quinta-feira, 21 de agosto de 2025

O babaca que balança o pregão nacional, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Malafaia deu a definição mais precisa sobre o deputado que abalou o mercado

O Real recuperou parte da valorização que havia perdido ante o dólar, o Ibovespa voltou a subir e as ações dos bancos, com uma única exceção, o BTG, registraram uma tímida recuperação. O respiro veio junto com a reabertura de canais entre o sistema financeiro e o Supremo Tribunal Federal que, ao longo da escalada da terça-feira, pareciam incontornavelmente obstruídos.

A decisão do ministro Flávio Dino, que se limitou a reafirmar dispositivo vigente na legislação brasileira há décadas, o de que uma decisão estrangeira precisa ser ratificada por tribunal nacional para valer no país, foi protocolada no STF às 11h57 da segunda-feira. Houve algum nervosismo ao longo tarde, mas foi só na terça que o mercado financeiro, ante a perspectiva de um embate entre a toga e o pregão e de um relatório de banco aqui outro acolá, acordou.

Os panos quentes desta quarta-feira devolveram a situação para o novo normal de tensão e indefinição que tem dominado o Brasil desde que Donald Trump colocou o país no alvo de sua malquerença. Tão normal que Flávio Dino, em palestra no STJ no fim da tarde de quarta, tascou um “especulação” para definir o barulho da véspera.

O deixa-disso só não foi capaz de reverter a desconfiança, ou mesmo a irritação em alguns gabinetes togados, de que o resultado do diálogo entre representantes da Corte e do sistema financeiro, seja levado à mesa de operações por, pelo menos, um dos seus interlocutores.

A entrevista de Alexandre de Moraes à Reuters é uma tradução deste movimento. O ministro reitera a mesma obviedade de Dino, a de que os EUA têm suas leis e o Brasil, as suas e que, se os bancos cá usarem as de lá, haverá penalidades. Acena, porém, com o reconhecimento de que as sanções da Lei Magnitsky, que não reconhecem as fronteiras nacionais, colocaram as instituições financeiras numa “situação difícil”.

O freio de arrumação tem mais de freio do que de arrumação. Chega num momento em que o governo é lembrado de que movimentos que ponham em risco indicadores capazes de afetar o recuo da inflação podem lhe custar a popularidade que, a duras penas, volta a ser reconquistada.

A Genial-Quaest mostrou, que se o tarifaço ainda é alvo do rechaço geral da nação, é o recuo na inflação que tem dado consistência à recuperação da popularidade do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Como o câmbio comportado é a âncora deste recuo, movimentos que arrisquem sua estabilidade, como a ameaça da Magnitsky sobre o sistema financeiro nacional, são amplificados.

É claro que, em função disso, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) vai se valer do novo indiciamento seu e de seu pai, pela Polícia Federal, por coação na ação do golpismo, para redobrar a demanda aos seus interlocutores do Departamento de Estado pela ampliação da Lei Magnitsky. Da mesma maneira, o pastor Silas Malafaia, alvo de uma operação de busca e apreensão ao desembarcar no aeroporto do Galeão, vai acionar seus contatos no pentecostalismo americano no mesmo sentido.

Já é possível constatar que nem todas as pressões chegam para adubar o novo normal da política brasileira. O deputado do partido democrata americano, Jim McGovern, um dos autores da Magnitsky, mandou uma carta a Donald Trump em que classifica de “vergonhosa” a aplicação da lei contra Moraes. É improvável que o presidente americano dê ouvidos a um parlamentar do partido adversário, mas o argumento usado por McGovern, o de que seu uso contra o ministro brasileiro fortalece a acusação russa de que a lei é usada como ferramenta política, favorece a resistência institucional às sanções americanas.

Também é na linha da resistência que tem se dado a pressão contra o tarifaço. A associação americana do café, como escreveu Assis Moreira, no Valor, mostrou que a importação do grão brasileiro permite ao setor, nos EUA, um valor agregado de 4.200%. Da mesma maneira, a associação dos produtores soja americanos disse a Trump que os chineses estão trocando seu produto pelo brasileiro.

No quesito resistência, porém, foi Silas Malafaia que ganhou o troféu do dia. Desde “Apocalipse nos Trópicos”, de Petra Costa, sabe-se que o pastor é a metralhadora giratória do bolsonarismo. No filme, Malafaia esbraveja contra a decisão de Jair Bolsonaro de deixar o país às vésperas da posse de Lula: “Um líder fica”.

O que ainda não se sabe é se, nas mensagens rastreadas pela Polícia Federal, o pastor também reage à minuta de pedido de asilo do ex-presidente à Argentina. O que já se conhece é o epíteto usado contra Eduardo Bolsonaro. Ao comentar a perda de 6% no valor das ações do Banco do Brasil, que processa a folha de pagamentos do Supremo Tribunal Federal, a presidente da instituição financeira, Tarciana Medeiros, se insurgiu contra o deputado federal sem mencionar seu nome: “É muita falta de responsabilidade quando algum brasileiro vem colocar em xeque a solidez, segurança e integridade de uma empresa como o Banco do Brasil”. Além de irresponsável, sabe-se agora, trata-se de um filho que xinga o pai com palavrão. Malafaia, nas mensagens trocadas com o ex-presidente, foi mais preciso. “É um babaca”, disse o pastor sobre o filho de Bolsonaro a quem só os pregões da finança nacional não parecem oferecer resistência.

 

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