EDITORIAIS
Partido do Governo
Folha de S. Paulo
Ex-Arena, PP chega ao coração do Planalto e
se torna sigla mais forte do centrão
Na reorganização partidária dos estertores
da ditadura militar, no início dos anos 1980, o Partido Democrático Social
(PDS) herdou o grupo político que até então sustentava o regime na forma da
Aliança Renovadora Nacional (Arena).
Com o fim do governo dos generais, em 1985,
de sua costela mais dissidente saiu o PFL (Partido da Frente Liberal), que por
fim desaguou no atual Democratas.
Já o ramo original passou por fusões
envolvendo cinco agremiações e se tornou Partido Progressista Brasileiro (PPB).
Sua estrela era o presidenciável derrotado dos militares em 1985, Paulo Maluf.
O partido, hoje Progressistas (abreviado
como PP), apoiou todos os governos desde a redemocratização, com mais ou menos
poder —o ápice até aqui havia sido sob Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Com a chegada
de seu presidente, o senador Ciro Nogueira (PI), à Casa Civil, sela
a união que já ocorria na prática desde 2020 sob Jair Bolsonaro na mais alta
posição atingida em décadas de adesismo: o coração do governo.
Não só. A agremiação controla a Câmara, na
figura do alagoano Arthur Lira, que exerce comando férreo e serve por ora como
um elusivo seguro contra o impeachment. É um novo patamar de poder para o
chamado centrão, que ganha um partido dominante entre os cerca de dez (não há
conta exata) que compõem o bloco.
É certa novidade, dado que o caráter
gelatinoso do grupo associado ao mesmo tempo à fisiologia e à governabilidade
sempre privilegiou caciques, não siglas.
Ademais, a eventual filiação de Bolsonaro, sob fogo dos interessados em manter alianças regionais com Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022, garantiria ao Progressistas poder momentâneo enorme.
Um exemplo se vê no Orçamento, com o
esquema das emendas parlamentares do relator, que somam R$ 18,5 bilhões só
neste ano.
Invenção do centrão com beneplácito do
Planalto, o instrumento permite gastos discricionários com baixíssima
rastreabilidade. É um cheque em branco para a compra de apoio de deputados
sedentos por verbas para se reelegerem.
Há percalços possíveis. Desalojados da Casa
Civil, os militares do governo correm o risco de ver parte de seu butim em
cargos ser ameaçada pelo avanço do centrão.
Desde 2020, esses fardados compartilham a
Esplanada com as forças que costumavam demonizar como a encarnação dos
problemas políticos brasileiros. Agora, numa ironia histórica, parecem
destinados a ser minoritários na aliança de ocasião a sustentar Bolsonaro,
enquanto ganham protagonismo os herdeiros da velha Arena.
Hesitação vacinal
Folha de S. Paulo
Nos EUA, resistência à imunização torna
desigual avanço no controle da epidemia
A variante delta do vírus da Covid-19 causa
preocupação nos Estados Unidos, que, dado o avanço no controle da
epidemia, chegaram a
dispensar o uso de máscaras para os já vacinados, entre outras
medidas de relaxamento.
A média diária de novos casos cresce;
hospitalizações e mortes também, mas num ritmo bem menor do que o de novas
infecções.
Paradoxalmente, o recrudescimento do
contágio também encerra boas notícias. A mais importante é que as vacinas
funcionam, mesmo contra a temível delta. Cerca de 97% das novas hospitalizações
ocorrem entre não vacinados, e a situação é mais grave nas unidades federativas
que apresentam as menores coberturas vacinais.
Na Louisiana, que tem apenas 37% da
população imunizada, a taxa de novas infecções é de 79 por 100 mil habitantes
(a média dos EUA está em 19 por 100 mil).
Já em Vermont, onde a vacinação alcançou
67% dos residentes, a taxa de infecções recentes é de apenas 4 por 100 mil. E,
embora o número de novos casos tenha crescido também nesse estado, as
hospitalizações caíram e não se registraram mortes —diferentemente do ocorrido
na Louisiana.
A esta altura, o maior problema dos EUA
chama-se hesitação vacinal, definida como a recusa ou o adiamento da imunização
quando existem produtos disponíveis. Lá, há vacinas para todos os adultos e
adolescentes que desejem tomá-las, mas a cobertura com duas doses atinge só 49%
da população.
Depois de um avanço expressivo no primeiro
semestre, o processo agora está bem mais lento, pois a parcela dos americanos
que estava ansiosa pela vacina já a tomou, e progressos dependem cada vez mais de
convencer os recalcitrantes. O país, que chegou a aplicar 3,3 milhões de
injeções por dia, hoje inocula cerca de 500 mil.
Empresas e estados já oferecem variados
tipos de incentivos à imunização, incluindo loterias com prêmio em dinheiro,
dias de folga e até cerveja grátis. O próximo passo é passar a exigir
certificado de vacinação para o exercício de certas funções e atividades.
O Brasil está bem atrás em cobertura, com
apenas 24% dos adultos totalmente imunizados, e ainda não há biofármacos para
todos os que desejem tomá-los.
Temos, no entanto, a vantagem de a
resistência ser menor. Pelo último Datafolha, 94% ou já tomaram a vacina ou
pretendem fazê-lo quando possível. Nos EUA, segundo pesquisa Economist/YouGov,
esse número é de apenas 70%.
Bolsonaro entrega a ‘alma do governo’
O Estado de S. Paulo
Alianças tardias, como esta que Jair Bolsonaro está forjando com Ciro Nogueira e o Centrão, tendem a ser caras e pouco efetivas
Ao confirmar a nomeação de Ciro Nogueira
(PP-PI) para a Casa Civil, o presidente Jair Bolsonaro disse que estava
entregando “a alma do governo” ao senador, um dos principais líderes do
Centrão.
A definição é bastante precisa. A Casa
Civil é a “alma do governo”. Aquela é a instância ministerial que coordena as
demais pastas. Com esse poder, o titular da Casa Civil é considerado o
principal assessor presidencial, razão pela qual todos os presidentes
escolheram para esse cargo pessoas de sua mais absoluta confiança, sem usá-lo
como moeda de troca para obter apoio parlamentar.
Com Bolsonaro, esse padrão mudou radicalmente.
O presidente não titubeou em afastar Luiz Eduardo Ramos, fidelíssimo camarada
de todas as horas, para entregar a Casa Civil a um líder político que não tem
amigos, apenas interesses.
Não faz muito tempo, há pouco mais de três
anos, o novo ministro da Casa Civil classificou Bolsonaro de “fascista”,
duvidou de sua capacidade de governar e, na mesma ocasião, disse que Lula da
Silva – que para os bolsonaristas é o demônio em pessoa – havia sido “o melhor
presidente deste país”.
Na eleição de 2018, enquanto seu partido, o
PP, integrava a coligação do candidato Geraldo Alckmin, Ciro Nogueira pedia
votos para o petista Fernando Haddad, preposto do então presidiário Lula da
Silva.
E no início de 2016, Ciro Nogueira, depois
de passar vários dias negociando a ampliação do espaço do PP no governo de
Dilma Rousseff para garantir os votos de seu partido contra o impeachment,
mudou de ideia e trabalhou pelo afastamento da petista.
Ao confiar a poderosa Casa Civil a um
político com esse perfil equívoco – que, ademais, tem considerável passivo
judicial no âmbito da Lava Jato, o que tisna o discurso anticorrupção de
Bolsonaro –, o presidente mostra o tamanho de seu desespero.
O pretexto de Bolsonaro é melhorar a
interlocução com o Congresso. De fato, um dos mais graves problemas do governo
é a maneira atabalhoada e preguiçosa como lida com os parlamentares, o que
rendeu sucessivas derrotas ao Palácio do Planalto mesmo em temas de grande
interesse do bolsonarismo. Mas Ciro Nogueira dificilmente terá habilidade suficiente
para resolver um problema insolúvel na relação do governo com o Congresso, que
é a natureza de Bolsonaro – antidemocrática e hostil ao diálogo.
Ademais, está claro que Ciro Nogueira não
está no governo em nome do PP, mas sim de apenas uma parte do partido, o que
mostra o limite de sua capacidade de articulação. Por isso, sua nomeação não
significa necessariamente que Bolsonaro terá algum conforto no Congresso, mas
certamente significa que Ciro Nogueira terá influência efetiva sobre a
formulação das políticas do governo, e isso às portas de um ano eleitoral.
Eleito por um partido nanico, Bolsonaro
pretendia governar sem as coalizões que sustentaram, de um jeito ou de outro,
quase todos os seus antecessores. Imaginava que as bancadas armamentista, evangélica
e do agronegócio o apoiariam em bloco, o que não aconteceu. Contava com a força
de sua votação na eleição para se impor como líder populista, mas o “povo” que
ele tantas vezes invoca está crescentemente insatisfeito com seu desempenho.
Assim, impopular, sem partido e com uma
base fiel muito precária, Bolsonaro está à mercê de forças que não tem a menor
condição de controlar e que, por sua vez, sabem muito bem o que almejam:
cargos, verbas e poder. Por ora, é o que Bolsonaro pode lhes proporcionar, mas
nem isso lhe garante fidelidade ou, principalmente, apoio para a reeleição.
Afinal, o Centrão, depois de parasitar os recursos estatais a que terá acesso,
não hesitará em deixar o presidente no sereno se este não representar uma real
perspectiva de poder.
Alianças tardias, como esta que Bolsonaro
está forjando com Ciro Nogueira e o Centrão, tendem a ser caras e pouco
efetivas. Podem até dar algum respiro ao presidente – e ninguém pode duvidar
que sua capacidade de causar problemas, malgrado suas dificuldades, continua
intacta –, mas não representam nenhuma melhora na governabilidade. Ou seja, o
País não ganha absolutamente nada com isso.
O apagão nos sistemas do CNPq
O Estado de S. Paulo
Problema deixa claro como o atual governo despreza a educação, a ciência e a pesquisa
Apesar de não ter havido comprometimento
dos dados arquivados, o apagão nos sistemas de informática do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) é mais demonstração dos
graves problemas que as áreas de ensino e pesquisa estão sofrendo desde o
início do governo do presidente Jair Bolsonaro.
Só neste ano, o CNPq – que é a maior e mais
importante agência de fomento à pesquisa no País – já foi obrigado a promover
um corte drástico em seu programa de bolsas de pós-graduação no País e no
exterior, por causa de cortes orçamentários. E agora, em decorrência do apagão
nos sistemas de informática do órgão, a comunidade acadêmica está há quase uma
semana sem poder acessar a Plataforma Lattes, que é um banco de currículos e de
informações detalhadas sobre a produção acadêmica e científica no País.
A Plataforma Lattes é um site que reúne
toda a trajetória acadêmica dos pesquisadores brasileiros e de pesquisadores
estrangeiros que têm alguma relação com as universidades brasileiras. A
permanente atualização do currículo é uma exigência feita a todos os que atuam
no ensino superior e no setor de desenvolvimento tecnológico, especialmente na
hora de se candidatar a projetos e a vagas de mestrado e doutorado.
A Plataforma Lattes cataloga artigos,
ensaios, livros, entrevistas, palestras e viagens profissionais de cada
pesquisador e serve para várias finalidades. Ela é o principal instrumento para
o julgamento dos pedidos de bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado e de
solicitações da comunidade acadêmica para a realização de pesquisas e eventos
científicos. Também é usada pelos meios de comunicação para identificar quem
pode dar entrevistas sobre temas técnicos de interesse público e pelas bancas
examinadoras nos concursos de ingresso e progressão na carreira acadêmica.
Permite a coordenação de estudos entre diferentes grupos de pesquisa espalhados
pelo Brasil e pelo mundo. E ainda serve de base para a avaliação, pela
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), de todo o
sistema brasileiro de pós-graduação.
Além da plataforma Lattes, o apagão nos
sistemas de informática do CNPq atingiu a Plataforma Carlos Chagas, que reúne
informações de grupos de pesquisa e bolsistas do CNPq, e o Diretório dos Grupos
de Pesquisa no Brasil, que é uma base de dados importante para conhecer quais
especialistas estão trabalhando em cada área do conhecimento. São informações
que interessam não só à comunidade acadêmica, mas, igualmente, à iniciativa
privada. O apagão também atingiu sistemas internos do CNPq, que são utilizados
pelos diferentes comitês de assessoria e de consultoria ad hoc do órgão.
Desde o momento em que detectaram
dificuldades para acessar essas plataformas, pesquisadores e cientistas
advertiram para o risco de perda de todas as informações armazenadas durante as
últimas décadas. Foi por isso que, antes mesmo de informar os problemas que
provocaram o apagão dos sistemas de informática, a direção do CNPq divulgou uma
nota afirmando que dispunha de backup de todos os seus arquivos e informando
que não ocorreram perdas de informações. E, para tranquilizar a comunidade
científica, disse que o pagamento das bolsas não será afetado e os prazos
relacionados a projetos e entregas de relatórios serão prorrogados.
A direção do CNPq fez o que se esperava,
agindo de modo transparente e tomando as providências necessárias para que seus
sistemas voltassem a funcionar. Chegou, inclusive, a reconhecer que não sabia
quando a situação estaria normalizada. O mesmo, porém, não aconteceu com o
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, ao qual o órgão é vinculado. A
exemplo do que ocorreu por ocasião do drástico corte de bolsas, no primeiro
semestre, a pasta se omitiu.
Infelizmente, esta tem sido a sina das
áreas que são norteadas pela reflexão e pelo debate no âmbito de um governo
que, sob o pretexto de defender a tradição, é declaradamente inimigo da
educação, da ciência e da pesquisa.
Um desafinado no trio
O Estado de S. Paulo
Crescimento no primeiro trimestre dá ao Brasil um destaque duvidoso
Brasil,
Austrália e Coreia cresceram o suficiente, no primeiro trimestre, para voltar
ao patamar econômico pré-pandemia, isto é, ao nível de produção dos três meses
finais de 2019. China, Índia e Turquia já haviam retornado no fim de
2020. EUA, Alemanha, Japão, Reino Unido e demais membros do Grupo dos 20
(G-20), formado pelas maiores economias do mundo, ficaram para trás nesse
percurso. No período janeiro-março deste ano as economias australiana, coreana
e brasileira cresceram 1,8%, 1,7% e 1,2% em relação ao último trimestre do ano
passado. Nesta mesma comparação, o Produto Interno Bruto (PIB) do G-20 aparece
com avanço de 0,8%.
Festejado no governo e celebrado no mercado
financeiro nacional, o balanço do primeiro trimestre estimulou a revisão, para
cima, das projeções de crescimento econômico em 2021. Várias instituições já
elevaram para 6% suas estimativas de expansão do PIB neste ano. Mas os números
do Brasil ficam bem menos brilhantes, apesar da invejável companhia da
Austrália e da Coreia no período recente, quando se levam em conta outros
indicadores muito importantes – especialmente para o bem-estar das populações,
especialmente dos grupos menos abonados.
A imagem brasileira fica muito menos
atraente, na cena internacional, quando se examinam os dados do mercado de
trabalho. No Brasil, os desempregados no primeiro trimestre foram 14,8 milhões,
número equivalente a 14,7% da força de trabalho. Na Austrália, no mesmo
período, o desemprego ficou em 6%. Na Coreia, em 4,4%. Nos dois países a
desocupação foi inferior à média dos países da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), então situada em 6,7%. Na zona do euro o
desemprego foi maior (8,2%), mas ainda ficou muito abaixo do nível observado no
Brasil.
Os dados do emprego indicam algumas
diferenças muito importantes. Os níveis de ocupação, bem superiores aos do
Brasil antes da pandemia, logo entraram em recuperação depois da pior fase do
ano passado. Não retornaram, logo, ao nível anterior à contração econômica, mas
continuaram melhores que os brasileiros. No conjunto da OCDE, a retomada
produziu benefícios econômicos bem mais espalhados que no Brasil, mesmo
naqueles países onde o PIB permaneceu, até o primeiro trimestre deste ano,
abaixo do patamar de antes da crise de 2020.
Outros dados muito relevantes também
compõem as distinções. As desigualdades são muito menores que as observadas no
Brasil e há menos pobreza. Mas, além de mais pobres, os brasileiros ainda
enfrentam condições de preços muito mais desfavoráveis. Em abril, a inflação
anual aumentou na OCDE e atingiu o nível médio de 3,3%, principalmente por
causa do encarecimento da energia.
No G-20, a média anual subiu de 3,1% em
março para 3,8% em abril. Na maior economia, a dos EUA, a alta de preços em 12
meses chegou a 4,2% naquele mês (e saltou para 5% em maio). No Brasil, a
variação nesse período alcançou 6,8% em abril, mais que o dobro da taxa
registrada na OCDE, e superou 8% em maio. Na zona do euro, em abril, os preços
ao consumidor estavam apenas 1,6% mais altos que um ano antes. No grupo das
sete maiores economias capitalistas a diferença estava em 2,9%.
O quadro brasileiro fica muito mais sombrio
quando se leva em conta a combinação da alta de preços com as condições do
mercado de trabalho. Estas condições incluem, além do desemprego, os efeitos da
alta informalidade, dos empregos com jornadas insuficientes, da precariedade da
ocupação por conta própria e, naturalmente, do desalento, isto é, do abandono
temporário da busca de ocupação por muitos trabalhadores (cerca de 6 milhões na
última apuração). O total dos subutilizados foi estimado em 33,2 milhões,
recorde da série iniciada em 2012.
Também é preciso considerar, numa comparação realista, a situação de dezenas de milhões de famílias desprovidas, no primeiro trimestre, do auxílio emergencial suspenso em janeiro e só retomado, com maiores limitações, a partir de abril. Quando todos esses fatos são lembrados, a composição do trio Austrália-Coreia-Brasil fica muito estranha.
É hora de debater a melhora do ensino
profissionalizante
Valor Econômico
Muitos jovens chegam ao mercado de trabalho
sem disporem de ferramental que os capacite a atender as demandas das empresas
O número de jovens que não trabalham nem
estudam, os chamados “nem-nem”, cresceu na pandemia, mais pela deterioração do
mercado de trabalho para esse grupo do que por um aumento da evasão escolar.
Segundo a pesquisa divulgada recentemente por Marcelo Neri, diretor do FGV
Social, a porcentagem de pessoas de 15 a 29 anos que não estudam nem trabalham
aumentou para 25,52% no quarto trimestre de 2020, ante 23,66% no fim de 2019.
Ao longo do ano passado, esse número bateu recorde, atingindo 29,33% no segundo
trimestre. O ponto mais baixo da série, iniciada em 2012 a partir de microdados
da Pnad Contínua, foi no primeiro trimestre de 2014, com 20,78%.
Esses dados mostram a urgência e a
importância de se tratar de forma prioritária o planejamento e execução de como
preparar melhor os jovens para sua entrada no mercado. É um tema que
periodicamente volta a ser debatido na academia, por representantes de várias
áreas do governo e por organizações não governamentais voltadas para a
educação. Mas efetivamente pouco se faz e a questão se torna ainda mais
relevante diante da retomada do crescimento econômico que se desenha, segundo
os indicadores macroeconômicos mais recentes. Sem ensino profissionalizante que
os ajudem no início da carreira, o país terá novamente gerações de jovens à
margem do mercado de trabalho.
Na sexta-feira da semana passada, dia 23,
tiveram grande repercussão as declarações sobre a preparação de jovens para o
trabalho feitas pelo secretário de política econômica do Ministério da
Economia, Adolfo Sachsida, na Live do Valor. Chamaram muita atenção suas afirmações de
que teria chegado o momento do chamado Sistema S (que reúne Sesi, Senai, Sesc,
Senac etc) contribuir com recursos para programas de inclusão de jovens
carentes no mercado de trabalho. “Temos que passar a faca no Sistema S, tem que
tirar dinheiro deles para passar para o jovem carente, para ele ter uma chance
na sua vida de ter um emprego, de se qualificar e conseguir ter uma vida
decente para o futuro”, afirmou. Sachsida disse que o Sistema S arrecada cerca
de R$ 20 bilhões ao ano e que o governo pede R$ 6 bilhões para esses programas.
Ou seja, 30% do total.
Representantes do Sistema S reagiram
lembrando que as entidades sob o seu chapéu contribuem - de maneira expressiva,
segundo sua direção - com o aprendizado profissionalizante. Comunicado da
Confederação Nacional da Indústria explicitou que no Senai, 7 em cada 10 dos
formados nas suas escolas encontram-se empregados um ano após a conclusão da
formação técnica, além de oferecer educação básica para mais de 900 mil jovens.
Nesse contexto, é importante aproveitar o
momento para uma avaliação mais aprofundada de como melhorar e alargar os
programas de treinamento profissional dos jovens. É necessário, por exemplo,
considerar se são adequados os programas elaborados pelo próprio Ministério da
Economia - o governo anunciou duas iniciativas nesse sentido, batizadas
inicialmente de Bônus de Inclusão Produtiva e Bolsa de Incentivo de
Qualificação, que concederiam bolsas para o trabalhador se qualificar
profissionalmente, recebendo algo entre R$ 300 a R$ 600. Os valores seriam
bancados parcialmente por Brasília e o restante por empresas. O que se pode
arguir é se este modelo é o ideal já que o trabalhador terá que estar empregado
para poder receber o benefício, trabalhando menos horas do que o usual para
poder estudar no outro período. Além disso, esse modelo não é dirigido
especificamente para jovens entrantes no mercado de trabalho.
É mais do que sabido que o Brasil precisa
investir mais e com maior objetividade na educação e no ensino
profissionalizante. Inúmeras pesquisas mostram que muitos jovens chegam ao
mercado de trabalho sem disporem de ferramental que os capacite a atender as
demandas das empresas e mesmo do setor público. A pesquisa de Marcelo Neri, da
Fundação Getulio Vargas, mostra que o panorama é especialmente ruim para os
jovens que estão em situação de maior vulnerabilidade.
A saber, os maiores percentuais de pessoas que não trabalhavam nem estudavam no fim do ano passado eram mulheres (31%), pretos (29%), moradores na região Nordeste (32%) e na periferia das grandes cidades (27%), assim como chefes de famílias (27%) e pessoas sem instrução (66%).
Nenhum comentário:
Postar um comentário