O Estado de S. Paulo
Não parece haver boas opções para enfrentar quem não diferencia entre amigos e inimigos
Não há muita margem de manobra para o Brasil
frente a Trump. No plano geral geopolítico, o presidente americano está
desfazendo a ordem internacional que nos foi vantajosa. No plano imediato das
tarifas impostas contra exportações de aço e alumínio brasileiras, o espaço de
resposta é reduzido comparado ao que aconteceu no primeiro mandato de Trump.
A causa imediata é a probabilidade de que Trump implemente tarifas elevadas para outros setores. O agro aguarda isso a qualquer momento. É séria e real a ameaça de Trump de impor reciprocidade nas tarifas. Em outras palavras, mesmo que o Brasil retalie aqui ou ali, o buraco é bem maior.
O setor privado tem tentado ajudar
discretamente o governo através dos canais tradicionais com parceiros
americanos, mas a questão não é apenas compensar a inexistência de ligações
“diretas” de governo a governo. Trump não faz mais distinções entre amigos e
inimigos e abraçou a ideia de que o declínio americano teria sido causado pelo
livre comércio.
O Brasil há décadas afirma que a ordem
internacional pós-Segunda Guerra, liderada pelos EUA, deveria ser “corrigida”
em favor do que hoje se chama de Sul Global. Ironicamente, para o atual governo
americano é exatamente essa ordem liberal a responsável pela “fraqueza” do
país, que tem de ser “great again”. Daí ser tão central em Washington a arma da
política protecionista.
Na visão de Trump, essa arma serve não só
para obter concessões também em instâncias que nada tem a ver com déficits
comerciai. Ela “reverteria” décadas de liberalidade em relação a concorrentes
como a China, mas também a União Europeia. Fato que se revela na brutalidade de
sanções tecnológicas e financeiras americanas.
Há certo consenso entre analistas distantes
do embate ideológico quanto à visão de que não havia muito mesmo o que os
americanos pudessem ter feito para “frear” a China e sua capacidade de desafiar
a potência hegemônica agora também em termos militares. Trump não dá indicações
de perceber, porém, que o imenso vigor da economia americana e sua capacidade
de inovação estão associados a um sistema internacional que depende de regras,
cooperação, integração e essencialmente de alianças.
Para o Brasil, essa “virada para dentro” dos
Estados Unidos é negativa em vários sentidos, e “schadenfreude” pelo que está
acontecendo com o “império” é resultado genuíno do famoso complexo de
vira-lata. Nossa situação é delicada não só pelo que Trump faz e desfaz mas,
principalmente, pelas nossas próprias vulnerabilidades.
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