quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

O Brasil diante de Trump - William Waack

O Estado de S. Paulo

Não parece haver boas opções para enfrentar quem não diferencia entre amigos e inimigos

Não há muita margem de manobra para o Brasil frente a Trump. No plano geral geopolítico, o presidente americano está desfazendo a ordem internacional que nos foi vantajosa. No plano imediato das tarifas impostas contra exportações de aço e alumínio brasileiras, o espaço de resposta é reduzido comparado ao que aconteceu no primeiro mandato de Trump.

A causa imediata é a probabilidade de que Trump implemente tarifas elevadas para outros setores. O agro aguarda isso a qualquer momento. É séria e real a ameaça de Trump de impor reciprocidade nas tarifas. Em outras palavras, mesmo que o Brasil retalie aqui ou ali, o buraco é bem maior.

O setor privado tem tentado ajudar discretamente o governo através dos canais tradicionais com parceiros americanos, mas a questão não é apenas compensar a inexistência de ligações “diretas” de governo a governo. Trump não faz mais distinções entre amigos e inimigos e abraçou a ideia de que o declínio americano teria sido causado pelo livre comércio.

O Brasil há décadas afirma que a ordem internacional pós-Segunda Guerra, liderada pelos EUA, deveria ser “corrigida” em favor do que hoje se chama de Sul Global. Ironicamente, para o atual governo americano é exatamente essa ordem liberal a responsável pela “fraqueza” do país, que tem de ser “great again”. Daí ser tão central em Washington a arma da política protecionista.

Na visão de Trump, essa arma serve não só para obter concessões também em instâncias que nada tem a ver com déficits comerciai. Ela “reverteria” décadas de liberalidade em relação a concorrentes como a China, mas também a União Europeia. Fato que se revela na brutalidade de sanções tecnológicas e financeiras americanas.

Há certo consenso entre analistas distantes do embate ideológico quanto à visão de que não havia muito mesmo o que os americanos pudessem ter feito para “frear” a China e sua capacidade de desafiar a potência hegemônica agora também em termos militares. Trump não dá indicações de perceber, porém, que o imenso vigor da economia americana e sua capacidade de inovação estão associados a um sistema internacional que depende de regras, cooperação, integração e essencialmente de alianças.

Para o Brasil, essa “virada para dentro” dos Estados Unidos é negativa em vários sentidos, e “schadenfreude” pelo que está acontecendo com o “império” é resultado genuíno do famoso complexo de vira-lata. Nossa situação é delicada não só pelo que Trump faz e desfaz mas, principalmente, pelas nossas próprias vulnerabilidades.

 

Nenhum comentário: