Resultado
das urnas mostra que a escolha predominante recaiu sobre candidatos e partidos
tradicionais
Os
ventos mudaram. A apuração das eleições do último domingo mostrou que o
eleitorado optou por candidatos reconhecidos, pertencentes a partidos
tradicionais, com capacidade testada para governar, perfil que havia perdido
terreno nos últimos pleitos para novos rostos que representavam a
“antipolítica”, a rejeição a “tudo isso que está aí”.
Desta
vez, os eleitores preferiram não arriscar. Escolheram nomes e legendas com
experiência política e administrativa. Os oito partidos mais votados são todos
tradicionais: MDB, PSDB, PSD, DEM, PP, PT, PDT e PSB. Somaram 64% dos 102,5
milhões de votos computados, elegeram 64% dos vereadores e 71% dos prefeitos
que venceram no primeiro turno.
Dos
13 prefeitos de capitais que concorreram à reeleição, apenas o de Porto Alegre,
Nelson Marchezan Júnior (PSDB), foi derrotado. Os demais ganharam ou disputarão
segundo turno. Estão reeleitos: Rafael Greca (DEM, Curitiba), Gean Loureiro
(DEM, Florianópolis), Alexandre Kalil (PSD, Belo Horizonte), Marquinhos Trad
(PSD, Campo Grande), Álvaro Dias (PSDB, Natal) e Cinthia Ribeiro (PSDB,
Palmas). Disputarão o segundo turno: Bruno Covas (PSDB, São Paulo), Marcelo
Crivella (Republicanos, Rio), Emanuel Pinheiro (MDB, Cuiabá), Edvaldo Nogueira
(PDT, Aracaju), Hildon Chaves (PSDB, Porto Velho) e Socorro Neri (PSB, Rio
Branco).
A
onda da “nova política” que fez sucesso nos últimos pleitos perdeu fôlego. O
eleitorado se desiludiu com discursos que não se traduzem em resultados
concretos. O exemplo mais eloquente é o ex-juiz Wilson Witzel, que chegou ao
Palácio Guanabara numa ascensão meteórica e, com menos de dois anos no governo
do Rio, foi afastado e enfrenta um processo de impeachment, acusado de
corrupção.
Os
resultados reafirmam a persistência dos partidos tradicionais. O MDB conquistou
mais prefeituras (774, ou 14% de 5.408 municípios). Em seguida, aparecem PP
(682, ou 13%) e PSD (650 ou 12%). O MDB foi também a legenda que que fez o
maior número de vereadores (6.487, ou 13% do total), seguido por PP (5.716, ou
11%) e PSD (5.194, ou 10%).
Um
recado claro sai das urnas: os eleitores querem respostas objetivas para os
problemas graves que afligem suas cidades — mazelas que a pandemia escancarou.
Demandam mais soluções e menos discursos, mais trabalho e menos saliva, mais
entrega e menos ideologia. Nesse ponto, dispensaram o apoio de padrinhos
políticos e optaram por quem já conhecem, quem já foi testado no dia a dia.
Aprovaram também as medidas de restrição adotadas pelos prefeitos durante a
pandemia, mesmo sob o fogo cerrado do presidente Jair Bolsonaro. As decisões
foram respaldadas pelo voto.
Os
próximos quatro anos serão desafiadores para os prefeitos eleitos ou reeleitos.
Pode ser que a experiência reconhecida nas urnas os ajude a recuperar as
cidades devastadas pela pandemia, num cenário de recursos ainda escassos. É
isso que os eleitores esperam deles.
A
política venceu – Opinião O Estado de S. Paulo
O
eleitorado aparentemente se cansou da gritaria, da leviandade e do cinismo. A
política baseada na arte da negociação não só ganhou fôlego, como se mostrou
capaz de seduzir as novas gerações.
Há
duas maneiras de reagir a uma derrota eleitoral: como um democrata, aceitando
os resultados e cumprimentando o vencedor, ou como um autoritário, inventando
amalucadas conspirações para denunciar fraude nas urnas e, assim, deslegitimar
o eleito. Como era previsível, muitos bolsonaristas, inspirados no ídolo Donald
Trump e no presidente Jair Bolsonaro, preferiram o modo antidemocrático de
lidar com o desastre eleitoral que sofreram no domingo passado.
Colaborou
para criar o clima de maquinação a tentativa de invasão do sistema eletrônico
do Tribunal Superior Eleitoral, notícia que causou confusão bem ao gosto do
bolsonarismo. A tal invasão, deflagrada sob medida para colocar em dúvida a
lisura do pleito, foi neutralizada e não ameaçou em nenhum momento a segurança
da votação. Mas nada disso importa para os bolsonaristas, para os quais a
simples menção a um “ataque hacker” foi suficiente para dar feição de verdade à
patranha segundo a qual as urnas eletrônicas não são confiáveis – como reiterou
irresponsavelmente o presidente Bolsonaro um dia depois da esmagadora derrota
que sofreu nas urnas.
Sem
nenhuma vocação democrática, aos bolsonaristas só resta mesmo recusar-se a
aceitar que poucos candidatos apoiados pelo presidente Bolsonaro foram
bem-sucedidos. Dos 13 candidatos a prefeito para os quais o presidente fez
campanha, somente 2 foram eleitos e outros 2 estão no segundo turno. No Recife,
por exemplo, sua candidata, Delegada Patrícia, chegou em quarto lugar; em
Manaus, o postulante bolsonarista, Coronel Menezes, ficou em quinto.
Entre
os candidatos a vereador apadrinhados por Bolsonaro, o desempenho não foi muito
melhor. Carlos Bolsonaro, enfant
terrible do clã, reelegeu-se para a Câmara do Rio, mas perdeu
36 mil votos entre uma eleição e outra. Wal do Açaí, funcionária fantasma de
Jair Bolsonaro quando este era deputado federal, adotou o sobrenome do padrinho
e contou com declaração oficial de apoio do presidente, mas obteve pífios 266
votos na eleição para a Câmara de Angra dos Reis.
Mas
a maior derrota, sem dúvida, se deu na disputa pela Prefeitura de São Paulo, na
qual seu candidato, Celso Russomanno, outrora líder das pesquisas com 30%,
chegou em quarto lugar, com 10%. Para piorar, os finalistas no segundo turno
são o prefeito tucano Bruno Covas, correligionário de seu maior desafeto, o
governador João Doria, e o psolista Guilherme Boulos. Qualquer que seja o
desfecho, portanto, o maior colégio eleitoral do País estará sob influência de
um franco antagonista de Bolsonaro.
Se
serve de consolo para o presidente, a performance do lulopetismo não foi muito
melhor. O candidato do PT em São Paulo, Jilmar Tatto, carregado nos ombros por
Lula da Silva, teve a pior votação da história do partido na capital, ficando
num vergonhoso sexto lugar. E os resultados no resto do País foram igualmente
decepcionantes, o que complica muito o projeto petista de liderar o movimento
antibolsonarista que vai se formando para enfrentar o presidente na eleição de
2022.
A
debacle bolsonarista e lulopetista nas urnas, dois anos depois de terem
protagonizado a polarização que enfiou o País numa crise moral sem precedentes,
é uma ótima notícia para a democracia brasileira. Significa que a política tem
tudo para recuperar o terreno que os arautos da antipolítica julgaram ter
conquistado com a vitória de Bolsonaro.
Significa,
também, que o eleitorado aparentemente se cansou da gritaria, da leviandade e
do cinismo, cujos protagonistas nada têm a oferecer a um País carente de rumo.
Diante da devastação causada pela pandemia e ampliada pelo desgoverno de
Bolsonaro, a política tradicional – que envolve uma disputa entre as melhores
ideias, e não entre as mentiras mais descaradas – volta a ser valorizada. E é
de ressaltar a presença de jovens candidatos competitivos em várias partes do
País – o que prova que a política tradicional, baseada na arte da negociação,
não só ganhou fôlego, como se mostrou capaz de seduzir as novas gerações.
Conversa
fiada – Opinião | Folha de S. Paulo
Ataque
farsesco de Bolsonaro a urna eletrônica mal esconde temores de derrota
Eleições
em ambientes democráticos competitivos, como é o caso brasileiro, ganham-se e
perdem-se. O manual de boas condutas políticas prescreve aos derrotados que
reconheçam o desempenho do vitorioso e sigam em frente, porque logo as urnas
lhes propiciarão oportunidades de recuperação.
As
correntes autoritárias e populistas que despontaram nos últimos anos rasgaram
essa cartilha. Quando a derrota se insinua, ou se consuma, reagem com
tentativas de desacreditar as instituições e as autoridades eleitorais com
acusações infundadas sobre fraudes e conspiratas fabulosas.
O
mestre Donald Trump —que como criança mimada esperneia contra uma derrota
incontestável nos EUA— mostra o caminho, e seu discípulo o imita aqui no
Brasil.
Ao
presidente Jair Bolsonaro decerto não convém debater os resultados das eleições
municipais deste domingo (15), que lhe
foram desfavoráveis. Então tenta mudar de assunto voltando a questionar,
sem apresentar nenhuma evidência, o modelo da urna eletrônica.
O
mandatário aproveitou-se da lamentável falha do Tribunal Superior Eleitoral,
que atrasou a divulgação dos resultados do pleito, para pregar o retorno ao
voto impresso como forma de supostamente garantir a lisura do processo. Um
minuto de atenção ao noticiário basta para acusar o sofisma.
O
defeito em computadores do tribunal e a tentativa
rechaçada de ataque hacker ao seu site não colocaram em xeque a
confiabilidade da apuração dos votos. No primeiro caso, retardou-se a
publicação de resultados; no segundo, evitou-se acesso a dados sigilosos.
Há
que apurar os dois eventos, identificar e responsabilizar os delinquentes no
segundo caso e agir para que os problemas não se repitam. Mas é preciso ter
claro que em nenhuma hipótese conhecida a vontade do eleitor manifestada na
cabine indevassável, alicerce da democracia, foi conspurcada.
A
urna eletrônica brasileira não está conectada à internet e por isso não se
presta a ataques remotos. Ao final do escrutínio, de cada uma delas se extrai
um boletim impresso descritivo da votação, que pode ser conferido e auditado.
Auditorias
e testes de vulnerabilidade são parte constante do processo e se incrementam a
cada ciclo eleitoral. Em mais de duas décadas de uso maciço, nenhuma fraude foi
comprovada no dispositivo.
O
que preocupa Bolsonaro, obviamente, não são os aspectos técnicos do sistema de
votação. Ele não se importa com a sustentação fática das asneiras que
patrocina.
Dá
curso à conversa fiada conspiratória porque enxerga nuvens carregadas no seu
horizonte político. E sabe que, no Brasil como nos EUA, quem perde volta para
casa.
Centrão
avança, mas DEM, PSDB e MDB levam capitais – Opinião | Valor Econômico
Bolsonaro
segue competitivo mas, para vencer de novo terá de contar com a caridade de
estranhos
As
eleições municipais, com suas particularidades, deixaram sinais importantes
para as próximas, presidenciais. Com a pandemia, campanhas curtas e distanciamento
social, a continuidade dos partidos no comando das prefeituras prevaleceu -
doze prefeitos tentaram reeleição em 13 capitais, seis conseguiram no primeiro
turno e seis estão no segundo. A esquerda mostrou alguma reação, mas está
dividida e sem rumo. Após a ascensão de Bolsonaro, ou por causa dela, novatos
que esculhambavam a “política” foram ultrapassados por profissionais. As urnas
alertam que o presidente Jair Bolsonaro corre o risco de entrar para a galeria
dos políticos fugazes, que surgem como um cometa, vindo do nada, e desaparecem.
Dois
anos em uma situação de crise econômica são uma eternidade e nada está
assegurado quanto ao futuro. Mas dentro das linhas hoje traçadas, há três
blocos se desenhando para a disputa presidencial. Parece claro que o presidente
Jair Bolsonaro se lançou nos braços do Centrão e suas 10 legendas para impedir
o impeachment, mas também para que a aliança possa reconduzi-lo ao cargo em
2022. Sozinho, no grito, por cima dos partidos, não mais.
Desdenhando
o segundo partido da Câmara, o seu (PSL), Bolsonaro testou seu prestígio à sua
maneira: voluntariosa e sem método. Indicou nomes para os dois maiores centros
eleitorais do país - Celso Russomanno foi um fiasco (4º lugar em São Paulo) e
Marcelo Crivella se arrastou para o segundo turno no Rio a uma grande distância
do favorito, Eduardo Paes (DEM). De suas outras indicações resta o Capitão
Wagner, que vai a segundo turno em Fortaleza.
A
popularidade não se transferiu a ungidos ou familiares, como Walderice Conceição
(a Wal do Açaí, fantasma paga por seu gabinete quando era deputado) ou a
ex-mulher e mãe de Flavio, Carlos e Eduardo Bolsonaro, Rogéria, que não se
elegeram. As pesquisas mostraram novo aumento do percentual dos brasileiros que
julgam sua gestão ruim ou péssima, que chegou a 50% em São Paulo e aumentou no
Rio. O resultado mostrou que, sem partido, Bolsonaro deveria ter ficado longe
das eleições, como prometera. Ao se meter nelas, nada de proveitoso colheu,
exceto derrotas.
O
presidente precisaria de cumprir a metade final de seu mandato com ótimos
resultados na economia e no combate à pandemia para reeditar sua carreira solo
de 2018. Não vai acontecer, e a tentativa de reeleição depende agora do
Centrão, que não foi mal e avançou na rede de prefeituras. Com o PSD, e sem o
MDB, as 10 siglas elegeram 2.545 prefeitos, quase metade dos 5.360 escolhidos
até ontem. Só PP, PSD e PL tinham somados 1.650 prefeitos, ou 30% do total.
Como ponto de partida, é forte.
Mas
nas capitais, o centro de irradiação das candidaturas, a história não foi essa
e se encaixa em outro bloco que almeja a Presidência, a centro-direita
tradicional, com DEM, PSDB e, possivelmente, MDB. Esse bloco venceu nas
capitais e arregimentou 1721 prefeitos, 31% dos municípios em disputa. DEM e
PSDB venceram em 5 das 7 capitais em que a eleição se encerrou em primeiro
turno. MDB disputa o segundo turno em seis delas, o DEM em uma (Rio) e os
tucanos em outra (São Paulo). Ou seja, uma alternativa de centro fora do
Centrão para desalojar Bolsonaro pode tomar forma.
A
esquerda é o terceiro bloco, mas seu avanço não foi tão inequívoco quanto a ida
para o segundo round da disputa por Guilherme Boulos (Psol) e Manuela d’Ávila
(PCdoB) faz parecer - as chances de ambos vencerem são pequenas. O PT, antes
hegemônico, foi mal e ainda perdeu prefeituras na comparação com o péssimo
desempenho em 2016, onde elegeu 1 prefeito nas 96 maiores cidades do país,
incluindo as capitais. Marília Arraes pode ganhar, mas o PT perdeu em centros
importantes do Estado, como Caruaru, Petrolina e Jaboatão. Tem governadores no
Ceará e na Bahia, mas perdeu nas capitais. Em São Paulo, teve a pior votação de
sua história.
O
Nordeste, mais avesso a Bolsonaro, não sufragou só a esquerda desta vez. O PDT
pode manter Fortaleza e ganhar Aracaju, mas João Pessoa, Teresina, Maceió e
Natal foram para PP, MDB e PSDB. Em tese, isto pode ser positivo para os
cálculos de Bolsonaro, se a esquerda não se reagrupar, o que depende muito do
PT.
Bolsonaro
segue competitivo mas, para vencer de novo terá de contar com a caridade de
estranhos - um Centrão volúvel, que não hesitará em desembarcar do apoio, como
fez com Dilma, se o presidente por tudo a perder e melhores oportunidades
surgirem
Os limites constitucionais entre Bolsonaro e as Forças Armadas – Opinião | O Globo
Alerta
do comandante do Exército antes das eleições reafirma os deveres dos militares
perante a Carta
Depois
de o presidente Jair Bolsonaro passar a primeira metade de seu mandato
abrigando militares no governo, numa tentativa de usá-los como escudo, o
comandante do Exército, Edson Pujol, aproveitou uma live para fazer um alerta:
as Forças Armadas são instituições de Estado, não de governo. Pujol reiterou
ainda noutro evento seu entendimento — correto — do lugar das Forças Armadas no
arranjo institucional do país.
Em
mensagem publicada nas redes sociais, Bolsonaro respondeu sem discordar de
Pujol, mas citou a parte do artigo 142 da Constituição, que define o espaço do
Exército, Marinha e Aeronáutica, em que fica estabelecido estarem as três armas
sob a “liderança suprema do Presidente da República”.
O
assunto não ficou por aí. Uma nota do Ministério da Defesa lançada na véspera
da eleição tentou pôr nos eixos a relação, delicada e vital, entre os militares
e o Planalto. “A característica fundamental das Forças Armadas como
instituições de Estado, permanentes e necessariamente apartadas da política
partidária”, diz o texto assinado pelo ministro Fernando Azevedo e Silva e
pelos três comandantes militares, “em nada destoa do entendimento do governo e
do presidente da República”. Foi uma solução salomônica que, dada a repercussão
fraca, ainda é insuficiente para encerrar a questão.
O
governo Bolsonaro representou, queira-se ou não, um avanço dos militares sobre
a política. A eleição da chapa formada com o general Hamilton Mourão deu às
Forças Armadas um protagonismo no novo governo que elas não tinham desde a
ditadura. Dos 23 ministros da Esplanada, dez são militares, um deles da ativa.
Milhares de cargos de confiança são hoje ocupados por militares, não
necessariamente indicados por critérios técnicos.
Criou-se
um espaço vulnerável a situações embaraçosas. Um exemplo foi o desvario de pôr
como ministro da Saúde, em plena pandemia, o general de divisão da ativa
Eduardo Pazuello, depois humilhado pelo capitão numa live. Choques frequentes
com a ala ideológica desgastam Mourão e já derrubaram os generais Carlos
Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo) e Otávio do Rêgo Barros
(porta-voz).
As
críticas de integrantes das Forças Armadas à mistura perigosa com o poder
sempre estiveram presentes, mas de forma discreta (caso do artigo recente de
Rêgo Barros). Jamais houve manifestação tão clara, tão óbvia e tão necessária
quanto a de Pujol. Algo que militares diziam em caráter privado se tornou
público: para eles, a “suprema liderança” que o inquilino do Planalto exerce
sobre as Forças Armadas não lhe permite usá-la, ou qualquer instrumento do
Estado, contra a Constituição, cujos freios e contrapesos impedem autogolpes e
outras aberrações.
Desigualdades na educação pública – Opinião | O Estado de S. Paulo
Equidade
não pode ser utopia. É possível fazer mais, como muitos municípios têm feito.
É cada vez mais consolidada a constatação de que a pandemia do novo coronavírus ampliou as desigualdades da oferta educativa. Realizado pelo Todos Pela Educação, o estudo Desigualdade entre Escolas nas Redes Municipais de Ensino traz novas luzes sobre o tema, ao mostrar que a expansão das desigualdades não é um fenômeno restrito às circunstâncias excepcionais deste ano.
Entre
2015 e 2019, a maioria dos municípios (57,5%) apresentou um aumento na
desigualdade entre escolas dos anos iniciais do ensino fundamental. Assim, o
desafio de uma educação mais equitativa não se resume a enfrentar os graves
problemas causados pela crise de covid-19, mas inclui reverter uma tendência arraigada,
que já vinha causando vários desequilíbrios.
A
partir de dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o
estudo avaliou as desigualdades existentes entre escolas públicas de um mesmo
município. Seu objetivo foi oferecer elementos para que as respostas de cada
gestão municipal sejam aderentes à realidade de sua rede de ensino.
“Mesmo
entre os municípios que avançaram no Ideb, 58% obtiveram esse êxito aumentando
a desigualdade entre os grupos de escolas com os maiores e os menores resultados
no indicador”, diz o estudo. Ao mesmo tempo, e aqui está um ponto especialmente
importante, pouco mais de um terço dos municípios (35,8%) conseguiu conciliar
melhora do Ideb com avanço da equidade. Além de indicar que não é impossível
aliar esses dois objetivos, o expressivo porcentual revela a existência de boas
práticas de gestão pública, que podem e devem ser replicadas em outras
localidades.
Outro
aspecto interessante destacado no estudo é a chamada “janela de cooperação
local”. A desigualdade entre escolas da mesma rede de ensino revela que, no
mesmo município, há escolas de qualidade, que conseguiram atingir sua meta no
Ideb. Há assim um potencial de interação e de ajuda entre diferentes
instituições de uma mesma localidade. O que as escolas mais fracas precisam
talvez já esteja sendo aplicado em outra escola da mesma cidade. As soluções
não estão distantes e, como lembra o Todos Pela Educação, essa interação pode
beneficiar e acelerar o desenvolvimento de todos.
Ao
longo do estudo, fica evidente que não basta perseguir uma genérica melhoria do
ensino ou tratar todas as escolas da mesma forma. As políticas públicas
educacionais precisam estar expressamente orientadas para uma maior equidade.
Caso contrário, “será muito difícil romper esse ciclo vicioso de exclusão
educacional”, diz o estudo.
Não
há respeito pleno ao direito à educação quando crianças de um mesmo município,
de uma mesma rede pública de ensino, têm acesso a ofertas educativas tão
díspares. A equidade educativa é elemento fundamental de cidadania e do Estado
Democrático de Direito. Sem tratamento privilegiado ou discriminatório, todos
são iguais perante a lei e todos têm direito à igualdade de oportunidades. O
poder público falha gravemente quando duas crianças recebem uma educação desigual,
simplesmente porque estão matriculadas em escolas municipais diferentes.
Os
prefeitos que tomarão posse em janeiro de 2021 terão grandes desafios na área
educativa. É urgente dar continuidade à retomada das atividades presencias nas
escolas, bem como mitigar os muitos efeitos da pandemia na comunidade escolar.
Mas é possível – e necessário – ir além. “Os quatro anos de gestão são tempo
suficiente para que se estabeleçam políticas visando ao fortalecimento do
sistema educacional local com orientação para a equidade”, diz o Todos Pela
Educação, com base nos resultados de muitas gestões municipais.
O
direito à educação com equidade não pode ser uma utopia. É possível fazer mais,
como muitos municípios vêm fazendo. Tantas vezes repetida pelos gestores públicos,
a prioridade à educação deve se manifestar na adoção de políticas públicas
responsáveis e realistas, baseadas nas muitas evidências disponíveis. Não
avança apenas quem não quer.
Em
São Paulo, a esperança de vida ao nascer aumentou 17,7 anos desde 1970.
É notável o avanço da longevidade dos brasileiros nos últimos anos. No Estado de São Paulo, a esperança de vida ao nascer chegou a 76,4 anos em 2019, de acordo com a Fundação Seade. Nas últimas cinco décadas, esse índice aumentou 17,7 anos. O ritmo, intenso pelo menos desde 1970, manteve-se alto nos últimos anos: entre 2000 e 2019, o aumento foi de 4,8 anos. O estudo divulgado pela Fundação Seade indica que o dado do Estado de São Paulo é melhor do que a média mundial, de 72,3 anos, bem como a média da América do Sul, com esperança de vida ao nascer de 75,6 anos, e comparável ao índice da Argentina, de 76,5 anos.
O
dado expressa o número médio de anos que, mantidos os padrões de mortalidade
daquele momento, um recém-nascido pode viver. É uma medida que, sem ser afetada
pela estrutura etária da população, reflete as condições de vida e de saúde da
população no momento em que é calculada.
Assim,
seu avanço expressivo nos últimos 50 anos de certa forma resume a melhoria das
condições em que vive a população residente no Estado de São Paulo. É, além
disso, um dado de grande relevância para o planejamento, gestão e avaliação de
políticas públicas no campo social, sobretudo na área de saúde, nos programas
de assistência social e no sistema previdenciário.
No
estudo da Fundação Seade, a esperança de vida ao nascer no Brasil é estimada em
75,5 anos, número ligeiramente inferior ao utilizado por estudos
internacionais, como o último Relatório de Desenvolvimento Humano elaborado
pelo Programa das Nações para o Desenvolvimento (Pnud) e que mede o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) de cada país-membro da organização internacional.
Para o cálculo do mais recente IDH, no qual o Brasil ficou na 79.ª posição no
ranking mundial, foi considerada a expectativa de vida ao nascer de 75,7 anos
no País.
Dados
mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
referem-se a 2018, quando a expectativa de vida ao nascer no Brasil foi
estimada em 76,3 anos, acima do valor utilizado pelo Pnud e pouco abaixo da
média paulista de 2019 calculada pela Fundação Seade. Embora os dados
apresentem alguma discrepância, o que talvez possa ser explicado pelos períodos
a que eles se referem, sua evolução no Estado de São Paulo e no País nas
últimas décadas mostra um paralelismo bastante apreciável.
Se
em São Paulo o aumento entre 1970 e 2019 foi de 17,7 anos, no Brasil a
esperança de vida ao nascer aumentou 18,7 anos entre 1970 e 2018. O aumento
maior na média brasileira pode ser explicado em boa parte pelo fato de que, no
momento inicial da comparação (1970), a média paulista era mais alta do que a
do País (58,7 anos ante 57,6). O que a evolução desses índices mostra é que, ao
longo do tempo, as condições de vida para a média dos brasileiros melhoram mais
depressa do que as de São Paulo, aproximam-se das do Estado mais desenvolvido
do País e praticamente já se equivalem a estas. Visto por meio desse indicador,
o Brasil vem se tornando regionalmente menos desigual.
Obviamente
as disparidades entre as regiões ainda permanecem. Um dado que expressa com
grande clareza essas diferenças é a probabilidade (em porcentagem) de um
recém-nascido não completar o primeiro ano de vida. Enquanto no Amapá essa
probabilidade era de 22,8% em 2018, em São Paulo estava em 9,3% e no Espírito
Santo (Estado com o melhor índice), em 8,1%. São dados do IBGE.
Num
mesmo Estado há diferenças expressivas na esperança de vida por sexo. Em São
Paulo, a esperança de vida feminina em 2019 era de 79,4 anos e a masculina, de
73,3 anos. A diferença, de 6,1 anos, era de 9,0 anos em 2000. É o fenômeno
chamado de “sobremortalidade masculina”, observado em todo o País. Desde a
década de 1980 há maior ocorrência de mortes atribuídas a fatores externos,
causados pela urbanização. Entre esses fatores estão homicídios, acidentes de
trânsito e agressões, que atingem mais a população jovem masculina.
Um ano depois – Opinião | Folha de S. Paulo
Nova
Previdência evita incerteza econômica maior, mas agenda restante empaca
Decorrido
o primeiro
ano desde a entrada em vigor da reforma da Previdência, o país colhe
benefícios. A poupança de recursos orçamentários será crescente com o passar do
tempo, podendo chegar a R$ 1 trilhão em uma década com medidas complementares.
Cabe
apontar que, não estivessem em vigor as novas regras para aposentadorias,
dificilmente teria sido possível, por exemplo, mobilizar tanto dinheiro para o
combate a pandemia, dado que o endividamento do governo se encontraria em
situação ainda mais explosiva.
Outro
fator essencial para evitar uma espiral de descrédito na solvência do setor
público é o teto para os gastos federais inscrito na Constituição. Apesar de
imperfeições, a norma estabelece a contenção da despesa até 2026, pelo menos, e
proporciona um horizonte para o reequilíbrio paulatino das contas do Tesouro
Nacional.
Ocorre
que tais dispositivos, embora fundamentais, são insuficientes. Mais reformas
são necessárias para proporcionar uma gestão mais virtuosa das receitas e dos
desembolsos do Estado brasileiro.
Quanto
a isso, não se vê o que comemorar. A incompetência do governo em encaminhar uma
pauta clara e a falta de disposição para mobilizar o Congresso continua a
atrasar o país. O exemplo mais notável é o pacote legislativo elaborado, também
há um ano, pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Entre
as propostas importantes que não avançaram está a chamada PEC Emergencial, que
prevê ajustes automáticos de despesas para reforçar o teto de gastos. Como o
nome indica, essa proposta de emenda constitucional deveria ser a prioridade
mais imediata.
Tampouco
progrediram outras matérias mais complexas, como a ainda não bem explicada
flexibilização de dispêndios obrigatórios em saúde e educação. Outra frustração
se verifica na sempre prometida reforma do caótico sistema tributário
brasileiro.
Uma
das explicações para os atrasos é a ineficácia de Guedes, que se notabiliza
mais por promessas extravagantes nunca cumpridas do que por estabelecer
objetivos claros e estratégias viáveis.
Entretanto o obstáculo principal é mesmo o presidente Jair Bolsonaro, que não percebe a urgência dessa agenda nem se mostra disposto a liderar o que quer que seja —muito menos o enfrentamento de poderosos interesses corporativistas que engessam e encarecem a gestão do Estado brasileiro.
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