domingo, 17 de agosto de 2014

'Marina faz política de um jeito que não é o nosso'

• Vice na chapa de Alckmin, Márcio França diz que agora é o PSB que terá crédito por aceitá-la como candidata

Júnia Gama, Eduardo Bresciani e Cristiane Jungblut – O Globo

SÃO PAULO - Protagonista de um duro embate com Marina Silva dentro do PSB, o candidato a vice-governador de São Paulo, na coligação com o PSDB, e tesoureiro da campanha de Eduardo Campos, Márcio França afirmou que o trágico acidente inverteu a relação do partido com a candidata e a Rede de Sustentabilidade. França venceu a queda de braço com Marina quando ela defendia a candidatura própria do PSB ao governo paulista, mas ele era favorável à aliança com o PSDB. Segundo França, Marina precisa dizer que quer ser candidata.

- Ela (Marina Silva) era a principal puxadora de votos. Agora ele (Eduardo Campos) é o grande puxador. O que ficou dele, as falas, a entrevista ao Jornal Nacional, serão usados como nosso mantra. Ser candidata depende mais dela. Marina precisa expressar que quer ser candidata. Ela não disse "quero ser". Marina tem um outro jeito de fazer política, que não é o nosso. É dela e do partido dela - afirmou.

França lembrou que, na condição de vice, Marina não era responsável por decisões financeiras tomadas na campanha, pois está sendo usado apenas o CNPJ do PSB (a Rede de Sustentabilidade, partido de Marina, não existe formalmente)

- É o mundo real que tem de ser colocado para que ela faça sua escolha. Seria injusto colocá-la como candidato sem que saiba. Marina não era responsável por nada na campanha. Ela não sabe nem quanto custa o aluguel do comitê - afirmou.

França lembra que Marina teria imposto aos candidatos do PSB que não usassem a imagem dela em suas campanhas sem o seu consentimento expresso, o que havia sido aceito pelo partido. Para que não ocorresse o contrário, Marina Silva apresentou ofício ao partido.

- Ela tem de nos acolher e temos de acolhê-la. Antes ela criou crédito, pois era a mais famosa. Neste instante, criou o débito. Nós é que iremos acolhê-la para ser candidata a presidente. Agora ela se torna nossa candidata para dirigir o pais - afirmou.

Nas mãos de Marina

• A morte súbita de Eduardo Campos recoloca a ex-ministra no centro da arena eleitoral e muda o rumo da eleição presidencial

Ricardo Mendonça – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A queda do avião de Eduardo Campos mal havia sido confirmada quando a Prefeitura de Santos começou a receber políticos e jornalistas angustiados por informações.

Na tarde da quarta-feira trágica, o local funcionou como quartel-general da crise, com gente nervosa andando para lá e para cá, falando sem parar nos celulares, quase todos tentando obter ou confirmar fragmentos de notícias.

Foi para lá que a ex-senadora Marina Silva dirigiu-se para fazer seu pronunciamento público de pesar.

A chegada de Marina, circunspecta e visivelmente abalada, silenciou o ambiente.

"A imagem que quero guardar dele é a da nossa despedida de ontem: cheio de alegria, cheio de sonhos e cheio de compromissos", disse ela.

Ao terminar, Marina levantou e caminhou em silêncio para fora do salão. Quando a porta fechou, o falatório e a movimentação nervosa voltaram a tomar conta do lugar.

A reverência solene dos presentes diante de Marina explica-se por duas razões.

Primeiro, por sua conhecida proximidade com Campos. Uma convivência política que se intensificou há dez meses quando, esgotada a chance de oficialização do partido Rede, ela surpreendeu até os mais próximos ao anunciar sua filiação ao PSB.

Segundo, pelo ensejo político que a tragédia produziu. A morte súbita de Campos colocou nas mãos de Marina a possibilidade de determinar o rumo da atual eleição.

Embora não tenha relação fluida com caciques do PSB, o entendimento político que se firmou é o de que Marina só não será candidata no lugar de Campos se não quiser.

Mas depois de passar meses tentando criar um partido para tal e ter feito a arrojada operação que a colocou como vice de Campos, como iria explicar agora que não quer?

Agraciada com 19,6 milhões de votos em 2010, Marina sempre obteve melhor desempenho que Campos nas pesquisas. Num período, isso chegou a ser visto como ameaça ao presidenciável do PSB.

Nos levantamentos do Datafolha que a incluíam no rol de possíveis candidatos, Marina Silva aparecia invariavelmente em segundo lugar.

Em abril, alcançava 27%, 11 pontos a frente do senador Aécio Neves (PSDB) e 12 pontos abaixo da presidente Dilma, que concorre à reeleição.

Na época, a hipótese de viabilização da Rede Sustentabilidade ainda não havia sido descartada. Marina era identificada como a única figura do sistema político preservada (ou até beneficiada) dos enormes protestos que tomaram conta do país em junho do ano passado.

Repetição
Com a volta de Marina para o centro da arena, a disputa de 2014 tende a ficar mais parecida com a de 2010, com o possível retorno de temas que pautaram aquela eleição. O aborto é um deles.

No início da campanha de 2010, a evangélica Marina era a única constantemente cobrada sobre isso. Ainda que sempre tenha cultivado a imagem de progressista, ela é contrária à ampliação das situações em que a interrupção da gravidez é permitida.

O surpreendente crescimento de sua candidatura no final, combinado com uma entrevista em que Dilma não deixava explícita sua posição, contribuiu para que o tema aborto fosse alçado como principal assunto eleitoral.

Outro tópico com potencial de ganhar impulso é meio ambiente, área em que também é reconhecida pelas fortes convicções. Apesar de o governo Dilma ser severamente criticado nesse setor, é um tema que seus rivais não vinham demonstrando muito apetite para explorar.

Na economia, a aproximação de Marina com economistas de pensamento liberal, como André Lara Resende e Eduardo Giannetti, afastou dúvidas sobre como seria um governo seu nessa área.

Seringueira alfabetizada só aos 15 anos, discípula do ambientalista Chico Mendes, assassinado no Estado do Acre em 1988, senadora negra, primeira ministra nomeada pelo ex-presidente Lula em 2003, Marina sempre foi vista como uma predestinada.

A atual circunstância, fruto de nova tragédia, deve reforçar essa imagem. Se a Rede tivesse sido viabilizada, ela provavelmente seria agora a candidata de uma sigla nanica com tempo irrisório de propaganda na TV.

Merval Pereira: O novo grid

- O Globo

A corrida está apenas começando, o que mudou foi o grid de largada. Com essa imagem, um assessor do tucano Aécio Neves define o ambiente no PSDB a partir da nova realidade eleitoral que presumivelmente surgirá das próximas pesquisas, fortemente influenciadas pela comoção provocada pela morte do candidato do PSB à Presidência da República, Eduardo Campos.

Definida como a candidata substituta do PSB, Marina Silva deve aparecer no novo grid de largada à frente de onde estava Campos, talvez até à frente de Aécio Neves, que era o segundo colocado. Sondagens telefônicas nos últimos dias sugerem que Marina estaria empatada tecnicamente com o tucano, mas à frente numericamente. Se, mesmo assim, Aécio mantiver seu índice, é sinal de que tem votos cristalizados.

Todo o ambiente político está impregnado da tragédia, que hoje terá seu ápice no enterro em Recife, com a viúva Renata ao lado de Marina, protagonistas da nova cena eleitoral. Mesmo que não venha a ser a candidata a vice, o mais provável, Renata terá papel fundamental na campanha que recomeçará já amanhã.

Marina já deu o seu tom, ao afirmar que foi a “providência divina” que a tirou do avião, e que tem “compromisso com a perda que Eduardo nos impõe”. Na verdade, a razão de não estar no avião fatídico é bem mais prosaica e humana: ela não queria encontrar o deputado Márcio França (PSB), candidato a vice do governador tucano Geraldo Alckmin (coligação a que ela se opunha em SP) e que esperava o grupo em Santos.

Mas sem dúvida esse ar místico que envolve a ex-senadora dará à campanha o tom de escolhida pelo destino para presidir o país. Se se confirmarem as informações preliminares, Marina ganha força política para comandar uma campanha que será em tudo diferente da de 2010. Ela terá a apoiá-la partido mais bem estruturado do que era o PV, mas em compensação não terá unidade partidária no comando da campanha.

O presidente do PSB, Roberto Amaral, que foi obrigado a ungi-la candidata, terá o mesmo papel secundário do presidente do PV, José Luiz Penna, na campanha anterior, mas outros interesses partidários ao longo da campanha podem afastar os aliados de hoje, que engolem as diferenças devido à expectativa de poder que ela exibe nessa largada.

Se, porém, os caminhos da campanha a levarem a discordâncias programáticas com o que chama de “velha política”, ou com o agronegócio, corre o risco de ser cristianizada, ficando sem a estrutura hoje já precária. Num primeiro momento, ela representa a grande novidade, do mesmo modo que quando se uniu a Campos.

Com o tempo, o encanto do eleitorado foi se desvanecendo, e ela, que marcara 27% em uma pesquisa do Datafolha, acabou se transformando em uma possibilidade de transferência de votos para Campos que até agora não tinha se realizado.
A situação atual muda a perspectiva de Dilma, que contava ainda poder se eleger no 1º turno e agora tem pela frente um 2º turno praticamente certo. Já Aécio, que precisava de pouco para chegar ao 2º turno, terá que recomeçar a campanha dentro de uma nova dimensão.

Antes, disputava com um candidato que tinha a metade de seus votos e a metade de seu tempo de propaganda eleitoral. Agora enfrentará uma candidata que, tudo indica, começa com o mesmo tamanho eleitoral e metade da propaganda, mas que é o dobro do que teve em 2010, quando fez 20% dos votos.

Aécio tem a tradição de oposição do PSDB e uma máquina partidária que até agora tem feito a diferença. Vai disputar contra duas mulheres e na condição de ser o mais desconhecido. Mas tem a vantagem de ser diferente de Dilma e Marina e ser mais próximo da figura política de Eduardo Campos, conciliador e negociador.

Se Marina tirar mais votos de Dilma do que dele, há até mesmo a possibilidade, remota embora, de que o 2º turno seja contra Marina, e não contra Dilma.

Mas entrou na pista de corrida possibilidade que era quase inexistente antes, a de Marina ir ao 2º turno contra Dilma, deixando ao PSDB o papel de grande eleitor. Nas pesquisas anteriores, tanto Campos quanto Aécio cresciam muito num 2º turno contra Dilma, sendo que o tucano chegou a empatar tecnicamente com ela.

Se Marina surge na primeira pesquisa como capaz de vencer Dilma no 2º turno, torna-se automaticamente a candidata a ser vencida, condição que já foi de Aécio. A consistência dessa situação, só o desenrolar da campanha dirá.

Dora Kramer: Presença de Marina

- O Estado de S. Paulo

O candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, aponta dois movimentos imediatos no cenário eleitoral em decorrência da substituição de Eduardo Campos por Marina Silva como titular da chapa do PSB.

O primeiro, a consolidação do segundo turno. "O que era uma tendência passa a ser um fato". O segundo diz respeito às perdas e ganhos em termos de intenções de voto.

Na opinião do tucano, na largada só Marina ganha. Ele prevê que no primeiro momento, em boa parte devido ao clima de comoção, a ex-senadora talvez apareça nas pesquisas com o dobro dos índices registrados por Campos, previsão esta coincidente com as expectativas de políticos do PSB.
O senador mineiro acha que a presidente Dilma perde um pouco, ele próprio acredita que deva ter uma pequena queda nos índices ("isso vai atrasar meu crescimento"), mas imagina que a maior fonte de votos da ex-senadora esteja no grupo dos pesquisados dispostos a anular ou deixar o voto em branco.

O fato de o quadro se alterar, na visão de Aécio não quer dizer que a mudança será radical. "Não tem essa história de que o jogo ficou zerado".

Obviamente ele continua trabalhando com o cenário de um segundo turno entre ele e a presidente Dilma Rousseff, embora reconheça que a vaga agora será mais disputada. Este pensamento é traduzido assim por um companheiro dele de partido radicado em São Paulo: "Antes haveria segundo turno sem o risco de Aécio ser ultrapassado, agora já não podemos ter tanta certeza".

Voltando ao candidato, para ele a "grande incógnita" é saber como Marina vai se posicionar uma vez assumida a candidatura: se terá um discurso franca e nitidamente de oposição ao PT, a Dilma e a Lula ou se vai se concentrar em falar de si, de suas propostas e concepções sobre grandes temas de interesse nacional deixando de lado o embate mais agressivo.

E por que isso é importante? Justamente por causa do segundo turno. Aécio não se concentra na possibilidade de ter ou não o apoio pessoal de Marina. Até porque há certo consenso no PSDB de que pelo histórico de 2010 e pela personalidade dela o mais provável é que caso fique de fora da fase final não apoie nenhum dos dois concorrentes.

A preocupação do tucano é herdar o eleitorado dela. Se não na totalidade, a maior parte. Por isso a intenção dele será manter a sintonia com o eleitor de oposição, imaginando que quem escolhe Marina Silva não vota no governo.

Neste aspecto, não há mudança estratégica no rumo da campanha. A avaliação é a de que os setores do PSB próximos ao PT ficarão com Dilma e os que já têm boas relações com o PSDB em vários estados não têm motivo para romper acordos já fechados.

O que muda nesse momento e pelas próximas duas semanas é o grau de atritos. Haverá uma "baixada" de alguns decibéis no tom dos discursos. A morte de Eduardo Campos abalou a todos; até que o efeito do choque se amenize não há clima para beligerância.

Apaga a luz. Ao contrário da avaliação do presidente do PT, Rui Falcão, sobre a necessidade de a presidente Dilma se reeleger para o ex-presidente Lula "voltar em 2018", um ministro de fino tino político acha que a reeleição encerra um ciclo.

Na opinião desse integrante do primeiro escalão do governo, caso Dilma consiga mais um mandato o PT terá gastado seus últimos créditos junto ao eleitorado.

Pálida ideia. Na rodada estadual do Datafolha divulgada sexta-feira Geraldo Alckmin continua firme no patamar de 55% de intenções de votos.

O governo é considerado ótimo ou bom por 47% dos entrevistados. Mas, quando perguntados sobre quais as melhores áreas da administração, 22% responderam "nenhuma" e 24% não souberam dizer. Juntos, somam 46%.

Ou seja, o paulista vota em Alckmin, mas não sabe por quê.

João Bosco Rabello: Da utopia à realidade

- O Estado de S. Paulo

A síntese que melhor definiu o drama político do PSB e da ex-senadora Marina Silva foi do ex-secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, Sérgio Xavier, para quem "é hora de chorar e trabalhar ao mesmo tempo".

Possivelmente essa dura realidade removeu parcialmente o constrangimento do partido e, ao final, da própria Marina, para que o passo incontornável de consolidá-la candidata em substituição a Eduardo Campos fosse dado antes dos rituais de despedida do ex-governador.

O que isso determina, por ora, é a garantia de um segundo turno, muito embora ele já fosse dado por certo antes da tragédia, pela lógica da soma dos votos dos candidatos de oposição no cenário de queda da candidata Dilma Rousseff.

O raciocínio que leva a esse prognóstico se baseia no maior patrimônio eleitoral de Marina, mas desconhece que o ex-governador ainda iniciaria a campanha na televisão, que além de torná-lo mais conhecido, o vincularia à ex-senadora, consolidando a transferência de votos que se estimava desde a aliança que os uniu.

O dado novo é a tragédia que ganha justificadamente tom emocional e molda o cenário em que a adversidade não subtrai, mas soma. Eduardo se vai, mas deixa o sonho de um novo país que embalará a campanha da coligação.

Não há dúvida do impacto dos acontecimentos para as candidaturas de Dilma Rousseff e Aécio Neves. No primeiro caso, dissipa-se a esperança, ainda que tênue, da vitória no primeiro turno. No segundo, está ameaçada a liderança que o garantia como representante da oposição no segundo.

De imediato, Aécio é o mais atingido se considerada a votação de Marina em 2010, quando teve desempenho melhor nas regiões onde o PSDB se mostra mais forte que o PT. Mas Dilma pode sofrer duro revés com a migração para Marina dos votos brancos e nulos atraídos pelo discurso do novo.

Nesse contexto, profecias estão desautorizadas, mas as especulações são naturais. E nos últimos dias elas incluíram mesmo a possibilidade de um segundo turno sem governo, hipótese baseada na previsão de um efeito avassalador da tragédia política.

O enredo, no entanto, se desenvolverá passo a passo, como impõem as circunstâncias. As chances de Marina serão tanto maiores quanto à sua capacidade de agregar a coligação que tinha em Campos seu poder moderador.

É um desafio ao equilíbrio da ex-senadora, se considerada a necessidade de assimilar que sua "nova política" começa pela convivência com a velha, posto que transformação é processo. O que testará sua capacidade de conciliar utopia e realidade nas doses certas.

Eliane Cantanhêde: Não ao voto nulo!

- Folha de S. Paulo

As manifestações de junho de 2013 foram uma explosão de insatisfações. O acidente do Cessna 560 XL foi uma explosão que repõe as coisas no devido lugar.

A grande maioria dos brasileiros ou não conhecia ou tinha uma vaga ideia de quem era Eduardo Campos, este que aliados, adversários e jornalistas, antes tão críticos, agora descrevem (descrevemos) como um político excepcional e uma pessoa afável, virtuosa, de vida exemplar.

Em algum ponto entre a paixão destrutiva da eleição e a comoção endeusadora da morte, se encaixa o candidato Campos, com seus defeitos, suas qualidades e suas potencialidades. E é exatamente nesse ponto que devemos também ajustar os candidatos à nossa disposição, esses que tentam sobreviver às pressões deletérias pré-eleitorais.

O governo produz uma profusão de dados preocupantes na economia (portanto, para o futuro), mas Dilma é uma mulher honesta, bem intencionada, empenhada fazer o que julga melhor para o país.

O jeitão alegre, de festas e noitadas, gera desconfiança em relação a Aécio Neves, mas, tal como Campos, seu avô fez história e seus dois governos em Minas estão no topo dos mais bem avaliados do país.

Eduardo Jorge (PV) tem ótimos serviços prestados à saúde e à mulher. Luciana Genro (PSOL) tem o frescor dos idealistas. Até o Pastor Everaldo (PSC), goste-se ou não, representa um forte segmento.

E vem aí Marina Silva, com um carimbo conservador, mas a promessa de um "novo jeito de fazer política" e de um país equilibrado entre o crescimento econômico e a distribuição mais equitativa do bem-estar. Se preferirem, entre PSDB e PT.

A prateleira de opções é rica, variada e expõe os melhores produtos do mercado político. Depende de você, eleitor, escolher o melhor para o país e o futuro. A crítica é construtiva, a descrença é estéril.

Como pregou Campos, "não desista do Brasil!". Não ao voto nulo!

Cristovam Buarque: Não desistiremos, Eduardo


  • O nome de Eduardo Campos não estará nas urnas, e isso fará uma dramática diferença nas expectativas de milhões de eleitores

- Folha de S. Paulo

A primeira notícia foi a de que os ventos de agosto derrubaram o avião que levava Eduardo Campos e outras seis pessoas, apagaram a chama de uma esperança para o futuro e espalharam perdas pelo Brasil.

A primeira perda foi familiar. A dor da mãe, da avó, da mulher, dos filhos, do irmão e dos parentes de Eduardo. Para estes não é preciso tinta escrita, só lágrimas.

A segunda perda é dos amigos e conhecidos. Era impossível estar junto de Eduardo e não ter uma razão para deslumbrar-se com sua simpatia e suas histórias sobre a cultura nordestina e a vida política. Ao saber da notícia de sua morte, quem o conheceu sentiu um vazio pessoal, sem contar sua liderança política.

Ele era um líder político, e a terceira perda é a da esperança que representava para seu povo, sua pátria. Eduardo carregava a esperança de uma alternativa à polarização que domina a política brasileira nas últimas décadas.

Mesmo reconhecendo qualidades no PT e no PSDB, ele conseguia ser diferente dos dois blocos que dominam a política nacional.

Era a alternativa viável à mesmice da política atual, em que a discordância ideológica foi substituída pela raiva mútua que impede a capacidade de dialogar. Era capaz de conversar com todos os lados, sem perder a firmeza de suas posições. Como dissera o poeta Ferreira Gullar sobre Gregório Bezerra, "era feito de ferro e de flor".

A quarta perda é a da chance de mudança nos rumos do país para atender ao desejo coletivo por uma alternativa que supere o esgotamento da democracia sem ética; o sistema de transferência de renda que não transforma o modelo excludente; uma estabilidade monetária claudicante; um crescimento econômico interrompido.

Sem propor rupturas, Eduardo defendia uma inflexão no rumo do Brasil para consolidar as bases da estabilidade monetária; utilizar a educação integral como porta de saída para os beneficiados pelo Bolsa Família; e criar os instrumentos necessários para retomar o crescimento de uma economia moderna baseada no conhecimento científico e tecnológico. Ele era firme e radical em seu compromisso com uma reforma política, capaz de robustecer nossa degradada democracia.

A quinta perda é a do exemplo, da coerência sem intransigência e da coragem de servir a um projeto político e dele se afastar quando percebeu que o modelo perdeu seu vigor transformador, abandonou seus princípios e deixou de atender aos anseios da nação que pede mudanças.

A sexta perda é do futuro. Já sentimos perdas com as mortes de vários líderes: Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Tancredo Neves, Miguel Arraes, Ulysses Guimarães --mas eram líderes que já tinham dado a contribuição que o país esperava deles. Aos 49 anos, Eduardo estava começando a saltar do que fez por Pernambuco para fazer para o Brasil inteiro. Adiante estava o futuro, dele e do país.

A sétima perda é eleitoral. O nome de Eduardo Campos não estará nas urnas, e isso fará uma dramática diferença nas expectativas de milhões de eleitores que viam nele o candidato da novidade, da reforma política, da afirmação da República sobre os partidos, do tratamento do patrimônio público compromissado com o povo, o Estado e a nação; da construção de um modelo econômico sem exclusão; que esperavam dele utilizar todos os recursos federais necessários para fazer a revolução na educação que o país adia há séculos.

Fica, porém, o legado e a chama que um vento de agosto não é capaz de apagar. Até porque, na véspera da sua morte, as últimas palavras públicas de Eduardo foram: "Não desistam do Brasil".

Cristovam Buarque, 70, é senador pelo PDT-DF e professor da Universidade de Brasília
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Ferreira Gullar: Bagunçou o coreto

• Pode ser que a candidatura de Marina introduza na disputa o fator emocional que estava faltando

- Folha de S. Paulo / Ilustrada

A notícia da morte de Eduardo Campos, na manhã da quarta-feira (13), sacudiu o país como um terremoto. Isso se deve, sem dúvida, ao fato de ser ele um dos principais candidatos à Presidência da República mas também à sua juventude, à sua personalidade positiva, envolta de um charme especial.

Para mim, pelas circunstâncias mesmas em que soube do fato, foi como algo absurdo, quase impossível de crer. Estava vendo na televisão a notícia da queda de uma aeronave, na cidade de Santos.

Ninguém sabia ao certo qual avião era aquele --diziam inicialmente que se tratava de um helicóptero. Mais tarde a Aeronáutica informava que o avião acidentado era um jato particular, que decolara do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro.

O noticiário falava de algumas pessoas que haviam sido feridas pelo impacto do avião contra um prédio mas nada dizia a respeito de quem estaria dentro dele. Imaginei que o choque do avião contra o prédio fora tão violento que não dava para saber quantas pessoas estavam nele e muito menos quem eram elas.

Fui para o escritório, liguei o computador e fiquei ali durante algum tempo. Quando voltei à sala recebi o golpe: Eduardo Campos, candidato do PSB à Presidência da República estava no avião e havia morrido no acidente.

Mal acreditei no que ouvia o locutor afirmar. Ao aparecer o rosto de Eduardo na tela, não suportei, desliguei a televisão. "Mas que país louco é este nosso!", disse a mim mesmo, andando pela casa.

Tomei um gole de café, liguei de novo a televisão para saber os detalhes do que, de fato, ocorrera. Logo começaram os telefonemas de parentes e amigos, igualmente estarrecidos com a notícia.

Uma dessas pessoas achava que poderia ser uma sabotagem para matar o candidato, hipótese que descartei de imediato. Já outros cogitavam sobre consequências daquela morte na campanha eleitoral e no resultado dela.

Essa foi a primeira pergunta que me fiz, passado o impacto inicial da notícia. Que sua morte teria influência nas eleições de outubro era o óbvio, já que se tratava de um dos três principais candidatos.

Mas qual seria essa a influência e as consequências dela? Beneficiaria Dilma ou beneficiaria Aécio? Não era possível saber, mas o impacto emocional que aquela inesperada morte provocaria nas pessoas, pensei, talvez favoreça Aécio, o outro candidato da oposição. Dificilmente beneficiaria Dilma, contra cujo governo ele se manifestava a cada entrevista, a cada pronunciamento que fazia.

Mas surgiu outra hipótese: a candidatura de Marina Silva seria a substituição natural à de Eduardo Campos e poderia arrastar, emocionalmente, uma parte considerável do eleitorado, alterando significativamente a correlação de forças, levando quem sabe à derrota de Dilma.

Eram tudo suposições, uma vez que, naquele dia, nem Aécio, nem Marina, nem Dilma, nem ninguém de qualquer dos partidos políticos queria, naturalmente, tocar nesse assunto. Mas a questão estava sobre a mesa.

Tudo bem, aquele era um tema que iria dar muita discussão dentro do PSB e com o pessoal de Marina Silva. Também ninguém sabia que atitude tomaria a própria Marina. Se aceitasse assumir o lugar de Eduardo Campos, o futuro das eleições presidenciais seria imprevisível e perturbador.

Tanto Dilma quanto Aécio, na hipótese de Marina se candidatar, terão de rever seu projeto de campanha eleitoral. Digo isso porque, até aqui, um dos principais problemas dos candidatos é a indiferença de grande parte do eleitorado.

Quase a metade dele se mostra desinteressada das eleições, uma vez que nenhum dos candidatos tem conseguido empolgá-la.

É que nem Dilma, nem Aécio, nem Eduardo têm significado, para essa parte do eleitorado, a alternativa capaz de mudar de fato o rumo tomado pela política no país e impor-se como uma alternativa renovadora.

Em circunstâncias normais, tampouco Marina Silva representaria isso; no entanto, em face da morte trágica de Eduardo Campos, pode ser que a candidatura dela introduza no combate eleitoral o fator emocional que estava faltando. Mas uma coisa é certa: no primeiro turno ninguém ganhará as eleições presidenciais de outubro.

Gaudêncio Torquato: Apaga-se a estrela da geração pós-64

- O Estado de S. Paulo

O imprevisível ronda o planeta da política. Quando menos se espera, chega devastador, trazendo consigo o poder de gerar perplexidade, assustar, causar comoção. Poder que se expande às alturas quando o ator é um candidato ao posto mais alto da Nação, esbanjando jovialidade, vitalidade, dinamismo, confiança, e desaparece de cena vitimado por uma tragédia aérea. A morte de Eduardo Campos, no fatídico 13 de agosto - a mesma data em que faleceu seu avô Miguel Arraes, em 2005 -, é um forte golpe na fisionomia política brasileira, eis que o perfil do ex-governador, estruturado sobre uma sólida, coerente e vitoriosa carreira pública, reunia potencial para puxar o cordão de mudanças no processo político nos próximos anos.

 Um quadro da geração pós-64 (nasceu em 1965), alimentava um sonho, confessado a este escriba há cerca de dois anos, em Comandatuba, na Bahia, por ocasião de um evento reunindo empresários e políticos.

Dizia: "Meu sonho é reunir a geração pós-64 (chegou a citar alguns nomes de grupos e partidos diferentes), fazermos uma grande aliança e tomar as rédeas do País, deixando os nossos mais velhos, que já deram sua cota de sacrifício, descansando com sua aposentadoria". O tom da conversa, incisivo, não deixava dúvidas. Campos achava viável agrupar os representantes de sua geração, compor um formidável programa de mudanças, realizar um pacto com o sistema produtivo e incentivar o ingresso dos jovens na política. A mudança dos costumes políticos tinha de vir de baixo, pela via da formação da juventude, e não por decreto. Ele mesmo, em Pernambuco, diferentemente da escola de seu avô, implantara uma metodologia de gestão voltada para resultados e promovendo, segundo ele, "revolucionária" política educacional. Parecia comprometido com um diferenciado modus faciendi na administração pública. 

O fato de ter procurado Marina Silva para compor sua chapa, na condição de candidata a vice-presidente da República, revela a inclinação por perfis inovadores, mesmo sabendo que o escopo da sustentabilidade, defendido com vigor pela ex-senadora, constitui um cardápio pouco palatável ao gosto das massas. A parceria construída expressava avanço e coerência. Ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, essa semente haveria de frutificar, na onda da conscientização sobre o planeta sustentável.

Dito isto, vem a interrogação: e agora, o que acontecerá com a moldura eleitoral, saindo o terceiro grande competidor do pleito presidencial? A primeira resposta parte da ideia de que a comoção com o seu repentino desaparecimento, a começar por Pernambuco, deverá estender-se até as urnas.

Veremos, pois, um forte voto emotivo, ao lado da escolha racional, essa que encontra guarida na cabeça crítica do eleitor disposto a não mais se deixar levar pelo "lero-lero" eleitoreiro. Em segundo lugar, a confiança de Eduardo Campos em Marina Silva, opção que fez questão de bancar contra forte resistência de alas do PSB, a credencia para ser sua substituta. O partido teria de indicá-la candidata da legenda e ela, sob o empuxo das correntes comovidas que banharão o território nacional, ganhará ampla visibilidade, suprindo o estreito espaço na mídia eleitoral (menos de dois minutos).

A natural locução nas ruas e os debates midiáticos formarão ondas de redundância, alçando-a ao primeiro plano da imagem. Sob o manto estético da evangélica Marina estará visível a imagem exuberante de Eduardo, formando um sistema de signos na cabeça do eleitor. É razoável supor que o voto será carreado por dois fenômenos da psicologia, a identificação e a projeção, com os quais os olimpianos e ídolos atraem a atenção das massas.

Será essa carga simbólica suficiente para alterar profundamente o quadro eleitoral? Vai depender do humor social mais adiante. E isso tem que ver com a economia. Algumas hipóteses se apresentam. Se Marina assumir a posição do titular, a maior parcela de votos de Eduardo migrará para ela. Pode, até, vir a encostar em Aécio Neves, reforçando a tese do segundo turno.

E se ela não for indicada pelo PSB ou não aceitar?

Nesse caso, o PSB perderia a condição de terceira via, pelo fato de rejeitar o único nome capaz de galvanizar apoios. Marina, por sua vez, se recolheria ao silêncio. Parcelas do eleitorado iriam para o tucano Aécio e para a presidente Dilma Rousseff (PT). Já se Marina substituir Eduardo, a urna governista terá menos votos. Veríamos, ainda, remodelagem dos discursos e da agenda de candidatos. Sob o véu da perplexidade que cobrirá as próximas etapas da campanha, os candidatos se obrigariam a ser mais contritos, menos extravagantes, mais comprometidos com ideias, menos propensos às firulas.

O fato é que a morte de Eduardo Campos mexe com o ânimo de múltiplas plateias, inclusive a que não o admirava. Identificou-se com as marcas da boa gestão na administração pública.

Resta, ao final, a impressão de que o País perde uma das alavancas de sua modernização institucional. Não por seus feitos em Pernambuco, restritos a quem acompanhou a administração, mas pelos potenciais que reunia e tencionava usar. Seria forte candidato em 2018, caso não fosse vitorioso este ano. Era a estrela de seu partido. Não há perfis à sua altura ou nomes capazes de pegar o bastão que ele empunhava. Não deu tempo de formar quadros, uma de suas metas. Se o Leitmotiv da política é despertar a esperança que dorme na cabeça dos cidadãos, a morte trágica do ex-governador de Pernambuco bate no coração das pessoas como um desalento. Esgarça-se mais uma bandeira da esperança, expande-se a descrença. E, assim, a campanha mais contundente de nossa contemporaneidade perde um dos seus três maiores guerreiros.

O fato é que, se quiser preservar parte do seu legado, o PSB terá de pedir a Marina que segure a onda e torne viável a terceira via. Qualquer outro caminho será mais estreito.

Jornalista, professor titular da USP,

Elio Gaspari: O PR-AFA de Eduardo Campos acertou Dilma

• Se Aécio também foi atingido, é uma dúvida, mas o dano causado à campanha do PT é uma certeza

- O Globo

A conta é simples: em agosto do ano passado, antes de ter o registro de seu Rede negado pelo Tribunal Superior Eleitoral, Marina Silva tinha 26% das intenções de voto na pesquisa do Datafolha. Tendo-se abrigado no PSB, acabou numa chapa que era encabeçada por Eduardo Campos. Há um mês, tinham 8%.

Os números de uma nova pesquisa do Datafolha estarão nas ruas nos próximos dias. Partindo-se dos 8%, somando-se o efeito da comoção provocada pelo acidente do jatinho PR-AFA, ela poderá surpreender. Para que Dilma saia incólume, qualquer ponto percentual que vá para Marina precisará sair do acervo de Aécio Neves, e essa hipótese é absurda. Dilma certamente perde quando fortalece-se a possibilidade de um segundo turno. Se Aécio Neves perde algo com a nova situação, é uma dúvida.

Manejando-se apenas percentagens vai-se a lugar nenhum. Falta saber o que Marina proporá para transformar preferências em votos. No primeiro turno de 2010 ela teve cerca de 20 milhões de votos (19,33%). Até agora, o programa de sua chapa foi ralo e confuso. Fala em "eixos programáticos", "brasileiros socialistas e sustentabilistas", "borda de desfavorecidos", "democracia de alta intensidade", em "ampliar a dimensão dos controles ex post frente à primazia dos controles ex ante". Propõe plebiscitos e "um novo Estado". Isso pode dar em qualquer coisa.

Com dois minutos no programa eleitoral gratuito contra 11 de Dilma e quatro de Aécio Neves, só as redes sociais e a internet poderão socorrê-la. Tomara que isso aconteça e que ela ponha carne no feijão. A ideia de uma candidata a líder espiritual reconforta o eleitor desencantado com a polaridade PSDB-PT, com seus mensalões mineiro e federal. Para o primeiro turno isso é um bálsamo. Para o segundo, uma aventura.

Tiro na doutora
Na quinta-feira o presidente do PSB, Roberto Amaral, anunciou que o partido só decidiria a substituição de Eduardo Campos depois do seu sepultamento.

O PSB é soberano, mas, se alguém no Palácio do Planalto acreditou que, derrubando-se Marina Silva dentro da grande área ajuda-se a doutora Dilma, enganou-se.

O efeito da jogada seria um pênalti contra a meta de Dilma. Quem derruba jogador sempre espera que o juiz não veja o lance. No caso, os juízes serão os eleitores, sobretudo os indecisos ou parte daqueles que pensavam em anular o voto.

Dilmês
Levando um texto escrito e falando da tribuna do Palácio do Planalto, a doutora Dilma tratou do desaparecimento de Eduardo Campos e disse o seguinte:

"Uma morte tirou a vida de um jovem político promissor".

José Dirceu
Pelas suas contas, o comissário José Dirceu acredita que em outubro deixará o regime semiaberto, dormindo em casa.

Felizmente, tanto ele como José Genoino abandonaram o comportamento teatral que exibiram no dia em que se apresentaram à prisão. Ambos de punho cerrado, e Genoino envolto numa cortina que servia-lhe de manto para sabe-se lá o quê.

Fritura de Obama
Outro dia Hillary Clinton deu uma entrevista atirando na testa do companheiro Barack Obama.

O casal Clinton mostrou que pretende esfolá-lo. Se Hillary acerta nas testas, Bill corta jugulares. Em novembro realizam-se eleições parlamentares e tudo indica que os republicanos mantêm a maioria na Câmara e arriscam levar também o Senado.

Os Clinton querem distância desse legado.

Bombas atômicas
Começou a contagem regressiva para os 70 anos das manhãs em que os Estados Unidos jogaram duas bombas atômicas sobre duas cidades japonesas, em agosto de 1945.

É uma grande história diplomática, industrial, tecnológica e militar. Está na rede o livro "Hiroshima Nagasaki - The Real Story of the Atomic Bombings" ("A História Real dos Bombardeios Atômicos"), do jornalista australiano Paul Ham. Sai por US$ 16,99. Cada aspecto da carnificina vale um livro, mas Ham conseguiu juntar todos num só. Era um tempo em que o presidente da Dupont relutava em participar da produção da bomba. Tendo aceitado construir a usina que produziria o plutônio que explodiu em Nagasaki, estabeleceu que a empresa não ganharia um tostão com isso.

Narrativa emocionante, sustenta que o uso das bombas em cima de duas cidades foi uma demasia. Coisas da vida. Passados 70 anos, muita gente pensa assim. Em 1945 ocorria o contrário, e a tardia rendição do Japão foi festejada em todo o mundo.

Recordar é viver
Rompimentos e alianças políticas são coisas fugazes, mas Eduardo Campos, falando da sala em que seu avô recebeu os militares que o prenderam no dia 1º de abril de 1964, informou a Lula que não pretendia mais ter relações políticas com ele.

Espiral
O ministro Ricardo Lewandowski assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal e imediatamente vestiu o manto de presidente do sindicato dos magistrados.

Defendeu um aumento salarial para os juízes usando uma expressão capaz de assombrar Lula e a doutora Dilma. Segundo ele, há no Brasil uma "espiral inflacionária".

Vieralves, o Vanderbilt da UERJ
Em plena campanha eleitoral, caiu em cima da candidata a deputada federal Benedita da Silva a denúncia de que em 2010 dois de seus filhos, funcionários da Câmara Municipal desde 1987, foram pendurados na folha de pagamento da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Faturaram R$ 143 mil.

À primeira vista, isso faz parte do tiroteio da campanha. Olhando-se bem, há meses a comissária Benedita, seus dois filhos e mais o reitor da Uerj, companheiro Ricardo Vieiralves de Castro, sabiam que estavam encrencados. O caso estourou agora porque não foi esclarecido direito enquanto era investigado pelo Ministério Público. Os dois filhos da deputada ficaram lotados no gabinete de Vieiralves. Diligências revelaram que eles lá não iam e em seus depoimentos deram explicações contraditórias a respeito de serviço que faziam. Os dois, mais Vieralves, tornaram-se réus na 1ª Vara da Fazenda Pública, acusados de improbidade administrativa. Benedita, não.

Filhos de maganos pendurando-se em Câmaras Municipais e transferindo-se para outras paragens são costumes antigos. Quando esse abrigo é uma universidade, dá pena. Quando nela é o gabinete do reitor, dá raiva. Desde que o processo foi aberto a Uerj manteve solene silêncio. Em busca da posição da universidade, no dia 12 os repórteres Cassio Bruno e Fábio Vasconcelos enviaram-lhe uma mensagem com perguntas. Passados dois dias depois, Vieiralves não se dignara a responder. O doutor pegou a linha de Alice Vanderbilt, a milionária americana que entrou no carro, disse o nome da dona da casa onde ia jantar, percebeu que o motorista tomou um caminho errado, mas ficou calada. Ela não falava com criados. Com uma diferença, madame Vanderbilt cuidava do dinheiro dela. Vieralves mexeu com dinheiro da Viúva.

Miriam Leitão: Natureza da política

- O Globo

A política tem a capacidade de embaralhar todas as peças e derrubar as certezas. A economia tem oscilações que influenciam o rumo político, às vezes. O papel da economia pode crescer, mas determinante é a política em si mesma. Estão agora todos os candidatos andando sobre gelo fino, e qualquer erro cobrará sua conta. A campanha ficou inesperadamente tensa e difícil.

Não faz muito tempo, o marqueteiro da presidente Dilma fez a previsão que já era temerária na época e agora revela amadorismo. Segundo João Santana, a presidente iria "ganhar no primeiro turno porque ocorrerá uma antropofagia de anões. Eles vão se comer lá embaixo e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo". Quando foi dita, a frase era arrogante. Agora, é estúpida.

Os "anões" que se comeriam "lá embaixo" seriam Marina, Eduardo Campos e Aécio Neves. Eles não se atacaram e dois deles se uniram até que a morte os separou. A presidente teve uma queda súbita de popularidade com as passeatas de junho do ano passado. Seus índices de intenção de votos rodam num nível mais baixo e nada confortável para quem contava em liquidar a fatura no primeiro turno, ainda que permaneça na frente, nas pesquisas.

O acaso acaba de fazer ao Brasil uma dolorosa surpresa. De luto, brasileiros falaram intensamente da tragédia que nos levou um precioso quadro político no momento em que ele alçava seu voo nacional. A história da República brasileira é marcada por comoções que alteraram o rumo dos acontecimentos. Historiadores e cientistas políticos mostram que a coleção dessas cicatrizes é maior do que se imagina. "Mas o Brasil é bom nas crises", disse Maria Celina D"Araújo, professora da PUC-Rio. Defendeu a tese de que nesses momentos o país cresce e surpreende.

Na economia, é assim também. Nos distúrbios agudos foram tomadas decisões difíceis. Quando a crise é crônica, como agora, a tendência dos gestores e políticos é adiar as medidas impopulares. O volume de problemas que se acumula na economia é assustador. Falarei de um só, como exemplo, porque é impossível esgotar numa coluna a lista de bombas a desarmar.

Nos últimos tempos, o governo conseguiu refazer um perigoso embaralhamento dos balanços de entes públicos. A Eletrobrás, que deve à Petrobras, pegou dinheiro emprestado no Banco do Brasil e na Caixa, para pagar apenas uma parte, e pendurou o resto. O Tesouro não tem repassado à Caixa todos os valores devidos para o Bolsa Família e o seguro-desemprego. As distribuidoras de energia elétrica, privadas, receberam empréstimos de BB, Caixa, bancos estaduais, BNDES e bancos privados em operações financeiras intermediadas por uma câmara de empresários, por ordem do governo, e tendo como garantia o aumento futuro da tarifa. O Tesouro deve bilhões ao FGTS e ao FAT. O BNDES deve R$ 400 bilhões ao Tesouro. É um emaranhado de dívidas cruzadas. Isso já ocorreu no Brasil, e o saneamento das empresas e bancos deu muito trabalho ao governo Fernando Henrique.

Quem se sente flanar no Olimpo pode achar que nada disso chega ao eleitor comum. Mas esses e outros mal feitos gerenciais minam a confiança na economia, murchando investimentos em todos os níveis. Um taxista me disse dias atrás que adiou a compra do carro novo para trabalhar porque não sabe se terá clientes. Ele vê os consumidores perdendo fôlego. Os sinais da economia se propagam dos grandes aos pequenos.

Da economia, não virá o impulso para que Dilma ganhe no primeiro turno. Ela enfrentou segundo turno até quando o PIB crescia a 7,5%, em 2010. E o ex-presidente Lula, grande encantador de plateias, também passou por isso duas vezes.
O historiador José Murilo de Carvalho conta que a República presidencialista do Brasil tem sido afetada por sucessivos eventos, trágicos ou inesperados, que alteram o cenário eleitoral. A lista é longa e vem do século XIX, mas é da natureza da política brasileira.

Estamos vivendo mais um desses eventos em que tudo mudou, exigindo novas atitudes e estratégia de todos os atores. A economia será subsidiária.

Painel:: Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

Devagar com o andor
Dirigentes do PSB e da Rede estão vacinados para não tomar as primeiras pesquisas com o novo cenário eleitoral como medida das chances reais de Marina Silva. A expectativa dos aliados é que ela largue ao menos empatada com Aécio Neves (PSDB) no segundo lugar. No entanto, o clima de comoção com a morte de Eduardo Campos deve se esvair até outubro. "Estamos no auge da emoção. Depois, as pessoas tendem a se acostumar", diz o novo presidente do PSB, Roberto Amaral.

Meio vazio Passado o choque com a tragédia, Marina deverá enfrentar dificuldades na competição com Aécio. O tucano contará com mais estrutura e com palanques estaduais mais sólidos.

Meio cheio Por outro lado, a candidata que entra com a disputa em curso já é mais conhecida nacionalmente do que o tucano, que disputa sua primeira eleição fora das divisas de Minas Gerais.

Tabelinha Em São Paulo, o novo protagonismo de Marina tende a beneficiar Eduardo Suplicy (PT) no duelo com José Serra (PSDB) pela única vaga no Senado. Ela já havia declarado apoio ao petista, de quem é amiga.

Tarefa O novo presidente do PSB está preocupado em engajar Marina na disputa das vagas de deputado federal. "É isso que define a divisão do fundo partidário e da propaganda. Eleger dez senadores não dá um segundo a mais de TV", diz Amaral.

Retrovisor Em 2010, o desempenho de Marina na eleição presidencial não turbinou o PV, que elegeu os mesmos 13 deputados da disputa anterior. Neste ano, ela apoiará candidatos da Rede espalhados por várias siglas.

Voz das ruas Funcionários do hotel que sediou as últimas reuniões do PSB em São Paulo torciam para que Marina fosse escolhida para substituir Campos. "Tem que ser ela", repetia uma atendente que servia café aos políticos.

Futurologia Na torcida por um segundo turno contra Aécio, a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) considera que Marina tenderia à neutralidade nesse cenário, e parte de seus eleitores poderia anular o voto. Com ela no páreo, o tucano seria obrigado a apoiá-la.

Déjà-vu No segundo turno de 2010, a ex-senadora optou por não apoiar nem Dilma nem José Serra, candidato tucano à ocasião.

Novo discurso A campanha de Aécio vai levantar dúvida sobre a capacidade de gestão de Marina, que nunca esteve à frente de um governo. "Quem tem experiência para administrar um país em crise?", questiona o coordenador José Agripino (DEM).

Sombra Com a candidatura de Campos, Aécio tinha um rival nesse quesito, já que o pernambucano também havia sido bem avaliado como governador do Estado.

O clima piorou Na capital paulista, 28% dos eleitores dizem que não votariam de jeito nenhum em Alexandre Padilha (PT) para governador, mostra o Datafolha. Na mesma época de 2012, a rejeição a Fernando Haddad (PT) na cidade era de 15%.

Rei do interior O governador Geraldo Alckmin (PSDB) ostenta seus menores índices de aprovação nos municípios paulistas com mais de 500 mil habitantes. Neles, 37% dizem que sua gestão é ótima ou boa. Em cidades médias, esse índice é de 58%.

O bispo derreteu A candidatura de Marcelo Crivella (PRB) ao governo do Rio sofreu queda acentuada entre os eleitores mais pobres. Há um mês, ele tinha 28% no universo com renda de até dois salários mínimos. Agora, aparece com apenas 16%.
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Tiroteio
Não se explica uma tragédia assim com uma nota oficial de três linhas a um partido que perdeu o seu maior líder.
DO DEPUTADO BETO ALBUQUERQUE (PSB-RS), sobre as explicações da Aeronáutica para a falta de registro de áudio do avião de Eduardo Campos.
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Contraponto
Governador e confidente

À frente do governo de Pernambuco, Eduardo Campos percorria o interior do Estado para entregar ambulâncias com o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Em Ibimirim, a dupla se reuniu com o prefeito para passar as chaves e ficou sabendo que, antes de assumir o cargo, ele cuidava de um armazém. Depois do habitual choro sobre as dificuldades financeiras do município, os dois foram surpreendidos pela primeira-dama:

-Até agora o meu marido não fez nada na prefeitura.

Quando ainda se recuperavam do riso, ela emendou:

-E mais: também não está cuidando da bodega!

Diário do Poder – Cláudio Humberto

- Jornal do Commercio (PE)

• Congresso dá como certa a ‘Lava Jato, parte 2
As investigações e depoimentos como o da ex-contadora Meire Poza, no âmbito da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, realizada há cinco meses, levam as consciências pesadas do Congresso Nacional à expectativa de uma “parte II” da mesma operação. As provas colhidas nesse período também indicam ser iminente a prisão de políticos e empresários enrolados no esquema do doleiro Alberto Youssef.

• A quadrilha
Meire Poza já revelou à Justiça o que apenas insinuou no Conselho de Ética da Câmara: a lista de políticos corrompidos por Alberto Youssef.

• BC da corrupção
A ex-contadora definiu o ex-patrão Alberto Youssef como um “banco”. Ou “banco central da corrupção”, como qualificou esta coluna em maio.

• O verdadeiro Joaquim
Meticuloso, discreto, corajoso e competente, o juiz Sergio Moro, que ordenou a “Lava Jato”, é tudo o que se imaginava de Joaquim Barbosa.

• Fazendo História
Juristas experientes avaliam que o juiz Sergio Moro, apenas porque cumpre seu dever, simples assim, ainda fará História no Brasil.

• Calote na ONU: ministérios fazem jogo de empurra
Os ministérios do Planejamento e Relações Exteriores culpam um ao outro pelo calote de R$ 380 milhões aplicado na Organização das Nações Unidas. O Brasil passou vexame quando o secretário-geral da ONU citou o País entre seus principais devedores. No jogo de empurra, o Itamaraty diz que os pagamentos cabem ao Planejamento, e este garante que efetua todas as transferências solicitadas pelo Itamaraty.

• Tudo que está ruim…
A última vez que o Brasil pagou o que devia à ONU foi no ano de 2008. Nesses 6 anos, não honramos os pagamentos para as missões de paz.

• … pode piorar
Nos últimos dois anos só quitamos os débitos referentes à reforma da sede da ONU, onde trabalham os irmãos Antonio e Guilherme Patriota.

• Bye, bye Conselho
“Ficha suja” na ONU, o Brasil perde prestígio internacional. O fundo do poço foi ser chamado de “anão diplomático” por Israel.

• Devassa fiscal
Aliados dos líderes evangélicos Silas Malafaia e Valdemiro Santiago se queixam de que eles estão sob devassa da Receita Federal, até nas contas pessoais. E se defendem criticando Dilma e o PT. Lula tentou interceder, de olho na influência eleitoral deles, mas Dilma não recuou.

• A pedidos
Dilma confessou a interlocutores seu “horror” às pregações de Silas Malafaia e Valdemiro Santiago, para ela, “politicamente incorretas”. Mas a devassa seria a pedido de rivais dos bispos ligados ao PT.

• Homem-bomba
O ex-ministro Roberto Amaral, vice-presidente do PSB, está entre os cotados para vice de Marina, na campanha presidencial. Mas a turma dela se arrepia ao lembrar que ele andou defendendo bomba atômica.

• Gesto
A fim de diminuir resistência no agronegócio, socialistas que defendem a candidatura de Marina Silva têm ressaltado a emblemática ida dela à sabatina realizada pela Confederação Nacional da Agricultura.

• Relações financeiras
As revelações de Meire Poza sobre a participação de Luiz Argôlo como sócio do doleiro Alberto Youssef muda o foco do caso, considerado “passional”, até então, pelo relator Marcos Rogério (PDT-RO).

• Tomando as rédeas
Diante da negativa de Paulo Skaf (PMDB) em oferecer palanque a Dilma em São Paulo, o vice Michel Temer decidiu transformar seu escritório pessoal em comitê de campanha, no bairro de Pinheiros.

• Tudo pelo voto
Funcionários do Congresso não escondem a surpresa ao ver a maioria dos políticos sisudos e carrancudos durante o mandato, agora abrindo largos sorrisos, abraçando e até beijando os eleitores na campanha.

• Histórico
A bancada do PMDB-MT é só desconfiança com ministro Neri Geller (Agricultura), que já foi do PP e do PSDB. Ele se reuniu com adversário local e depois, sob pressão, declarou apoio à chapa com o PT.

• Risco desnecessário
É falsa a indecisão do PSB para confirmar Marina Silva como candidata a presidente: afinal, se não o fizer corre o risco de tornar-se irrelevante.

Panorama Politico :: Ilimar Franco

- O Globo

O voto facultativo
O cientista político Paulo Kramer, a despeito de Marina Silva, avalia que "podemos ter recorde de abstenções" na eleição. Em 2010, foram 21%. Lembra que o protesto de junho (2013) revelou que há um "desencanto com políticos e a política, independente de partidos e ideologias". Acrescenta que o voto facultativo já é uma realidade no país. E diz: "Com R$ 7 de multa, o voto é facultativo". A multa pela ausência é de R$ 3,51 por turno.

Dilma x Marina
Com a candidatura de Marina Silva, serão mais delicadas as conversas do PT e do PSB. Os petistas tinham um diálogo mais fluente com Eduardo Campos. Agora, as pontes terão de ser reconstruídas. Marina atribui à ação do Planalto e do PT a decisão do TSE que não permitiu o registro de seu partido, a Rede. Além disso, Marina e a presidente Dilma divergem desde que elas eram ministras do Meio Ambiente e de Minas e Energia. No Planalto, comenta-se ainda que há também um drama emocional: as duas teriam ciúmes por causa do ex-presidente Lula. Segundo relatos, Marina era a "queridinha" de Lula, mas Dilma atropelou com sua gestão na Casa Civil.
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“O ideal é que Marina (Silva) transformasse o PSB na sua alternativa partidária. Não é difícil um entendimento (com a Rede)
Antonio Carlos Valadares
Senandor (PSB-SE), tio do ex-deputado Pedro Valadares, que também morreu no acidente de Santos
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A gente se vê por aqui
Os "marineiros" não temem por Marina ter apenas 1 minuto e 49 segundos de propaganda na TV. O deputado Alfredo Sirkis (PSB-RJ) diz que em 2010 pesou mais a presença diária de Marina no "Jornal Nacional" com o mesmo tempo de Dilma e Serra.

Na estrada
A cantora Sula Miranda (SP) é uma das apostas do PRB para dobrar a bancada na Câmara de oito para 16 deputados federais. Em 2010, o partido elegeu dois deputados em São Paulo. Este ano, não tem coligação proporcional. Conhecida como a Rainha dos Caminhoneiros, Sula defende a aposentadoria com 25 anos de serviço para esses profissionais.

A arte imita a vida
O "remake" da novela "O Rebu" fez referência ao escândalo de 2009 no Rio em que o empreiteiro Fernando Cavendish e integrantes do governo Cabral requebravam com guardanapos brancos na cabeça. Na cena, que foi ao ar na terça-feira, o empresário Carlos Braga (Tony Ramos) festeja licitação com políticos e guardanapos brancos.

O teste das urnas
O PSD (44) e o Solidariedade (21) devem eleger bancadas menores que as atuais. Essa é a previsão inicial do Diap. Os deputados que foram para esses partidos não levaram consigo toda a estrutura que tinham em suas antigas legendas.

Eu tenho a força
O Diap, que faz esse tipo de projeção desde 1990, com índice de acerto de 90%, prevê que o único dos novos partidos que pode crescer é o PROS (20). A nova sigla deve se beneficiar da força política dos irmãos Gomes (Ciro e Cid) no Ceará.

A previsão do Diap é a de que o PT, 87 deputados, e o PSDB, 53 deputados, terão nas eleições um leve crescimento de suas bancadas para a Câmara.

Antônio Maria e a saudade do Recife

Manuel Bandeira: Evocação do Recife

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
— Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado
e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê
na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras
mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:
Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:
Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão

(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão...)
De repente
nos longos da noite
um sino
Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era são José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.

Rua da União...
Como eram lindos os montes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame de dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
...onde se ia pescar escondido
Capiberibe
— Capiberibe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redemoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro
os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras

Novenas
Cavalhadas
E eu me deitei no colo da menina e ela começou
a passar a mão nos meus cabelos
Capiberibe
— Capiberibe
Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
Rua da União...
A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro
como a casa de meu avô.

sábado, 16 de agosto de 2014

Opinião do dia: Antonio Lavareda

O formato da disputa será mais uma vez triangular, mas os três vértices são muito diferentes hoje, o que dificulta qualquer previsão. O PSDB tem Aécio Neves, político jovem, com rejeição menor do que a de José Serra em 2010. No PT, Dilma é o oposto. Em 2010, tinha sob seus pés o crescimento econômico de Lula e a imagem imaculada de mãe do PAC. Hoje, é a mais rejeitada numa situação econômica difícil. Mas tem ainda a força de Lula e o cargo, além de um tempo de TV ainda maior. Marina é maior do que em 2010, acrescida do sentimento das manifestações de 2013, do apoio de uma aliança e de uma máquina várias vezes maior do que que a que tinha em 2010 e mais que o dobro de tempo de TV. E ainda tem a carga emocional do trágico desaparecimento de Campos, que é algo difícil de mensurar. É bastante plausível que influencie em alguma medida o processo eleitoral”.

Antônio Lavareda, sociólogo, na entrevista: ‘Marina é o maior patrimônio que o acaso deu ao PSB’. O Globo, 15 de agosto de 2014.

Marina dá aval ao PSB para encaminhar candidatura

• Ex-ministra recebeu a cúpula do partido na sua casa em SP; legenda se reúne no dia 20

• Marina mostra disposição para disputar Planalto e aceita acordos do PSB

• Em encontro com dirigentes e aliados da Rede em São Paulo, ex-ministra afirma que tem responsabilidade sobre legado de Campos

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva afirmou nesta sexta-feira em conversas reservadas que está disposta a disputar a Presidência da República no lugar de Eduardo Campos, morto na quarta-feira passada em um acidente aéreo em Santos, no litoral paulista. Candidata a vice na chapa do ex-governador pernambucano, ela se comprometeu a respeitar os acordos regionais do PSB e a manter o programa de governo firmado pela aliança. Essas eram as exigências do partido para lançá-la ao Planalto, algo que deve acontecer nos próximos dias.

Marina recebeu em seu apartamento em São Paulo dirigentes do PSB e aliados da Rede - partido que tentou criar sem sucesso no ano passado. Disse que se sente responsável pelo legado de Campos e que, se não houver objeção na aliança, está disposta a disputar o Palácio do Planalto contra a presidente Dilma Rousseff e o candidato tucano Aécio Neves.

Foram os primeiros encontros políticos realizados por Marina após a tragédia de três dias atrás. A ex-ministra recebeu uma comitiva do PSB formada por Roberto Amaral, que assumiu a presidência nacional do partido após a morte de Campos, pelo coordenador-geral da campanha, Carlos Siqueira, por outro integrante da coordenação, Milton Coelho, pela deputada Luiza Erundina, e pelo porta-voz da Rede, Walter Feldman.

O grupo indagou Marina sobre a candidatura. Ela respondeu, de acordo com relato dos presentes, que não se oporia “aos processos do partido.”

No PSB, sigla à qual Marina aderiu em outubro do ano passado após não conseguir o registro da Rede, a maioria dos dirigentes apoia a candidatura da ex-ministra do Meio Ambiente. A escolha está ligada ao capital político da neoaliada, que quatro anos atrás, quando disputou o Palácio do Planalto pelo PV, obteve 19,33% dos votos e ficou na terceira colocação. Campos ainda não havia atingido dois dígitos nas pesquisas.

Divergências. Apesar de haver resistências internas - grupos minoritários do PSB dizem preferir um nome com uma ligação mais forte com o partido, como o de Luiza Erundina, por exemplo -, os dirigentes acreditam que o anúncio da ex-ministra possa ser feito até quarta-feira. Eles não querem fazer o anúncio oficial antes que os restos mortais de Campos sejam enterrados no Recife. Nesse período, pretendem consultar governadores, prefeitos e parlamentares do partido sobre a escolha.

Além dos dirigentes do PSB, Marina também recebeu aliados próximos, que a auxiliaram na tentativa de criar a Rede. Estiveram em seu apartamento Eduardo Giannetti, economista, Neca Setubal, herdeira do Banco Itaú que integra a coordenação do programa de governo da aliança PSB-Rede, Ricardo Young, vereador do PPS, entre outros. A eles, falou sobre a “responsabilidade” com o legado do pernambucano.

Silêncio. Até sexta-feira, Marina vinha se recusando a falar de política. Passou a lidar com o tema após a própria família de Campos revelar preferência por sua candidatura. O único irmão de Campos, Antônio, divulgou anteontem uma carta na qual defende abertamente a indicação da ex-ministra como candidata ao Palácio do Planalto.

Renata, viúva do ex-governador, também é a favor de que Marina passe a ser o nome do PSB. As duas conversaram por telefone na quinta-feira. A ex-ministra deve embarcar hoje para Recife, onde os restos mortais de Campos serão enterrados.

Colaboraram Alessandro Lucchetti e Mateus Coutinho

Marina sinaliza ao PSB que disputará o Planalto

• Ex-senadora indica que ratificará os acordos estaduais feito pelo partido

PSB sela acordo para lançar Marina no lugar de Campos

• Novo presidente aceita inversão da chapa; Beto Albuquerque deve ser vice

• Ex-ministro de Lula, Roberto Amaral afirma que Marina 'contempla' o partido; aliado diz que ela está 'à disposição'

Bernardo Mello Franco, Paulo Gama Bruno Boghossian – Folha de S. Paulo

O PSB superou as divergências internas e selou acordo para lançar Marina Silva à Presidência da República no lugar de Eduardo Campos. Ela concordou com a inversão da chapa e deverá ser anunciada oficialmente na próxima quarta-feira (20).

O novo presidente do PSB, Roberto Amaral, era visto como último entrave ao acerto. Sob forte pressão de correligionários, ele se convenceu a apoiar Marina, que disputou o Planalto em 2010 pelo PV.

O PSB agora discutirá a indicação do novo vice na chapa presidencial. O deputado gaúcho Beto Albuquerque, hoje candidato ao Senado, é o mais cotado para a vaga.

"A candidatura de Marina contempla nosso projeto. Será uma solução de continuidade. O PSB indicará o novo vice", disse Amaral à Folha.

Depois de uma reunião com Marina, o coordenador da Rede Sustentabilidade, Bazileu Margarido, confirmou à reportagem que ela aceita disputar a Presidência.

"Com o OK do PSB, ela está à disposição para ser a candidata", disse.

Por respeito à memória de Campos, o anúncio oficial da nova chapa só deverá ser feito três dias depois do enterro, programado para o domingo (17), em reunião da executiva nacional do PSB.

A negociação se acelerou após Marina receber apoio público da família do ex-governador de Pernambuco. Segundo aliados, ela se sentiu revigorada ao conversar com a viúva Renata Campos, que a incentivou a concorrer.

Ex-ministro da Ciência e Tecnologia no governo Lula e considerado próximo ao PT, Roberto Amaral visitou Marina na tarde desta sexta (15). Com seu aval, começou a consultar os governadores do PSB sobre a inversão da chapa.

Ele quer dar caráter coletivo à decisão e agora buscará entendimento sobre o vice até a reunião da executiva. "Vou fazer um trabalho de afunilamento. O ideal é chegar com dois nomes. Ou um", disse.

Além de Albuquerque, que se aproximou de Marina desde que ela aderiu à candidatura de Campos, são vistos como alternativas o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), o ex-deputado Maurício Rands (PSB-PE) e Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), ex-ministro da Integração Nacional no governo Dilma Rousseff.

Marina sinalizou ao PSB que respeitará as duas principais exigências do partido: respeitar os acordos regionais fechados à sua revelia, em Estados como Rio e São Paulo, e incorporar o discurso desenvolvimentista.

A ex-senadora disse a pessoas próximas que pretende conduzir a campanha da mesma forma que Campos a conduziria, atuando como líder de uma coligação, e não apenas da Rede, o futuro partido que ela quer criar.

Embora tenha se recusado a falar publicamente sobre política, em respeito ao luto pelo ex-governador, repetiu a aliados que era preciso manter o projeto da chapa.

Ela disse que o PSB foi generoso ao abrigar a Rede em 2013, quando a Justiça Eleitoral negou registro ao partido, e agora é a hora de retribuir.

Colaboraram Ranier Bragon e Valdo Cruz, de Brasília, Gustavo Uribe, de São Paulo,Natuza Nery e Marina Dias, enviadas especiais ao Recife