quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

O lenga-lenga sobre tarifas e dólar - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Explicações peremptórias sobre tarifas, câmbio ou rito da economia são conversa fiada

Assim que Donald Trump anunciou o aumento de imposto de importação sobre aço e alumínio apareceram estatísticas detalhadas de exportações brasileiras, tabelas de "quem ganha e quem perde" e outras especulações sobre qual pode ser o efeito desse de tantos decretos sinistros.

Nesta quarta, Jerome Powell, presidente do Fed, disse que não tem ideia de qual vai ser o efeito das "tarifas", que depende de extensão, tamanho e duração dos impostos. "Em alguns casos, não chega muito ao consumidor, em alguns casos, chega... Depende de fatos que ainda estamos para ver".

Powell poderia estar desconversando, até porque não quer treta extra com Trump. Mas, de fato, "depende". Se Trump decretar aumento generalizado de impostos de importação, como no caso da "reciprocidade", os impactos irão muito além da relação de cada país com os EUA. Pode haver sobra de mercadorias, desova ("desvio") em terceiros mercados, entre muitos efeitos secundários, do comportamento de empresas a mudanças em juros. Por ora, há muita lenga-lenga.

Neste fevereiro, o preço do dólar no Brasil deixou de ser aberração mundial, como em dezembro, ao menos entre 37 moedas relevantes acompanhadas pelo FMI. Em dezembro, "o mercado" atribuía a desvalorização do real à piora da percepção do problema fiscal.

De fato, o tombo do real foi de início provocado pelo anúncio do pacote de final de novembro. Descambou em pânico. Mas, neste fevereiro, o problema fiscal continua igualmente ruim. E aí?

Na comparação com a média de fevereiro de 2024, porém, o real ainda é a segunda moeda mais desvalorizada (entre aquelas 37). Perde para o México, vizinho infeliz de Trump. Tem mais. Em fins de setembro, a taxa de juros futuros de um ano estava perto de 12%. Foi à casa de 15% ao ano no pânico financeiro de dezembro. Continua por aí, em 15%.

Nesta quarta, Armínio Fraga na prática pediu que Gabriel Galípolo, presidente do BC, convença Lula a dar um jeito nas contas do governo. "Considero que o paciente [contas públicas] está na UTI, não precisa nem entrar nas discussões sobre dominância fiscal, isso é muito acadêmico [é mesmo, outra lenga-lenga]. O mix macro precisa mudar, e acho que isso não parece estar na agenda".

O preço do dólar baixou em parte devido ao desmonte de aplicações financeiras que ganhariam com a alta da moeda americana, desmonte mundial e que arrastou também operações brasileiras. De modo um tanto louco, donos de dinheiro grosso acreditam que Trump não fará tanto estrago na inflação. O efeito do problema fiscal permanece, no entanto.

Qual a lenga-lenga? Falar de taxa de câmbio como se o Brasil fosse de outro planeta ou fazer campanha político-econômica com base em solavancos cambiais.

Suave e indiretamente, à sua maneira, Galípolo disse nesta quarta que "o mercado" elevou seus preços também por causa do receio de que o governo vá reagir ao desaquecimento da economia com aumento de crédito ou gasto público.

O aumento de crédito tem sido uma lenga-lenga de Lula nas últimas semanas. Se a economia não esfriar um tanto, a inflação não cai (não que a inflação dependa inteiramente disso). Em dezembro e janeiro, apareceram alguns sinais de esfriamento. Galípolo disse que pode ser falso alarme (assim foi no final de 2023 e mesmo em agosto de 2024).

Ideias peremptórias sobre volatilidades e incertezas são lenga-lenga.

 

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