Valor Econômico
Progressistas só quer do presidente o que
não tem: voto
A posse do senador do PP do Piauí, Ciro
Nogueira, na Casa Civil marca um ponto de não retorno para o partido. Já não se
aposta mais que o Progressistas abandone o barco do presidente Jair Bolsonaro.
O que não significa que tenham, como destino, o mesmo porto.
O plano A do PP passou a ser a reeleição do
presidente, a ser vendido como um “centrista” capaz de abocanhar a terceira
via. Sob duas condições. Que o vice, ao contrário do atual, não sirva de seguro
contra o impeachment e que Bolsonaro não vá para o PP, onde engoliria o fundo
eleitoral.
A verba é fundamental para a meta
onipresente do Progressistas em todos os planos do alfabeto: eleger uma bancada
capaz não apenas de liderar a reeleição de Arthur Lira (AL) à presidência da
Câmara como de tornar o partido incontornável. Para que o eleito em 2022, seja
quem for, coma na sua mão.
Some-se ao fundo eleitoral o inchaço das
emendas parlamentares operado por Lira e está montado o apoio transpartidário à
sua recondução à Mesa da Câmara.
Para levar a cabo suas ambições, o PP
elegeu três alvos. O primeiro deles são os militares, que o partido expôs à
execração política na armadilha que resultou na carta desastrada do ministro da
Defesa atestando a legitimidade do voto impresso. O movimento ainda se vale das
auditorias do Tribunal de Contas da União, pródigo em encontrar uma infinidade
de benesses e malfeitos da corporação armada, e da CPI, empenhada em pegar a
tropa do general Eduardo Pazuello na Saúde.
Ao espalhar armadilhas para os militares, os parlamentares também buscam cumplicidade com o Supremo. Alvo permanente da zanga fardada, a Corte tem reagido ao avanço das emendas parlamentares sobre o Orçamento público.
Como Bolsonaro liberou as amarras de posse
e porte de armas, cortejou baixas patentes militares e mantém em estado de
alerta gangues digitais e físicas de provocadores, não dá para descartar
eventos que proporcionem ao presidente álibi para o acionamento do artigo 142
da Constituição, que prevê a atuação das Forças Armadas na ordem interna do
país. Espera-se, porém, que a quantidade de trapalhadas dos ministros generais
ao longo deste governo indisponha o Alto Comando das Forças a aventuras do
gênero.
O segundo alvo do PP é o ministro da
Economia. O partido já comandou a desmoralização da pauta privatista de Paulo
Guedes com a MP da Eletrobras e faz o mesmo com a reforma tributária, que
angariou oposição até mesmo das entidades empresariais mais subservientes.
Agora avança para o fatiamento daquele que um dia foi conhecido como
superministério da Economia, com o desmembramento da Pasta do Trabalho e a
almejada recriação do Ministério do Planejamento.
O PP cobiça ainda o Coaf, hoje sob a alçada
do Banco Central. Tem como parceiro na investida o filho do presidente, senador
Flávio Bolsonaro (Patriotas-RJ), alvo frequente do Conselho de Controle de
Atividades Financeiras.
O terceiro alvo do PP é o PSD de Gilberto
Kassab. O partido tem representado, até aqui, a maior capacidade de
arregimentação de uma terceira via, alternativa que o PP pretende liquidar com
a formatação de uma recandidatura presidencial sob novos moldes. E não apenas.
O PSD também foi o partido que, sob a dupla Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e Davi
Alcolumbre (DEM-AP), mais cresceu no Senado, encostando na maior legenda da
Casa, o MDB.
O PSD tem o comando da CPI da Covid, que
ameaça Flávio Bolsonaro, e Pacheco tem a pauta do Senado para resistir contra a
investida do PP. Segurou a LDO para ver que rumo toma a discussão do fundo
eleitoral e a proeminência de Ciro Nogueira sobre os senadores. Está ainda
sentado sobre a indicação do advogado-geral da União, André Mendonça, ao STF. A
mensagem com seu nome foi enviada pelo presidente uma semana antes do recesso
mas não foi lida por Pacheco, travando a tramitação.
O PP cativa o MDB com a perspectiva de
retomada da mesa diretora e avança para desidratar o PSD, dando por descartada
a candidatura de Pacheco e a adesão do partido à postulação do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
A hipótese de aliança do PSD com o PT no
primeiro turno, propagandeada para levar de volta ao bolsonarismo os
desertores, é negada com veemência pelos correligionários de Kassab. A filiação
de Pacheco ao PSD será adiada para março, prazo limite da legislação eleitoral,
para que ele exerça a presidência do Senado sem o carimbo de candidato.
Mas o PP alveja a terceira via não apenas
na ofensiva contra o PSD mas pela própria liderança de Ciro Nogueira na frente
bolsonarista. Em 2018 o senador do PP do Piauí levou ao limite a articulação
para viabilizar a candidatura Ciro Gomes.
A repaginada para atrair de volta a
diáspora bolsonarista foi simbolizada com a cerimônia de lançamento do sistema
de integridade do governo. Escolhida a dedo para marcar a estreia do novo
ministro, réu no Supremo em cinco processos, a cerimônia foi protagonizada por
ministros que permaneceram de máscara o tempo todo.
É bem verdade que a campanha bolsonarista
esbarra nos interesses regionais de Ciro Nogueira e Arthur Lira. Ambos vêm de
Estados em que Lula nada de braçada. Mas para Ciro, que ainda tem quatro anos
no Senado, a aliança com Bolsonaro, na verdade, o livra de uma candidatura ao
governo estadual fadada ao fracasso porque o governador do Piauí, Wellington
Dias, é do PT e montará palanque competitivo para Lula. Já Lira é candidato à
reeleição, mas numa postulação proporcional. Está despejando tanto dinheiro em
Alagoas que vai ofuscar seu noivo de 2022.
Colados ao governo, ambos explorarão a
dependência de seus Estados da União. Nas contas do professor da Universidade
Federal do Piauí, Ricardo Alaggio, 50% de sua riqueza está atrelada a
transferências federais. A liderança do PP na transformação do investimento
público num grande emendão parlamentar serve precisamente a este propósito.
Com as emendas parlamentares, o fundo
eleitoral e o comando do Executivo, o PP avança para transformar Bolsonaro num
apêndice de seu governo. Limitado a obter aquilo que o partido não tem: voto. É
o ensaio do semipresidencialismo que Lira passou a defender.
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