Entre suas várias anomalias, o sistema político no Brasil costuma remeter para a Justiça casos de deputados e senadores infiéis aos seus partidos. É um traço marcante do subdesenvolvimento democrático do país.
Numa democracia consolidada, um juiz não seria chamado para punir um deputado que troca de legenda. Aqui, está na lei. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acaba de decidir enviar à Justiça uma dezena de ações pedindo a cassação de congressistas infiéis.
Sem querer parafrasear o PT, que tem culpado o "sistema" pelos seus erros, o que ocorre nesse caso de políticos infiéis é uma mistura de regras disfuncionais com excesso de imbricação entre dinheiro público e partidos.
É nula a chance de esse cenário se alterar no curto prazo. Mas um episódio assim --a possível cassação de muitos mandatos por infidelidade-- convida a refletir sobre qual rumo poderá, quem sabe, ser tomado pelo país no futuro.
A lógica atual é simples. Nenhum político se elege sozinho. Precisa do partido, que dá dinheiro e tempo de rádio e de TV. Logo, nada mais natural do que cobrar fidelidade de quem vence a eleição e está exercendo um mandato.
Tudo bem. A ideia é fortalecer os partidos políticos. Só que esse modelo existe há décadas. Ao contrário de siglas sólidas, a maioria é cada vez mais frágil. Algo está muito errado. O DNA do problema é a extrema facilidade com que se monta uma nova agremiação para receber dinheiro público e acesso a outros benefícios. Reforma ampla nunca virá. Uma medida mais simples seria a cláusula de desempenho: só partidos com pelo menos 3% dos votos teriam amplo acesso a dinheiro público e ao rádio e à TV. Mas nem isso parece ter chance de prosperar no Congresso.
Assim, resignemo-nos. A Justiça permanecerá ainda muito tempo cassando deputados infiéis.
Fonte: Folha de S. Paulo
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