No retrato de um país onde a desigualdade social começa cedo, dados do IBGE mostram que, entre os 20% mais pobres da população, 29% das crianças estão fora da pré-escola. Entre os 20% mais ricos, a proporção cai para 8%. Embora os indicadores sociais e de renda melhorem, 60,5% da população ainda têm acesso restrito a um dos seguintes direitos: educação, saúde e serviços básicos no domicílio. Na análise do comportamento das famílias, cresce a "geração canguru": quase um quarto dos jovens de 25 a 34 anos ainda mora com os pais.
Desigual desde criancinha
IBGE aponta diferenças de acesso e de estrutura nas creches e pré-escolas de pobres e ricos
Antônio Gois, Carolina Benevides e Letícia Lins
RIO E RECIFE- A desigualdade na educação brasileira começa desde cedo, e não se resume apenas ao acesso à escola. O IBGE comparou a frequência à escola de crianças de 4 e 5 anos por nível de renda. No grupo que concentra os brasileiros que estão entre os 20% mais ricos da população, apenas 7,5% das crianças estão fora da escola. Já entre os 20% mais pobres, esse percentual cresce para 29%. Os dados são da Síntese de Indicadores Sociais 2013 — Uma análise das condições de vida da população brasileira.
Não bastasse o acesso desigual, uma vez matriculados numa pré-escola, estabelecimento que atende a esse grupo etário, a diferença na qualidade já é sentida desde cedo. A partir de dados do Censo Escolar do MEC, o IBGE identificou que a maioria das crianças matriculadas em pré-escolas públicas estuda em estabelecimentos sem parque infantil e banheiro adequado. Enquanto na rede pública a proporção de matrícula em estabelecimentos com esses equipamentos é de, respectivamente, 47% e 44%, na rede privada essas proporções crescem para 86% e 79%, respectivamente.
Como em quase todos os indicadores sociais do país, porém, quando os dados de acesso à pré-escola são comparados ao longo do tempo, há melhorias significativas. De 2002 a 2012, o número de crianças de 4 e 5 anos fora da escola caiu de 43% para 22%, e os avanços foram maiores no grupo mais pobre. Até 2016, a matrícula nessa faixa etária será obrigatória, o que indica que ainda há um esforço a ser feito para se adequar à nova legislação.
Também há desigualdade de acesso à creche. O IBGE constatou que, em 2012, entre os 20% mais ricos da população, 37% das crianças entre 2 e 3 anos estavam fora da creche. Entre os 20% mais pobres, porém, o percentual foi de 78,1%. Mas, muitas vezes, mesmo crianças com acesso não têm estabelecimentos adequados.
ESGOTO E RISCO DE CURTO-CIRCUITO
Na creche São João, na Zona Norte de Recife, 90 crianças são atendidas. A dedicação dos servidores só desperta elogios da comunidade, mas a satisfação não é a mesma no que diz respeito às instalações e equipamentos. As crianças não têm pátio, e os brinquedos ficam no salão que serve de refeitório. No berçário, falta espaço, e 13 dos 15 bebês com menos de 1 ano dormem em colchões no chão. Falta de material de higiene também é problema. Algumas vezes, a creche fica sem sabonete e fraldas descartáveis. Além disso, pais e professores contam que basta chover muito para que seja preciso suspender as aulas por conta do esgoto, que corre a céu aberto em um canal em frente ao prédio.
— Quando chove muito, as águas se misturam, e há dias até que há necessidade de suspender o atendimento, porque não há como os funcionários e as crianças passarem em meio ao esgoto — conta Maria Marileide de Souza, de 51 anos, que tem netos matriculados na creche. Eles até choram pedindo para ficar lá. Gostam muito.
Diretora da creche, Sandra Teixeira diz, no entanto, que o pior é a instalação elétrica. Ela conta que existem muitos "gatos" no bairro, o que faz com que a rede fique sobrecarregada. Por conta disso, os curto-circuitos são constantes.
— Dois dos três ventiladores queimaram por causa disso, e aqui só não pega fogo porque o disjuntor funciona bem — diz Sandra.
A Secretaria de Educação de Recife " confirmou que muitas creches na capital de Pernambuco não possuem par-quinhos nem banheiros adequados, inclusive para pessoas com deficiência. Informou ainda que quase todas as unidades da rede necessitam de requalificação do espaço físico, com acessibilidade e ampliação.
ESCOLARIDADE MÉDIA DE 7,6 ANOS
Considerando a população adulta com mais de 25 anos, os dados mostram que o brasileiro não atingiu sequer a média de oito anos de estudo, isto é, não completou o ensino fundamental. Em 2012, a escolaridade média era de 7,6 anos. Dez anos antes, era de 6,1. Nesse caso, também houve redução da desigualdade. Entre os que estão entre os 20% mais pobres, o avanço foi de 3,3 anos médios de estudo para 5,2. Entre os mais ricos, o avanço foi de 9,7 anos de estudo para 10,7. Mesmo nesse grupo, em média, o brasileiro não chega a completar 11 anos de estudo, ou seja, não chega a concluir o ensino médio.
Fonte: O Globo
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