Folha de S. Paulo
ONU quer US$ 43 bi para evitar fome e
mortes; Musk quer dar US$ 46 bi no Twitter
A ONU diz que
precisa de US$ 43 bilhões para dar de comer ou proteger de violências 194
milhões de pessoas, ora sob ameaça imediata de perder a vida. É "ajuda
humanitária" de urgência. No total, 296 milhões estão sob risco terminal,
diz a ONU. Quase 9% da humanidade passa fome braba.
Na semana passada, Elon
Musk disse que teria juntado US$ 46 bilhões para comprar o Twitter.
A guerra na Ucrânia aumentou
o risco de "agitação social" ("social unrest"),
"especialmente preocupante" em "mercados emergentes" e
"economias em desenvolvimento" com pouco dinheiro público para gastar
e muito dependentes de importação de energia e alimentos, agora mais inflacionados.
É o que diz um trecho pouco citado do relatório
do FMI que acaba de sair, o "Perspectiva da Economia
Mundial".
"Se você acha que agora é o inferno na Terra, se prepare. Se a gente não ligar para o Norte da África, o Norte da África vai para a Europa. Se a gente não ligar para o Oriente Médio, o Oriente Médio vai para a Europa". É o que disse David Beasley em entrevista ao site Político, em março —ele é o diretor-executivo do Programa Mundial de Alimentos da ONU.
Não são, claro, opiniões de esquerda,
embora pessoas sob efeito de drogas ideológicas bolsonaristas achem que a ONU é
"comunista". Beasley é um político do Partido Republicano dos EUA,
ex-governador da Carolina do Sul. O FMI dispensa apresentações, como diz o clichê.
A situação não deve melhorar tão cedo,
prevê também o FMI. A inflação
geral pode diminuir um pouco em 2023, mas não a da comida. Desde a
explosão de preços que começou no trimestre final do ano passado até março
deste 2022, a inflação dos alimentos foi de 66% (segundo índice da FAO, a
Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura). A carestia dos
cereais foi de mais de 71%.
Não se trata apenas de fome.
Na revisão de março do seu "Panorama
Humanitário Global 2022", a ONU registrou que 296 milhões de pessoas
precisavam de "assistência humanitária e proteção", 1 de cada 27
pessoas no mundo, em 69 países. A necessidade extrema afetava 1 pessoa de cada
95 em 2015. Em torno de 1 em 56 de 2016 a 2019.
Pouco?
Eles estão falando de ajuda para gente à
beira da inanição ou morte violenta em países destruídos por guerra, miséria e
surtos de ebola como a República Democrática do Congo, por guerras crônicas,
como a Síria ou o Iêmen, por guerras recorrentes, como na Etiópia ou no Sudão
do Sul, por ruína variada e histórica, como o Haiti ou o Afeganistão —a
Venezuela também está no pacote.
Claro que há muito mais gente em situação
terrível. Estamos tratando aqui dos casos de pessoas sob risco iminente e que
chegam ao conhecimento da ONU, graças a pedidos desesperados de ajuda.
O efeito
da inflação deve bater no mundo pobre também por meio da alta de juros
no mundo rico e da baixa do crescimento mundial, o que piora a situação de
países pobres já prejudicados por fugas de capitais na epidemia, do desastre
social da Covid, de renda menor com comércio, turismo e remessas de emigrados
etc.
Segundo o FMI, "cerca de 60%" dos
governos de países de renda baixa correm o risco de uma crise da dívida
("debt distress", calote) ou já estão inadimplentes. Trata-se dos 40
países mais pobres do mundo (24 deles africanos), entre os quais a dívida
mediana praticamente dobrou desde 2013.
Peste, fome, dívida impagável e tem mais, para concluir, mas longe de acabar: "O número de pessoas vivendo em zonas de conflito [guerra] quase dobrou entre 2007 e 2020", discursou David Malpass, presidente do Banco Mundial, na semana passada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário