpresa na França não foi menor que a
produzida nos processos americano e britânico —aos 39 anos, sem nunca ter
disputado eleição, um ex-executivo da finança privada e ex-ministro de governo
socialista desbancava partidos tradicionais e conquistava o Eliseu.
Mas o sinal da vitória por margem folgada
de Emmanuel Macron contrastou vivamente com o dos triunfos do populismo
nacionalista na América do Norte e na Grã Bretanha. O novo presidente francês
representava tolerância, multilateralismo e abertura econômica.
Apesar de ter-se mantido nessa linha e
atuado, com a alemã Angela Merkel, como contraponto de lucidez ao terremoto
diplomático da gestão Trump, Macron viu fortalecer-se o radicalismo doméstico à
esquerda —com Jean-Luc Mélenchon, terceiro colocado no primeiro turno— e à
direita, com Le Pen.
Na França e em outras nações ocidentais, a
anteposição política mais frequente deixa de ser a entre centro-esquerda e centro-direita
para tomar a forma da rivalidade entre forças comprometidas com o Estado
democrático de Direito, de um lado, e correntes que questionam esse arcabouço,
do outro.
Atua nesse segundo polo o nacionalismo
exacerbado de Marine Le Pen, mal disfarçado por uma fina camada de verniz para
tentar diferenciá-la das boçalidades segregacionistas defendidas pelo
extremista Éric Zemour no primeiro turno.
A eleição de Le Pen, que não haja dúvidas
sobre isso, desencadearia não apenas uma reviravolta reacionária na política
imigratória francesa. Representaria também uma ameaça constante de restrição de
direitos da população não branca.
Todos os desafios que exigem colaboração
internacional para ser enfrentados, da mitigação do aquecimento global ao
enfrentamento de autocracias belicosas, encontrariam em Le Pen um obstáculo.
A invasão da Ucrânia pela Rússia colocou em
termos claros o que está em jogo quando adversários do avanço civilizacional
que a muito custo neutralizou o exercício tirânico do poder de Estado encontram
substrato favorável para prosperar.
Marine Le Pen, admiradora de Vladimir Putin
—também elogiado por Donald Trump—, é sócia dileta desse clube do retrocesso.
A peneira de Aras
Folha de S. Paulo
PGR mostra ignorar pilar da democracia ao
processar colunista que o criticou
Augusto Aras, na condição de
procurador-geral da República, resolveu tapar o sol com a peneira. Reprovado
amiúde por inverter o sentido do cargo que ocupa, fez o que lhe pareceu mais
fácil: processou
um de seus críticos.
Trata-se de Conrado Hübner Mendes,
professor de direito constitucional da USP e colunista desta Folha. O procurador-geral quer
vê-lo condenado por calúnia, injúria e difamação devido a postagens em redes
sociais e uma coluna intitulada "Aras
é a antessala de Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional".
Aras não gostou de ser chamado de
"Poste Geral da República", de "servo do presidente" e de
grande fiador da crise vivida no Brasil em decorrência da Covid, expressões
utilizadas por Mendes para caracterizar a omissão do PGR diante dos desmandos
de Jair Bolsonaro (PL).
Na primeira instância do Judiciário, deu-se
o mais natural. A juíza federal Pollyanna Kelly Alves, lembrando o valor
inestimável que tem o direito de liberdade de expressão dos pensamentos e
ideias, entendeu não ter havido ofensa à honra de Aras e rejeitou a
queixa-crime.
A
surpresa surgiu no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, quando os juízes
federais Marllon Sousa e Maria do Carmo Cardoso votaram a favor do recurso de
Aras, vencendo a posição sustentada por Olívia Merlin Silva e determinando que
o processo volte a tramitar.
Ignoraram, com isso, decisões em que o
Supremo Tribunal Federal estabeleceu que, numa sociedade democrática, não cabe
a repressão penal ao pensamento, sobretudo quando a crítica, por mais severa e
ácida que seja, venha inspirada pelo interesse público.
Para o STF, a liberdade de imprensa abrange
o direito de informar, de buscar a informação, de opinar e de criticar.
Não se confundam tais prerrogativas com um
vale-tudo. Criticar é uma coisa, ameaçar e coagir são outra. Existem limites,
mas eles não são cruzados quando os comentários expressam opiniões negativas,
ainda que mordazes ou irônicas, a respeito de figura pública.
Autoridades públicas estão sujeitas a maior
escrutínio em sociedades democráticas, e não será com a abertura de processos
penais que esse pilar sairá fortalecido.
Aras, ao ascender à PGR, deveria saber que atrairia para si mais luzes do que nunca. Talvez seja impossível passar pelo cargo sem sofrer críticas, mas elas certamente são pouco numerosas e menos duras para quem honra a função.
Fiascos autocráticos
O Estado de S. Paulo
Os reveses da China e da Rússia fissuram a ideia de que ‘a autocracia funciona’. As forças democráticas do Ocidente têm a oportunidade de desmoralizar suas lideranças
Há mais de uma década a democracia global
está em recessão e a autocracia, em ascensão. Em 2019, Vladimir Putin declarou
o liberalismo “obsoleto”. Assim como ele, Xi Jinping na China consumou manobras
constitucionais para se perpetuar no poder. A narrativa da “decadência
ocidental” despertou uma legião de emuladores nas democracias liberais.
Tipicamente, esses populistas e
autoritários se apresentam como indispensáveis – “só eu posso consertar as
coisas” disse Donald Trump nos EUA. De Varsóvia a Nova Délhi, de Ancara a
Brasília, lideranças estimulam um culto à personalidade, apresentam-se, domesticamente,
como campeões do “povo” contra as “elites” e, internacionalmente, como
encarnações de suas nações. À direita, em especial, a nostalgia nacionalista, o
conservadorismo cultural, a intolerância com minorias e o desprezo pelo
“politicamente correto” galvanizaram o Brexit na Inglaterra, a eleição de Trump
ou os eurocéticos na União Europeia.
O presidente Jair Bolsonaro, usualmente tão
desconfortável nos palcos internacionais, fez questão de visitar Putin e Viktor
Orbán para se banhar em sua aura de “líderes fortes”. Recentemente, Luiz Inácio
Lula da Silva se derramou em loas à China, como “um modelo de desenvolvimento
para o mundo inteiro”, “capaz de lutar contra o coronavírus tão rapidamente
porque tem um partido forte e um governo forte, porque o governo tem controle e
poder de comando”.
De fato, a pandemia parecia o laboratório
ideal para testar a potência das tecnocracias centralizadoras e a virilidade de
seus líderes. Do mesmo modo, uma ocupação rápida e massiva da Ucrânia
confirmaria Putin como “mestre estrategista”. Mas os fatos caminham em outra
direção. Os tanques russos sucateados na Ucrânia e as ruas desertas de Xangai
com centenas de milhões de chineses confinados com fome e medo são a imagem
mais eloquente desse revés.
Paradoxalmente, a potencial desmoralização
dos autocratas e seus admiradores não tem raízes morais. Fosse o caso, ela já
teria acontecido após as atrocidades na Síria ou em Xinjiang. Não é um problema
de moralidade, mas de competência.
A resistência ucraniana foi bem mais feroz
do que Putin previa. Assim também a coordenação ocidental. Novos países querem
se juntar à Otan. O fiasco militar e econômico despertou focos de dissidência
entre celebridades, oligarcas e mesmo militares russos.
A estratégia da “covid zero” na China se
tinge com as cores de uma distopia. O partido não preparou os cidadãos para
conviverem com o vírus, suas vacinas são menos eficientes e não cobriram todos
os vulneráveis. O controle sobre seu empresariado, com um misto de subsídios e
intimidação, arrisca enfraquecê-lo no mercado global de capitais e deixá-lo
para trás na corrida pela inovação. O apoio a Putin pode ferir as relações com
a Europa e os EUA.
Não que se deva subestimar as autocracias.
Irã, Cuba e Venezuela já se mostraram notavelmente resistentes às sanções
ocidentais. A popularidade de Putin parece ter crescido após a guerra. A
economia chinesa segue em ascensão e o mero tamanho de seu mercado sempre
tentará as multinacionais a contornar seus padrões éticos. Mas a pandemia e a
guerra expuseram suas vulnerabilidades. A obsessão com o controle da vida
privada, a húbris resultante da desnecessidade de prestar contas a uma
burocracia de sicofantas e a ojeriza a admitir seus erros continuam imorais
como sempre, mas estão se mostrando ineficazes como nunca.
O abalo à ideia de que “a autocracia
funciona” é uma ameaça existencial aos populistas e autoritários no Ocidente.
Como disse o articulista Thomas Friedman, “enquanto ainda pudermos votar para
nos livrar de líderes incompetentes e manter ecossistemas de informação que
exponham mentiras sistêmicas e desafiem a censura, seremos capazes de nos
adaptar numa era de rápidas mudanças”. Mas essas vantagens competitivas só
serão reais se forem postas em prática. Se os líderes autocráticos estão mais
vulneráveis, os democráticos ainda têm um longo caminho para resgatar a
confiança de suas populações.
CPMI das Fake News era necessária
O Estado de S. Paulo
Com a CPMI das Fake News, o Congresso identificou uma das principais frentes do bolsonarismo contra o regime democrático. Provas reveladas não podem ser abandonadas
Em julho de 2019, deputados e senadores
requereram a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI)
para investigar, entre outros temas, “os ataques cibernéticos que atentam
contra a democracia e o debate público” e “a utilização de perfis falsos para
influenciar os resultados das eleições 2018”. Instaurada em setembro daquele
ano, a CPMI das Fake News funcionou até março de 2020, quando sua atividade foi
suspensa em razão da pandemia. Após promessas de reativação, a comissão
continua parada, sem expectativa de retomada dos trabalhos.
É uma pena esse desfecho da CPMI das Fake
News, sem conclusão formal das investigações. Em seus meses de funcionamento, a
comissão descobriu indícios muito significativos sobre as campanhas de
desinformação no País e suas estruturas de financiamento.
Houve depoimentos reveladores, como o da
deputada Joice Hasselmann (PSDB-SP), que confirmou a existência do “gabinete do
ódio” no Palácio do Planalto. Formado por assessores especiais da Presidência
da República – ou seja, bancado com dinheiro público –, o grupo tinha o
objetivo de propagar notícias falsas e difamações. “De maneira, digamos, legal,
comprovável imediatamente, (são
destinados) praticamente R$ 500 mil, de dinheiro público, para
perseguir desafetos”, disse a deputada na ocasião.
Além de depoimentos reveladores, a CPMI das
Fake News obteve provas documentais importantes. A partir de requerimento dos
parlamentares, o Facebook identificou que o perfil do Instagram “snapnaro”,
vezeiro em atacar e difamar adversários do bolsonarismo, foi editado a partir
de uma rede de computadores do Senado entre fevereiro e maio de 2019. No
período, foram feitos 95 acessos pela rede do Senado. No mesmo dia em que Joice
Hasselmann prestou depoimento à comissão, o perfil “snapnaro”, que existia
desde maio de 2017, foi apagado. Esse é apenas um exemplo, entre tantos outros,
de como a CPMI das Fake News conseguiu de fato revelar esquemas ilegais
operados a partir da estrutura estatal.
Noutro caso, o Facebook informou à CPMI das
Fake News que uma página usada para desferir ataques virtuais contra o Supremo
Tribunal Federal (STF) e o Congresso havia sido registrada a partir de um
telefone utilizado por um assessor parlamentar do deputado Eduardo Bolsonaro
(PL-SP). Ou seja, a comissão cumpriu de fato sua tarefa de investigar os
ataques cibernéticos contra a democracia. E talvez seja exatamente por isso,
por ela ter feito o seu trabalho, que houve e há tanto interesse em mantê-la
suspensa, sem término formal.
O contraste entre a relevância de suas
descobertas e a atual situação da CPMI das Fake News é ainda mais estridente
tendo em vista que a desinformação e os ataques contra a democracia só
cresceram desde 2019. É de reconhecer que o Congresso foi muito certeiro na
abertura dessa investigação no primeiro ano de governo Bolsonaro, identificando
logo uma das principais frentes do bolsonarismo contra o regime democrático.
Basta ver a campanha de desinformação que, ao longo de todo o governo, Jair
Bolsonaro vem empreendendo contra o sistema eleitoral.
É preciso admitir, no entanto, que o
Legislativo, depois desse acerto inicial com a CPMI das Fake News, reduziu
consideravelmente sua participação na defesa do Estado Democrático de Direito.
Dentro do sistema constitucional de freios e contrapesos, essa retração do
Congresso – em especial, da Câmara dos Deputados sob a presidência de Arthur
Lira (PP-AL) – acabou por destacar, em tom de protagonista, a atuação do STF em
defesa da Constituição.
Tudo fica um pouco desequilibrado quando o
Congresso não cumpre seus deveres constitucionais até o fim. Às vezes, o maior
obstáculo surge exatamente quando o Legislativo começa a realizar bem seu
trabalho, o que desperta resistências. Foi assim com a CPMI das Fake News e,
também, com a CPI da Pandemia. Depois de tudo o que veio à tona, verifica-se um
enorme esforço para que tudo volte à escuridão e ao esquecimento. É papel do
Congresso não permitir que seu bom trabalho seja jogado fora.
Brasil de novo atrás, segundo o FMI
O Estado de S. Paulo
Fundo melhorou a projeção para 2022, mas crescimento estimado para o País está abaixo dos padrões internacionais
Com crescimento de 0,8% neste ano e de 1,4%
no próximo, o Brasil continua correndo bem atrás dos outros emergentes e até
dos países mais desenvolvidos, segundo os balanços e projeções do Fundo
Monetário Internacional (FMI). Já observado nos
últimos dez anos, esse descompasso deve continuar nos próximos cinco, em todo o
horizonte coberto, portanto, pelo Panorama Econômico Mundial (World
Economic Outlook), na versão divulgada na terça-feira. Pelas novas
estimativas, severamente afetadas pela guerra na Ucrânia, a produção global das
economias avançadas deve aumentar 3,3% em 2022 e 2,4% em 2023. Para o conjunto
dos países emergentes e em desenvolvimento as taxas previstas para esses períodos
são 3,8% e 4,4%, com alguma moderação do desempenho chinês.
Com a invasão da Ucrânia, já foram cortadas
as projeções de crescimento de todos os grupos de economias. Terminar a guerra
é a maior prioridade, afirmou o economista-chefe do FMI, Pierre-Olivier Gourinchas,
levando em conta, além da tragédia humanitária imediata, os efeitos econômicos
do conflito e das sanções à Rússia.
Sem ter ainda vencido os desajustes
ocasionados pela pandemia, o mundo enfrenta agora a crise provocada pelo
governo russo. Menor crescimento e inflação maior ameaçam a economia global,
revertendo as perspectivas de recuperação. Pelos novos cálculos, o crescimento
mundial deve ser, neste ano, 0,8 ponto inferior ao estimado em janeiro. A taxa
prevista para 2023 ficou 0,2 ponto menor que a indicada no início do ano.
A guerra, segundo Gourinchas, agrava os
choques de oferta enfrentados pela economia global nos últimos anos. Seus
efeitos devem propagar-se “como ondas sísmicas de choques” pelos mercados de
produtos básicos e pelos canais financeiros.
Diante dos novos desajustes, foram revistas
para baixo as perspectivas de médio prazo de todos os grupos de países, mesmo
daqueles exportadores de commodities, porque deverão beneficiar-se da alta dos
preços da energia e dos alimentos.
O Brasil é um desses exportadores e deve,
portanto, ser um dos beneficiários do aumento das cotações internacionais de
produtos básicos. Esse efeito benéfico já tem sido observado nas contas
externas do País. Nenhum desses detalhes foi examinado na apresentação geral de
Gourinchas, mas o crescimento previsto para o País neste ano ficou 0,5 ponto
maior que o projetado em janeiro. O estimado para 2023, no entanto, diminuiu
0,2 ponto. Além disso, a economia brasileira se destaca, na análise do FMI,
pela inflação já elevada e persistente, pela perspectiva de baixo crescimento e
pelo alto desemprego.
Neste ano e no próximo, o crescimento do
Brasil deve ser inferior às médias da América do Sul, de 2,3% em 2022 e de 2,1%
em 2023. As médias anuais da inflação brasileira, estimadas em 8,2% para este
ano e 5,1% para o próximo, devem ser maiores que as taxas da maior parte dos
sul-americanos. O desemprego, calculado de acordo com critérios do FMI, deve
ficar em 13,7% e 12,9%, superando também os números da maior parte do continente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário