Valor Econômico
O batismo de 2025 foi dado por um egresso da
finada frente ampla: “Temos nos ocupado muito com renda e emprego mas, no
fundo, as pessoas só se preocupam com a inflação”
A crença de que o ano só começa depois do
carnaval ganhou ainda mais adeptos com a previsão de que o Orçamento será
votado em março. Mas não é preciso esperar esta aprovação, inequívoca visto que
o Congresso hoje é seu sócio quase majoritário. Tampouco é preciso aguardar a
reforma ministerial ou a equação para as emendas para se concluir que o ano
começou antes mesmo da troca de calendário.
Seu ponto de partida foi dado por um graúdo integrante deste governo egresso da finada frente ampla que o elegeu: “Temos nos ocupado muito com a renda e o emprego mas, no fundo, as pessoas só se preocupam com a inflação”. Esses dois polos estão representados pelos ministros da Casa Civil e da Fazenda. O peso de cada um deles sobre o presidente da República define rumos mais do que toda a Esplanada.
Ninguém tem dúvida de que o ano, que já
começou sob o signo da decisão de Lula de não avalizar o ajuste pretendido pela
Fazenda, manteve, com a trapalhada do Pix, Fernando Haddad no escanteio. O
ministro é um dos poucos no entorno do chefe capaz de lhe dizer: “O senhor
pensa A e eu penso B. Vou fazer A mas vou lhe dizer o que vai acontecer”. Ter
razão nem sempre é o melhor caminho pra vencer a parada. Só que, desta vez,
aconteceu. Repara onde vai parar o juro.
No outro polo está o ministro que mais
emplaca teses. A de que o governo é bom mas se comunica mal lastreou a troca na
Secom, mas foi má conselheira de Rui Costa na troca da laranja pelo limão. A de
que o governo é ruim porque os ministros são desorganizados e não reconhecem a
autoridade da Casa Civil favorece a si e aos seus, como o ministro das Minas e
Energia. A de que Haddad é Joaquim Levy II e o governo vai perder sua base
social abre portas para Gleisi Hoffmann na Secretaria-Geral da Presidência.
Se Haddad recobrou fôlego é porque ficou
claro o efeito corrosivo da inflação sobre a popularidade do presidente. Ainda
não se sabe, porém, se terá força para operar mudanças adicionais. Em vez de
contingenciar o Orçamento no fim do ano, como em 2024, fazê-lo no início para
ir soltando à medida das contingências políticas e fiscais. A ideia tem sido
tratada com discrição porque, espraiada no Congresso, pode tumultuar o
Orçamento.
Se a indisposição do presidente do Senado,
Davi Alcolumbre (União-AP), a conter gastos é notória, aquela do novo
presidente da Câmara pode ser averiguada pelo projeto que, segundo Marcelo
Ribeiro, do Valor,
Hugo Motta (Republicanos-PB) pretende levar à votação. A pretexto de cumprir
decisão do STF que manda ajustar as bancadas ao Censo 2022, tirando de uns
Estados e aumentando a de outros, Motta pretende acrescer 14 cadeiras à Casa. O
projeto é da deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do seu mentor.
Este é apenas um aperitivo da disposição com
a qual os parlamentares se preparam para a votação do Orçamento. Como
represaram a definição das comissões para março, vai tudo junto e misturado. A
alocação de recursos será uma venda casada com a escolha das comissões que
concorre, em grau de importância, com a disputa pela Esplanada.
Basta lembrar as trocas das ex-ministras Ana
Moser (Esportes) e Daniela Carneiro (Turismo) e a resistência à saída de
Juscelino Filho (Comunicações), indiciado pela PF, para concluir que a
ampulheta da reforma ministerial não se move por cálculos políticos
sofisticados. Acontecerá quando der na telha do presidente.
Tampouco faz sentido imaginar que a reforma
possa amarrar os partidos que seguirão com o Palácio do Planalto em 2026. Quem
assistiu ao impeachment de Dilma Rousseff conhece os personagens que faziam
juras de fidelidade à ex-presidente no almoço e se acertavam com Michel Temer
no jantar. São os mesmos que aí estão. De tão à vontade, os caciques
partidários nem mesmo se dão ao trabalho de prometer fidelidade ao governo.
A única reforma que hoje deveria importar é a
do ajuste necessário para conter a inflação. E não é Paulo Teixeira
(Desenvolvimento Agrário) ou Carlos Fávaro (Agricultura) que vão resolvê-la,
como disse o presidente, mas um Haddad longe da sombra de Rui Costa. Até para
facilitar a vida do novo ministro (Secom) baiano.
O cinturão de proteção ao ministro da Fazenda
tem contado com Renan Filho (Transportes) e Silvio Costa Filho (Portos e
Aeroportos). Por convicção e para se contrapor aos algozes do ministro no PP,
no PSD e no União, fizeram do mantra de Renan Filho (“Governo que cumpre meta
de inflação não precisa explicá-la”) antídoto contra as ofensivas.
Os problemas não se restringem a um Congresso
perdulário. Se o programa de empréstimo consignado no setor privado, costurado
pela Febraban, colabora com a economia geral da nação, por permitir a troca de
dívidas caras por uma mais barata, o choque de crédito dos bancos públicos vai
na direção contrária.
Até a reação desenfreada a Donald Trump pode
colaborar para desandar a pauta. Uma taxação generalizada sobre as exportações
brasileiras é uma catástrofe, mas é na costura miúda com os demais prejudicados
que se vai resolver. Retaliar com uma taxação amplificada de serviços digitais,
usados pela maioria dos brasileiros, é adubar a inflação. E não apenas. É
também enfrentar uma retaliação política da Casa Branca que pode acabar
devolvendo fôlego ao viralatismo bolsonarista.
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