Expansão do Minha Casa, Minha Vida é engano habitacional
O Globo
Governo deixa de financiar reforma de imóveis
no Centro para construir casas novas em regiões distantes
Preocupado com a perda de popularidade, o
governo Lula acaba
de ampliar o teto de financiamento do Minha Casa, Minha Vida (MCMV) para
famílias com renda bruta mensal entre R$ 8 mil e R$ 12 mil. A medida representa
uma contradição com o objetivo original do programa, lançado para atender à
população de baixa renda. Pode-se argumentar que, diante de um déficit
habitacional de 6 milhões de moradias, toda ajuda é bem-vinda. Mas o MCMV é a
política habitacional errada para as necessidades e oportunidades brasileiras.
Ele herdou distorções dos antigos programas de moradia popular. A principal é incentivar a construção de novas moradias a baixo custo, em geral conjuntos habitacionais em periferias sem infraestrutura de serviços e transportes. O governo fica contente com os números de casas entregues e as imagens para propaganda. As construtoras ficam contentes com os financiamentos generosos e os negócios em expansão. E os beneficiados? Bem, estes terão de arcar com alto custo de transporte, numa rotina desgastante que consome horas dentro de ônibus e trens, além de enfrentar a violência e as demais mazelas de um Estado ausente.
Urbanistas há tempos criticam a expansão
horizontal das cidades, que exige mais investimento de infraestrutura, cria
riscos para segurança e um sem-número de custos indiretos. Ao mesmo tempo, há
dezenas de regiões centrais abandonadas, em decadência, cujos imóveis, muitos
públicos, poderiam ser reformados para habitação. O mercado de retrofit pode
ser menos atraente às incorporadoras, mas atenderia de modo mais barato às
necessidades habitacionais das faixas de renda mais baixas. Só que
financiamentos do MCMV a reformas foram reduzidos.
Entre as próprias construtoras há quem veja a
requalificação das áreas centrais como oportunidade. Uma questão básica é o
envolvimento dos governos para que as normas, em especial tributárias, tornem o
investimento atraente à iniciativa privada. O Recife, com apoio do Ministério
das Cidades e da Caixa, desenvolve parcerias público-privadas para reformar
prédios da União. Outras cidades e estados mostram interesse no modelo. O
Ministério das Cidades selecionou 654 imóveis para restaurar em São Paulo, Rio,
Belo Horizonte, Manaus, Goiânia, Porto Alegre e João Pessoa.
A Prefeitura paulistana criou em 2021 o
Programa Requalifica Centro, com o objetivo de levar 220 mil moradores à região
em dez anos. A intenção é que a iniciativa se perpetue, independentemente da
troca de prefeitos. O tratamento tributário especial é extenso: perdão de
dívidas de IPTU; isenção por três anos para o edifício reformado; redução da
alíquota do ISS para projetos e obras; isenção do Imposto sobre Transmissão de
Bens Imóveis.
No Rio, chegou a haver 4 mil endereços vazios
no Centro. Por muitos anos a legislação proibiu construções na região. Com o
programa municipal Reviver Centro, o quadro mudou. Segundo o Sindicato da
Construção Civil, hoje o maior volume de lançamentos e de vendas ocorre no
Centro e na Zona Portuária em revitalização. Falta adensar o comércio, mas o
mais importante, o retorno aos Centros, parece irreversível. Lojas e serviços
vêm em seguida. A reurbanização das áreas centrais merece bem mais atenção do
governo federal do que medidas de fundo eleitoreiro, como a extensão dos
financiamentos a novos imóveis pelo MCMV.
Ensino básico ganha com avaliação de questões
discursivas no Ideb
O Globo
Proposta que leva em conta qualidade da
escrita representa aperfeiçoamento nos indicadores da educação no Brasil
Políticas educacionais precisam de
aperfeiçoamento constante. Por isso é bem-vinda a iniciativa do Ministério
da Educação (MEC)
de passar a considerar, no cálculo do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (Ideb), a qualidade da escrita na resposta a questões discursivas. É um
salto importante para a melhoria do sistema de avaliação de ensino, que precisa
ser mantido como política de Estado permanente e preservado dos humores
ideológicos do governo da ocasião.
Calculado a cada dois anos, o Ideb usa dados
do Censo Escolar, que fornece as taxas de aprovação, e dos exames do Sistema de
Avaliação da Educação Básica (Saeb). No início os testes eram anuais, depois
passaram a ser aplicados apenas no 5º e 9º anos do ensino fundamental e na 3ª
série do ensino médio, última do ciclo básico. A inclusão da qualidade das
respostas por escrito no Saeb é um marco no aperfeiçoamento dos exames.
Permitirá acompanhar a capacidade de raciocínio lógico e de expressão dos
alunos a partir do que aprendem. Começará a refletir uma avaliação mais ampla
do preparo dos estudantes, algo impossível pelas respostas por múltipla escolha
do formato atual.
Os testes com perguntas discursivas começarão
a ser aplicados ainda neste ano, para que a mudança passe a vigorar em 2029.
Espera-se que possam ser adotadas antes. “A ideia é que a gente introduza essa
dimensão da escrita como uma parte da avaliação. Isso impacta o tempo de
produção dos resultados e também tende a exigir dos elaboradores dos testes
previsibilidade em relação à correção”, diz Manuel Palacios, presidente do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
braço técnico do MEC responsável pelas avaliações. Daí ser necessário o período
de testes, embora o Inep já tenha razoável experiência com a correção de
redações, acumulada na aplicação do Enem.
O cálculo das notas do Ideb, que variam de zero a 10, poderá sofrer mudanças para torná-lo um indicador de alcance mais amplo. Em abril, o assunto será discutido em seminários por todo o país, com a presença de secretários de educação, professores e pedagogos. Há, ainda, a ideia de criar quatro níveis de aprendizado — avançado, adequado, básico e abaixo do básico. A mudança tem relação com as novas metas propostas pelo MEC para o Plano Nacional de Educação, que será debatido no Congresso. Elas preveem que 70% dos estudantes concluam o 5º ano com aprendizagem adequada; 65% cheguem dessa forma ao final do ensino fundamental; e 60% ao final do ensino médio. Sejam quais forem a metodologia adotada para os indicadores e as metas a alcançar, governadores e prefeitos precisam apoiar suas secretarias de educação para elevar o padrão do ensino.
Emendas crescem mais em orçamento pouco
realista
Valor Econômico
Se o salário mínimo fosse corrigido, como antes, apenas pelo INPC, e as despesas constitucionais de saúde e educação pelo IPCA, o governo central teria obtido em 2024 superávit primário de 0,41% do PIB
O orçamento de 2025, aprovado na correria em
votação simbólica no Congresso, na quinta-feira, três meses após o prazo, foi
bastante generoso com os gastos e mais ainda com as emendas parlamentares. O
superávit fiscal orçado subiu de R$ 3,7 bilhões para R$ 15 bilhões, os
investimentos aumentaram e vários programas do governo, para os quais não havia
recursos definidos, foram encaixados de alguma maneira. A receita foi
reestimada em R$ 22,5 bilhões, o que, junto com a subestimação de despesas,
permitirá que o governo Lula finalmente chegue ao azul nas contas públicas - no
papel. O ano deve fechar com um déficit de R$ 75 bilhões, segundo a Instituição
Fiscal Independente (IFI) do Senado, ou 0,7% do PIB, em um cálculo alinhado com
os dos analistas privados.
O Orçamento foi recalibrado pela diferença
entre a inflação ocorrida até junho (4,23%) e a efetiva de dezembro, de 4,83%.
As receitas foram empurradas para cima, enquanto algumas despesas subiram e
outras foram cortadas. Entre as que foram aumentadas estão os investimentos,
que passaram de R$ 74,3 bilhões para R$ 89,4 bilhões, os gastos com Educação,
que foram de R$ 117 bilhões para R$ 167 bilhões, e os de saúde, que foram
reavaliados de R$ 228 bilhões para R$ 232 bilhões. Áreas importantes perderam
recursos em relação à dotação original. As principais: Ciência e Tecnologia (R$
2,96 bilhões), Desenvolvimento Social (R$ 2,94 bilhões) e Educação (R$ 2,7
bilhões).
Além disso, o Congresso contou como dadas
receitas extraordinárias que têm probabilidade muito alta de não se realizarem.
A mais óbvia é o ganho de R$ 20,9 bilhões decorrente do aumento da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido e dos Juros sobre Capital Próprio, rejeitado pelos
parlamentares. Os ganhos esperados com processos com acordos feitos por
empresas por derrotas no Carf, de R$ 28,5 bilhões, devem se revelar miragem,
como o foi o de R$ 54,7 bilhões com os mesmos tributos no orçamento de 2024 - a
arrecadação foi inferior a R$ 300 milhões. Há pelo menos uma grande despesa
subestimada, a maior delas, com a Previdência Social. Sua dotação aumentou em
R$ 8 bilhões, ainda assim bem abaixo do que os analistas estimam ser realista.
Em 2024, houve uma diferença entre o estimado e o resultado efetivo de R$ 30
bilhões. No atual orçamento, há diferença entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões.
O orçamento de 2025 ficou no limbo à espera
de definição sobre a prioridade absoluta dos parlamentares: recursos para
emendas. A exigência de transparência e publicidade no uso de recursos
públicos, feita pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, que
proibiu o pagamento, travou o fluxo das emendas. Mas o Congresso voltou à carga
com apetite. Em primeiro lugar, foram incluídos R$ 11,5 bilhões em emendas de
comissão. A toque de caixa, depois que um acordo com o STF foi finalizado,
Câmara e Senado votaram por “ressuscitar” restos a pagar que tinham sido
cancelados em 2024.
Além dos R$ 50,5 bilhões garantidos - são
obrigatórias as emendas individuais, de R$ 24,7 bilhões, e as de bancadas, de
R$ 14,3 bilhões -, o governo concordou em liberar mais R$ 11,2 bilhões para
deputados e senadores. A indicação do destino dos recursos será feita por eles
com verbas para as despesas discricionárias do Executivo, o que representa um
grau a mais, absurdo e indesejável, de apropriação orçamentária pelo
Legislativo. Não para por aí. Esses recursos sairão da rubrica RP2, as
tristemente famosas emendas do relator, que originaram o “orçamento secreto”,
do qual o atual presidente do Senado, Davi Alcolumbre, foi um dos principais
intermediadores e beneficiários. Nelas, não há nomeação dos autores das
indicações das verbas, exatamente o que o acordo recém-aprovado proibiu.
Apesar dos dribles no orçamento, será mais
fácil ao governo conseguir este ano atingir a meta fiscal, novamente usando o
piso, um déficit de R$ 30,9 bilhões, com a exclusão de R$ 44 bilhões de
pagamentos dos precatórios. A arrecadação no primeiro bimestre, segundo a IFI,
cresceu 3% reais, e o superávit no período dobrou para R$ 52 bilhões. Contou
decisivamente para o bom resultado o limite de gastos a um doze avos com a não
aprovação do orçamento. Os reajustes aos servidores não foram feitos e as
despesas discricionárias foram contidas, causando uma queda real de 5,1% das
despesas primárias. Para a IFI, se as receitas continuarem com bom desempenho
(um grande “se”), houver um bloqueio de R$ 18,6 bilhões e com empoçamento
(recursos autorizados e não gastos) de R$ 15,7 bilhões, será possível cumprir a
meta no limite inferior.
Mais importantes que as ginásticas no
orçamento são o resultado do estudo feito pela instituição mostrando com
números o que se sabia, e que o governo teimou em ignorar. Se o salário mínimo
fosse corrigido, como antes, apenas pelo INPC, e as despesas constitucionais de
saúde e educação pelo IPCA, o governo central teria obtido em 2024 um superávit
primário de 0,41% do PIB, perto da meta original de 0,5%, alterada pelo
Planalto. Continua ao alcance do governo estancar a rápida trajetória do
aumento de gastos e do endividamento público, e ele deveria estar interessado
nisso.
Orçamento é engessado por governo e Congresso
Folha de S. Paulo
Há projeções duvidosas, excesso de despesas
obrigatórias e aumento de emendas parlamentares; modelo não será sustentável
Aprovado com atraso de quase três meses na
semana passada, o Orçamento federal para 2025 prevê superávit de R$ 15 bilhões,
excluídas as despesas com juros, mas traz projeções irrealistas e agrava o
problema da ampliação desmedida da influencia do Legislativo por meio de
emendas parlamentares —o que compromete a capacidade do Executivo de gerir os
recursos públicos com eficiência.
O
montante destinado a elas atingiu R$ 50,4 bilhões, um pouco menos que no
ano passado. É alarmante, porém, o salto das emendas de execução impositiva,
que passaram de R$ 26,3 bilhões (49% do total) em 2024 para R$ 39 bilhões (77%)
em 2025.
O quadro é piorado com o acordo patrocinado
pela ministra das Relações Institucionais, Gleisi
Hoffmann, segundo o qual valores referentes a emendas atrasadas serão pagos
com o direcionamento pelos congressistas de recursos dos ministérios.
Desde 2020, os gastos fixados por deputados e
senadores somam exorbitantes R$ 150 bilhões, uma transferência de poder
ao Congresso
Nacional que privilegia interesses paroquiais em detrimento de
prioridades nacionais, amplia
o risco de mau direcionamento de recursos e favorece a corrupção.
Desse total, R$ 36,5 bilhões foram
direcionados para as chamadas emendas de relator, sem designação dos autores e
extintas após acordo entre os três Poderes. A falta de transparência em boa
parte dos desembolsos aprovados, entretanto, persiste.
As projeções oficiais de receita e despesa
para o ano também não trazem alento quanto às dificuldades para a execução da
peça orçamentária, considerada muito otimista por especialistas. A arrecadação
permanece dependente de mais de R$ 160 bilhões oriundos de fontes incertas ou
condicionadas a aval legislativo.
Um exemplo é a projeção de R$ 28,5 bilhões em
ganhos por resolução de controvérsias tributárias de empresas no âmbito do
Carf, um conselho administrativo —ante apenas R$ 308 milhões realizados no ano
passado. A coleta de impostos também deve desacelerar com o menor ritmo de
crescimento da atividade econômica, para cerca de 2% após 3,4% em 2024.
Há duvidas ainda sobre despesas, caso
do programa educacional Pé-de-Meia, que tem custo estimado de R$ 12
bilhões, mas conta com provisão de apenas R$ 1 bilhão. Na soma geral, estima-se
que o governo precisará contingenciar até R$ 30 bilhões dos gastos para atingir
a meta indicada (que não considera R$ 44 bilhões em pagamentos de precatórios).
Evidencia-se mais uma vez o engessamento do
Orçamento. Cerca de 80% dos recursos são absorvidos por salários,
aposentadorias e benefícios sociais. Sem reformas para conter a expansão de
dispêndios obrigatórios, prosseguirá o esmagamento do que resta para manutenção
da máquina pública e investimentos, o que é insustentável. Não será possível
adiar o enfrentamento do problema por muito tempo.
O debate perdido na segurança pública
Folha de S. Paulo
Polêmica sobre fala de Lewandowski mostra
como governo e esquerda estão acuados, enquanto a direita advoga linha dura
O ministro Ricardo
Lewandowski, da Justiça, meteu-se em campo minado ao fazer uma observação
ligeira sobre uma percepção comum de impunidade no país. "É um jargão que
foi adotado pela população, [o de] que a polícia prende
e o Judiciário solta. Eu vou dizer o seguinte: a
polícia prende mal e o Judiciário é obrigado a soltar", disse o
ex-magistrado durante um evento público.
A declaração provocou reação ruidosa das
corporações, aí incluída a Associação Nacional dos Delegados de Polícia
Federal, abrigados na pasta comandada por Lewandowski. Políticos de
oposição aproveitaram a oportunidade para fustigar o governo.
Diante da controvérsia, o ministro buscou a
pacificação. Na sexta-feira (21), afirmou que a frase de dois dias antes havia
sido tirada de contexto —a falta de integração das informações da polícia e as
audiências de custódia. E fez elogios à polícia brasileira, que seria
"altamente eficiente, preparada" e mereceria mais remuneração e
equipamentos.
O episódio poderia ser corriqueiro se não
envolvesse um dos temas mais espinhosos para o governo Luiz Inácio Lula da Silva
(PT). Trata-se de
exemplo revelador de como a esquerda e mesmo as forças moderadas se encontram
acuadas no debate em torno da segurança pública.
Nessa seara, a direita tem sabido explorar
com eficiência as mais que justas preocupações da população com a criminalidade
e a violência —que
no Brasil e na América Latina estão muito acima da média global— para a defesa
de políticas de linha dura que não raro descambam para populismo
penal, corporativismo e incentivo à letalidade policial.
É nesse cenário que a administração petista
tenta mais uma vez levar adiante o que deveria ser sua principal iniciativa no
setor: uma proposta de emenda constitucional da qual se fala há quase um ano e
nunca foi formalmente apresentada ao Congresso
Nacional.
Uma primeira tentativa de debate do texto com
os governadores, no final de outubro do ano passado, deu ideia das dificuldades
pela frente. Oposicionistas, alguns deles potenciais candidatos à disputa
presidencial de 2026, rejeitam a ideia de maior coordenação federal na
segurança pública —e podem aproveitar a oportunidade para empunhar bandeiras
conservadoras.
Faltou ao governo Lula, desde a campanha eleitoral, um programa consistente na área, e falta aos políticos arejados disposição para encampar teses mais ousadas, como a descriminalização progressiva das drogas, defendida por esta Folha.
Lula descobre que existem bandidos
O Estado de S. Paulo
Presidente percebe que a segurança é tema que
dá e tira votos e resolve finalmente endurecer o discurso contra bandidos –
aqueles que o PT sempre considerou vítimas de ‘injustiça social’
Tisnado pela impopularidade, com índices de
aprovação empurrados ladeira abaixo e lá permanecendo, o presidente Lula da
Silva parece que finalmente descobriu o quão grande é a sensação de insegurança
na população brasileira – e que esse não é um problema restrito apenas ao
eleitorado mais conservador. A segurança pública, como se sabe, é uma área na
qual nem o governo nem a esquerda nem muito menos o PT têm o que mostrar.
Recentemente, porém, durante evento no Ceará, em que protagonizou uma de suas
muitas inaugurações palanqueiras, Lula afirmou que não permitirá que a
“república de ladrões de celular comece a assustar as pessoas nas ruas deste
país”.
A retórica de vingador mascarado, própria de
gibis de super-heróis, não orna bem nem com um presidente da República, que não
tem entre suas atribuições cuidar da segurança dos cidadãos, nem com um
integrante do PT, partido que jamais se preocupou de verdade com isso. Ademais,
a “república de ladrões de celular” já é conhecida de todos os brasileiros que
vivem nas grandes metrópoles. Logo, Lula chegou tarde ao debate.
Roubo e furto de celulares são hoje os crimes
que mais preocupam os cidadãos quando questionados sobre violência urbana,
crimes esses que ocorrem de forma democrática, afetando todas as classes
sociais. Em alguns casos, como o de São Paulo, há também um notável crescimento
nos índices de latrocínio (roubo seguido de morte).
Já faz tempo que o roubo e o furto de
celulares resultavam apenas em prejuízo financeiro. Especialistas lembram que
os aparelhos viraram fonte de devassa na vida da vítima. Enquanto esta perde um
patrimônio de valor e o seu sigilo bancário, bandidos acessam dados pessoais e
podem realizar movimentações financeiras e realizar compras com cartões
cadastrados. Tudo isso amplifica a sensação de insegurança. Além de São Paulo,
números crescentes são registrados em capitais como Salvador e Rio de Janeiro.
Lula descobriu o que sucessivas pesquisas já
apontavam desde o ano passado: a maioria dos brasileiros vê piora na segurança
pública. Em março de 2024, 79% dos entrevistados em enquete da Quaest sentiam
que a violência no Brasil havia piorado nos 12 meses anteriores. O Datafolha
também registrou, ao longo daquele ano, a volta da segurança pública ao topo
das preocupações nas capitais. Não se viu reação governamental significativa,
apenas uma tentativa tímida do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo
Lewandowski, de transmitir algum movimento na área. Até aqui, deu no que deu:
em nada.
Agora há registros na imprensa descrevendo o
esforço de auxiliares do presidente para convencer o chefe de que, assim como a
inflação, a segurança pública é um problema que também prejudica a imagem do
seu governo, ainda que seja atribuição dos Estados. Como o único problema que
Lula de fato conhece é a sua popularidade (e a próxima eleição à vista), ele
resolveu agir – ao seu estilo: com bravatas e campanha publicitária. No mesmo
palanque no Ceará, o presidente disse que “lugar de bandido não é na rua assaltando,
assustando e matando as pessoas”, numa fala calculada para tentar convencer o
eleitorado de que pode enfrentar a direita nesse terreno. Além do discurso, o
governo também promete, ora vejam, mais uma campanha, provisoriamente focada no
“Celular Seguro”, aplicativo do Ministério da Justiça que ajuda a bloquear e
localizar celulares perdidos ou roubados.
Ao jornal O Globo, o deputado Jilmar
Tatto, secretário nacional de Comunicação do PT, escancarou a estratégia: “O PT
até agora não achou embocadura para esse tema, mas o governo, depois de muitos
debates, não está mais tendo essa confusão. Bandido tem que ser julgado e ir
para cadeia, cara que rouba tem que ser julgado e pagar pelo que fez, sendo
pobre ou rico. Essa é a mudança conceitual e de comportamento do ponto de vista
de como tratar o tema e a linguagem”. Bem, antes tarde do que nunca: para um
partido que sempre atribuiu o crime às “injustiças sociais”, chamar bandido de
bandido é um progresso e tanto.
Minha Casa Minha Vida para classe média
O Estado de S. Paulo
Governo turbina crédito do programa
habitacional com recursos do Fundo Social do Pré-Sal para atender a uma faixa
de renda mais alta, em novo esforço para seduzir esses eleitores
Desesperado para recuperar a popularidade
perdida, o governo Lula da Silva decidiu enviar R$ 15 bilhões do Fundo Social
do Pré-Sal para ampliar a verba do Programa Minha Casa Minha Vida. Com o
reforço, a ideia é viabilizar uma forma de financiar operações para compra da
casa própria por famílias com renda bruta mensal entre R$ 8 mil e R$ 12 mil,
que atualmente não são alcançadas por essa política habitacional.
A intenção do Executivo de ampliar as
possibilidades de uso dos recursos do Fundo Social já estava clara desde a
edição da Medida Provisória 1.291/2025, de 6 de março deste ano, que incluiu,
entre os possíveis destinos da verba, gastos com habitação de interesse social,
infraestrutura social, mitigação e adaptação às mudanças climáticas e
enfrentamento das consequências sociais e econômicas de calamidades públicas.
Ainda faltava, no entanto, um detalhamento
sobre como o dinheiro seria utilizado, o que foi elucidado após o Ministério do
Planejamento enviar um ofício ao relator do Orçamento, senador Angelo Coronel
(PSD-BA).
A classe média é o novo alvo do governo, que,
com uma só medida, pretende resolver dois problemas. O primeiro é aumentar os
financiamentos da chamada faixa 3 do Minha Casa Minha Vida, para pessoas com
renda mensal entre R$ 4,7 mil e R$ 8 mil, com recursos do Fundo Social do
Pré-Sal.
O segundo é aproveitar a “sobra” de recursos
da poupança e do FGTS, que seria direcionada à faixa 3, para criar a faixa 3
estendida, com renda mensal entre R$ 8 mil e R$ 12 mil, que hoje excede o
limite de renda para enquadramento em financiamentos a juros reduzidos no
programa habitacional.
Como se sabe, a disputa por recursos da
caderneta, tradicional fonte de recursos para o financiamento habitacional, tem
sido feroz em razão da combinação de inflação elevada, altas taxas de juros e a
popularização de investimentos mais rentáveis e líquidos – situação que levou a
Caixa a suspender novas contratações em outubro do ano passado e, depois, a
exigir entrada maior dos compradores.
O governo, se desejasse, poderia colaborar de
outras formas. Se reduzisse o gasto público, também diminuiria a demanda e, por
consequência, a inflação e a necessidade de o Banco Central manter a Selic em
nível tão elevado, o que tem feito com que os recursos para crédito
habitacional acabem mais rápido. Mas isso demandaria responsabilidade e
paciência, e um governo que só tem olhos para a reeleição não tem tempo a
perder.
Ao utilizar recursos financeiros do Fundo
Social do Pré-Sal para operações de crédito habitacional, o governo conseguirá
injetar mais dinheiro na economia sem ultrapassar o limite de despesas nem
descumprir a meta de resultado primário. Seria perfeito, não fosse a dívida
bruta, cuja trajetória não mente.
É o tipo de medida que dificulta a tarefa do
Banco Central (BC) de conduzir a inflação à meta. Não por acaso, ata após ata o
Comitê de Política Monetária (Copom) repete que o crédito direcionado é um dos
fatores que elevam a taxa de juros neutra, reduzem a potência da política
monetária e aumentam o custo de desinflação.
Para o governo, nada disso importa. Enquanto
o BC, de um lado, tenta frear a economia para reduzir a inflação, do outro o
governo pisa no acelerador para ampliar a disponibilidade de recursos, manter a
demanda aquecida e impulsionar a economia até a próxima eleição.
Com um déficit de 6,2 milhões de domicílios,
segundo a Fundação João Pinheiro, o Brasil precisa de uma política habitacional
que vá além da construção de microapartamentos nas regiões centrais e conjuntos
habitacionais distantes dos centros urbanos. É só o que se consegue com o valor
dos imóveis estabelecido no programa.
Não há uma solução única para um problema tão
complexo e um país tão desigual, mas há de se ter soluções que garantam moradia
acessível nos centros das principais capitais, hoje abandonados, inseguros e
tomados por barracas improvisadas. Parcerias com municípios, Estados e a
iniciativa privada tendem a ser mais baratas e mais rápidas. Mas a prioridade
do governo são votos, e não solucionar o déficit habitacional.
A aula do STF aos estatólatras
O Estado de S. Paulo
Barroso acerta ao derrubar liminar que
impedia iniciativa privada de construir e gerir escolas em SP
O presidente do Supremo Tribunal Federal
(STF), ministro Luís Roberto Barroso, derrubou uma decisão do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) que suspendia uma parceria
público-privada (PPP) para a construção e a gestão de escolas. Ao fazê-lo,
explicou didaticamente aos estatólatras por que a associação do Estado com a
iniciativa privada para atuar em serviços públicos não fere nenhum preceito
constitucional.
Em junho do ano passado, o governador
Tarcísio de Freitas publicou um decreto em que autorizou a Secretaria da
Educação do Estado a abrir editais de licitação para conceder os serviços “não
pedagógicos” de 33 novas escolas à iniciativa privada. Como de costume, os
opositores de esquerda partiram para o ataque.
O Apeoesp, sindicato dos professores
estaduais ligado ao PT, até tentou travar o leilão na Justiça, mas os certames
de dois lotes, com 17 e 16 escolas para atender a mais de 34 mil alunos, foram
realizados em outubro e novembro, ao custo de mais de R$ 2 bilhões no total.
Inconformado, o PSOL recorreu ao TJ-SP para derrubar o decreto, meses depois de
sua publicação, e a desembargadora Marcia Dalla Déa Barone atendeu ao pedido em
fevereiro deste ano. Passado tanto tempo, presume-se que não havia a urgência
invocada.
O PSOL citou uma série de artigos da
Constituição que supostamente teriam sido desrespeitados, como violações à
competência da União para definir as bases da educação, à moralidade
administrativa e à educação pública, gratuita e de qualidade. Coube ao presidente
do STF retomar a racionalidade. Ao atender a um recurso da Procuradoria Geral
do Estado (PGE), Barroso refutou um a um os argumentos.
Segundo o ministro, o cenário apresentado
pelo governo paulista “evidencia a existência de risco de grave lesão à ordem
pública”, como custos de desmobilização, atrasos na entrega das escolas e
prejuízos ao erário em caso de indenizações e encargos contratuais. E qualquer
atraso, por óbvio, só prejudicará os estudantes.
Barroso destacou ainda que a “delegação de
serviços públicos”, conforme previsto na Constituição, “não implica a perda da
titularidade pelo Estado, mas a transferência da execução de determinadas
atividades a um particular, por tempo determinado e sob condições previamente
estabelecidas”. E, no caso paulista, há o prazo de 25 anos de concessão, sem
interferência no currículo das escolas.
Ademais, os serviços que serão prestados pela
iniciativa privada hoje já são delegados pelo Estado a terceiros, como a
manutenção predial e de equipamentos, a limpeza e a vigilância. Como afirmou o
presidente do STF, na concessão de Tarcísio, esses serviços serão centralizados
em um contrato, e não em múltiplos, o que em nada afronta a Constituição,
evidenciando o esperneio da oposição, haja vista que o projeto pedagógico do
Estado será cumprido nas escolas.
Essa modalidade contratual, para Barroso, “se insere no espaço de discricionariedade do administrador público”. E essa discricionariedade de Tarcísio foi lhe dada por mais de 55% dos votos válidos dos paulistas. Aos inconformados, só resta o encontro com as urnas na próxima eleição.
Ano do cooperativismo abre oportunidades
Correio Braziliense
Baseado no conceito do trabalho em conjunto,
com a participação efetiva dos integrantes, as cooperativas podem proporcionar
efeitos duradouros em diversas esferas
Em um mundo que sinaliza para a
individualidade, com tecnologia capaz de, cada vez mais, possibilitar às
pessoas a realização de tarefas e a solução de problemas sozinhas, alternativas
para recuperar o convívio social inspiram estudos. A internet e as redes
sociais, feitas para unir, têm produzido afastamento. Nos negócios, campo que
também enfrenta essa conjuntura, o cooperativismo é uma ferramenta com
potencial para impulsionar relacionamentos e gerar ganhos coletivos.
Baseado no conceito do trabalho em conjunto,
com a participação efetiva dos integrantes, as cooperativas podem proporcionar
efeitos duradouros em diversas esferas. Atenta a isso, a Organização das Nações
Unidas (ONU) instituiu 2025 o Ano Internacional das Cooperativas (AIC2025). A
iniciativa, segundo o organismo intergovernamental, reconhece o papel do
movimento. O tema, inclusive, fará parte das mesas de debates da 30ª
Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorre em Belém (PA), em
novembro.
Em contexto mundial, o país pode aproveitar
para oferecer sua contribuição com a apresentação de modelos de sucesso, além
de promover, como anfitrião, a transferência de conhecimentos. Internamente, é
uma oportunidade para discutir as ações de cooperação que vêm sendo
desenvolvidas nacionalmente — e a largada não pode esperar.
Pelo Brasil, gestores e representantes
cooperativistas — em níveis local e regional — precisam aumentar o foco sobre
decisões que apontem caminhos para as questões globais, como os impasses
socioeconômicos, os problemas ambientais e a garantia do trabalho digno. Em um
país com tantas desigualdades, ampliar o impacto do cooperativismo pode
significar o cumprimento de direitos e a melhoria da qualidade de vida para
muita gente.
Muitos conceitos do modelo cabem
perfeitamente como soluções para desafios de ordens variadas. Inseridas nas
comunidades, as cooperativas têm condições de conhecer as necessidades da
população ao seu redor. Esse diferencial deve ser aproveitado pelos poderes
Executivo e Legislativo. A capacidade de fomentar renda e desenvolvimento de
forma sustentável é uma experiência do cooperativismo que precisa ser copiada
em maior escala. Sistemas agroflorestais, por exemplo, têm sido desenvolvidos
com eficiência, mantendo a produtividade e conservando a biodiversidade.
Neste ano, que é um marco significativo para
o segmento, o Brasil tem a oportunidade de fortalecer o empreendedorismo
coletivo – especialmente como forma de mitigação das mudanças climáticas já
estabelecidas. Durante a COP30, o cooperativismo pode acentuar suas
contribuições em áreas como finanças sustentáveis, mercado de carbono,
transição energética e economia circular.
Portanto, aumentar o engajamento dos brasileiros com o propósito cooperativista é uma das tarefas do movimento em 2025. Esse trabalho cabe, sobretudo, às lideranças do setor, mas também aos demais atores envolvidos. Para isso, compromissos firmes que façam do cooperativismo uma referência de entregas para a sociedade precisam ser firmados.
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