Chega o tempo das queimadas, da escassez de chuvas, da energia controlada e dos preços absurdos dos gêneros de primeira necessidade, produtos agrícolas colhidos, nas tais “entressafras”. A baixa umidade do ar ressuscitará os problemas respiratórios, de pele e as gripes que virão para se juntar à Covid. “A culpa é do Bolsonaro!” - Joga pedra na Geni!
Na realidade, trata-se da sazonalidade
(repetição anual) dos mesmos fenômenos e desafios no mesmo período. Esses
problemas são tratados com as mesmas soluções, ineficientes, sem qualquer
criatividade, mas financeiramente caudalosas.
Nunca os brasileiros se preparam para a
chegada do inverno. Os políticos passam o ano se acusando e se defendendo. Nada
produtivo. Ninguém se apega aos problemas estruturais da sociedade e menos
ainda aos males presentes. Nenhum deles parece se interessar pela
governabilidade. Nesse happening, atravessam incólumes os
Exercícios. A sustentabilidade alimenta, inclusive, a retórica
de reeleição. E só.
Na sociedade civil, participar e até organizar
alguns eventos, na semana do meio ambiente, esgota o esforço militante de
alguns. Ganham perenibilidade a poluição do ar, da água, do solo, do subsolo,
nos biomas terrestres, nas inadequadas técnicas e ferramentas usadas
para extração, cultivo ou transformação até dos recursos para
subsistência.
O quadro remete à abertura da Conferência (da ONU) em Estocolmo, na Suécia, no dia 15 de dezembro de 1972, cinquenta anos atrás, cujo tema era o Ambiente Humano. O chefe da delegação brasileira, na contramão da História, conclamou os países a virem poluir no Brasil. Era um chamamento para o processo de desenvolvimento em curso por aqui: “Temos recursos naturais abundantes, mão de obra barata e um amplo mercado consumidor” - e emendou - “Falta capital e tecnologia”. Já não se pensava mais em substituição de importações, mas na atração da indústria pesada, de bens de capital, aquela que reproduz o próprio sistema de produção.
Logo os grandes conglomerados e o capital
desembarcaram no Brasil. O governo desandou a preparar a
infraestrutura: melhorou portos e aeroportos, abriu e asfaltou
estradas, instalou sistema de energia e de informação, financiou e avalizou
projetos de apoio a esse processo, doou áreas para implantação de
empresas. Tomou bilhões de dólares e petrodólares em empréstimos.
Em pouco tempo, a balança comercial do Brasil
estava lá em cima. Mas, as contas de pagamento não fechavam. Eram déficits
altíssimos. Os lucros do capital ou eram remetidos para as matrizes no exterior
ou ficavam retidos nos bancos, para formar reservas de
garantia para as tomadas de recursos novos: O Brasil chegou a ser o maior
devedor do mundo. “Dívida não se paga, rola-se”, dizia o ministro da
Fazenda para atenuar as preocupações internas. Raciocinava com um calote
eterno, como fez a Argentina.
Os novos investimentos geravam empregos,
salários e a ampliação do mercado de consumo interno. Tivemos inflação de
demanda. Só não era uma festa, porque tudo isso vinha acompanhado de juros
altíssimos e de uma forte repressão política e policial: era a ordem
em nome do progresso, centralizada em um Estado autoritário. Com garantias como
essas, o capital estrangeiro fincou esteios no País.
No final desse ciclo, aparentemente virtuoso,
iniciado com Getúlio, passando por Juscelino, agora estava nas mãos dos
militares. De repente, os brasileiros depararam-se com um quadro
extraordinário de predação dos recursos naturais, invasão de territórios
indígenas, endividamento externo, solo e subsolo
devastados, secas prolongadas atingindo áreas produtivas, riquezas
minerais apropriadas por estranhos, perdas de grandes massas
florestais, águas contaminadas por lixos químicos, fauna
e flora em extinção, enquadrado ainda entre os maiores destruidores ambientais
do planeta, além de abrigar uma crescente pobreza. De uma taxa de desemprego
de 4% naquele período, chegamos a 14% hoje. A
concentração da renda e a sua má distribuição concomitante ao aumento da
população, entre 2% a 3% ao ano, se agravou. Milhares de jovens escolarizados
tiveram o futuro profissional comprometido.
Sob a pressão do desemprego, os governos
populares, populistas e oportunistas que vieram a seguir tentaram intervir à
busca de soluções menos concentradoras de renda. A
politicagem desfazia tudo. O crescimento do PIB que, no momento
anterior, registrava taxas quase chinesas, sofreu um retrocesso, e colocou o
País em recessão.
Projetos ambientais, pequenos e pontuais, originados
de reações pulverizadas da sociedade civil tentam recuperar os elos perdidos
com a exuberante “terra brasilis”. Difícil. Avança-se um passo, logo a seguir
enfrenta-se uma crise: secas prolongadas, queimadas, falta de chuvas, ou algo
assim inesperado como uma geada, a Aids, a Covid. O Congresso não ajuda em
nada. Impossível fazer projeção de futuro, sem o amparo honesto da ciência e
sem levar em consideração as sazonalidades dos fenômenos, que afetam a todos e
não apenas aos que equivocada e egoisticamente conduzem o Planeta em direção
ao esgotamento dos recursos naturais.
As projeções climáticas são catastróficas; as
soluções são limitadas e os índices de demanda, com diálogos emperrados,
configuram este cenário. A impressão que se tem é a de que a sociedade chegou
aos limites do próprio planeta. A limites abusivos. “A culpa é do
Bolsonaro!”. A insensatez é tamanha, que assusta. A educação, sem
partido, é a última esperança. Na questão ambiental, ela revela os
primeiros resultados com as novas gerações, ainda modestas. Só espero que
cheguem a tempo.
*Jornalista e professor
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