O Estado de S. Paulo
O histórico de contingenciamentos aponta que
é possível, mas também ressalta a importância de contenção já no início do ano
Em janeiro, o governo central deve ter
registrado superávit primário de R$ 89,3 bilhões, pouco acima da projeção da
Warren Investimentos, de R$ 88,2 bilhões. Os dados são do portal Siga Brasil,
coletados por minha equipe no último dia 10. O Siga compila dados do Sistema
Integrado de Administração Financeira (Siafi), permitindo a antecipação do
resultado do Tesouro Nacional.
No mesmo mês do ano passado, o superávit primário foi de R$ 79,5 bilhões ou R$ 83,1 bilhões quando corrigido pela inflação. A melhora de R$ 6,2 bilhões no resultado deu-se com altas reais de 4,6% da receita líquida (receita total menos transferências a Estados e municípios) e de 3,2% da despesa, na comparação com janeiro de 2024.
A receita total foi de R$ 303,9 bilhões, com
crescimento real de 4,1%. Dada a centralidade da arrecadação para o alcance da
meta de resultado primário no ano passado – como havia planejado o Poder
Executivo –, é necessário o acompanhamento detalhado do desempenho das receitas
também no exercício presente. Isso pois a estratégia permitiu uma melhora do
déficit primário de 2,3% do PIB em 2023 para 0,4% do PIB no ano passado.
Ademais, a alta do mês passado foi conduzida
pelo conjunto de rubricas chamado de receitas administradas (impostos e
contribuições), que avançou 5,5%, já descontada a inflação. Esse grupo, além de
ser o maior, é o mais sensível ao ciclo econômico e às medidas de recomposição
da base tributária adotadas pelo governo.
Vale notar ainda o ingresso de R$ 4,3
bilhões, em janeiro de 2024, a preços corrigidos pelo IPCA, derivado da
tributação extraordinária do estoque de rendimentos dos fundos exclusivos.
Portanto, no início de 2025, há consistência no desempenho das receitas, que
continuam avançando mesmo na ausência de novas receitas não recorrentes.
Subtraídos R$ 43,8 bilhões da arrecadação
total, a título de transferências constitucionais, chegamos à receita líquida
de R$ 260,1 bilhões, 4,6% superior ao mesmo mês do ano passado, como
mencionado.
Já os gastos somaram R$ 170,9 bilhões,
maiores em 3,2%. Alguns dos principais componentes da despesa já tinham aumento
previsto e devem seguir em alta. A Previdência somou R$ 73,2 bilhões e o
Benefício de Prestação Continuada (BPC), R$ 10,1 bilhões, crescimentos de 2,4%
e 14,8%, respectivamente. Isso se explica pelo maior número de beneficiários e
da valorização do salário mínimo.
A complementação da União ao Fundeb chegou a
R$ 11 bilhões no mês, aumento de 21,9%, e deve continuar crescendo até 2026,
por determinação constitucional. As despesas chamadas obrigatórias com controle
de fluxo somaram R$ 28,3 bilhões, com alta de 5,3%. Dentro desse conjunto, vale
destacar a queda real de 7,9% nos gastos com Bolsa Família, possivelmente
associados a um “pentefino” no programa no decorrer de 2024, e a alta de 23,2%
nos dispêndios com saúde, cujo valor desembolsado é vinculado às receitas da União.
Outro ponto de atenção são os gastos com
pessoal, de R$ 30,9 bilhões no mês passado. Esse montante representa diminuição
real de 4,5% frente a janeiro de 2024, pois em termos nominais o valor
continuou praticamente constante. A atenção, mesmo com queda, se deve à não
aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA) até o momento. Apenas após a
efetivação da LOA é que podem ser concedidos aumentos ao funcionalismo, com
essa valorização salarial sendo então aplicada de maneira retroativa.
Finalmente, as despesas não obrigatórias,
chamadas discricionárias, somaram R$ 7,9 bilhões, com aumento real de 19,1%.
Remanesce uma dúvida sobre o ritmo de execução desses dispêndios enquanto não
for aprovada a LOA. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) permite gastos de
até 1/12 da dotação do Projeto de Lei Orçamentária (Ploa) enviado pelo Poder
Executivo em 2024. Porém, há especulações sobre possível adoção de ritmo mais
lento de desembolsos discricionários, como 1/18 do valor do Ploa.
Fato é que janeiro não irá dirimir essa
questão, e será necessário observar o resultado de fevereiro para aferirmos
qual a cadência dos gastos não obrigatórios até a aprovação do Orçamento.
Porque tradicionalmente o dispêndio é baixo nessas rubricas no primeiro mês do
ano, dados certos trâmites orçamentários, independentemente de LOA aprovada ou
não.
De 2019 a 2025, a fração gasta do que era
previsto para as discricionárias no Orçamento anual, em janeiro, foi de 3,1% em
média, valor bastante inferior a 1/12 (8,3%) e 1/18 (5,6%). Em 2025, tais
dispêndios foram de 3,6% da previsão contida no Ploa.
A importância de se gastar lentamente o
orçamento de despesas discricionárias, nesse momento, reside na necessidade
premente de contingenciar despesas para cumprir a meta fiscal anual. Isso é
mais difícil de ser feito caso a execução esteja acelerada, reduzindo a margem
de manobra do governo em consequência.
Calculamos que serão necessários cortes de R$
35 bilhões para atingir o limite inferior de tolerância da meta legal de
resultado primário. O histórico de contingenciamentos aponta que isso é
possível, mas também ressalta a importância de contenção já no início do ano.
Essa será a grande medida fiscal deste ano. E precisará vir com brevidade.
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