segunda-feira, 7 de abril de 2014

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

Apesar de tudo, PT e governo já se estão preparando para enganar o povo na próxima campanha eleitoral fazendo-se de defensores do interesse popular, como se este se confundisse com estatização e hegemonia partidária, e estigmatizando os adversários como representantes das elites e fiadores dos interesses internacionais.

Cabe às oposições desmistificar tanto engodo, tomando à unha o pião dos escândalos da Petrobrás, rechaçando a pecha ideológica de "neoliberal" e reafirmando a urgência de mudar os critérios de governança das estatais.

Fernando Henrique Cardoso, sociólogo, foi presidente da República, Sem mistificações, O Estado de S. Paulo / O Globo, 06 de abril de 2014.

Doleiro do caso Petrobrás intermediou doações eleitorais para PP e PMDB

E-mails interceptados pela PF mostram conversas entre Alberto Yousseff, preso por suspeita de lavagem de dinheiro e ligado ao ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa, com executivos de empresas que contribuíram para campanhas das duas siglas

Eduardo Bresciani, João Domingos e Fausto Macedo - O Estado de S. Paulo

Documentos da Operação Lava Jato da Polícia Federal mostram que o doleiro Alberto Yousseff teria intermediado doações para deputados e diretórios do PP e para o PMDB de Rondônia nas eleições de 2010. Ele está preso desde o dia 17, por suspeita de comandar um esquema de lavagem de dinheiro. Yousseff ainda é investigado por suas ligações com o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, também detido pela PF.

As negociações foram flagradas pela PF com a quebra de sigilo de e-mails do doleiro. Em um dos endereços eletrônicos atribuído a Yousseff ele trata das doações com representantes das empresas Queiroz Galvão e Jaraguá Equipamentos, ambas fornecedoras da Petrobrás em empreendimentos como a construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A PF acusa Costa de corrupção passiva em relação a esse projeto da estatal.

Os interlocutores de Yousseff são Othon Zanoide de Moraes Filho, diretor-geral de desenvolvimento comercial da Queiroz Galvão, e Cristian Silva, da Jaraguá. Ambos tratam com o doleiro de dados bancários e emissão de recibos das contribuições eleitorais.

Cruzamentos feitos pelo Estado mostram correspondência entre os valores mencionados nos e-mails com o montante declarado pelos beneficiários à Justiça Eleitoral. O PP nacional aparece em uma conversa entre Yousseff e Moraes em 17 de agosto de 2010 como destinatário de uma doação de R$ 500 mil que deveria se registrada em nome da Vital Engenharia, empresa que faz parte do grupo Queiroz Galvão. O diretório aparece em outra troca de e-mails entre os dois como beneficiário de R$ 2,040 milhões. Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o PP relata ter recebido R$ 2,240 milhões da Vital Engenharia e R$ 500 mil da Queiroz Galvão.

O PP baiano foi outro agraciado com doações da construtora que aparece nos documentos da investigação. O diretório é presidido pelo deputado Mário Negromonte, ex-ministro das Cidades e apontado como um dos padrinhos da indicação de Costa na diretoria da Petrobrás. Por e-mail, o executivo cobra de Yousseff um recibo de doação de R$ 500 mil. No TSE, há duas doações de R$ 250 mil cada.

O mesmo ocorre com o diretório pernambucano do PP. O executivo pede recibo para uma doação de R$ 100 mil. Na Justiça Eleitoral constam três doações - uma é de R$ 100 mil.

Parlamentares. Deputados do PP também são citados nos e-mails do doleiro. Nelson Meurer (PR) foi beneficiário de R$ 500 mil, Roberto Teixeira (PE) recebeu R$ 250 mil e Roberto Britto (BA) ficou com R$ 100 mil. Todos declararam esses valores ao TSE. Aline Corrêa (SP) aparece em uma mensagem como beneficiária de R$ 250 mil. No total, ela declarou R$ 350 mil. Aline é filha do ex-presidente do PP Pedro Corrêa, condenado no processo do mensalão.
Também condenado no processo, Pedro Henry (MT) é citado pelo doleiro como beneficiário de R$ 100 mil. O valor foi declarado ao TSE. O deputado é ainda beneficiário de uma doação da Jaraguá. E-mail enviado por Cristian Silva informa os dados da empresa que devem constar no recibo. A doação registrada no TSE é de R$ 100 mil.

Além dos diretórios do PP, o regional de Rondônia do PMDB é citado nos e-mails de Yousseff. Presidente licenciado em Rondônia, o senador Valdir Raupp está a frente do diretório nacional em virtude da licença do vice-presidente da República, Michel Temer. A doação referida nos e-mails é de R$ 300 mil. A prestação de contas do diretório regional informa o recebimento de R$ 500 mil da construtora. Um dos recibos é de R$ 300 mil.

Dornelles rejeita convite para ser relator contra CPI da Petrobras

Decisão foi divulgada neste domingo pela assessoria de imprensa do senador

Agência Estado

A assessoria do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) informou neste domingo (6) que ele rejeitou o convite do presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), e não será o relator da questão de ordem dos governistas contra a proposta de CPI da Petrobras formulada pela oposição e nem da questão de ordem dos oposicionistas contra a CPI proposta por senadores governistas.

A oposição quer uma CPI no Senado para investigar exclusivamente a Petrobras. Os governistas protocolaram um pedido de CPI para investigar, além da Petrobras, o metrô de São Paulo, o porto de Suape (PE) e a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), todas empresas de Estados administrados pela oposição. Uma e outra CPI foram alvos de questionamentos pelos que se opõem a cada uma das propostas.

Na semana passada, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), decidiu transferir para a Comissão de Constituição e Justiça a decisão sobre se as questões de ordem serão aceitas ou rejeitadas.

Veja também, na Folha:

Aécio sai do bastidor e retoma ofensiva

Raymundo Costa – Valor Econômico

BRASÍLIA - As circunstâncias políticas mudaram e junto com elas o comportamento do pré-candidato do PSDB a presidente, senador Aécio Neves. Antes discreto, o tucano está agora na ofensiva, que deve ser ampliada a partir desta semana com uma bateria de comerciais do PSDB no rádio e na televisão. A CPI da Petrobras é o sujeito atrás dessa virada.

Contrariando o estilo de político de bastidor, o pré-candidato do PSDB tomou a frente das articulações para a criação da CPI, quando a presidente Dilma Rousseff deixou-se enredar na trama da compra de uma refinaria, a preço superfaturado, pela Petrobras, em Pasadena, no Texas (EUA). Uma iniciativa de risco, dez vez que o governo é amplamente majoritário no Senado.

Para viabilizar a CPI, Aécio precisava de 27 assinaturas, um terço do Senado. Conseguiu 28, com a ajuda definitiva do governador de Pernambuco e pré-candidato do PSB, Eduardo Campos. Mas Campos não seria decisivo, se o pré-candidato do PSDB não tivesse antes garimpado autógrafos na própria base do governo. Foi nesse instante que a mudança na conjuntura ajudou.

Em abril de 2013, o PSDB tentou explorar as mesmas denúncias contra a gestão do PT na Petrobras, mas não encontrou receptividade na base governista. Agora, não só contou com uma rebelião no PMDB, como também novos parceiros de oposição (o Solidariedade, por exemplo). E a eleição, que em abril do ano passado era um fato longínquo, já determinava, desde o início de 2014, novos alinhamentos políticos.

Exemplo: o presidenciável tucano sempre manteve boas relações com o PP, partido da base governista. Mas a senadora gaúcha Ana Amélia, candidata do partido ao governo do Estado, só assinou o requerimento da CPI, a pedido de Aécio, depois que DEM) PSDB e Solidariedade decidiram jogar juntos na sucessão estadual.

Foi a semana perfeita de Aécio. Na segunda-feira ele esteve em São Paulo numa reunião com empresários. Foi aplaudido de pé, ao contrário do que aconteceu em outras incursões que fez no PIB paulista, quando teve recepção fria. Uma pesquisa entre os presentes indicou que ele ganharia a eleição, se a escolha ficasse a cargo desse grupo de empresários: 56% contra 28% de Dilma e 13% de Eduardo Campos.

À saída, também fez sua melhor intervenção na pré-campanha desde que foi eleito presidente do PSDB, em maio de 2013. Diante das ameaças de setores do PT de recorrer ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na hipótese de queda acentuada da popularidade de Dilma, Aécio declarou que "não importa se é o ex-presidente Lula ou Dilma [o adversário]. O que eu quero é mudar um modelo que não vem fazendo bem ao Brasil".

Em uma só manifestação expôs o queremismo petista e disse que não teme enfrentar Lula: Aécio acredita que as pistas seguidas pela oposição indicam que o ex-presidente da República também é vulnerável ao escândalo da compra da refinaria de Pasadena, cujos principais trâmites ocorreram nos seus dois mandatos no Palácio do Planalto.

Em encontros com jornalistas, Aécio sempre repetiu que eles estavam conversando "com o futuro presidente da República". Desde sua eleição para presidente do PSDB, em maio do ano passado, as avaliações sobre sua viabilidade eleitoral eram reticentes, sobretudo diante da atuação apagada do senador por Minas Gerais.

Segundo aliados, antes de avançar como candidato, Aécio precisava pacificar o PSDB, empreitada difícil, mas que o senador julga hoje ter levado a cabo. Prova disso é que o ex-governador José Serra, seu maior adversário no partido, indica que será candidato a deputado federal, o que pode levar o PSDB a eleger uma boa bancada por São Paulo, um colégio eleitoral chave para as pretensões de qualquer candidato a presidente da República.

Outra demonstração de que Aécio tem o partido nas mãos e a candidatura presidencial sob controle ocorreu quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recuou de uma posição contrária à criação da CPI, tão logo Aécio deixou claro que aquela era uma decisão partidária. Não fazia sentido FHC ficar contra Aécio - e fragilizar o candidato tucano -, quando a Polícia Federal já havia aberto mais de um inquérito para investigar o negócio de Pasadena.

Outra boa notícia da semana: o prefeito de Salvador, Antonio Carlos Magalhães Neto, deixou claro aos aliados que está fechado com a candidatura Aécio Neves, o que assegura um precioso minuto de tempo de televisão no horário eleitoral gratuito para o tucano - no comando da cidade que detém o terceiro maior colégio eleitoral do país, ACM Neto se manteve afastado o quanto possível da questão eleitoral, a fim de preservar suas relações com o Planalto.

Ainda há dificuldades na composição com o deputado Ronaldo Caiado, que insiste em disputar contra o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), mas o presidente do DEM, Agripino Maia, também trabalha pela reedição da aliança PSDB-PFL.

A maior ameaça à semana perfeita de Aécio veio de seu próprio quintal, quando na quarta-feira o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), admitiu a possibilidade de deixar o cargo para disputar o governo do Estado. Um fato novo com potencial para desarrumar o cenário que Aécio desenhara para a sucessão em Minas e, o que seria mais grave, envenenar as relações amistosas com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos.

Segundo o PSB, Eduardo Campos não teve influência na decisão de Márcio Lacerda. Não estimulou sua candidatura, não pediu e até o início da semana trabalhava com a informação de que Lacerda não seria candidato. O prefeito, na realidade, movia-se por injunções da política local. Bastou uma boa conversa com Aécio Neves, na quinta-feira, para que o prefeito voltasse atrás.

Aécio e Campos querem o mesmo lugar, a cadeira de Dilma, mas sabem que em algum momento, depois do fim de junho, a atual relação amistosa deve abrir espaço para a disputa de quem vai para o segundo turno com Dilma, se houver segundo turno. O desafio dos dois pré-candidatos é manter uma disputa saudável, de modo que possam estar juntos mais adiante.

Aécio Neves retoma o protagonismo num momento importante da pré-campanha, quando Eduardo Campos parece magnetizar todos os holofotes.

Com menos de 20% nas pesquisas de intenção de voto divulgadas até sexta-feira, Aécio está distante do desempenho histórico do PSDB nas eleições presidenciais. O figurino de oposição parece assentar melhor no governador Eduardo Campos.

Essa percepção é que Aécio pretende mudar ao assumir o comando da CPI. No momento exato em que uma overdose de PSDB e Aécio deve tomar conta da propaganda partidária no rádio e televisão a partir de 8 de abril com dezenas de inserções de 30 segundos do PSDB que serão exibidas até o dia 15, quando então será levado ao ar o programa partidário de dez minutos.

Esquemas ardilosos: O Estado de S. Paulo - Editorial

A polêmica decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros, de transferir para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa a responsabilidade de decidir sobre a ampliação das investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobrás proposta pelo PT, é uma manobra claramente procrastinatória destinada, com o incentivo do Palácio do Planalto, a diluir o impacto do escândalo da Refinaria de Pasadena, que, graças às trapalhadas de Dilma Rousseff, acabou criando riscos para o projeto petista de perpetuação no poder. Trata-se de mais uma chicana política dentre as muitas do amplo repertório de que o notório presidente do Senado se vale para levar vantagem em barganhas com o Executivo.

Há nesse episódio, porém, algo muito mais grave do que a cumplicidade de Renan Calheiros com o Palácio do Planalto para transformar em pizza as investigações parlamentares sobre a Petrobrás. É a constatação de que o presidente da Câmara Alta não hesita, por um lado, em desmoralizar o instituto da CPI, poderoso instrumento de que os congressistas - em especial a minoria - dispõem para cumprir com eficiência sua missão constitucional de fiscalizar o Poder Executivo. E, por outro lado, Renan submete mais uma vez a Casa a que preside ao vexatório exercício de se prostrar diante do Executivo.

Existe ainda nessa tramoia uma terceira e mais grave ameaça às instituições democráticas. Se de acordo com a esdrúxula interpretação de Renan Calheiros de que uma CPI sirva para tudo, menos para investigar a fundo assuntos que incomodam um governo que disponha de base parlamentar majoritária, está aberto o caminho para que seja vedado à minoria o direito - mais do que isso, a obrigação constitucional - de controlar os eventuais excessos da maioria e dos outros Poderes. Um direito e uma obrigação, aliás, que são garantidos à minoria pela Carta Magna quando estabelece que uma CPI pode ser convocada por apenas um terço dos senadores ou deputados federais, em suas Casas ou no Congresso Nacional. Há também no texto constitucional, bem como na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), outras salvaguardas a esse direito da minoria.

Coadjuvantes da farsa, parlamentares governistas tentam, com argumentos falaciosos, criar confusão em torno do objetivo da CPI da Petrobrás, que, de acordo com a lei, deve ser a investigação de "fato determinado". No caso, a controvertida compra da Refinaria de Pasadena, no Texas. "Já que vamos investigar a Petrobrás, por que não investigar também outros casos suspeitos?", pergunta o senador petista Humberto Costa (PE). "Desejamos apenas ampliar o debate", tergiversa Gleisi Hoffmann (PT-PR).

Ora, se o PT quer exercer o legítimo direito de investigar as denúncias de corrupção no Metrô ou eventuais irregularidades no porto pernambucano de Suape, dispõe de maioria mais do que suficiente no Senado e na Câmara para criar uma CPI para cada um desses "fatos determinados". Quem é que poderia se opor a isso? Mas transformar a investigação sobre a Petrobrás num "combo" é um deboche que só pode desmoralizar o Congresso.

Além da proposta de CPI da Petrobrás apresentada pela oposição no Senado, à qual o PT adicionou a possibilidade de ampliar a investigação para abranger os casos de São Paulo e Pernambuco, e que nessa condição será avaliada pela CCJ a pedido de Calheiros, há ainda mais duas propostas, apresentadas na Câmara, uma pelos governistas e outra pela oposição, de formação de comissões mistas de senadores e deputados, dedicadas também à Petrobrás.

Em resumo: já que o escândalo que paira sobre a maior empresa brasileira não sai das manchetes, armam-se esquemas ardilosos para dar à opinião pública a impressão de que a base governista desenvolve corajoso combate à corrupção, estando, no entanto, tudo armado para que qualquer CPI que venha a se instalar para investigar a Petrobrás termine em pizza. E o pior é que esse atentado à integridade institucional do Parlamento não está sendo perpetrado pelo Executivo - que apenas o inspira. Sujam suas mãos membros do Poder cujas prerrogativas democráticas deveriam proteger.

Publicado em 06 de abril de 2014.

Líder do PPS defende afastamento de Vargas da Câmara

Sandra Manfrini - Agência Estado

As novas denúncias sobre o envolvimento do vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), com o doleiro Alberto Youssef levaram o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR), a defender neste domingo, 6, o afastamento de Vargas do cargo. "Diante das inúmeras acusações de envolvimento do vice-presidente da Câmara com o doleiro preso, o seu afastamento do cargo é o melhor caminho para dar condições à Mesa Diretora da Câmara de apurar com isenção as denúncias que pesam sobre ele", defendeu Bueno por meio de nota.

De acordo com reportagem da revista Veja desta semana, em mensagens interceptadas pela Polícia Federal, Vargas promete ajudar Youssef em contratos que o doleiro pretendia fechar com o governo federal. As suspeitas são de que Youssef e Vargas sejam sócios do laboratório Labogen. O doleiro está preso desde o dia 17 de março em decorrência das investigações da Operação Lava Jato, que apura um esquema de lavagem de dinheiro.

Para o líder do PPS, o discurso de pedido de desculpas, feito por Vargas na semana passada, já não basta. "É preciso um gesto mais efetivo, como o licenciamento do cargo, para que a instituição Câmara dos Deputados não se contamine com o cipoal de denúncias contra André Vargas", afirmou.

PSDB e DEM também já anunciaram que vão protocolar representação no Conselho de Ética da Câmara contra André Vargas por quebra de decoro, em razão de ele ter viajado em avião pago pelo doleiro Youssef. Em seu discurso, na semana passada, no plenário da Câmara, o vice-presidente da Câmara admitiu que foi "imprudente". "Em relação ao avião, eu reconheço: fui imprudente, foi um equívoco. Deveria ter exigido contrato, deveria ter quitado, não deveria ter exposto minha família", disse Vargas.

A representação do PSDB e DEM, que deve ser protocolada no início desta semana, irá destacar que o uso da aeronave pode configurar recebimento de vantagem indevida, procedimento incompatível com o decoro parlamentar e punível com a perda do mandato, conforme o inciso II do art. 4º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados.

Oposição defende que André Vargas se afaste da vice-presidência da Câmara

Para Rubens Bueno, petista deveria deixar o cargo até apuração de denúncias

Deputado é acusado de ter ligação com doleiro

Isabel Braga e Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA - Dois partidos da oposição defenderam neste domingo que o vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), se licencie do cargo até a Casa concluir as investigações de denúncias da ligação entre ele o o doleiro Alberto Youssef. O líder do PSDB na Câmara, deputado Antonio Imbassahy, e o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR), querem Vargas afastado, para garantir a isenção nas apurações.

- É absolutamente indispensável que ele se afaste. A coisa se agravou bastante. Já estava complicado e ficou mais grave. É uma questão de natureza moral, o mínimo que se espera é que ele se afaste, para evitar constrangimentos e para não comprometer ainda mais a imagem da Câmara - disse Imbassahy.

Para Bueno, embora Vargas tenha discursado e pedido desculpas públicas na tribuna e tentado se explicar, a divulgação de outras mensagens trocadas entre Vargas e Youssef, pela revista “Veja”, impõe que ele peça licença do cargo até que tudo seja apurado. Nas mensagens, Vargas promete ajudar Youssef - que está preso desde o último dia 17 na Operação Lava-Jato da Polícia Federal - em contratos que ele pretendia fechar o Ministério da Saúde.

- Diante das inúmeras acusações de envolvimento do vice-presidente da Câmara com o doleiro preso, o seu afastamento do cargo é o melhor caminho para dar condições à Mesa Diretora da Câmara de apurar com isenção as denúncias que pesam contra ele - disse Bueno, acrescentando:

- O discurso de pedido de desculpa (feito pelo deputado petista na semana passada) agora já não basta. É preciso um gesto mais efetivo, como o licenciamento do cargo, para que a instituição Câmara dos Deputados não se contamine com o cipoal de denúncias contra André Vargas.

Na operação Lava-Jato da PF, Youssef é suspeito de lavagem de dinheiro, remessa ilegal de dólar e financiamento ao tráfico de drogas. As suspeitas, segundo hipóteses da Operação Lava-Jato, são de que Youssef e Vargas sejam sócios no laboratório Labogen. O Ministério da Saúde informou que não tem contrato com o laboratório.

O PSDB promete protocolar nesta semana representação no Conselho de Ética da Câmara contra o vice-presidente da Casa, André Vargas (PT-PR), por quebra de decoro. Vargas viajou em avião pago pelo doleiro Alberto Youssef, preso pela Polícia Federal, suspeito de participar de um esquema de lavagem de dinheiro que movimentou R$ 10 bilhões.

Reportagens da imprensa com base em informações da PF apontam para a existência de uma sociedade entre Vargas e Youssef: o vice-presidente da Câmara receberia orientações do doleiro e passaria informações das conversas que ele, como parlamentar do PT, mantinha com integrantes do governo.

De acordo com a representação, que será protocolada no início da semana que vem, o uso da aeronave pode configurar recebimento de vantagem indevida, procedimento incompatível com o decoro parlamentar e punível com a perda do mandato, conforme o inciso II do art. 4.º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados.

Para o vice-líder do PSDB, Nilson Leitão (MT), Vargas não tem mais condições de permanecer no mandato. “A cada dia surgem mais elementos que comprovam a ligação dele com o doleiro preso. E a explicação que deu não convenceu. É uma situação extremamente grave, que expõe e desmoraliza o Parlamento”, afirmou.

PPS, PSDB e DEM entrarão com representação contra Vargas

Sandra Manfrini - Agência Estado

O PPS ingressará nesta semana, junto com PSDB e DEM, com representação no Conselho de Ética da Câmara contra o vice-presidente da Casa, deputado André Vargas (PT-PR), por quebra de decoro parlamentar. A decisão foi anunciada neste domingo, 6, pelo presidente nacional do partido, deputado Roberto Freire (SP), que considera as denúncias do envolvimento de Vargas com o doleiro Alberto Youssef "da maior gravidade".

Em nota divulgada neste domingo, 6, Freire afirma que as denúncias precisam ser investigadas com isenção pelo conselho. "Já que o vice-presidente não tomou a iniciativa de se afastar espontaneamente do cargo, vamos ingressar com representação contra ele no Conselho de Ética por entender que o seu envolvimento com o doleiro preso pela PF fere o decoro parlamentar", disse.

De acordo com reportagem da revista Veja desta semana, em mensagens interceptadas pela Polícia Federal, Vargas promete ajudar Youssef em contratos que o doleiro pretendia fechar com o governo federal. As suspeitas são de que Youssef e Vargas sejam sócios do laboratório Labogen. O doleiro está preso desde o dia 17 de março em decorrência das investigações da Operação Lava Jato, que apura um esquema de lavagem de dinheiro.

Pesquisa
Roberto Freire avaliou que as denúncias contra o governo envolvendo a Petrobras e integrantes do PT só aumentam a desconfiança da sociedade, sentimento esse que tem sido apontado pelas recentes pesquisas de opinião, como a DataFolha, divulgada no sábado, 5. A pesquisa apontou uma queda de 6 pontos porcentuais nas intenções de voto da presidente Dilma Rousseff para as próximas eleições: de 44%, em fevereiro, para 38%.

"Cresce a tônica por mudanças e à oposição neste momento cabe o papel de preparar propostas alternativas de governo porque há sinais cada vez mais claros do esgotamento do ciclo petista, cuja principal marca é a corrupção", afirmou Freire, lembrando que a pesquisa ainda aponta que 72% da população têm desejo por mudanças.

Pressionado por aliados e oposição, André Vargas deve se afastar da vice-presidência da Câmara

Político é investigado por seu envolvimento com o doleiro Alberto Youssef em negócios suspeitos no Ministério da Saúde

Isabel Braga e Carolina Brígido – O Globo

BRASÍLIA Diante das pressões tanto da oposição como, nos bastidores, de integrantes da base governista, especialmente do próprio PT, o deputado André Vargas (PT-PR) — investigado por seu envolvimento com o doleiro Alberto Youssef em negócios suspeitos no Ministério da Saúde — deverá se licenciar do cargo de vice-presidente da Câmara dos Deputados. O afastamento será discutido hoje, mas desde ontem deputados aliados do governo estão conversando com o presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), para encontrarem a solução adequada.

O que desencadeou a reação foram as notícias de que Vargas e Youssef, preso no último dia 17 na Operação Lava-Jato da Polícia Federal, trocaram mensagens comprometedoras negociando contratos suspeitos. Numa delas, o doleiro diz a Vagas que os negócios suspeitos iriam garantir a “independência financeira” dos dois. Em outra, o doleiro diz que precisa de ajuda para resolver problemas financeiros, e o deputado afirma: “Vou atuar”.

Em conversas reservadas, temendo o efeito das denúncias em ano eleitoral, petistas tentam isolar a ação de Vargas, para mostrar que, se houve alguma irregularidade nos negócios com o Ministério da Saúde, não foi cometida com o aval do partido. O assunto ainda está sendo debatido nos bastidores, mas há entre os deputados da bancada do PT um consenso: Vargas terá que se explicar diante do teor das mensagens com o doleiro. Além disso, dizem petistas, não haverá, no partido, complacência com qualquer erro, diferentemente do que aconteceu com os condenados do mensalão.

Na semana passada, depois da denúncia da divulgação de que ele usou o jatinho do doleiro para viajar de férias com a família para João Pessoa, Vargas primeiro se manifestou por nota e, na quarta-feira foi à tribuna da Câmara pedir desculpas aos colegas. Ao falar, no entanto, acabou mudando a versão inicial que tinha dado ao jornal “Folha de S.Paulo”, sobre o pagamento dos custos, o que já gerou reação da oposição, que anunciou representação contra ele no Conselho de Ética da Casa.

No fim de semana, a pressão aumentou depois que as mensagens trocadas entre Vargas e o doleiro foram divulgadas pela revista “Veja” e pela TV Globo. Ontem, os líderes dos três partidos da oposição — PSDB, DEM e PPS — defenderam o afastamento de Vargas da vice-presidência da Câmara até que a Casa possa concluir as investigações sobre o envolvimento dele com o doleiro.

Segundo os líderes Antônio Imbassahy (PSDB-BA), Mendonça Filho (DEM-PE) e Rubens Bueno (PPS-PR), Vargas deve se licenciar da vice-presidência para garantir a isenção nas apurações. Os três partidos reforçaram que entrarão no Conselho de Ética com representação por quebra de decoro parlamentar, contra Vargas. A estratégia de petistas também é pressionar Vargas a se licenciar e, assim, tentar evitar as representações no conselho.

— É absolutamente indispensável que ele se afaste. A coisa se agravou bastante. Já estava complicado e ficou mais grave. É uma questão de natureza moral, o mínimo que se espera é que ele se afaste, para evitar constrangimentos e não comprometer mais a imagem da Câmara — disse Imbassahy.

— Não vejo outra saída, não tem sentido ele permanecer na função enquanto durarem as investigações. Eu não vejo sentido que ele permaneça na função — afirmou Mendonça Filho.
Para Bueno, embora Vargas tenha discursado e pedido desculpas na tribuna e tentado se explicar, a divulgação de outras mensagens trocadas entre Vargas e Youssef, pela revista “Veja”, impõe que ele peça licença do cargo até que tudo seja apurado.

— Diante das inúmeras acusações de envolvimento do vice-presidente da Câmara com o doleiro preso, o seu afastamento do cargo é o melhor caminho para dar condições à Mesa Diretora de apurar com isenção as denúncias que pesam contra ele. O discurso de pedido de desculpa agora já não basta. É preciso um gesto mais efetivo, como o licenciamento do cargo, para que a Câmara não se contamine com o cipoal de denúncias contra Vargas — disse Bueno.

Sugundo a representação, o uso da aeronave pode configurar recebimento de vantagem indevida, ato incompatível com o decoro parlamentar e punível com a perda do mandato, conforme o inciso II do art. 4º do Regimento Interno da Câmara. Para o vice-líder do PSDB, Nilson Leitão (MT), Vargas não tem mais condições de permanecer no mandato.

— A cada dia surgem mais elementos que comprovam a ligação dele com o doleiro preso. E a explicação que deu não convenceu.

Na operação Lava-Jato, Youssef é suspeito de lavagem de dinheiro, remessa ilegal de dólares e financiamento ao tráfico de drogas. As suspeitas, segundo a PF, são de que ele e Vargas sejam sócios no laboratório Labogen. O Ministério da Saúde informou que não tem contrato com o laboratório. O GLOBO procurou a assessoria de imprensa de Vargas, mas não obteve retorno. O líder do PT na Câmara, Vicentinho (SP), não retornou as ligações.

Para Aécio e Eduardo Campos, queda de popularidade de Dilma reflete desgaste do governo

Para político do PSB, campanha "volta Lula" demonstra insatisfação até mesmo dentro do PT

Tucano atribui queda de seis pontos a erros do governo

Eliane Oliveira, Isabel Braga – O Globo

BRASÍLIA - Os dois principais adversários da presidente Dilma Rousseff nas eleições deste ano, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB-PE), atribuíram neste domingo a queda de popularidade da petista em pesquisa realizada pelo Datafolha ao desgaste de seu governo perante os eleitores. Ambos minimizaram a baixa pontuação que obtiveram no levantamento, divulgado no último sábado, justificando que ainda são pouco conhecidos entre a população.

Para Eduardo Campos, a campanha "volta Lula", conduzida, nos bastidores, por integrantes do próprio PT, demonstra que até mesmo o partido está insatisfeito com os rumos da gestão Dilma. Campos também acredita que os escândalos de irregularidades envolvendo a Petrobras, o baixo crescimento da economia e a alta da inflação são fatores que deixam os eleitores mais pessimistas.

- A busca de alternativas dentro do próprio campo governista é um atestado de que este governo frustrou o país - disse o pré-candidato pernambucano, por email, em resposta ao GLOBO.

Sobre o fato de Aécio contar com 16% das intenções de voto, enquanto ele detém 10%, Campos afirmou que as pesquisas refletem mais o grau de conhecimento e menos a preferência por candidaturas. Ele, no entanto, destacou que, independentemente dos números que existem hoje, o dado mais significativo da pesquisa é que mais de 70% dos brasileiros desejam alguma mudança.
- O Brasil rejeita a alternativa de mais quatro anos do que aí está.

Assim como Campos, o pré-candidato tucano disse que, no momento atual, as pesquisas não refletem um cenário real de intenção de voto. Aécio enfatizou que não há como comparar pré-candidatos com grandes diferenças de conhecimento por parte do eleitorado. Acrescentou que isso vai mudar a partir do início da propaganda eleitoral em rádio e TV, quando a população terá chance de conhecer as propostas e os perfis de cada um "de forma mais equilibrada".

- O que vai se confirmando em todas as pesquisas é que aumenta a percepção dos brasileiros sobre os repetidos erros cometidos pelo governo - completou Aécio.

De acordo com a pesquisa Datafolha, a presidente Dilma teria 38% das intenções de voto e venceria no primeiro turno, caso a eleição fosse hoje e seus adversários fossem Aécio e Campos. Nesse cenário, o tucano teria 16% do total e o governador pernambucano, 10%.

Aliança entre PSB e Rede está indefinida em metade dos Estados

Cristian Klein, Fábio Brandt e Cristiano Zaia – Valor Econômico

SÃO PAULO e BRASÍLIA - A seis meses das eleições e seis meses depois do anúncio da união nacional entre o PSB, do presidenciável Eduardo Campos (PSB), e o Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva, provável vice na chapa, os dois partidos ainda não sabem se a aliança se repetirá para a eleição a governador em cerca de metade das 27 unidades da Federação. De acordo com levantamento do Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor, as dificuldades se refletem na indefinição em 13 Estados.

Na sexta-feira, o clima de divergência esquentou quando o Rede criticou publicamente a possibilidade de apoio do PSB à candidatura do presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB), ao governo do Rio Grande do Norte.

Em nota, o grupo de Marina Silva afirmou que a aliança do PSB com o PMDB representa "a manutenção da velha política" e "que irá realizar todos os esforços políticos para que não se viabilize".

Ao Valor, o primeiro-secretário nacional do PSB, Carlos Siqueira, disse que essa ainda não é a decisão oficial da legenda. "O partido ainda não deu [o apoio ao PMDB]. Isso ainda será submetido à [comissão] executiva nacional", afirmou.

A polêmica sobre o Rio Grande do Norte é apenas mais uma entre a série de arestas que os dois partidos tentam aparar. Em 14 unidades da Federação a situação da aliança já foi resolvida, sendo que em duas está sacramentado que cada legenda irá para um lado.

No Paraná, o PSB vai aderir à campanha a reeleição do governador Beto Richa (PSDB), enquanto o Rede pedirá voto para a pré-candidata do PV, Rosane Ferreira. Em Alagoas, o PSB lançará o recém-filiado deputado federal Alexandre Toledo, um ex-tucano, ao governo estadual mas o grupo de Marina, por enquanto, decidiu que fará campanha apenas para Heloísa Helena (PSOL), que concorrerá ao Senado.

A maior parte dos desentendimentos e negociações tem, pelo menos, duas origens: a necessidade do Rede de expor seus candidatos em candidaturas majoritárias aos governos estaduais ou ao Senado e a recusa do grupo de Marina em se aliar a PSDB, PMDB ou outras legendas, consideradas de direita.

É o caso de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, onde, antes da entrada do grupo de Marina, o PSB articulava participar da coligação à reeleição de Geraldo Alckmin (PSDB). Depois de pressões, a tese da candidatura própria prevaleceu e o Rede conseguiu afastar os pessebistas dos tucanos. Mas a indefinição continua em relação a quem será o candidato.

O PSB defende o deputado federal Márcio França, presidente estadual da legenda. Mas o Rede apresentou os nomes do também deputado federal Walter Feldman e do vereador de São Paulo Ricardo Young. Os dois estão filiados, respectivamente, ao PSB e ao PPS, mas são ligados ao Rede Sustentabilidade. Como a legenda de Marina não obteve o registro a tempo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para participar das eleições deste ano, a agremiação encaminhou seus integrantes para se filiarem a outros partidos - o principal deles foi o PSB.

Em Minas Gerais, está a situação mais indefinida entre os partidários de Campos e Marina, de acordo com Pedro Ivo Batista, integrante da comissão executiva nacional e responsável pela montagem dos palanques estaduais do Rede. Ali, ainda não há decisão a respeito de coligação ou candidatura própria. O plano A do PSB era lançar o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, que, no entanto, desistiu de concorrer na sexta-feira, quando venceu o prazo de desincompatibilização. O outro plano é se aliar ao candidato dos tucanos, o ex-ministro Pimenta da Veiga, conforme confirma Siqueira ao Valor.

Ocorre que o Rede quer distância do PSDB e apresentou o nome do médico sanitarista e ambientalista Apolo Heringer, de 71 anos. Heringer foi um dos líderes da Polop, organização de esquerda que combateu a ditadura militar, e pela qual deu aulas de marxismo à então militante e hoje presidente Dilma Rousseff, por quem disse ter tido uma paixão platônica à época.

Já o casamento entre o Rede e o PSB esbarra, ainda, no reconhecimento de acordos feitos com terceiros. A candidatura de Heringer, por exemplo, iria contra um suposto pacto de não agressão firmado entre Campos e o presidenciável e senador Aécio Neves (PSDB-MG), pelo qual um não lançaria candidato no Estado do outro. Em Pernambuco, os tucanos já anunciaram decisão neste sentido.

"Não sei que acordo é esse", afirma Pedro Ivo Batista.

Carlos Siqueira também nega que o trato tenha existido, mas afirma que onde Rede e PSB não puderem andar juntos isso deve ser encarado de uma maneira natural. O dirigente pessebista minimiza as discordâncias. "Todo mundo tem esse tipo de problema. Num país de dimensão continental como o Brasil, não dá para exigir verticalização [das alianças estaduais]. A base aliada do governo federal e o PSDB também têm esses desafios", diz.

Na Bahia, a união foi das menos problemáticas. Os dois partidos dividiram a chapa majoritária, já que a senadora Lídice da Mata (PSB) concorrerá ao governo e a ex-magistrada Eliana Calmon - que está no PSB como uma "filiação democrática" da Rede - disputará o Senado.

O grupo de Marina, aliás, já conseguiu ou ainda tenta emplacar vários filiados como candidatos ao Senado. No Ceará, a ambientalista Geovana Cartaxo (PSB/Rede) fará dobradinha com a empresária Nicole Barbosa (PSB), que concorrerá ao governo estadual. Em Goiás, o procurador federal Aguimar Jesuíno (PSB/Rede) formará a chapa com o ex-prefeito de Senador Canedo, Vanderlan Cardoso (PSB).

Na Paraíba, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul, o Rede apresentou para o Senado, respectivamente, os nomes do advogado Hilário Junior (PSB/Rede), do professor Luís Claudio Ribeiro (PPS/Rede) e da advogada Tatiana Ujacow (PSB/Rede), também sugerida como candidata a vice-governadora.

Tudo isso depende de negociação com outros parceiros da coligação. Em Pernambuco, por exemplo, o secretário estadual de Meio Ambiente Sérgio Xavier (PV/Rede) abriu mão da primeira suplência ao Senado para facilitar o apoio do PV a Paulo Câmara (PSB), a aposta de Campos à sua sucessão.

No Paraná, onde os partidos estarão separados, a professora Sigrid Andersen (PV/Rede) é a candidata ao Senado em coligação com o PV.

A recusa do Rede em apoiar tucanos e pemedebistas atinge ainda Estados como o Pará - onde apresentou o nome do ambientalista Marcelo Aiub (PSB/Rede) para o governo - e o Piauí, onde a agremiação não reconhece a composição da chapa pela qual o PMDB terá o candidato a governador, o PSDB o vice, e o PSB ao Senado. "Esse arranjo é incerto, ainda não nos foi oficializado", rebate Batista.

A exceção ao PMDB é feita no Rio Grande do Sul, onde o grupo de Marina Silva aceita apoiar o ex-prefeito de Caxias do Sul José Ivo Sartori, ligado ao senador pemedebista do Estado Pedro Simon, um entusiasta da formação do Rede.

Pedro Ivo Batista, contudo, nega a versão de que Marina teria se "encantado", em Santa Catarina, com Paulo Bornhausen, identificado com partidos à direita - foi do DEM, passou pelo PSD e agora preside o PSB no Estado.

"Não procede isso. Não sei de onde inventaram", diz.

Candidato do governo ao TCU é suspeito de lavagem e corrupção

Para auditores do tribunal, Gim Argello não reúne condições para o cargo

Fernanda Krakovics – O Globo

BRASÍLIA - Prestes a ser indicado para o cargo vitalício de ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), apadrinhado pelo governo Dilma Rousseff, o senador Gim Argello (PTB-DF) responde a seis inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), suspeito de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, falsidade ideológica, peculato (desvio de dinheiro público) e crime contra a lei de licitações.

A indicação para a vaga aberta com a aposentadoria do ministro Valmir Campelo, na última quinta-feira, cabe ao Senado e tem que ser aprovada por maioria simples, em votação secreta, pelos plenários da Casa e da Câmara.

Um dos inquéritos abertos no STF para investigar Argello é o de número 3.746, que apura indícios de lavagem de dinheiro. Relator do caso, o ministro Celso de Mello autorizou, no dia 20 de agosto do ano passado, investigação pela Polícia Federal. Trata-se de “procedimento administrativo criminal”, de acordo com despacho do relator, instaurado a partir de comunicados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) a respeito de movimentações financeiras consideradas atípicas de Márcia Cristina Argello e Jorge Argello Júnior, esposa e filho do senador.

“As informações sobre as movimentações financeiras de Jorge Argello Júnior e Márcia Argello foram relatadas pelo Coaf devido aos indícios da prática de crime de lavagem de dinheiro pelo Senador Gim Argello, que figura como acusado em ações penais que tramitam em segredo de justiça perante essa Corte e que apuram crimes de apropriação indébita, ocultação de bens, peculato e corrupção passiva”, afirma trecho do despacho de Celso de Mello.

Uma das movimentações financeiras citadas no despacho do relator é a de R$ 2,7 milhões na conta bancária do filho do senador, no período de fevereiro a setembro de 2010, “valor incompatível com sua renda declarada de R$ 6.500,00 (seis mil e quinhentos reais)”.

Também está no STF o inquérito 3059, no qual o então procurador-geral da República Roberto Gurgel ofereceu denúncia contra o senador, imputando-lhe a prática dos crimes de peculato (desvio de dinheiro público) e contra a lei de licitações, de acordo com despacho do relator, ministro Gilmar Mendes, no dia 31 de julho do ano passado.

As associações nacionais dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC) e do Ministério Público de Contas (AMPCON) organizam um ato público “em defesa do TCU”, contra a indicação de Argello, amanhã, na rampa do tribunal. O argumento é que ele não atende as exigências constitucionais de reputação ilibada e idoneidade moral. As entidades criaram uma página do Facebook intitulada “Ministro Ficha Limpa para o TCU”.

— É como a mulher de Cesar: não basta ser honesta, tem que parecer honesta. Imagina se algum gestor público vai aceitar que suas contas sejam julgadas por um ministro que está sendo acusado de crimes como lavagem de dinheiro. Não há por que ter tratamento diferenciado só porque a presidente da República quer fazer jogo político com o TCU. Se fosse para ter julgamento político, não precisava ter o TCU, bastava o Congresso — afirmou a presidente da ANTC, Lucieni Pereira da Silva.

Líder no Senado do bloco “União e Força”, formado pelo PTB, PR e PSC, Argello é suplente do ex-governador Joaquim Roriz, que renunciou ao mandato de senador, em 2007, para escapar da cassação em meio a um escândalo de corrupção.

O governo bateu o martelo sobre o apoio à indicação de Argello para o TCU em reunião da cúpula do PTB com os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Ricardo Berzoini (Relações Institucionais) na noite da última quarta-feira. Nessa mesma reunião, também foi sacramentada a indicação do então ministro do TCU Valmir Campelo para a vice-presidência de governo do Banco do Brasil. No dia seguinte, Campelo, que foi senador pelo PTB, antecipou sua aposentadoria, cujo prazo legal era outubro. A previsão é que a sua nomeação para o BB seja feita amanhã. Esse cargo no banco é ocupado atualmente pelo presidente do PTB, Benito Gama, que está saindo para disputar as eleições para deputado federal.

Senador se considera “adequado” para a função
O senador refutou, por meio de sua assessoria de imprensa, as suspeitas contra ele que constam nos inquéritos abertos pelo STF e disse estar preparado para assumir o cargo de ministro do TCU. Ainda de acordo com sua assessoria, o senador se considera “adequado” para a função, mesmo com as investigações em curso.

O senador apontou “erros crassos” cometidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) no inquérito 3.746, que apura indícios de lavagem de dinheiro. A assessoria de Argello afirmou que o próprio Coaf corrigiu, no inquérito, informações referentes a dois depósitos feitos por Márcia Cristina Argello e Jorge Argello Júnior, esposa e filho do senador, que teriam sido informadas erroneamente pelos bancos. O inquérito tramita sob segredo de Justiça.

Uma das movimentações financeiras que originalmente foi considerada atípica pelo Coaf e que teria sido corrigida é um depósito de R$ 262 mil, feito pelo filho do senador, na conta do Sindicato Rural de Santa Cruz de Monte Castelo, cujo responsável é o próprio Jorge Argello Júnior. A outra é um depósito da esposa do senador, no valor de R$ 675 mil, na conta do mesmo sindicato. A assessoria de imprensa de Argello afirmou que esses recursos eram para pagamento de imposto referentes à venda de imóvel.

Aplicação contestada
A defesa do senador contesta, no inquérito, a informação sobre uma aplicação financeira de R$ 1 milhão atribuída a Argello Júnior. Segundo a assessoria de imprensa, essa aplicação nunca existiu, o que poderia ser comprovado por extrato bancário.

Quanto ao inquérito 3.059, no qual o então procurador-geral da República Roberto Gurgel ofereceu denúncia pela prática dos crimes de peculato (desvio de dinheiro público) e contra a lei de licitações, a assessoria do senador ressalta que ele foi absolvido pela 4ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal e pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

Segundo a assessoria de imprensa de Argello, ele foi acusado, quando era presidente da Câmara Distrital, de desviar dinheiro para uma empresa de informática que fornecia computadores para a Casa

Ipea foi degradado e aparelhado, critica José Serra

Ex-governador de SP disse que órgão 'foi contaminado pela síndrome da inépcia total do governo Dilma'

Circe Bonatelli - Agência Estado

O ex-governador de São Paulo e candidato na última eleição para Presidência da República, José Serra (PSDB), fez duras críticas ao governo federal e ao Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) pelos dados errados divulgados na pesquisa sobre a violência contra as mulheres. "É o efeito contágio", disparou, em mensagem publicada hoje em redes sociais.

O Ipea é ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência. Na opinião de Serra, o instituto manteve um padrão mínimo de seriedade e competência nas décadas passadas, independentemente dos governos no poder. No entanto, "começou a ser degradado e aparelhado na era petista" acusou o tucano. "Agora, foi contaminado pela síndrome da inépcia total do governo Dilma", completou.

As críticas foram feitas após o Ipea informar que 65% dos brasileiros concordam, total ou parcialmente, com a afirmação de que "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas". No entanto, o dado correto é 26%. A pesquisa gerou repercussão no Brasil, com depoimentos da própria presidente Dilma Rousseff condenando o machismo e a violência contra as mulheres.

"Isso foi divulgado e gerou declarações, artigos, até discursos indignados pelo machismo da população brasileira. Confesso que não acreditei nos números. Achei que a pesquisa tinha sido mal feita. E foi", criticou Serra. "Erraram nos gráficos, nas perguntas e na amostragem."

Aécio Neves: O Brasil do PT

Portal PSDB

Na última semana, o Brasil viu a Petrobras continuar afundando num poço de lama. E, enquanto o governo mobilizava todas as forças e artifícios para impedir que as irregularidades fossem investigadas, fomos confrontados com mais um dano provocado pelo aparelhamento das nossas instituições. Desta vez, a vítima é o Ipea, importante referência da vida nacional.

Com "criatividade" de mais e ética de menos, o governo faz com que o brasileiro não conheça mais a realidade do país em que vive. Três exemplos:

1) O PAC 1 até hoje não entregou inúmeras obras prometidas. Outras, muito atrasadas, foram incorporadas de forma disfarçada à prestação de contas do PAC 2, que sofre com a ausência de resultados para chamar de seus. A realidade, que geraria constrangimentos em muitos governos, não impede o atual de preparar, novamente, para a véspera das eleições, o lançamento do PAC 3.

A propaganda maciça enterrou de vez a chance da população perceber uma das maiores farsas construídas no país, que vende como novidade e resultado do governo federal o que não é uma coisa nem outra.

No Brasil, tudo o que antes era rotina de governos virou PAC. Investimentos realizados por empresas privadas, por empresas estaduais e até a prestação paga pelas famílias pela casa própria inflam os números anunciados.

2) Há pouco tempo, o governo lançou milionária campanha publicitária: "o fim da miséria é apenas o começo", dizia a propaganda. Meses depois, no programa partidário do PT, veiculado em outubro de 2013, a presidente, em pessoa, candidamente afirmou: "e como já dissemos antes, o fim da miséria é apenas o começo".

Como assim? Quem disse antes foi o governo federal, com recursos do contribuinte, e não o PT. Ou seja, o governo federal gasta milhões de recursos públicos para repertoriar um slogan a ser utilizado pelo partido da presidente?

3) O acordo Metas do Milênio da ONU fixou em US$ 1,25 por dia a renda per capita mínima para retirar uma pessoa da extrema pobreza. Foi esse o critério utilizado pelo governo federal para anunciar que o país estava acabando com a pobreza absoluta. Pois bem, por esse mesmo critério, o governo federal deveria estar pagando hoje ao beneficiário do Bolsa Família um mínimo per capita de aproximadamente R$ 85. Quando o governo convocará rede de TV para informar aos brasileiros que, lamentavelmente, 16 milhões de pessoas voltaram para a extrema pobreza?

No país do PT, a Petrobras vai muito bem, o PAC impulsiona o desenvolvimento nacional, o governo respeita os limites entre o interesse público e o partidário. E, o mais importante, acabou com a pobreza absoluta no Brasil.

"Criatividade" tem limite. E desrespeito também.

Aécio Neves, senador (MG) e Presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat: O adversário de Dilma

“A alternância no poder é importante para a democracia.” LULA, em 2007

O Globo

Nem Marina Silva, nem Aécio Neves, nem Eduardo Campos. O principal adversário da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição, é Luiz Inácio Lula da Silva – por cinco vezes candidato a presidente, eleito em 2002, reeleito em 2006, e agora aspirante ao terceiro mandato. Não acredite se Lula voltar a dizer que não deseja subir outra vez a rampa do Palácio do Planalto. Simplesmente não acredite.

Dilma e Lula travam uma batalha de morte para Dilma e de adiamento de um sonho para Lula. Caso não concorra a um segundo mandato - ou concorra e acabe derrotada -, o mais provável é que Dilma saia de cena. Política não é a praia dela – pelo menos a política do “me empresta seu jatinho que eu lhe ajudo a fazer negócios com o governo”.

Lula preferiu ser sucedido por Dilma ao imaginar que isso facilitaria sua volta. Afinal, ela lhe seria grata para sempre. Outro nome do PT que o sucedesse, talvez não. Passados quatro anos, Dilma cederia o lugar a Lula sem oferecer resistência. Quem mais do PT seria capaz de se comportar assim? É o que Lula deve ter pensado.

De resto, Dilma nunca foi do PT. Foi do PDT de Leonel Brizola. Por conveniência, filiou-se ao PT. Mas nunca se reconheceu como uma petista de verdade. Nem o PT a reconhece como tal. Ocorre que Dilma gostou do poder. E quer provar que não é um poste que Lula acende ou apaga ao seu gosto. Compreensível, pois não. Daí...

Daí a batalha surda que travam. Por ora essa é a batalha que importa. Marina como vice de Eduardo, Aécio e Eduardo ainda não entraram no ringue. Preparam-se para entrar. Dilma está no meio do ringue. E defende-se sozinha. Lula? Só finge que a defende. O PT? Nem isso. Os demais partidos torcem pelo fim do seu governo.

Com poucos telefonemas, se quisesse, Lula enterraria de vez o movimento “Volta, Lula”, que recrudescerá depois da queda de Dilma na mais recente pesquisa Datafolha sobre intenção de voto. Ela caiu seis pontos percentuais, embora ainda se reeleja no primeiro turno. O mais preocupante para Dilma: aumentou a vontade dos brasileiros por mudanças.

Pouco mais de 70% querem que o próximo presidente aja de maneira diferente da maneira de Dilma. E
m cerca de um ano cresceu de 34% para 63% o percentual dos que dizem que Dilma faz pelo país menos do que eles esperavam. O fantasma do desemprego assombra mais gente. Assim como o pessimismo com o poder de compra.

O enfraquecimento de Dilma favorece a volta de Lula, mas um enfraquecimento em excesso atrapalha ou inviabiliza. Quer dizer então que Dilma não foi melhor administradora do que ele? Lula garantiu que ela seria. A culpa é de quem? De Dilma que jamais cogitou de ser candidata a presidente? Ou de Lula que cogitou por ela?

Termina em 30 de junho o prazo para que os partidos indiquem seus candidatos às eleições deste ano. Se até lá se convencer de que será derrotada, Dilma abdicará da reeleição. Lula não poderá esperar tanto tempo. A costura das alianças políticas nos Estados está avançada ou quase pronta. Lula teria dificuldades para desmanchá-la.

Enquanto isso... A revelação de que a Petrobras fez negócios podres atinge os dois governos de Lula. O PT sofre com a revelação de que um dos seus dirigentes foi parceiro de um doleiro preso. E não falta munição contra Lula e o PT. Dilma nada tem a ver com isso - nada. E a tudo assiste desolada...

José Roberto de Toledo: Meia dúzia de sinais

- O Estado de S.Paulo

Seis sinais extraídos das pesquisas Datafolha e Ibope divulgadas nas últimas semanas sobre a corrida presidencial:

1. A eleição presidencial caminha para o segundo turno
Embora Dilma Rousseff ainda tenha mais intenções de voto do que seus adversários mais prováveis juntos, sua vantagem vem diminuindo pouco a pouco. Na simulação com Marina Silva no lugar de Eduardo Campos como candidata do PSB na mais recente Datafolha, a soma dos rivais já supera a presidente em intenções de voto: 43% a 39%.

É um cenário improvável, mas mostra que quando há um nome menos desconhecido na parada, Dilma perde uma franja de seu eleitorado para a oposição. Mesmo que Marina não seja candidata a presidente, o efeito pode vir a se repetir com outros nomes à medida que eles se tornarem mais reconhecidos pelos eleitores.

À tendência recente das pesquisas, soma-se o peso da história. Nem Luiz Inácio Lula da Silva nem Dilma em situações mais favoráveis conseguiram se eleger no primeiro turno. Em 2006 e 2010, os saldos de popularidade do ex-presidente eram maiores do que é hoje o de sua sucessora. A popularidade rege a votação.

2. Aumenta a chance de pulverização dos votos
Não é um cenário tão pulverizado quanto o de 1989, mas os candidatos nanicos estão roubando votos dos favoritos como há muito não acontecia. Na pesquisa Datafolha eles já somam 6% das intenções de voto. Pastor Everaldo (PSC), Eduardo Jorge (PV) e outros do mesmo porte mostram que podem crescer durante a campanha e favorecer a realização de um segundo turno.

Não é só Dilma que eles podem atrapalhar, porém. O fato de os nanicos estarem saindo do zero é um sinal de que Aécio Neves (PSDB) e Campos não são suficientemente conhecidos nem têm sido convincentes o bastante para conseguirem atrair todos os eleitores que estão saindo da órbita de Dilma.

A dificuldade de fazer uma pré-campanha eficiente por causa da Copa do Mundo no Brasil e a vantagem excepcional de Dilma em exposição na propaganda na TV e no rádio vão tornar ainda mais difícil para Aécio e Campos se destacarem dos nanicos. Fica assim mais aberta a disputa pela segunda vaga no segundo turno.

3. Mudança depende de haver um novo rumo claro
O desejo de mudança brota da insatisfação. A insatisfação vem da perda da perspectiva de melhora de vida por grande parte da opinião pública. Salvo o Nordeste, no resto do Brasil os avanços da era Lula já foram assimilados e não propulsionam Dilma tanto quanto antes. Mais do mesmo não levará a presidente à reeleição.

Se não acreditam que o rumo está certo, os passageiros pressionam o capitão a corrigi-lo. A presidente tem duas opções: sinalizar com mudanças em um eventual segundo mandato, ou responder com a difusão da incerteza. Foi a narrativa de Fernando Henrique Cardoso na campanha de 1998. O medo de perder o rumo foi mais forte do que a esperança de mudar o curso.

4. Pessimismo econômico e mau humor são os inimigos de Dilma
Previsões coletivas de que a inflação vai aumentar são autorrealizáveis. Quando a grande maioria da população começa a acreditar nesse prognóstico, qualquer aumento abusivo de preço parece descontrole inflacionário. O tomate excepcionalmente caro sanciona a expectativa negativa e a cultura da indexação faz o resto. Salários perdem poder de compra, e o governo perde poder. Ponto.

5) O que estará em jogo na Copa é o orgulho de ser brasileiro
Mais do que o resultado da competição, a imagem projetada pela organização da Copa é o que mais tende a influir na eleição. De nada adiantará a seleção ser campeã se o sentimento dos anfitriões for o de vergonha por não terem feito uma boa festa. Especialmente se faltar água e luz. A sorte de Dilma depende menos de Felipão do que das construtoras e da meteorologia.

6) O "Volta, Lula" é uma armadilha disfarçada de último recurso
Substituir Dilma por Lula na chapa petista é um jeito rápido de enterrar a biografia de um e admitir a incompetência de ambos.

Veja também na Folha:

Marcus Pestana: Liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós

- O Tempo (MG)

Cinquenta anos se passaram. A experiência democrática foi abortada naquele 31 de março. Os tanques e as tropas partiram de solo mineiro, da minha Juiz de Fora, para derrubar o governo constitucional de Jango. O golpe de 1964 inaugurou uma das páginas mais tristes e sujas de nossa história. A modernização do capitalismo brasileiro foi feito à sombra do autoritarismo. Tortura, mortes, censura, fim da liberdade de expressão, de organização e de imprensa, cassação de mandatos, fechamento de partidos e do Congresso, perseguição e exílio. Seriam 21 longos e penosos anos. A sociedade foi castrada. As instituições foram apequenadas. A história brasileira, manchada de formada definitiva.

Os “50 anos do Golpe de 64!” deram margem a inúmeras matérias na imprensa, seminários, eventos políticos e culturais. E é bom que assim seja. Só tem direito a reivindicar o futuro a sociedade que tem a compreensão mais precisa possível de seu processo histórico. Os fantasmas da história não devem ser mandados para debaixo do tapete, precisam ser efetivamente exorcizados. Por mais doloroso que isso possa ser.

Alguns relatos às Comissões da Verdade são de embrulhar o estômago. Atores da repressão e da tortura narrando fria e cruamente atos desumanos e cruéis. O aprendizado mostra o caminho. Como disse Mário Covas, certa vez, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, em belo discurso: “Só pode entender o verdadeiro sentido das palavras quem conheceu seus contrários. Só pode entender o verdadeiro sentido da liberdade quem vivenciou a dura noite do autoritarismo”. Não há outro caminho, não há outros valores tão absolutos e universais, como os da liberdade e da democracia.

O século XX foi presidido por um falso dilema. Liberdade versus igualdade. A Guerra Fria cristalizou uma falsa contraposição entre liberdade, simbolizada pelo mundo ocidental liderado pelos Estados Unidos, e justiça social, encarnada no bloco socialista capitaneado pela União Soviética. Como “tudo que é sólido desmancha no ar”, a história tratou de repor as coisas em seus devidos lugares. Não há caminho para a solidariedade humana, para a equidade social, para a fraternidade, que não seja o da liberdade e da democracia. A liberdade é a grande ideia vitoriosa a iluminar a travessia desse início de século XXI.

Esse aprendizado é fundamental para o futuro. Numa América Latina que vê renascer experiências populistas e autoritárias que agridem as liberdades fundamentais do ser humano, é preciso encher os pulmões e, aos quatro ventos e em alto e bom som, dizer: ditadura, autoritarismo, repressão, tortura, nunca mais!

O mantra a ser repetido no Brasil, em Cuba, na Venezuela, no Oriente Médio, na Coreia do Norte ou em qualquer parte do mundo é o que nos ensinou Cecília Meireles: “Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que a explique e ninguém que não a entenda”.
Liberdade, abra suas asas sempre sobre nós!

Marcus Pestana, deputado federal e presidente do PSDB de Minas Gerais

Renato Janine Ribeiro: Liberdade para defender a ditadura?

Ensino superior deve educar, não pregar

Valor Econômico

Dois ou três episódios recentes tematizam a pergunta: liberdade para quem diverge de nós? liberdade para quem defende a ditadura? Amigos discutem. Vou analisar esta questão sem me perder nos fatos, porque estes só respondem se os casos se enquadram ou não na regra geral, e é esta que precisamos definir.

A liberdade de expressão é suprema na democracia. Tanto o é, que está se emancipando da liberdade de imprensa. Esta última é exercida por organizações de mídia. A de expressão começava com o maluco inglês falando num caixote do Hyde Park e hoje está nas redes sociais.

A liberdade, dizia a líder marxista Rosa Luxemburg, é sempre a liberdade de quem pensa diferente de nós. Não pode haver liberdade só para o "nosso" lado. A liberdade incomoda. A democracia não é um regime da unanimidade. É o regime no qual os leitores convencidos de que o PT é um partido de ladrões veem gente votar nele, e os que acusam o PSDB de indiferença aos dramas sociais sentem igual frustração... Dependendo de nosso grupo social, uma dessas convicções pode predominar, a ponto de só convivermos com gente que pensa como nós. Mas a divergência existe e é essencial.

Todavia, a liberdade de expressão inclui o direito de incitar ao crime? Não. Incitar a cometer um crime é crime. Não há liberdade de expressão para pregar "mate policiais". Então, por que seria livre pedir a repressão aos negros, a desigualdade entre homens e mulheres, a cassação de direitos de quem não é criminoso, a tortura, prisão e assassinato de quem não concorda conosco? Defender a ditadura é pregar que se cometam crimes contra muitas pessoas; mais que isso: é defender que se cometa, contra a sociedade inteira, o megacrime que é privá-la do direito de escolher. É pregar crimes de altas proporções. Tanto assim que no Brasil é ilegal o racismo, nos EUA se punem crimes de ódio (como a homofobia) e na Alemanha, a pregação do nazismo.

Essa linha divisória deve ser nítida. Devem ficar claros os temas cuja prédica a democracia tipifica como crimes. Deve se evitar o julgamento por inferência ("se disse isso, significa que também disse aquilo...). Mas não esqueçamos, aqui, os dois princípios em choque. Um é a liberdade de expressão. O outro é o direito de cada um a não ser vítima de crime. A liberdade de falar e agir cessa onde fere o direito do outro à integridade física e pessoal. Por isso defender a tortura e mesmo a desigualdade dos gêneros pode constituir crime.

Não entro no detalhe dos casos recentes, como o do professor de Direito da USP. Entrar neles é checar se os fatos precisos se ajustam ou não aos princípios éticos que validamos. O que quero é esclarecer estes últimos. Por exemplo, se alguém acredita que a democracia deve admitir até os discursos contra a democracia (posição oposta à minha), ele avaliará de outra forma o caso do professor. Mas a diferença dirá respeito aos princípios, não aos fatos. E cada país legislará do seu modo sobre os crimes de pregação de ódio. Com nosso histórico de racismo e ditadura, esses dois temas exigem, de nossa parte, uma ação mais firme do que em países que não viveram tais experiências de desumanidade.

Exponho agora a posição contrária à minha. Vários entendem que até mesmo os discursos do ódio devem ser permitidos, porque a discussão pública dará conta deles. Eles creem profundamente nas virtudes do debate. É uma posição respeitável, iluminista, de crença na razão. Mas a meu ver a pregação do mal não é vencida tão facilmente; ela persuade muitos. Ela inclui apelos emocionais baixos, como a invocação do sobrenatural, que inibem o uso da razão. Geram danos irreversíveis em vulneráveis. Nos Estados Unidos, em nome dela, seitas africanas têm pregado que crianças que nascem com certas deficiências não têm alma. Imaginem o que os pais fazem com elas.

Acrescento. Primeiro, não é certo um professor realizar prédica político-partidária, ou religiosa, em aula. Pode opinar fora da sala. Dentro dela pode argumentar politicamente sobre assuntos de seu conhecimento, mas jamais saindo da esfera racional. Opinião e preferência são direito dele, como de qualquer cidadão; sua diferença, como professor, é que contribua para a formação de seus alunos, o que não passa por crenças mas por conhecimento. Esta muralha da China entre a pessoa privada, que tem crenças ou preferências, e a do professor, que tem um compromisso com o conhecimento, está determinada em lei no caso das instituições públicas de ensino, mas é um imperativo moral para todo professor, inclusive nos estabelecimentos privados. Sem essa separação, não se educa: se adestra.

Segundo, devemos rever se deve ou não haver discursos ou debates políticos nos campi universitários. No fim da ditadura, eram frequentes. Eram vitais. Veio depois uma lei proibindo o uso de prédios públicos para campanha eleitoral, entre os quais se incluem os das melhores universidades do Brasil, quase todas estatais. Essa proibição deve ser mantida, ou devemos excetuar as universidades, por serem ambientes em que se formam pessoas que farão o País de amanhã? Se for permitido, isso deve estar em lei, e precisa se garantir a pluralidade de posições. Outra pergunta: deve valer também para as instituições privadas? Ora, se o fim de umas e outras é a educação, o debate deve existir se tiver teor educativo, e não, se não o tiver. Nas privadas, acontece de ser convidado só um lado, o do dono. Nem essa nem qualquer outra discriminação irracional deve existir. Ou proíbe para todos, ou libera; e neste caso com equilíbrio, pelo menos, das principais posições.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.

Luiz Carlos Azedo: O golpe visto de hoje

- Correio Braziliense

Não existe democracia sem o Congresso funcionando livremente. O papel dele na realização de bons governos, porém, depende da forma como se relaciona com o Executivo. Sempre que o parlamento é afrontado ou desmoralizado, quem perde é a democracia.

O que nos liga ainda hoje ao golpe de 1964, no qual lideranças militares e civis destituíram um presidente constitucionalmente eleito, João Goulart, e implantaram uma ditadura que durou mais de 20 anos? Sem dúvida, é a defesa dos valores democráticos. A defesa da democracia contra a “ameaça comunista” foi um mito criado para justificar o regime militar, pois não havia a menor chance de os comunistas derrotarem Juscelino Kubitschek nas eleições de 1965. Também é um mito pós-democratização a ideia de que as forças de esquerda que defendiam as reformas de base “na marra” e, depois, promoveram a “resistência armada” ao regime militar apoiavam a democracia, pois queriam mudar as regras do jogo para conquistar o poder.

Visto de tão longe, isso parece não ter importância. Hoje, os ex-integrantes das organizações que participaram da luta armada já não pregam as mesmas ideias de outrora, haja visto a presidente Dilma Rousseff, ela própria uma ex-guerrilheira, que recentemente defendeu a preservação da Lei da Anistia tal como se encontra. Os militares linhas-duras, entre os quais muitos ex-torturadores, também não têm influência na caserna, onde predominam a hierarquia e a disciplina imposta pela Constituição de 1988 e pelos regulamentos militares. Tanto que o Ministério da Defesa resolveu fazer sindicâncias nas instalações militares que foram utilizadas como centros de tortura.

As Forças Armadas deram um passo para reconhecer seus erros e os ex-guerrilheiros fazem autocrítica da luta armada. Ambos dificilmente fariam as mesmas coisas para chegar ou se manter no poder. Diante da consolidação do regime democrático e do fato de que já não existe a Guerra Fria, isso seria praticamente impensável. Quando olhamos ao redor, para os nossos vizinhos da Argentina, da Bolívia e da Venezuela, porém, vemos que o caldo de cultura das velhas tentações golpistas latino-americanas está vivíssimo. De parte da velha direita, já que a esquerda chegou ao poder; e da nova esquerda, quando corre o risco de perdê-lo em razão do fracasso de sua estratégia “anti-imperialista” de desenvolvimento.

A velha direita ficou órfã. Os Estados Unidos de Barack Obama optaram por outras formas de intervenção política, depois do fracasso da estratégia de seus antecessores, como ocorreu na Venezuela nos primeiros anos do governo bolivariano de Chávez — embora a espionagem eletrônica esteja aí para provar que os serviços secretos monitoram quase tudo. No Brasil, mesmo que a democracia não seja um valor universal para todos os atores políticos, o fato de termos um processo eleitoral de massas, com apuração instantânea e limpa, faz com que a nossa ordem constitucional, a cada eleição, se torne mais robusta. As agressões ao nosso Estado de direito democrático são de outra ordem, estão mais ligadas aos velhos costumes políticos.

Crise dos partidos
Vem daí a desmoralização dos políticos, dos partidos e do próprio Congresso, no bojo de uma crise do sistema representativo, cujas origens são estruturais. Decorre da formação dos grandes meios de comunicação de massa e do surgimento de novos sujeitos sociais, como os movimentos de gênero e de minorias. Essa crise foi aprofundada pela internet e as redes sociais. É cada vez menor o papel dos partidos na formação da opinião pública, ou como porta-vozes dos interesses da sociedade na vida cotidiana, embora mantenham o monopólio do poder político. Trata-se de um fenômeno global.

Há 50 anos, o xis da questão na desestabilização política do governo Jango foi a péssima relação entre o Executivo e o Congresso, a partir do plebiscito que restabeleceu o presidencialismo, e de sua frustrada tentativa de decretar o estado de sítio, rejeitado pelo Congresso. Jango pretendia fazer reformas por decreto e convocar uma Constituinte. Não foi à toa que o próprio parlamento legitimou a ação dos militares golpistas, quando Jango se deslocou de Brasília para o Rio Grande do Sul, com o propósito de restabelecer a rede de apoio que garantira a sua posse em 1962. Como se sabe, a história se repete como farsa ou como tragédia.

No Brasil imediatamente pós-regime militar, o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, em meio a escândalos de corrupção e um amplo movimento de massas, resultou na renúncia e na posse do vice, Itamar Franco, com o país mergulhado na hiperinflação. Não houve interferência dos militares, foi um ajuste de contas das forças políticas que perderam a eleição para a Presidência. Collor fora um candidato outsider, considerado aventureiro pelos demais caciques políticos. Muito mais do que os casos de corrupção, o que determinou sua queda foi ter confrontado o Congresso. Desde então, nenhum presidente da República descuidou de manter uma ampla base parlamentar, mesmo em sacrifício do programa de governo. Graças a isso, Fernando Henrique Cardoso aprovou o direito à uma reeleição, uma das pretensões de Jango que o levaram ao exílio.

Não existe democracia sem o Congresso funcionando livremente. O papel dele na realização de bons governos, porém, depende da forma como se relaciona com o Executivo. Sempre que o parlamento é afrontado ou desmoralizado, quem perde é a democracia. Em geral, tal fenômeno decorre da conduta das forças que estão no poder, que ditam o padrão de atuação de sua base parlamentar — para o bem ou para o mal. Basta ver o que está acontecendo agora, no caso da CPI da Petrobras.

Paulo Brossard*: A revisão da anistia

Uma revisão da lei de anistia se assemelharia a uma anistia retroativa a deparar com o vácuo

- Zero Hora (RS)

Confesso estar impressionado, e não é de hoje, com o que me parece uma espécie de esquecimento quanto ao que foi feito, progressivamente, em matéria das instituições nacionais, estaduais e também municipais. Dirigentes partidários, administradores de mérito, parlamentares de variado prestígio, pela lei da morte ou não, foram se extinguindo sem renovação. Hoje é difícil saber quais e quantos são os ministros, e se faz necessário divulgar o respectivo curriculum vitae para saber-se de quem se trata. E o mesmo se pode dizer das representações parlamentares. Não se sabe donde vem, nem para onde vão.

É claro que para explicar um fenômeno haverá uma pluralidade de causas, mas, para mim, uma das maiores reside no período de governo absoluto servido por uma censura absoluta. Tudo poderia ser feito e tudo veio a ser feito, sem que notícia deles chegasse sequer a uma parcela mínima da comunidade. O segredo era total. Basta dizer que durante o tempo em que estive próximo aos acontecimentos, nunca chegou ao meu conhecimento algum dado concreto relativo a uma atrocidade, que me tivesse sido revelado, por exemplo. De outro lado, por incrível que possa parecer, ninguém estranhou que a “Constituição” ostentava a declaração dos direitos e garantias individuais, que eram excluídos pelo AI-5; em outros tempos, em casos semelhantes, não faltaram manifestações de entidades docentes ou culturais, que naquela época fora omissas.

A certa altura, a oposição passou a defender a anistia _ “ampla, geral e irrestrita”, e como falasse em “anistia recípocra” o governo, irritado, proclamou que os vencedores não precisavam de perdão. Certo dia, porém, a “bomba do Riocentro” estilhaçou os segredos e num dado momento o governo percebeu que a ele também interessava a anistia e, mediante transigências ela foi aprovada; posso dizer que sem elas, então, a anistia não seria decretada. Não foi a anistia que eu queria, mas foi a possível e que, Deus louvado, sem exagero, mudou a face do Brasil. A anistia decretada pela Lei 6.683 de 28/8/1979, agora apontada como merecedora de revisão, parece não ter sido desprezível. A meu juízo, foi necessária e benéfica, mudou a face do Brasil. A propósito, lembro que a senhora Dilma Rousseff foi por ela anistiada, e hoje é a presidente da República.

Pois se lembro dessas coisas é porque, agora, ao ensejo dos 50 anos do movimento que culminou no afastamento do presidente Goulart, começou a falar-se abundantemente em “revisão da lei de anistia”, quando, decorrido mais de um terço de século, uma unanimidade nacional se estabeleceu a seu respeito.

Ora, a anistia é de aplicação instantânea e imperativa, independente de quererem ou não seus destinatários; sua amplitude atinge até condenação criminal transitada em julgado; a que foi decretada em 28/8/1979, pela Lei 6.683, apagou a todos os que, entre setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, cometeram “crimes políticos ou conexos com eles, eleitorais…”. De modo que, o que havia deixou de existir, como se nunca houvesse existido; destarte, uma revisão da lei de anistia se assemelharia a uma anistia retroativa a deparar com o vácuo. Enfim, a anistia de 1979 anistiou.

Lamento que não possa estender-me sobre a anistia, importante e interessante. Premido pelo espaço, noto apenas que ela não se funda na Justiça, mas na temperança, no esquecimento, e particularmente na paz, que a juízo da lei, se faça aconselhável.

* Jurista, ministro aposentado do STF

‘Deu errado o ensaio desenvolvimentista’

Desafios 2015 – Entrevista: Samuel Pessoa

Para o economista Samuel Pessoa, atual modelo econômico é um desastre que precisa ser revisto

“Foram os anos 70 voltando. O Geisel voltando. Parece um trem fantasma

Alexa Salomão, Ricardo Grinbaum - O Estado de S. Paulo

Samuel Pessoa, um físico que leciona economia, estreitou as relações com o PSDB na campanha presidencial deste ano. O senador Aécio Neves, candidato dado como certo para a legenda, anunciou que ele é um de seus assessores. Pessoa faz duras críticas à atual política econômica: "eu chamo de ensaio nacional desenvolvimentista - foi uma tragédia para o País e tem de ser revertido", diz. Na sua avaliação, a reversão deve ser seguida reformas que possam dar eficiência ao Estado sem que seu tamanho seja reduzido: "A sociedade quer educação, sistema de aposentadoria, programas sociais - é impossível reduzir o Estado", disse na entrevista que segue.

Como o senhor esta vendo o atual momento da economia?

Samuel Pessoa: Vou falar o que repito em todo lugar porque acho importante. Quando se olha a formulação de política econômica no Brasil, eu acho que há duas agendas muito diferentes. A partir do final do segundo mantado do governo Lula, passamos a ter duas agendas. Uma é muito anterior ao governo Lula. É uma agenda que está com a gente desde a democratização - uma agenda estrutural. Há outra agenda, que veio de 2009 para cá. Ela está associada a saída do ministro Antonio Palocci e a ida do ministro Guido Mantega (no Ministério da Fazenda). Isso aconteceu em 2006. O ministro Mantega teve muito senso de oportunidade e habilidade política para implantar a agenda dele aos poucos, conforme os fatos fossem permitindo. Em 2009, depois da crise, foi o grande momento em que ele pode trazer para a formulação da política econômica uma nova agenda. A primeira agenda estrutural eu chamo de contrato social da redemocratização. A segunda agenda - da equipe econômica do Mantega e da presidente Dilma e do final do governo Lula - eu chamo de ensaio nacional desenvolvimentista. Eu separo muito bem essas duas agendas. Acho que essa segunda é petista puro sangue. Acho que o Palocci, dentro daquele grupo político, talvez seja a excepcionalidade e parece que esse grupo político do PT tem um visão muito favorável ao nacional desenvolvimentismo e a esse conjunto de políticas econômicas - se bem que, posso estar exagerando, porque houve um período do governo Lula em que havia muita continuidade e que esse tema da agenda nacional desenvolvimentista não tinha proeminência. A outra agenda, a estrutural, é uma opção que a sociedade brasileira fez na Constituição, lá em 88. Está materializada no texto constitucional e essa opção vem sendo referendada e repactuada a cada eleição desde então. Ela expressa o desejo da nossa sociedade de construir um Estado de bem estar social muito abrangente, nos moldes dos países da Europa continental. Esse desenho esta no nosso texto constitucional. Neste aspecto, não há nenhuma diferenciação entre nenhum grupo política em atuação no Brasil. Em particular, eu acho que isso não distingue tucanos de petistas. O que inclui? Política de valorização do salário mínimo. Abono salarial, que é um programa lá do governo Sarney (José Sarney, ex-presidente da república). A aposentadoria rural. A Lei orgânica da assistência social. Renda mensal vitalícia. O programa bolsa família. A universalização da saúde. Mais recentemente, algumas iniciativas muito interessantes, como ProUni, Fies (programas de financiamento para o ensino superior) e todo um esforço de educação técnica. É um desejo da nossa sociedade avançar na questão da equidade. Com mais ou menos eficácia - tem programas que fazem sentido e outros que não fazem - isso é uma discussão. Mas esse é o pacote que o eleitor quer. O que cada governo faz é muito em função do que está na agenda desse pacto. A segunda agenda, não. Ela tem uma diferença grande. É uma agenda para colocar o Estado - o setor público - interferindo no desenvolvimento econômico. É o Estado decidindo a alocação de capital. É o Estado fazendo microgerenciamento das políticas de impostos e das tarifas de importação para incentivar alguns setores escolhidos segundo certos critérios. É o Estado fazendo microgerenciamento da política de intermediação financeira. Além disso, tenta adotar teorias heterodoxas sobre o processo inflacionário que acabam interferindo na liberdade do Banco Central e tendo um impacto sobre a inflação. É uma agenda grande. Começou no governo Lula, antes de 2009. Mexe nos graus de independência das agências reguladoras. Coloca uma parte grande da regulação de volta para os ministérios e, além de colocar de volta para os ministérios, passa a ter muita discricionariedade na regulação de diversos setores da economia. Ou seja: ao invés de usar um sistema de regras e procedimentos, pesos e contra pesos, passamos a ter a mão pesada do Estado. A gente vê isso no setor de petróleo, no setor de energia elétrica. Até na reformulação do marco ferroviário, com a ideia de separação vertical - que eu acho que não vai funcionar. Foi uma má ideia. Tem uma lista longa. Esse pacote não é da sociedade. É um pacote de um grupo de pessoas que está no centro da formulação da política econômica e que avalia que essas medidas são necessárias para acelerar o crescimento econômico. A minha avaliação é que esse ensaio nacional desenvolvimentista deu errado. Deu tudo errado. Foi uma tragédia para o País. Foi adotado por motivos ideológicos e acho que ele tem de ser revertido.

O senhor fala que a agenda da sociedade pede uma social democracia. Mas agenda depende da situação fiscal, que hoje está na ordem do dia. Como o PSDB poderia conciliar a questão fiscal, hoje com limitações, com essa agenda da população?

Samuel Pessoa: Minha resposta a tua pergunta é: não sei. Mas quero esclarecer que não falo aqui pelo PSDB. Sou colunista da Folha. Escrevo aos domingos. Todo mundo sabe quais são as minhas ideias. Eu tenho um vinculo grande com o partido há muitos anos. Fui assessor do senador Tasso Jereissati durante sete anos. Foi uma experiência maravilhosa. Trabalhar com Tarso foi a atividade profissional mais interessante que eu tive. Foi um privilégio pertencer ao gabinete dele. Adicionalmente, acho que o presidente Fernando Henrique Cardoso foi o melhor presidente que a gente teve. Avaliar o País que ele pegou e o País que ele legou mostra isso. Eu gosto muito do Lula. O primeiro mandato do Lula foi espetacular. Mas frente aos desafios que a sociedade brasileira enfrentava em 94, acho que o legado de FHC é impressionante. Também acredito que a história já está dando a ele o devido crédito. Ele vai ser um desses homens festejados ainda em vida e espero que ele viva muito. Meus vínculos com o PSDB são imensos. Tenho conversado com o senador Aécio. Acho que ele é um candidato espetacular. Há um tempo, li uma entrevista do Paulo Bernardo que, inclusive, me deixou muito surpreso. Paulo Bernardo se referiu ao Aécio como se ele fosse um garoto de Copacabana. Isso é algo inacreditável quando você olha o currículo do Aécio. O Aécio cumpriu o caminho legislativo brasileiro inteiro. Foi líder na Câmara e no Senado. Foi governador oito anos. É difícil imaginar uma pessoa com tanta bagagem na política brasileira hoje. E ele é jovem, o que é surpreendente. É um jovem com a experiência de uma velho. É um candidato espetacular. Mas eu não estou discutindo com o candidato detalhes de política econômica.

Mas qual é a tua opinião?

Samuel Pessoa: Como eu falei, essa é uma agenda da sociedade. O que nós economistas podemos mostrar os custos e os benefícios das diversas opções. A gente pode redefinir os termos do contrato social. O que chamo de contrato social é uma série de programas, de seguros sociais e critérios, como valor do benefício. Este é o contrato que ela assinou com ela mesma e com o Congresso Nacional. Esse contrato tem implicações para a igualdade, para o crescimento econômico. Nós que atuamos de alguma forma nessa área - eu sou professor de economia, não sou economista, mas formado em física - podemos mostrar alguns caminhos possíveis. Mostrar custos e benefícios. Mas a decisão do que fazer nem é do candidato _ é da sociedade. A sociedade precisa ser informado. O presidente ou a presidente coordena, a partir do poder que tem de definir a agenda, já que no nosso presidencialismo de coalização o presidente muito pode. Mas o processo de tomada de decisão de como o contrato social vai evoluir é um processo que deve ocorrer no Congresso. Eu já falei muita bobagem na minha vida. É difícil encontrar uma pessoa que atue na minha área que não tenha falado uma bobagem. Mas entre todas, a que mais me causa arrependimento ocorreu num episódio em 2003 ou 2004 quando fui chamado para uma audiência pública no Senado para falar de salário mínimo. Eu falei contra o aumento do salário mínimo e sobre as questões fiscais. Me arrependo muito. Não acho que fui um bom auxiliar nesse caso. O Congresso me chamou para que eu o auxiliasse a pensar no problema e acho que minha intervenção foi péssima. Me dá dor de cabeça quando lembro. A minha mensagem foi careta - e estava tudo certo na mensagem careta. Primário tem que pagar dívida, juros tem que cair, tem que fazer primário. Mas quando se fala em política de valorização do salário mínimo é preciso lembrar que existem milhões de pessoas que vivem de salário mínimo. Tratar o aumento do salário mínimo como algo não importante, não dar atenção ao impacto sobre a vida de todas as famílias que dependem do salário mínimo, é uma enorme falta de sensibilidade política. Eu aprendi que o profissional de economia não tem muito a dizer sobre política de valorização de salário mínimo. Pode falar sobre custos, sobre benefícios, mas a decisão é certamente política. Quando eu falei das duas agendas, me referia a isso. Tem uma agenda que não só é políticas, por ser da sociedade, mas porque ela envolve questões distributivas profundas. A gente não sabe avaliar direito. Quem avalia isso é o político. A gente pode auxiliar fazendo conta, mostrando custo. A outra agenda, é mais técnica. O livro que eu estudei diz que tudo isso que foi feito está errado. Não é uma questão de menos distribuição de renda ou sobre visões diferentes do liberalismo. São visões diferentes sobre o funcionamento da economia e sobre o que é certo e o que é errado. Eu estudei em um livro e as pessoas que formulam a política econômica hoje estudaram outro livro. Evidentemente, a economia não é uma ciência dura. Elas podem estar certas e eu errado - tudo deu errado por outros motivos. Ou eu posso estar certo e elas, não - a coisa deu errado pelos motivos que eu acho. Essa é uma discussão infinita. É difícil ter uma conclusão, até pela natureza da disciplina de economia. Sobre essa questão do contrato social, tenho a mesma ideia desde 2006. Eu, Mansueto Almeia e Fábio Giambiagi falamos sobre isso em uma notinha no apêndice de um relatório de conjuntura econômica trimestral que havia no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e nunca mais mudei de ideia: o contrato social hoje requer que o gasto social cresça mais que o PIB. Esse é um dado.

Mas como resolver?

Samuel Pessoa: A solução não está na economia. A solução é política - e os políticos terão que resolver. O que a economia diz é: ou repactuamos, para que o gasto cresça mais lentamente, ou aumentamos a carga tributária, o que é legítimo, ou não fazemos nada e se soluciona com inflação - o que eu acho que a sociedade não quer. Mas nós que atuamos na área econômica temos apenas um papel, uma função: informar direito. Vamos pegar as manifestações do ano passado. A sociedade mostrou ter uma leitura diferente da minha e acho que essa leitura é muito equivocada. As sociedade acredita que dá para resolver todos os problemas do Estado combatendo a corrupção e suas ineficiências. Isso não é verdade. Combater a corrupção e as ineficiências do Estado é muito importante e precisa ser feito. É mais importante ainda quando se lembra que houve o ensaio nacional desenvolvimentista e destruição na governança de diversos setores da nossa economia - no setor de petróleo, no de energia, nas agências reguladoras. Construíram-se muitas ineficiências ao longo de anos de governo petista. Sendo bem específico: a gente gasta com o INSS algo como 7,5% do PIB. Tem uma tabela do Mansueto que todo ano a gente atualiza. Essa conta aumentou 3 pontos porcentuais do PIB nos últimos 20 anos. Essa conta não é cara porque tem um monte de falecidos ganhando indevidamente o benefício. Ou porque um monte de gente fraudou e está ganhando indevidamente o benefício. Ou porque um monte de gente que tem direito ao benefício conseguiu fraudar e recebe um benefício maior do que a regra permite. Isso deve existi em toda parte. Deve existir no Estados Unidos. É bem possível que seja um pouco pior no Brasil. Mas isso não representa o grosso. Medidas de gestão para resolver esses problemas não resolvem a questão estrutural - o fato de o contrato social requerer que o gasto público cresça a uma velocidade maior que o crescimento do PIB. Esse problema é estrutural. Essa questão vai ser tratada na esfera política, envolvendo executivo e legislativo. Os técnicos têm pouco a dizer a esse respeito.

Mas qual é a sua opinião - como compatibilizar a agenda social com a necessidade de financiamento público?

Samuel Pessoa: O processo eleitoral é que vai dizer o que fazer. A forma como a sociedade se pronunciar, a forma como o debate entre candidato e sociedade ocorrer é que vai dizer. Se eu disser o que quero, não vou falar como economista, vou falar como cidadão. Aliás, gente, eu não sou economista. Eu sou professor de economia e sou físico -- e apenas formado em física. Ser físico é para poucos. Não é o meu caso, infelizmente. Então, posso falar pelo cidadão Samuel, que é rico - todos nós aqui fazemos parte do 1% da sociedade mais rica. Até hoje, eu me penitencio pela aquela ida ao Senado, travestido de técnico. No fundo eu representava o cidadão. Isso me entristece até hoje. Eu confundi as duas personas. Por isso, acredito que agora não é momento para eu falar. Algum candidato contrario ao Aécio pode pegar alguma coisa que eu falar e apresentar em um programa para dizer: está vendo? O Aécio quer fazer isso. Um dos assessores dele disse que ele deve fazer isso.

Publicaram hoje uma entrevista do Aécio em que ele toca sobre vários pontos da economia. Dois deles chamam a atenção: ele acha que é preciso manter a política do salário mínimo e que o gasto não deve cresce acima do crescimento do PIB. Ele disse isso. Qual a tua opinião?

Samuel Pessoa: A política do salário mínimo e os atuais critérios de elegibilidade do INSS gera um dinâmica da previdência em que o crescimento é maior que o PIB. Tem sido assim nos últimos anos. Deve ter alguma ineficiência. É possível melhorar os mecanismos de controle. Mas não é isso que vai resolver. Para manter isso intacto, será preciso mexer em outras rubricas para que o gasto como um todo não cresça. Isso pode ser feito. Mas é preciso ver com o senador o que ele tem na cabeça. Eu acho que a aproximação do debate eleitoral, essas questões vão ser tratadas.

Olhando para a outra agenda, a nacional desenvolvimentista que o sr. criticou muito, o que é preciso mudar?

Samuel Pessoa: É preciso reduzir os créditos do Tesouro para bancos públicos. Foi um excesso. Foram os anos 70 voltando. O Geisel voltando. Parece um trem fantasma. É preciso consertar os preços. Novamente, isso também é um trem fantasma. Nos anos 70, na hiperinflação da redemocratização, por várias vezes, tentamos controlar preços segurando tarifa pública. Fizemos isso desde os anos 50. Nunca deu certo. O preço precisa ser real. Mas dizem: ahhhh, mas tem o problema da pobreza. Sim, mas o problema de pobreza a gente cuida com os mecanismos corretos - com um bolsa família, que é um instrumento poderoso, espetacular, que precisa ser valorizado e reforçado o tempo todo. Para mim, o presidente Lula marcou um enorme gol quando unificou os programas sociais, aumentou e potencializou os benefícios. Teve um impacto muito importante. As pessoas precisam ter uma garantia mínima de vida, sim, mas você faz isso com política de salário mínimo, com bolsa família, que dão uma renda para as pessoas. Mas os preços, da gasolina, da energia, precisam ser corretos. Isso precisa ser desfeito. Não gosto da política de desoneração. Acho que o senador tem uma opinião diferente da minha nesse aspecto. Eu sou um fiscalista. Acho muito ruim ter um superávit primário mais baixo quando as condições de endividamento do Estado não permitem. Acho muito ruim o risco-país, desde outubro, ter aberto 100 pontos em relação a México, Chile, Peru. Acho muito ruim a gente começar a fazer conta: será que essa dívida vai começar a crescer feito bola de neve? E eu acho que isso foi gerado por uma política desastrada de desoneração tributária. Tirando a desoneração sobre salário e sobre cesta básica, que têm benefícios óbvios e já deveriam ter sido adotadas há muito tempo, sou contrário as desonerações tópicas para esse ou aquele setor. A gente precisa reforçar a posição fiscal. O princípio de uma macroeconomia em ordem é um setor pública em ordem. A gente entrou numa crise muito profunda em 2008 e 2009 e houve muita competência por parte da equipe do ministro Mantega para enfrentar aquele episódio e tirar o País da crise. Um dos instrumentos adotados foi a política de desoneração. Eu acho que até exageram nos instrumentos contracíclicos em 2009. Não precisava de tudo que foi feito. Mas reproduzir a prática em 2011, 2012 foi um erro gigantesco. A economia brasileira já estava vivenciando uma realidade totalmente diferente. Por causa dessa política desastrada de desonerações ficamos com os ônus sem ter os bônus. O Tesouro Nacional ficou com os ônus, mas o País não teve os bônus da política. Também aumentaram imposto de importação, mas isso caiu. Foi uma boa medida cair. A gente agora via ter de enfrentar a inflação com uma posição fiscal sólida e um Banco Central independente. Uma boa medida é tentar passar no Congresso a independência formal do Banco Central.

Além da independência informal, que existia no governo de Fernando Henrique, o senhor acha necessária a independência formal?

Samuel Pessoa: Nunca fui um entusiasta da autonomia formal, porque é dessas coisas meio chatas: você só pode ter quando não precisa muito dela. É assim: se a sociedade não está convencida que é melhor fazer tudo que for necessário para combater a inflação, não é botando na veia que não vai ter inflação e que ela não vai existir. Vimos o exemplo da Argentina - botou na veia a conversibilidade, medida super dura, para não ter inflação. A sociedade não tinha resolvido o conflito distributivo e a inflação quando veio, veio pior. Amarras muito duras quando o amadurecimento da sociedade não é compatível com essas amarras pode ser contraproducente. Eu acho que a sociedade está demonstrando que está bem evoluída. Não está aceitando inflação. Nãos está reclamando que o Banco Central está subindo o juro. Acho que, talvez, a sociedade esteja madura para que tenhamos o instituto da independência formal do Banco Central.

Excluindo essa agenda que o sr. considera desastrosa, o que deve ser colocado no lugar para elevar o crescimento?

Samuel Pessoa: O tema crescimento também tem dois aspectos. Há um aspecto político. Crescer dói. Não é fácil. A China cresce 7% ao ano. Vai lá ver se está todo mundo feliz com aquele crescimento. A taxa de poupança de uma família chinesa é de 50% da renda. Poupando 50% da renda dá para crescer muito. Pergunta: a sociedade brasileira que poupar isso para crescer mais rápido? Ou tem outra escolha? Quer crescer mais lentamente? Esse são temas para os quais o profissional de economia não tem nada a dizer. Não é bom. Não é ruim. É uma escolha da sociedade. Isso bate no contrato social da redemocratização. Eu tenho dito, tenho escrito várias vezes - a sociedade brasileiro escolheu crescer pouco. Quer cresce de maneira mais sólida. A agenda da sociedade brasileira hoje não é crescimento. É equidade. O Brasil tem crescido e tem melhorado, mas no nosso ritmo, atendendo às nossas demandas. Por outro lado, o ensaio nacional desenvolvimentista piorou a situação, porque ele tira a eficiência da economia. Uma parte do nosso baixo crescimento é um padrão de escolha da sociedade. Mas outra parte do baixo crescimento, mais recente, no meu entender, vem da eficiência econômica e dos erros de política econômica que foram cometidos seguidamente a partir de 2009. Se for revertido, o Brasil cresce mais. Vou até dar a minha conta porque esse é um debate que temos feito. O Brasil está crescendo hoje 2 pontos porcentuais a menos do que crescia antes. O mundo cresce 0,6 a menos. A América Latina cresce 0,7 a menos. Nós estamos crescendo 2 a menos. Alguma coisa que aconteceu e fez com que a nossa desaceleração fosse muito maior do que a desaceleração do resto do mundo. É verdade que as economias estão interligadas e que o ciclo mundial é sincronizado, principalmente agora que o mundo é globalizado. O ciclo do Brasil é igual ao ciclo do mundo. Mas a gente abaixou mais. Por que? Bom, 0,6 ponto porcentual de queda foi provocada pelo mundo. E o resto? Você tem o esgotamento do fator trabalho, que deve explicar cerca de meio ponto porcentual de queda. Mas tem cerca de um ponto porcentual de perda - talvez um pouco menos - que no meu entender vem da ineficiência econômica e de uma certa desorganização que existe na economia. São as consequências na mudança do regime econômico que o ministro Mantega chamou de a nova matriz econômica. Isso está tirando um ponto porcentual do crescimento. Talvez a minha conta esteja exagerada e não seja tudo isso - seja 0,7 ou 0,8. Revertendo essa política, voltando ao regime anterior e avançando a partir de onde a gente estava antes, isso muda. O FHC não é o fim dos tempos. Ele fez o que era possível naquela janela de oportunidade nos oito anos que teve. Ele deixou muita coisa a ser feita. Nos primeiros anos do governo Lula, o País avançou muito, principalmente na área de crédito. Mas temos agora que desfazer as coisas erradas e continuar naquela toada.

O para frente nessa toada inclui o que?

Samuel Pessoa: Para atender as ruas, uma parte do trabalho é melhorar a eficiência do Estado. Essa é uma agenda que está parada. Falei isso inúmeras vezes. Desde o primeiro mandato de FHC, quando se fez muita coisa. Bresser Pereira passou pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Depois a Claudia Costin deu continuidade. Mas até pela complexidade dos temas tratados no segundo mandato de FHC, essa agenda ficou um pouco parada. O governo petista não conseguiu tocar essa agenda. A questão da reforma administrativa inclui dar ao Estado instrumentos de gestão para fazer com que as pessoas que passaram no concurso público, mas que sejam funcionários ruins, possam ser demitidas Hoje o cara só é mau funcionário público se roubar. Se ele tiver um desempenho ruim que penalize a comunidade, ele fica. Essa é uma questão fundamental para atender as demandas das ruas. Foi uma pena o longo ciclo petista não trazer nenhum reflexão nessa direção. Gastaram muito tempo destruindo coisas que funcionavam bem. Um exemplo: o marcado regulatório do petróleo. Gastou-se energia do setor público que poderia ser endereçada para outros temas. No âmbito estadual, o Aécio, dentro do que é possível fazer com legislação estadual, fez muita coisa em Minas Gerais. Essa é uma agenda importantíssima para que se possa melhorar os serviços de saúde, educação e segurança. A gente não vai melhorar saúde, educação e segurança colocando mais dinheiro. Talvez até precise gastar um pouco mais com saúde, mas a questão, de forma geral, não é mais dinheiro. É preciso usar melhor o dinheiro - mas para usar melhor o dinheiro é preciso olhar o Estado por dentro. Tem também a eterna agenda da reforma tributária. A presidente Dilma reconheceu e os economistas que trabalham com ela estão cientes e se esforçaram para levar adiante. No entanto, acredito que perdemos uma chance preciosa. O ensaio nacional desenvolvimentista destruiu a situação fiscal. Só para vocês terem uma ideia. O primário recorrente neste ano, desconsiderando receitas extraordinárias, provavelmente vai ser 0,8 % do PIB. O primário em 2002 era 3%. Um pouco mais que isso. O ano de 2002 terminou com déficit de transações correntes acho que um pouquinho abaixo de 2 pontos porcentuais. Este ano vai fechar em 4 ou 3,9. O fiscal, além da perda da transparência e outros efeitos ruins, piorou muito. A gente perdeu a oportunidade de usar o espaço fiscal que tínhamos lá atrás para fazer um reforma tributária, negociando com os estados. Foi trágico. Quiseram reinventar o Geisel, ao invés de usar esse espaço fiscal para fazer a reforma tributária, que é muito importante. Agora, essa reforma tributária só vai sair se o executivo quiser muito e se ele tiver espaço fiscal, para poder liderar o processo.

Quando o senhor fala que elevar a eficiência do Estado, considera a possibilidade de reduzir o seu tamanho retomando as privatizações?

Samuel Pessoa: Quando a gente fala de tamanho do Estado também temos duas agendas - totalmente diferentes. Acho impossível diminuir o Estado Brasileiro. A sociedade não quer diminuir o Estado - e a sua escolha é legítima. A sociedade quer saúde pública, universal, integral. Quer educação pública. Quer um sistema abrangente de aposentadoria. Quer um sistema abrangente de seguros público - abono salarial, seguro desemprego - e programas sociais. Como a sociedade quer tudo isso, é impossível reduzir o Estado. Nesta dimensão, o Estado só vai mudar, se a sociedade mudar. Como eu acho que ela não vai mudar, o Estado não vai diminuir. Isso não está em discussão. Eu como cidadão posso gostar mais de um Estado grande ou pequeno. Posso preferir a Suécia aos Estados Unidos. A sociedade brasileira já tomou a sua decisão - prefere a Suécia. Essa escolha não está em xeque. Não é isso que se discute nessa eleição. O que se discute é modelo de intervenção na economia. Eu acho que é preciso mudar a intervenção direta na regulação da economia. Isso é um desastre.

Para o Brasil ser Suécia, precisa de qual modelo de crescimento?

Samuel Pessoa: Uma vez eu pensei nisso. Acho que o modelo nosso modelo é meio nosso. Há o modelo anglo saxão, que é pouco welfare e tem pouca intervenção direta do Estado na economia. Há o modelo europeu que é muito welfare e tem uma regulação mais dura do Estado. Há o modelo oriental, muito pouco welfare, mas com muita regulação. O nosso é único. Muito welfare e com uma regulação menor na economia. Acho que isso é possível e tem condições de gerar crescimento econômico. Talvez seja um modelo parecido com países como a Austrália.

Como você compararia a transição de 2002 com a de 2014.

Samuel Pessoa: São bem parecidas, mas com uma diferença: em 2002 a gente estava melhorando. Havia um monte de problemas na época, mas estávamos muito melhor que em 1994. Se eu comparar agora com 2010, pioramos. Vamos comparar os números de 2002 e 2014. Eu olhei hoje. A inflação em 2002 fechou em 12,5%. Muito alta. A inflação neste ano vai fechar em 6,5%. Fica parecendo que piorou, mas não é bem isso quando você abre a inflação. Serviços em 2012: 5,5%. Serviços hoje: 8,5%. Serviços é o componente mais duro da inflação. Sob o critério inflação de serviços, 2002 é melhor. Impressionante. Não tinha nenhum atraso tarifário em 2002. Agora, há um enorme atraso tarifário. Apesar de a inflação em 2002 ser mais alta, a sua composição era muito melhor. Superávit primário de 2002: 3% do PIB. Neste ano: 0,8%. Déficit de transação correntes em 2002: 1,7% do PIB. Neste ano, provavelmente 4%. Aparentemente, hoje a conta está mais alta. Se levarmos em conta a inflação represada e a dificuldade para reduzi-la, porque as expectativas estão muito contaminadas, podemos dizer que o desafio em relação a inflação em primeiro de janeiro de 2015 será maior que o desafio em janeiro de 2003. Em 2003 a inflação era alta, mas o câmbio estava super desvalorizado. Coisa que agora não há. O câmbio desvalorizado apontava uma inflação cadente.

Então 2015 será um ano difícil?

Samuel Pessoa: Sim. Todo mundo sabe que será um ano difícil. O povo já sabe.

O eleitor percebe todos esses problemas?

Samuel Pessoa: Demora. A situação de renda continua boa. A PME (Pesquisa Mensal de Emprego) da semana passada mostrou que, na comparação ano a ano, a renda ainda está crescendo 3%. É menos que antes, mas ainda é acima da produtividade do trabalho. O PIB cresce 2% e a renda cresce 3%. O desemprego ainda está baixo. Mas acho que há um desconforto. Eu li no jornal hoje que novos cálculo da consultoria de Mário Veiga apontam que a probabilidade de racionamento de energia mais profundo é de 46%. Se abril não for chuvoso, esse negócio piora. Não parece que abril vai ser mais chuvoso. Esse é um assunto delicado. A dificuldade do FHC para eleger o Serra esteve relacionada ao racionamento. O racionamento abortou a possibilidade de crescimento. Se não tivesse tido racionamento, talvez a economia estivesse bombando, houvesse recuperação da renda e isso seria suficiente para eleger o Serra. A questão energética vai pesar.

O senhor espera uma disputa eleitoral acirrada?

Samuel Pessoa: Essa é uma pergunta para consultor político. Eu acho que vai ter segundo turno. Apesar de tanto Aécio quanto Eduardo Campos não serem políticos conhecidos nacionalmente, são políticos profissionais. Aécio está há mais de 30 anos na política. Por causa dessa experiência, a Dilma vai ter dificuldades no debate no segundo turno.