Por
Cristian Klein / Valor Econômico
RIO - A volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao jogo eleitoral e o agravamento da pandemia penderam o tabuleiro da sucessão ao governo do Rio para a esquerda. Com a crise gerada pela disputa entre o governador Cláudio Castro (PSC) e o prefeito da capital, Eduardo Paes (DEM), em torno das medidas de restrição para conter a covid-19, o nome do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, passou a ganhar força. Ele se junta a outras figuras do campo progressista que estão no radar do grupo de Paes, como o deputado federal Marcelo Freixo (Psol) e o ex-prefeito de Niterói Rodrigo Neves (PDT).
Após
se desentender com Castro nos últimos dias, Paes confirmou ao Valor o que vinha
afirmando a interlocutores nos últimos dias: gostaria de ver Santa Cruz como
seu candidato ao Palácio Guanabara, em 2022. Segundo o prefeito, Santa Cruz
demonstrou interesse pela proposta.
Num tom mais cauteloso, o advogado diz que não está pensando em eleições agora e que ouve “como lisonjeiros esses convites de pessoas que admiro”. “São gestos de reconhecimento pelo trabalho que realizei na OAB. Na vida, pela minha profissão, juntei mais amigos que inimigos e isso pesa nessa hora”, afirmou Santa Cruz, acrescentando que seu foco até 31 de janeiro de 2022 é a OAB.
“Depois,
eu e minha família - pois sou filho, genro, marido e pai de quatro jovens -
vamos resolver que caminho seguir”, disse. O advogado lembra que tem
escritórios no Rio, em São Paulo e em Brasília, que hoje estão nas mãos dos
sócios e de sua mulher: “Já sacrifiquei muito minha família com isso”.
A
visibilidade de Santa Cruz se intensificou nos últimos anos como um antagonista
do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em julho de 2019, protocolou uma
ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para interpelar Bolsonaro a respeito de
uma declaração pejorativa sobre seu pai, desaparecido político da ditadura
militar.
O
presidente da OAB foi sondado recentemente para se filiar ao PSDB, que tem como
pré-candidatos à Presidência os governadores de São Paulo, João Doria, e do Rio
Grande do Sul, Eduardo Leite. Com passagens pelo PT e MDB, o advogado tem
mostrado maleabilidade no trânsito político, à exceção dos embates com o
bolsonarismo.
Há
quase quatro meses, Eduardo Paes disse ao Valor que poderia apoiar a eventual reeleição
do governador Cláudio Castro, que exerce o cargo interinamente desde agosto,
quando Wilson Witzel (PSC) foi afastado por corrupção. Mas a relação azedou.
Enquanto
à direita Castro busca um alinhamento cada vez maior com Bolsonaro, o nome de
Santa Cruz levaria o grupo de Paes, de centro-direita, para uma candidatura
mais centrista, com potencial de servir de palanque ao PSDB, mas também à
esquerda, onde Lula e Ciro Gomes (PDT) precisarão de um candidato para chamar
de seu.
O
deslocamento de Paes para o centro seria facilitado pela anunciada migração do
aliado e correligionário Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados,
para o MDB, de onde Paes saiu há três anos, após a debacle da sigla no Estado
por causa dos escândalos de corrupção que levaram caciques, como o
ex-governador Sérgio Cabral e o ex-presidente da Assembleia Jorge Picciani, à
prisão.
Inimigo
do bolsonarismo, Maia rompeu com o DEM quando a legenda decidiu aderir à
candidatura do deputado Arthur Lira (PP-AL) à sua sucessão. Lira foi apoiado
pelo presidente da República, enquanto Maia buscava eleger Baleia Rossi,
presidente nacional do MDB. A migração de Maia para o partido desagrada
parlamentares e dirigentes estaduais, mas a transferência de Maia é respaldada
pela cúpula do MDB, liderada pelo ex-apadrinhado Baleia Rossi e o ex-presidente
da República Michel Temer.
Dois
políticos consultados pelo Valor consideram
natural que Paes acompanhe Maia ao MDB. Um deles, que se encontrou recentemente
com o prefeito, afirma que a movimentação de Paes “já delimita um campo” mas
ressalva que Felipe Santa Cruz estaria mais interessado numa candidatura ao
Senado do que a governador.
No
campo progressista, a opção mais forte ainda é a do deputado federal Marcelo
Freixo (Psol), que tem se movimentado muito para buscar uma complicada frente
ampla. Caso não consiga, pode novamente ficar fora da disputa, como ocorreu na
eleição a prefeito no ano passado. Freixo, segundo a fonte anterior, já teria
definido que sairá do Psol, mesmo que concorra à reeleição à Câmara, e teria
tido “uma conversa boa” com o prefeito, há cerca de duas semanas. “Ele [Paes]
chegou a sinalizar: ‘Freixo, se você sair de onde está e vier um pouco para o
centro, se você tiver viabilidade, pode ser o meu candidato”, relata.
Freixo,
ainda de acordo com este interlocutor, teve conversas para se filiar ao PT e
“já esteve muito mais no PDT do que agora”. A negociação com o partido de Ciro
Gomes foi freada depois da decisão do ministro do STF, Edson Fachin, que
devolveu os direitos políticos a Lula, conta: “Para ele ser um candidato de
toda a centro-esquerda do Rio, vai ter que ir para o PSB, por exemplo, com quem
também está conversando com a direção nacional”.
Um
dos problemas para a filiação de Freixo seria sua relação com o também deputado
federal Alessandro Molon, presidente do diretório estadual do PSB. As
diferenças, porém, já estariam sendo superadas. “Se havia alguma coisa está na
hora de se entenderem, e se entenderão. Tenho impressão que não há mais nada de
rusga entre eles, não”, afirma o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira.
Na
semana passada, num gesto para atrair o Psol e o PSB para o projeto
presidencial em 2022, o PT, com o aval de Lula, abriu mão dos dois principais
cargos da oposição na Câmara. Eles foram oferecidos a Freixo, que assumiu a
liderança da minoria, e a Molon, indicado como líder da oposição.
Para
Siqueira, tanto Freixo e Molon - que também é cotado ao Senado - quanto Felipe
Santa Cruz são “ótimos candidatos” para a construção de uma frente ampla de
centro-esquerda, que pode ser ampliada à direita para abarcar o grupo de
Eduardo Paes e Rodrigo Maia. “Não é impossível. Estamos vivendo o tempo da
polarização”, diz. O dirigente propõe que esse palanque de centro-esquerda seja
aberto para mais de uma candidatura a presidente, como a de Lula e Ciro, cujo
PDT cogita lançar Rodrigo Neves.
Aqui, Paes também lançou pontes à esquerda ao se aliar ao sucessor de Neves na prefeitura de Niterói, Axel Grael (PDT), na defesa de medidas restritivas mais duras durante os dez dias de suspensão de atividades não essenciais. Ao criticar a abertura de bares e restaurantes, Paes afirmou que o governador promoveria uma micareta ou a “Castrofolia”.
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