Banco
Central aperta forte a Selic e colhe alta no juro de mercado
O
Banco Central deu uma firme puxada na meta de taxa Selic, de 1,5 ponto percentual,
dividida em duas prestações, uma em março e outra em maio. Mas não colheu os
efeitos tranquilizadores no dólar e nos juros negociados no mercado financeiro
que muitos previam. O que aconteceu?
Antes
da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), os contratos com prazo de
dez anos, com vencimento em 2031, eram negociados com juros de 8,5% ao ano. No
fechamento da semana passada, já estavam em 9,1% ao ano. O dólar caiu abaixo do
patamar de R$ 5,50 depois que o BC agiu, mas subiu de novo.
O resumo da história é que, hoje, as condições financeiras e monetárias são mais restritivas. Não houve o efeito positivo que muitos analistas econômicos esperavam do BC conservador, uma espécie de contração monetária expansionista.
Isso
não significa que o forte aperto monetário feito pelo Banco Central será em
vão. Ele ajuda a atingir o objetivo da política monetária de garantir o
cumprimento da meta de inflação. Pela comunicação do BC depois da decisão, verifica-se
que a autoridade monetária não comprou a tese defendida por setores do mercado.
Pode-se discutir se, com a economia muito fraca, o BC exagerou na dose. Isso
ficará claro mais adiante, no ano que vem, se a inflação for muito baixa ou se
o preço pago em termos de atividade econômica for exageradamente alto.
Bruno
Coutinho, co-fundador e CEO da Mar Asset, é dos que andavam incomodados com as
afirmações comuns no mercado de que, se o Banco Central agisse com firmeza, a
curva de juros ficaria menos inclinada, e no fim iria colher condições
financeiras mais favoráveis para a economia.
“Se
a curva de juros está positivamente inclinada, é porque o Banco Central está
estimulando a economia”, afirma ele. “Quando a curva de juros está menos
inclinada, o Banco Central está estimulando menos.” Foi o que aconteceu nas
últimas semanas, à medida que o mercado passou a precificar o aperto monetário
pelo BC, e ganhou um reforço com a alta mais forte que a esperada dos juros
feita pelo Banco Central.
O
estímulo monetário ocorre quando o Banco Central coloca a Selic abaixo da taxa
neutra. Hoje, essa taxa neutra é estimada em 3% ao ano reais pelo Banco
Central, o que em termos nominais dá 6,25%, considerando uma meta de inflação
de 3,25% para 2023. Nessas circunstâncias, a curva de juros fica positivamente
inclinada porque, no longo prazo, todos esperam que a Selic vá flutuar ao redor
da taxa neutra. As taxas longas incorporam ainda prêmios para cobrir riscos.
Um
jeito de medir o grau de inclinação da curva de juros é pela diferença entre a
taxa de contratos DI de dois anos e de dez anos. No começo do ano, a diferença
estava em cerca de 3 pontos percentuais, agora está em cerca de 2 pontos. Quem
acredita na tese de que a inclinação da curva é importante, acha que houve um alivio
financeiro. Mas a curva de dez anos subiu de pouco mais 7% para 9,12%, devido
sobretudo à piora do risco fiscal, deixando mais caro o custo de empresas que
captam recursos no mercado. Já a taxa de dois anos subiu mais, de 4% ao ano
para 6,82% ao ano, afetando custos do crédito, já que bancos tipicamente captam
recursos com prazo de dois anos para emprestar.
De
fato, pondera Coutinho, existem algumas circunstâncias muito especiais em que
uma alta mais forte de juros pode trazer ganhos. Isso ocorre quando o BC tem
pouca credibilidade e, agindo com vigor, tira prêmio de risco inflacionário da
curva de juros. “Hoje não falta credibilidade ao Banco Central”, argumenta. “As
expectativas de inflação de longo prazo estão ancoradas.”
Coutinho
faz um exercício muito simples de olhar a parte mais longa da curva de juros -
fora do alcance das decisões mais imediatas do BC - para conferir os seus
determinantes. Em tese, explica, essa parte longa da curva deve refletir a taxa
neutra de juros (algo como 6,25% ao ano) mais o prêmio de risco. Ele extrai o
prêmio de risco do pedaço da curva do CDS que fica entre os cinco anos e os dez
anos, que representa o risco fiscal e o chamado “term premium”. Na sexta, esse
risco estava em 3,8 pontos percentuais. Somando juro neutro com o risco, dá
10%.
É
um percentual muito parecido com o juro a termo equivalente, considerando o
pedaço da curva de juros negociada no mercado doméstico entre cinco e dez anos,
que estava em 9,7%. A conclusão é que a parte longa da curva de juros reflete
basicamente o juro neutro mais o prêmio de risco. Quem pode ajudar a baixá-la é
a política fiscal e a política em geral, reduzindo os prêmios de risco da
economia.
A
dose de 1,5 ponto percentual na taxa de juros não alterou a tendência do
câmbio. Imediatamente antes da decisão do Copom, a moeda americana era
negociada a R$ 5,59. Depois de alguns dias de tranquilidade, fechou em R$ 5,75
na sexta. De forma semelhante aos juros longos, há estudos que confirmam que o
risco fiscal é um dos principais determinantes do câmbio.
No
Relatório de Inflação, divulgado na semana passada, o Banco Central publicou um
estudo que mostra que a taxa Selic não explica a volatilidade cambial. Outros
fatores têm peso mais importante, como a volatilidade de preços de ativos em geral
durante a pandemia, em particular a volatilidade das moedas dos demais
emergentes, a situação fiscal brasileira e a maior disseminação dos
minicontratos de câmbio.
A entrevista de apresentação do Relatório de Inflação despertou algumas dúvidas entre os especialistas sobre qual o impacto da alta de juros na atividade. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que não terá impacto no crescimento. “Explicitamos na comunicação oficial que esse movimento [na taxa de juros] que estamos fazendo não entendemos que prejudica o crescimento em 2022. Nós entendemos que isso está de acordo com o nosso cenário básico.” Já o diretor de Política Econômica do BC, Fábio Kanczuk, disse que o aperto mais forte que o esperado nos juros deverá fazer com que leve mais tempo para a economia preencher a sua capacidade ociosa, o que está previsto para acontecer ao longo de 2022.
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