domingo, 22 de dezembro de 2013

Modernização periférica - Luiz Werneck Vianna

A literatura em ciências sociais tem distinguido o duplo caráter dos processos de modernização, diferenciando os casos da modernização central dos da periférica. Os primeiros seriam caracterizados pela emergência da modernidade a partir de uma ruptura com a tradição desencadeada por movimentos revolucionários, a exemplo da Inglaterra e da França, enquanto os segundos resultariam de composições entre elites modernas e tradicionais, particularmente as originárias do mundo agrário. Antonio Gramsci, num de seus ensaios, designou como revoluções passivas os processos deste último tipo, precisamente a fim de caracterizar situações nacionais em que a mudança se opera num andamento que preserve as elites tradicionais e seus interesses.

Nesse sentido, a modernidade não se confunde com a modernização, uma vez que, nas lições incontomáveis de Jürgen Habermas, ela não estaria referenciada pelo tempo histórico passado, do qual se separou conscientemente com o movimento intelectual do Iluminismo e a Revolução Francesa. Sua referência é a do seu tempo e é a partir dele que deve instituir livremente a sua normativídade (O Discurso Filosófico da Modernidade, São Paulo, Martins Fontes, 2002). Daí serem constitutivas a ela a autonomia dos seres sociais e o processo de permanente deliberação entre eles, numa esfera pública isenta de coerção e que se encontre aberta igualmente a todos, para a es colha de rumos coletivos.

Os processos de modernização periférica, ao contrário, nascem comprometidos com a tradição e altamente dependentes das elites políticas que os desencadeiam, obrigadas a abrigar no governo forças sociais heterogêneas originárias de tempos históricos distintos e a manter sob controle a sua movimentação social, a fim de preservar a política que pretende impor. Relações heterônomas entre governantes e governados, com o vértice do poder disposto assimetricamente diante da sua sociedade, são, pois, intrínsecos a eles. O corporativismo foi, entre outras, uma dessas fórmulas, claramente dominante na América Latina na hora de partida da sua modernização, ainda presente, mesmo que de forma velada, em muitos dos seus países, como é o caso do Brasil.

O Brasil é um exemplo de manual da modernização periférica. No Império,quando o objetivo de suas elites visava a atingir os caminhos para a civilização -que pode, na cultura da época, ser considerada um equivalente funcional da categoria modernização sob o diagnóstico de que a nossa sociedade não estava preparada para o self-govermment a opção foi em favor da centralização administrativa e pelo estilo decisionista do Poder Executivo. Sob a ação pedagógica do Estado, a sociedade, ao longo do tempo, se dotaria da capacidade de participar da administração dos seus interesses. Nosso autoritarismo seria manso e justificado pelos seus fins benfazejos. Como se sabe, essa versão sobre o autoritarismo - dito instrumental - ganhou galas de descoberta original e ainda persiste sem coragem de dizer seu nome.

A tópica do moderno e da modernização seria vivida Com ambiguidade na República. Ruy Barbosa, a quem se deve a arquitetura de índole libertária da Carta de 1891, aderiu, com seu plano ferroviário, à agenda da modernização quando ministro da Fazenda. Já os anos de 1910 e 1920 testemunhariam a emergência de movimentos sociais especificamente modernos, como os do operariado que se organiza em sindicatos e se inscreve na política de modo autônomo com a criação, em 1922, do Partido Comunista por iniciativa de sindicalistas.

Contudo, aqui e no mundo, aqueles foram tempos de despertar das periferias, em que a luta contra o atraso reclamaria a intervenção da política, concentrada no papel de um Estado forte orientado para os objetivos da modernização, tal como a publicística brasileira daquelas primeiras décadas do século 20 diagnosticava, exemplarmente em Alberto Torres e Oliveira Vianna. Dados os imperativos de romper com uma situação de país retardatário, caberia às políticas de Estado acelerar o tempo, que não poderia ser o do "idealismo constitucional" da Carta de 91, que ignoraria o "País real".

A chamada Revolução de 1930 rompeu com a ambigüidade entre o moderno e a modernização - a expressividade do primeiro termo seria subsumida à do segundo. Essa complexa operação viria a ser realizada por duas novas agências estatais, os Ministérios do Trabalho - o Ministério da Revolução, como se dizia à época - e da Cultura, ambos confiados a intelectuais - Oliveira Vianna estará no primeiro e Gustavo Capanema e sua legião de jovens intelectuais modernistas, no segundo, entre os quais Carlos Drummond de Andrade. A tópica do nacionalismo, nas dimensões da economia e da cultura, viria a selar, na prática, a união entre eles. O Estado se consagrava como mais moderno que sua sociedade.

Mais à frente, nos anos 1950 e 1960, sob a legenda do nacional-popular essa versão se popularizou, quando então, na linguagem política corrente, se enfraquece a distinção entre o moderno e modernização, malgrado a resistência de alguns setores da esquerda, distinção essa que 0 regime militar veio a banir do dicionário. Paradoxalmente, o PT, que nos seus governos tem obscurecido a distância entre os significados desses dois conceitos, foi, nos seus anos de formação, a força política mais estridente na denúncia dessa síndrome, escorada, em boa parte, na crítica ao nacional-desenvolvimentismo formulada por grandes personalidades intelectuais a ele vinculadas, como Florestan Fernandes, Raimundo Faoro e Francisco Weffort.

A modernização à brasileira pôde e ainda pode muito, mas recentemente, nos idos de junho, se viu que o moderno que teima em renascer, mesmo que ainda não tenha encontrado seu caminho, não se deixa mais enredar por ela.

Professor-pesquisador da PUC-Rio.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Democracia política e valores democráticos -- Raimundo Santos

Os partidos da Oposição estão ante a responsabilidade de construírem, com suas candidaturas à Presidência da República, uma ampla convergência em condições de levar a disputa ao segundo turno e abrir caminho para a eleição de um governo de orientação democrática. A democratização da vida nacional do tempo contemporâneo progrediu quando atores de diferentes orientações se uniram na defesa da democracia política em conjunturas difíceis, nas quais correntes de esquerda não se desobrigaram de agir politicamente.

Na sequência do suicídio de Getúlio, em agosto de 1954, houve resistência à quebra da institucionalidade constitucional, no meio militar com a reação do general Lott garantindo a eleição presidencial de 1955. Este sentimento antigolpista se refletiu na candidatura de Juscelino Kubitscheck a Presidente da República e João Goulart a Vice-presidente por uma aliança de seis partidos liderada pelo PSD (Partido Social Democrático) e o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), com apoio dos comunistas. Empossado na Presidência da República no começo de 1956, Juscelino montou seu governo com setores, no dizer daquele tempo, “entreguistas” e “nacionalistas”. Esta composição ensejou, durante todo seu mandato, pressões de dentro e de fora da coligação eleitoral (da “ala moça” do PSD, dos trabalhistas, do PCB) por meio de ações parlamentares e extraparlamentares para que o Presidente adotasse medidas reformistas e de defesa da economia nacional.

Em 1960, o PSD e o PTB lançaram para Presidente da República, o general Lott, e, para vice, João Goulart, ex-ministro do Trabalho no segundo governo Vargas, em coligação com o PSB (Partido Socialista Brasileiro) e três outros partidos, também com apoio do PCB. Lott perdeu a eleição para Jânio Quadros, o candidato à presidente da UDN (União Democrática Nacional), no entanto, a coligação elegeu João Goulart, seu vice-presidente, como então permitia a legislação eleitoral. A renúncia de Jânio em agosto de 1961 alterou a disposição de forças do quadro político, formando uma conjuntura de grande instabilidade. O golpismo reapareceu no veto militar à posse de João Goulart e ao mesmo tempo desencadeou reações em defesa da Constituição. Vitoriosa a mobilização antigolpista, a posse de Jango abriu caminho para o surgimento de um governo de orientação diversa da de Jânio e da conservadora UDN, mesmo com a imposição do parlamentarismo, aprovado pelo Congresso Nacional, como condição para que assumisse a Presidência da República, cancelado pelo plebiscito de janeiro de 1963.
 
A posse de João Goulart colocou a sua coligação eleitoral o problema prioritário de agregar diferentes forças na ampla sustentação de um governo que se propunha concretizar “reformas de base” na vigência do regime democrático (ver os textos de época de Celso Furtado: “Reflexões sobre a pré-revolução brasileira” e “Subdesenvolvimento e estado democrático”, cf. C. Furtado, A pré-revolução brasileira, Rio de Janeiro: Fundo de cultura, 1962).

Santiago Dantas, Ministro da Fazenda de Jango, chamando os grupos políticos que compreendiam a complicada situação de "esquerda positiva", reclamou, no final de 1963, da falta de lucidez de setores das esquerdas e do trabalhismo e das áreas que influenciavam. Naquela conjuntura tensa, o campo da “esquerda positiva” não conseguiu evitar a radicalização que levou João Goulart ao isolamento político e ao fim do seu governo em 1964. Destituído o Presidente, opositores de diversas orientações, correntes partidárias, do mundo social e do meio cultural, e descontentes com o novo regime (total ou parcialmente, em relação a um ou mais aspectos das suas ações) se uniram no Movimento Democrático Brasileiro (MDB), dando vida à resistência política que daria fim à ditadura em 1985.

Diferentemente da experiência da “frente nacional e democrática” (expressão dos anos de JK e Jango), na convergência emedebista iria se firmar a valorização da democracia política como caminho para alargar direitos e realizar reformas estruturais. No transcurso da resistência ao regime de 1964 se desenvolveria um padrão de agir por meio da política segundo fins referidos ao conjunto da sociedade brasileira. Pode-se dizer que se assentaria comprometimento com os valores democráticos em ambientes do MDB e depois em áreas peemedebistas (uma parte significativa delas, mais adiante, em 1989, iria fundar o PSDB (Partido da Socialdemocracia Brasileira). Ao tempo que eram ativistas da Resistência por demais insistentes em colocar as liberdades no centro dos objetivos da frente democrática (PCB, 1965), os pecebistas receberiam influxos dessa vivência democrática no seu próprio modo de pensar. Com o correr do tempo, a esquerda histórica tentaria redimensionar suas concepções de mudança social sob hegemonia de classe, particularmente entre 1976 e os primeiros anos 1980.

Assim, essa cultura do agir político criativo na democracia se desenvolve na vida política nacional através do ativismo continuado de muitos atores, partidários e correntes de esquerda de orientação democrática, incorporando valores do meio artístico-cultural e elaborações da intelectualidade. Vários ambientes da música, da literatura, do teatro e do jornalismo são presenças construtivas da cultura da resistência política ao regime de 1964. Chama a atenção a função das revistas e editoras de cultura e política e seus espaços abertos à discussão intelectual e política, exemplares os livros e as revistas publicados pela Brasiliense, pela Civilização Brasileira e pela Paz e Terra, especialmente de 1965 até 13 de dezembro de 1968, quando o regime baixou o Ato Institucional n. 5 que endureceu seus traços de estado policial.

Os principais protagonistas da mobilização pelas liberdades e, a partir da anistia de 1979, pela consolidação de um processo de transição política (então iniciado sem um governo de transição, cf. Armênio Guedes. O impasse e a saída democrática (31/12//80), in O marxismo político de Armênio Guedes, Brasília/Rio de Janeiro: FAP e Contraponto, dez. 2012), exerceriam, com claros fins democráticos, papel decisivo nas Diretas-Já, na hora da derrota do regime de 1964, elegendo Tancredo-Sarney no Colégio Eleitoral, durante o primeiro governo civil, na Constituinte, e no impeachment de Collor. A cultura política da Resistência tem muita relevância quando setores seus estiveram à frente do apoio de todos os partidos ao breve governo político de Itamar Franco.

No começo do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, isolado o pequeno PCB, se reduziria a atuação de correntes de esquerda de orientação democrática na cena política nacional, sobremaneira quando o PT optou pela oposição total ao governo do PSDB e do PFL (Partido da Frente Liberal). O PT se recusava a distinguir a composição de governo heterogênea liderada por Fernando Henrique Cardoso, não querendo assim balizar sua atuação como uma ação dotada de previsão e perspectiva em relação à conjuntura e ao futuro próximo. Tampouco veria a globalização em registro positivo, não divisando possibilidade de pressões com vistas a modificar as reformas estruturais da coligação PSDB-PFL.

A nova esquerda não interveio na cena política em busca de convergência com correntes de esquerda e de centro-esquerda para se opor a Fernando Henrique Cardoso e negociar soluções alternativas. Como certa vez disse um dos líderes do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, o seu governo não teria encontrado oposição, a não ser a oposição do MST.

Entrementes, havia se formado um clima intelectual estimulante daquela postura do PT. Este clima começara a ser percebido entre nós, logo após a derrota de Lula na eleição presidencial de 1989, a partir da circulação nos meios acadêmico-universitários de muitos textos que traziam as teorias dos movimentos sociais como ações coletivas de confronto direto com o Estado, de desconfiança em relação aos partidos e instituições, senão de negação da própria atividade política. Não poucos autores da bibliografia especializada da passagem da década de 1980 aos anos 1990, passaram a falar dos "movimentos sociais como política”.

Como uma das decorrências da anistia de 1979, o PT surgiu desconsiderando aquela cultura política nascida para a ativação pluralista da vida nacional. Por sua vez, Luiz Inácio Lula da Silva, nos primeiros anos do PT, quando não era ainda liderança determinante da sua vida interna, nela não incidira. A partir de 2003, à frente da Presidência da República, de tanto repetir o “Nunca antes neste país”, para realçar dimensão histórica das suas realizações de governo, indicava caminho próprio, levando para rumo singular correntes de esquerda marxistas reunidas no PT, como agora se vê.

A princípio tida como idiossincrática, essa verbalização serviu para afirmar um imaginário de uma nova Era que o ex-presidente dizia inaugurada por ele e o PT. Lula transcendia sua identidade – e a do PT – de defensor de interesses trabalhistas, construindo imagem nova em nome de um social referido aos contingentes pobres, com o qual se projetaria na cena nacional como representante maior dos desvalidos.

Essa estratégia se afastava dos compromissos com o pluralismo e os valores da democracia política – concretizados em cláusulas da Constituição cidadã de Ulisses Guimarães. Ao contrário, no último decênio, a cooptação assumiu elevado nível, incorporando ao governo “tudo o que era vivo”, como já se disse dos mandatos do ex-presidente, e prossegue no governo de Dilma. Em todo este período, têm sido recorrentes nas falas de Lula ambiguidades e resistências em relação à aceitação plena do Estado democrático de direito.

Com frequência, surgem manifestações públicas – de Lula, do PT e de áreas de sua influência, inclusive intelectuais –, corrosivas de instituições republicanas, incessantes ataques à mídia e ao STF, acirrados nesse momento por conta das condenações da Ação Penal 470. Nos governos petistas, aprofundou-se o enfraquecimento do mundo político, sendo o mensalão o emblema maior da busca apolítica de maioria no Congresso Nacional e hegemonia nos partidos.

Ao “Nunca antes neste país” veio se somar o “nós e eles”, que igualmente perpassa diferentes falas do ex-presidente até hoje, o “eles” referido às elites e ampliado aos opositores e críticos do regime. Essa pregação da divisão do país ao meio reserva para o “nós” o discurso retórico – pois mobilizado para manter-se no governo – do vasto alcance da inclusão social que estariam trazendo os programas governamentais.
 
Esse imaginário de uma Era histórica dos governos petistas e a polarização entre a missão de Lula e as elites se naturalizou por dentro do PT, e áreas da sua influência e em meios intelectuais, espalhou-se por esferas e lugares governamentais, sedimentando um establishment de grande tamanho.

O pressuposto da democratização da vida nacional – a preservação e alargamento da democracia política e o pluralismo em suas muitas dimensões – volta a se colocar como questão central do presente momento eleitoral, pois pairam sobre o país nuvens estranhas, perigosas, se Lula, o PT e o governo retomarem o ímpeto – detido pelas movimentações de opinião pública de junho – com que vinham construindo o establishment, e se conseguirem minorar a erosão da condenação dos mensaleiros.

Logradas essas recuperações, talvez o “nós e eles” venha dar ao ex-presidente atributo ainda forte para tentar reger as coisas brasileiras e levá-las para dentro do seu imenso bloco oficialista. Em todo caso, a retomada da iniciativa, mesmo sem o fôlego anterior às passeatas dos jovens, movendo establishments e máquinas eleitorais desde Brasília e pelos estados e municípios, terá grande repercussão na eleição presidencial.

Prof. da UFRRJ e autor do livro Agraristas políticos brasileiros, Brasília: FAP-NEAD, 2007.

Fonte: “Gramsci e o Brasil” 

Uma herança pra ninguém botar defeito – Alberto Goldman

Como tudo na vida uma coisa não tem explicação não é porque ela não exista. É porque ainda não a conhecemos. E isso pode levar a conclusões erradas. Será um paradoxo, enquanto as explicações forem insuficientes.

É o que acontece com os dados de novembro divulgados pelo IBGE. A taxa de desocupação caiu para 4,6% e a renda média subiu, em um ano, em reais, de 1.908 a 1.965, isto é, 3%. Poderia ser o paraíso se outros dados, extremamente negativos, não precisassem ser levados em conta.

Que dados são esses? Vamos lá! De novembro de 2012 a novembro de 2013 houve uma queda de 0,7% no número de vagas ( postos de trabalho disponíveis ), equivalente a 170 mil trabalhadores. Também o número de pessoas empregadas e interessadas em trabalhar caiu em novembro, segundo a Pesquisa Mensal de Emprego, principalmente entre mulheres e jovens de 18 a 24 anos. O total de pessoas que não trabalhavam nem queriam trabalhar, que em novembro de 2012 era de 15,88 milhões, passou a ser de 16,85 milhões em novembro de 2013. Um milhão de pessoas a mais!

De Janeiro a Novembro de 2012 a geração de empregos foi a menor em dez anos. Com a queda de empregos em Dezembro, que já é tradicional, o resultado deste ano, que até agora é a criação de 1.547.000, será ainda pior.

Outro dado importante é que no Brasil existem 20,6 milhões de pessoas que recebem um salário mínimo da Previdência, como aposentadoria ou assistência social e o Bolsa Família beneficia algo como 50 milhões. Isso pode explicar em parte a retirada de pessoas do mercado de trabalho, mas certamente, não é a única explicação.

Sem dúvida o quadro do emprego no Brasil impacta o potencial de crescimento econômico que, como sabemos, não ultrapassa índices de 2% ao ano do Produto Interno Bruto ( PIB ). Ao mesmo tempo o baixo crescimento impacta a geração de postos de trabalho. Em comparação com os números de novembro de 2012, o pessoal ocupado na indústria caiu 3,9%, na construção caiu 4,4% e nos serviços domésticos caiu 12,2%. No comércio e na prestação de serviços, deu-se algum aumento.

Em 2014, com o possível aumento da população economicamente ativa (PEA), deveremos ter taxas de desocupação maiores. E, mesmo com a previsão do aumento das taxas de juros, não se pode esperar a queda do índice de inflação.

Do ponto de vista das repercussões políticas nesse ano eleitoral, com o crescimento do PIB modesto, os investimentos congelados, a inflação contida às custas da Petrobrás e das tarifas do setor elétrico e dos serviços prestados pelos Estados e Municípios, as contas externas se deteriorando e o equilíbrio fiscal indo pra cucuia, o governo vai tentar se “segurar” empurrando o agravamento da crise através do aumento do crédito ao consumidor, com a única finalidade de reeleger a presidente. Um cenário sombrio. E, qualquer que seja o novo presidente, haverá de enfrentar uma herança pra ninguém botar defeito.

Alberto Goldman, vice-presidente nacional do PSDB

Vitória contra o insulto - Ariel Dorfman

Para escritor, a surra eleitoral de Michelle Bachelet em Evelyn Matthei foi plebiscito sobre o futuro do Chile e marcou o fim da sombra pinochetista

A surra que Michelle Bachelet deu em Evelyn Matthei no segundo turno das eleições presidenciais no Chile, domingo passado, foi motivo de grande alívio para o país e, evidentemente, também para mim. Os 25 pontos de vantagem de Bachelet sobre a adversária conservadora (62% para míseros 37%) não representam apenas um plebiscito sobre o rumo futuro que o Chile seguirá depois de quatro anos de governo direitista de Sebastián Piñera. É ao mesmo tempo uma maneira de fazer com que o Chile avance na difícil epopeia de enterrar o passado ditatorial.

A alegria que me proporciona a enorme humilhação sofrida por Evelyn Matthei tem raiz pessoal. Numa certa ocasião passei pela desagradável experiência de ver em ação, de perto, a candidata que acaba de ser derrotada. O encontro - se é que posso chamá-lo assim - aconteceu casualmente no dia 8 de outubro de 1999, em Londres. Um ano antes, os ingleses haviam posto na prisão o general Augusto Pinochet, por crimes contra a humanidade, e naquele dia se esperava que o juiz britânico Ronald Bartle decidisse se havia razões para extraditar o ex-ditador chileno para a Espanha. Como estava em Londres de passagem para assistir com minha mulher, Angélica, a um festival literário, decidi ir caminhando de manhã cedo até o Tribunal de Bow Street.

Fui recebido por um barulho ensurdecedor. Separados por um forte contingente policial, dois grupos de chilenos se enfrentavam com fúria. No lado mais numeroso, homens e mulheres que haviam sido torturados pela polícia secreta de Pinochet antes de serem expulsos do país queriam calar aos gritos o outro lado vociferante, que acabava de chegar de avião a Londres para dar apoio a seu herói preso. Segundo os boatos, as passagens desse grupo de Santiago para Londres e, evidentemente, a estadia, corriam por conta da Fundação Pinochet, organizadora dos "pinotours", como eram jocosamente chamados.

Imediatamente, das entranhas raivosas da multidão pinochetista surgiu uma figura que eu vira apenas em fotos e na televisão. Era Evelyn Matthei, na época senadora, recém-chegada de Santiago, famosa pela vulgaridade com que tratava os adversários. Mas nada me preparara para a cloaca de impropérios que brotaram de sua boca. Ela insultava os exilados com uma série de xingamentos chulos que, por discrição, prefiro não reproduzir, mas desmereciam a mãe ou a orientação sexual dos que, a poucos passos dela, clamavam por justiça.

A grosseria da senadora era ainda mais chocante por provir de uma mulher elegantemente vestida, cujas mãos levantadas como garras haviam tocado delicadamente piano, uma vocação que, para cúmulo da ironia, perseguira precisamente nessa mesma Londres, décadas antes. Mais inquietante foi a lenta percepção de que aqueles aos quais ela dirigia seu ataque verbal ouviam as mesmas palavras contundentes que haviam acompanhado a tortura sofrida nos porões da ditadura. A inflamada pinochetista reproduzia, suponho que inconscientemente, uma situação traumática, fazendo com que as vítimas voltassem ao momento de sua mais brutal humilhação.

Lembrando a vileza daquele momento 14 anos mais tarde, me dou conta de algo que, na ocasião nem eu nem ninguém poderia ter previsto: Michelle Bachelet ouvira uma enxurrada de ofensas semelhantes enquanto a ameaçavam e espancavam ao ser presa, com a mãe, Ángela Jería, em janeiro de 1975. Sua culpa foi ser um membro da família do general Alberto Bachelet, que aceitara um cargo ministerial no governo socialista e democrático de Salvador Allende. Quando Allende foi derrotado, no dia 11 de setembro de 1973, o general Bachelet foi preso como tantos outros, e pagou com a vida a lealdade à Constituição. Em março de 1974, morreu de enfarte em consequência das torturas sofridas.

Sinto-me intimamente satisfeito, portanto, pelo fato de Michelle Bachelet ter vencido precisamente a mulher que, em Londres, maltratou seus companheiros de infortúnio. A vitória torna-se ainda mais significativa quando examinamos a história pessoal das duas concorrentes. Ambas se conhecem desde pequenas, quando brincavam juntas num bairro de Antofagasta, onde seus pais, oficiais das Forças Armadas, estavam destacados. Muito se escreveu - eu, inclusive - sobre a circunstância extraordinária de que Fernando Matthei, pai de Evelyn, fosse o melhor amigo de Alberto Bachelet. E que, meses depois do golpe de Estado, Matthei fosse nomeado diretor da Academia da Força Aérea e, embora tendo escritório nas proximidades do porão onde maltratavam seu camarada de armas, não o visitasse nem levantasse a voz para ajudá-lo. Se o fizesse, não chegaria a ser ministro da Saúde de Pinochet nem, pouco depois, membro da junta militar por 13 anos.

Os filhos não são responsáveis pela covardia dos pais, nem tampouco por seus crimes. Mas vale ressaltar que Evelyn, enquanto os sicários de Pinochet chutavam e interrogavam sua companheira de infância, estudava economia na Universidade Católica do Chile, onde imperavam os Chicago boys, seguidores fanáticos de Milton Friedman, guru do extremo liberalismo dos mercados. Suas políticas neoliberais de capitalismo selvagem e repressão dos direitos dos trabalhadores converteram-se na ideologia dominante da ditadura - medidas cruéis que Evelyn Matthei continuaria defendendo como deputada e senadora, com a restauração da democracia, em 1990.

É difícil avaliar até que ponto influiu nos eleitores a genealogia que unia e dividia as duas candidatas, considerando que durante a recente campanha nenhuma delas se referiu a esse contrastante e coincidente passado. Ao contrário, enfatizou-se, e com razão, o futuro, debatendo qual das duas poderia resolver os urgentes problemas que afligem o país, sua vergonhosa desigualdade, seu sistema educacional degradado pela avareza, e a necessidade de mudar a Constituição autoritária, fraudulentamente instaurada por Pinochet em 1980 e ainda hoje carregada de resíduos indignos.

Os chilenos declararam, com toda a clareza, que aspiram a um país mais justo e digno. Mas é inevitável que a decisão da cidadania seja vista também, devido aos sobrenomes e às trajetórias das concorrentes, como um plebiscito sobre o sujo legado da ditadura. Os chilenos não desejaram ser governados pela mulher que fora a Londres para defender o tirano responsável pela morte de tantos compatriotas. Eles optaram, antes, por uma mulher que também foi vítima daquele terror e conseguiu sobrepor-se ao assassinato do pai, a seu passado e a suas tristezas para tornar-se símbolo de um Chile no qual ninguém será submetido a tais ultrajes.

A única coisa inquietante da disputa de 15 de dezembro foi a enorme abstenção, que chegou a inusitados 58% do eleitorado. Por que tantos cidadãos não se deram o trabalho de votar? Por apatia e comodidade? Pela certeza do triunfo de Bachelet? Ou porque sentem que os políticos e os partidos tradicionais não representam os interesses da maioria? Será que os jovens, os que mais se abstiveram, acreditam que a solução dos dilemas do Chile se encontra na crescente e maciça mobilização de vastos setores da sociedade, constantemente menosprezados pelos poderosos de um e de outro lado?

Conheceremos a resposta nos próximos anos. Enquanto isso, a simbólica surra levada por Evelyn Matthei é também, embora não o saibam ou não se importem, uma vitória para os que deixaram de votar. O país inteiro abriga hoje a esperança de que, por fim, teremos vencido, de uma vez por todas, a sombra ofensiva de uma ditadura que nos devora há mais de 40 anos.

Tradução de Anna Capovilla

Ariel Dorfman é um escritor chileno. Seu livro mais recente é Entre Sueños y Traidores: un striptease del exilio (Seix Barral)

Fonte: O Estado de S. Paulo / Aliás

O fator Skaf - Igor Gielow

O ex-presidente Lula tem uma obsessão: desalojar os tucanos do comando do Estado de São Paulo, última cidadela oposicionista com poder para enfrentar a hegemonia liderada pelo PT no país.

Para tanto, Lula criou até uma mitologia própria sobre o Estado que o abrigou, acusando o tucanato de ser a última expressão autocrática de uma linhagem que remonta aos barões do café. Não por acaso, classifica o movimento de 1932 de golpe.

O momento tenderia a favorecer Lula, que logrou o primeiro êxito ao colocar o poste Fernando Haddad na prefeitura paulistana. Geraldo Alckmin sofre o desgaste das duas décadas de seu grupo no poder, e as graves suspeitas envolvendo o cartel dos trens pairam em nuvens carregadas.

Para a "Missão Bandeirantes", Lula sacou da cartola o ministro Alexandre Padilha (Saúde). Desconhecido e jovem, ele poderia emular a trajetória de Haddad na capital e avançar além dos tais 30% de eleitorado cativo do PT no Estado.

Hoje ele tem um dígito nas pesquisas, mas é consenso que irá crescer. Resta saber quanto, ainda mais sob o impacto da hecatombe que foi o primeiro ano da gestão de Haddad.

Aqui entra um fator imponderável: a candidatura do peemedebista Paulo Skaf, o presidente da Fiesp que tem feito uma pré-campanha tão descarada que até o abúlico TSE já emitiu sinais de que ele pode se dar mal.

A exposição ampla deu a Skaf um patamar sólido de 20% das preferências. Até há pouco tempo, Padilha contava com isso para forçar o segundo turno com Alckmin, assumindo, é claro, que seria ele o adversário.

Agora Skaf briga com Haddad sobre o IPTU paulistano, tema sensível àqueles que Padilha quer conquistar.
No PT, isso reforça a ideia de que as bandeiras do prefeito são danosas ao partido, mas há os que identificam em Skaf mais do que um "tertius" útil como Celso Russomanno foi em 2012, e sim uma ameaça. De todo modo, o sinal amarelo está aceso.

Fonte: Folha de S. Paulo

Personagem do ano - Dora Kramer

Para o bem ou para o mal, de quem se falou mesmo em 2013 na cena política foi de Joaquim Barbosa, alçado à condição de celebridade por sua atuação no caso do mensalão, como relator e presidente do Supremo Tribunal Federal na fase final do julgamento.

Desde então se especula sobre a possibilidade de o ministro se candidatar à Presidência da República. Tempo ele tem: magistrados podem se filiar a partidos até seis meses antes da eleição, enquanto para os demais interessados em se candidatar o prazo é de um ano.

Popularidade tampouco falta a Barbosa: é aplaudido e homenageado por onde passa; na última pesquisa do instituto Datafolha, o nome dele foi incluído. Apareceu com 15% das intenções de voto, na frente de Aécio Neves (14% nesse cenário) e de Eduardo Campos (9%). Fica atrás, bem distante, da presidente Dilma Rousseff (44%).

A questão é: ele teria vontade? Sondado a respeito, o ministro não confirma nem desmente. Essa dubiedade, junto com a disposição já insinuada de antecipar sua aposentadoria do STF por julgar que cumpriu o seu papel, alimenta as especulações.

A versão corrente entre políticos é a de que Barbosa "joga para a plateia" com o objetivo de disputar votos. O fato é que ele cogita, sim, entrar na política e vem se aconselhando com gente do ramo para avaliar essa possibilidade.

Aos interlocutores disse que não rejeita concorrer à Presidência. Acredita que, se o fizesse, estaria dando razão às acusações de que conduziu o julgamento do mensalão com a finalidade de angariar apoio político e eleitoral.

Sobre a hipótese de vir a compor uma chapa como candidato a vice-presidente, não abre nem fecha portas. Mas aí haveria o mesmo problema. Obviamente ele não concorreria por partido governista - até porque um dos conselheiros mais frequentes é marcadamente de oposição -, o que também daria margem a críticas do PT em relação à conduta dele no Supremo.

Tal comprometimento da figura de Joaquim Barbosa não interessaria a ele nem ao candidato a presidente que porventura viesse a tê-lo como companheiro de chapa.

A melhor porta de entrada na política, na avaliação resultante das consultas feitas pelo ministro, seria uma candidatura ao Senado pelo Rio de Janeiro.

Embora a maioria dos partidos diga que a filiação de Joaquim Barbosa não seria do interesse deles, nenhum o recusaria como cabo eleitoral. O apoio do ministro é tido como um ativo imperdível.

Uma enquete feita pelo Estado no início de dezembro com as 32 legendas existentes no Brasil mostrou a rejeição de 16 delas (justamente as maiores) a abrigar uma candidatura dele à Presidência. Oito outros partidos disseram que o assunto teria de ser "muito discutido internamente" e sete (todos nanicos) o aceitariam de bom grado. Só o PT negou-se a responder.

Houve "nãos" peremptórios. "Deus me livre", disse o presidente do PR; "No PP, não", rechaçou a direção; "Fugimos de filiações oportunistas", afirmou o presidente do PTB.

Mas houve também uma negativa propositadamente ambígua: "Nosso respeito pelo ministro é tão grande que sequer aventamos essa hipótese", disse o senador Aécio Neves, presidente e provável candidato do PSDB, partido forte em Minas e São Paulo e que anda precisando de reforço justamente no Rio, domicílio eleitoral do ainda presidente do Supremo.

Trunfo. A ex-ministra Ellen Gracie, primeira mulher a assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal, está filiada ao PSDB. Assinou a ficha no último dia 5 de outubro.

Bons ventos. Em 2013, ficamos por aqui. Ótimo Natal, esplêndido ano-novo e voltamos a nos encontrar no dia 7 de janeiro.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Alfabetização atrasada - Merval Pereira,

Um dos maiores problemas que os educadores veem no Plano Nacional de Educação (PNE), projeto de lei enviado pelo governo federal ao Congresso em dezembro de 2010 e que somente no próximo ano deverá ser aprovado, se refere à alfabetização.

No projeto original a meta era alfabetizar as crianças “até os 8 anos”. O relator na Comissão de Educação do Senado, o tucano Álvaro Dias, alterou a idade máxima para 7 anos, mas afirmando que, até o quinto ano de execução do PNE, a idade deveria ser de 6 anos. O substitutivo do PMDB colocou esse objetivo para “até 10 anos” de execução do plano.

O sociólogo Simon Schwartzman, presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), chama a atenção para a necessidade de começar a boa escolarização mais cedo, ainda na pré-escola, porque déficits de formação de vocabulário e outros nos primeiros anos podem afetar os estudantes pelo resto da vida.

“Mas as pré-escolas precisam ter qualidade, e isto é caro, e a maioria das que tem sido criadas no Brasil nos anos mais recentes não passam de depósitos de crianças. E mesmo se a pré-escola for boa, seus resultados se perdem, se as escolas mais tarde continuarem de má qualidade”.

Ilona Becskeházy pesquisadora de políticas públicas educacionais, ex-dirigente da Fundação Lemann e comentarista de educação da Rádio CBN, diz que a regra deveria ser alfabetizar aos 6 anos o mais rapidamente possível, porque a não alfabetização é que tira os alunos da escola mais para frente.

“Com os alunos entrando na escola aos 4 (mais de 80% já entram), não faz sentido esticar até os 8, além do que na escola privada aos 6 os alunos já escrevem pequenas redações e leem textos simples sozinhos”.

O grande problema é que o Pacto de Alfabetização define a idade errada, “mas para agradar ao governo e aos prefeitos do Nordeste, esticaram o prazo. Além do que pegaria muito mal para a presidente um plano que desdiz claramente o maior projeto dela na área de educação”.

O relatório da Unesco de 2012 sobre repetência no ensino primário tem um gráfico que a educadora classifica de “chocante”, mostrando que não alfabetizar na pré-escola até os 6 anos, “é um crime com o país e com as crianças. Só ditaduras e protonações quartomundistas permitem essa barbaridade, como mostra o gráfico. E nós”.

Para Ilona Becskeházy “deixar o parâmetro aos 8 anos, ou permitir flexibilidade nesse ponto crucial do trajeto educacional de uma pessoa ou país, vai nos deixar na vala de lama que nos metemos por negligenciar educação por tanto tempo”.

Ela diz que até mesmo a base de apoio do governo já se convenceu de que a idade do Pacto da Alfabetização está errada, mas atribui a “questões eleitoreiras” a decisão de postergar o prazo de alfabetização: os prefeitos, principalmente do Nordeste, acham que vai ser pressão demais sobre eles, mesmo que o país já esteja gastando bilhões para colocar as crianças na escola desde os 4 anos e que o Pacto pela Alfabetização tenha adicionado R$ 3 bilhões à conta.

“Alguém precisa explicar o que fazem as crianças dos 4 aos 8 anos. Nas escolas privadas, aos 5 anos as crianças já estão escrevendo muitas palavras e começando a ler e, nas favelas, as mães pagam R$ 20, 30, 50 por mês a ‘explicadoras’ que ensinam seus filhos a ler até os 6, pois veem os filhos das suas patroas lendo nessa idade”.

Para Ilona Becskeházy, “se não estão aprendendo a ler/escrever, a culpa é da escola e não do aluno”.

Fonte: O Globo

Capitalismo de Estado patrimonialista – André Lara Resende

O sentimento em relação ao Brasil no exterior mudou em 2013. O otimismo no País já vinha em queda há algum tempo, mas a percepção externa parece ter finalmente alcançado - e até mesmo ultrapassado-o recente desalento doméstico, A evidente deterioração da situação fiscal brasileira - apesar do uso de todo tipo de manobras contábeis para impedir que a extensão da piora fique clara -é o fator mais preocupante para analistas e investidores estrangeiros. A queda do superávit primário se refletiu num aumento do prêmio de risco, medido pelo seguro financeiro contra a probabilidade de calote -os chamados CDS - da dívida brasileira.

A alta do prêmio de risco, se entendido como a probabilidade de o país vir a ter problema de solvência com sua dívida pública, como ocorreu no passado recente, parece-me despropositado. A dívida em moeda estrangeira, especialmente a dívida pública, é pequena, não passa de 5% do PIB. Mesmo a dívida bruta total, que os truques contábeis têm menos capacidade de maquiar, está entorno de 60% do PIB. É alta, mas está longe de ser preocupante. O prêmio de risco reflete um desconforto mais difuso sobre o futuro do país. Os problemas são muitos, a grande maioria deles não é nova, mas há uma dimensão especialmente grave no atual quadro brasileiro: um Estado despreparado, patrimonialista, com objetivos próprios, dissociados da sociedade.

Desde a estabilidade monetária, o país vinha fazendo avanços sistemáticos na ordenação das finanças públicas. A carga fiscal passou de 25% para 36% do PIB e a dívida pública estava em queda. O processo foi revertido a partir de 2008. É preocupante, mas o problema do Estado brasileiro, hoje, não é de solvência, nem de descontrole macroeconômico, que poderia ser revertido, mas o fato de atuar contra a sociedade, a favor de seus interesses próprios. O custo do Estado está hoje perto de 40% da renda anual, equivalente aos mais altos do mundo, mas seu desempenho é abaixo da crítica.

O papel do Estado sempre foi um tema polêmico. Durante o século 20, tomou contornos ideológicos tão demarcados que praticamente inviabilizou o debate sereno e reacional. Parece inevitável que sociedades maiores e mais complexas sejam mais difíceis de ser administradas, exijam mais das empresas, das instituições e também do Estado. Há uma inexorável correlação entre tamanho e complexidades em toda empreitada humana. O mundo está superpovoado e definitivamente interligado pelo avanço das comunicações e da informática. A questão da escala e da complexidade está em toda parte, mas é ainda mais grave onde é menos reconhecido: na esfera da vida pública. As sociedades modernas se sofisticaram, tornaram-se mais complexas. O Estado foi obrigado a crescer para atender às suas novas funções.

Em livro de 2011, Vito Tanzii faz uma isenta e ponderada análise do inexorável avanço do Estado sobre todas as esferas da vida. O peso do Estado cresceu sistematicamente em toda parte do mundo. A proporção da renda extraída da sociedade pelo Estado, que era geralmente inferior a 10% no início do século 20, dobrou lá pela metade do século, até atingir mais de 40%, neste início de século 21.0 avanço foi sistemático, sobretudo a partir da década de 30.

Quando se exige mais do Estado, é razoável que o seu custo suba, mas espera-se que haja alguma correlação entre o custo e o serviço prestado, entre o custo e a qualidade do Estado. Não foi o que ocorreu no Brasil. Ao contrário, a rápida elevação recente da fatia da renda extraída da sociedade não foi acompanhada pelo investimento em infraestrutura. Houve séria deterioração da segurança pública e um dramático aumento da criminalidade. Não houve melhora digna de nota nem na educação, nem na saúde. O saneamento e o transporte público continuam abaixo da crítica.

Notícias recentes indicam que mais de 20% das pessoas - até 50% em alguns Estados - dizem terem sido vítimas de assaltos nos últimos doze meses. O nível de compreensão da língua e da matemática dos alunos brasileiros, segundo resultados recém-divulgados do PISA, exame de avaliação internacional de estudantes conduzido pela OCDE, é deplorável. O Brasil continua entre os últimos colocados, junto com a Albânia, a Tunísia e a Jordânia, muito abaixo do Chile e do México.

O World Economic Forum publica anualmente um índice global de competitividade. O Brasil caiu para o 56.0 lugar este ano. Ocupa o 80.° lugar em relação ao funcionamento das instituições e a 124.a posição em relação à eficiência do governo. A educação está na 121ª posição e a confiança nos políticos, na 136ª. Os bolsões de excelência tecnológica e a qualidade do empresariado ocupam a 36ª e a 39ª posições. As estatísticas e os rankings apenas confirmam uma realidade perceptível a olho nu: o Estado brasileiro não está à altura do estágio de desenvolvimento do País. A herança patrimonialista, misturada aos desafios de um país grande e desigual, a meio caminho para o mundo desenvolvido, criou um Estado caro, ineficiente e, sobretudo, disfuncional. Um Estado cujo único objetivo é viabilizar a expansão de seu poder e de suas áreas de influência. Um Estado que cria uma regulamentação kafkiana, com exigências burocráticas cartoriais: absurdas, cujo resultado é aumentar custos, reduzir a produtividade e complicar todas as esferas da vida. O patrimonialismo do Estado brasileiro, sua incapacidade de respeitar os limites e os deveres em relação à sociedade, tem longa tradição, mas toma novos contornos com a sofisticação da economia, com a chegada do País à sociedade do espetáculo e à democracia de massas.

O uso e o abuso das técnicas publicitárias, a criação de dificuldades de toda ordem para a venda de facilidades, a simbiose com cultura dos direitos especiais adquiridos e a aliança com grupos econômicos selecionados são a nova face do velho patrimonialismo.

Crítica. Diante da polarização do debate, a crítica ao patrimonialismo do Estado tende a ser desqualificada como uma reação conservadora aos avanços da cidadania. Cada uma das dimensões do progresso da cidadania - a civil, a política e a social - enfrentou, a seu tempo, fortes reações ideológicas.

O século 18 foi palco da luta pela cidadania civil, pelos direitos de opinião, de expressão e à justiça. No século 19, avançaram os aspectos políticos da cidadania, o direito ao voto e de participação política. Finalmente, no século 20, sobretudo a partir da década de 30, houve o avanço da dimensão social, com a criação dos sistemas de assistência e previdência, de educação e de saúde pública, capazes de garantir um padrão de vida mínimo para o exercício das demais dimensões da cidadania.

Adotado depois da grande crise do capitalismo do início dos anos 30 do j século 20, o Estado Assistencialista foi uma forma de aliviar as pressões sociais e o apelo do comunismo marxista, mas nunca deixou de enfrentar resistência. Resistência que encontrou na teoria econômica um poderoso aliado. A economia sempre teve um de seus pilares na tese de que os mercados competitivos tendem ao equilíbrio eficiente. O mercado competitivo 1 é uma construção intelectual, uma referência importante para a alocação eficiente de recursos, mas a polarização; ideológica levou a uma inferência indevida: a de que toda interferência governamental sobre o livre mercado seria; contraproducente.

Com a vitória incontestável dos direitos sociais, a teoria econômica paga até hoje o preço político de ser percebida como intrinsecamente conservadora. Toda crítica à falta de critérios e à ineficiência do gasto público, sobretudo se embalado como gasto social, é tachada de reacionária e desconsiderada. No Brasil de hoje, o velho patrimonialismo do Estado se esconde por trás do assistencialismo. O patrimonialismo indefensável reveste-se de assistencialismo inatacável. Desde que sob , o guarda-chuva de gasto social, toda sorte de abuso patrimonialista não admite questionamento.

A divisão do trabalho, o comércio internacional e os mercados são poderosos estímulos à criação de riqueza, mas dependem de leis, instituições e do Estado inteligentemente organizado. A complexidade do mundo contemporâneo exige do Estado ainda mais do que suas funções clássicas. As modernas sociedades democráticas requerem, necessariamente, algum tipo de assistencialismo distributivista, o que exige a coordenação do Estado. O desafio é ter um Estado competente, que contribua para uma sociedade melhor e cujos serviços justifiquem seu custo.

Um seminário recente, em Viena, em homenagem a Peter Drucker, reuniu expoentes da administração para discutir o tema da complexidade no mundo contemporâneo. Concordaram que a gestão dos negócios está mais complicada do que jamais foi e que a capacidade de lidar com a complexidade é prioridade na agenda dos empresários. Como em todas as outras esferas da vida contemporânea, os homens de negócios são confrontados com muito mais de tudo a todo tempo.

Duas linhas alternativas de interpretação se delinearam. A primeira é de j que é preciso simplificar, concentrar em alguns poucos objetivos, dar às empresas um foco e uma direção para os que nela trabalham, ainda que por imposição, de cima para baixo. A segunda interpretação sustenta que a maior complexidade é apenas uma nova ordem, que exige a revisão do modo de se administrar. A revolução das comunicações e da informática tornou obsoleta a administração linear, de comando e controle, que deve ser substituída por uma nova, baseada em redes espontâneas de módulos autônomos. O mundo contemporâneo é não linear e as empresas, assim como as demais instituições, ainda não se adaptaram a essa não linearidade. O caminho a ser seguido é reconhecer a nova ordem e não insistir na tradicional gestão de comando e controle, pois é a imposição de um estilo anacrônico de gestão que é contraproducente na complexidade contemporânea.

As duas interpretações exprimem as alternativas para se lidar com a complexidade contemporânea, não apenas na vida empresarial, mas também na vida pública. A opção por simplificar, ainda que de cima para baixo, por concentrar em alguns objetivos claros e dar uma direção para o país, tem enorme apelo diante das dificuldades da democracia representativa. O encanto provocado pelo novo capitalismo de estado chinês é exemplo do apelo da simplificação autoritária.

Como demonstrou a experiência soviética, é sempre possível acelerar o crescimento por meio da mobilização centralizada de poupança e do investimento estatal, com base em grandes planos, formulados a partir de um "projeto nacional" definido pelo Estado. A estratégia demonstrou ser bem-sucedida para as economias de baixa renda, onde as taxas de poupança e investimento são limitadas pelas necessidades básicas de consumo. Enquanto se percorre caminhos tecnológicos conhecidos, é possível acelerar autoritariamente o crescimento, mas quando a economia se aproxima da fronteira tecnológica, a estratégia do planejamento estatal deixa de obter resultados.

Tendo aprendido as lições do fracasso do planejamento central soviético, o capitalismo de estado chinês compreendeu que não poderia prescindir dos mercados. Usa as companhias esta; tais para garantir investimentos nos setores considerados estratégicos e utiliza empresas privadas escolhidas para dominar os mercados. Os resultados foram extraordinários, mas as tensões e desafios têm aumentado. Embora a China tenha dado sinais de que pode vir a aumentar o papel dos mercados, é pouco provável que a flexibilização mude a essência do modelo. Seu objetivo é manter o poder político concentrado na mão do Estado e a maximizar a probabilidade de perpetuação do governo.

Há uma diferença fundamental entre o Brasil e a China. A China tem uma tradição milenar de autoritarismo burocrático competente. O custo dó Estado é menos de 30% renda e está em queda. Já a participação do Estado no investimento, na chamada formação bruta de capital fixo, é de 21% do PIB. Ou seja, só o investimento direto do Estado chinês é uma proporção maior da renda nacional do que todo o investimento brasileiro, público, privado e estrangeiro, que não chega a 19% do PIB. Na China, o Estado é competente, custa pouco e investe muito. No Brasil, o Estado é caro e incompetente, não investe, nem cumpre suas funções básicas.

É questionável se o investimento estatal direto ainda seria capaz de fazer a diferença e acelerar o crescimento no Brasil. O modelo foi adotado por aqui durante o regime militar. Depois de reformas modernizadoras, inteligentemente concebidas e adotadas com competência, as taxas de crescimento atingiram níveis de até dois dígitos, durante o chamado "milagre econômico", da primeira metade da década de 70. O seu esgotamento, a partir da década de 80, deixou um triste legado: o Estado deficitário e endividado, as empresas estatais esclerosadas e duas décadas de estagnação sob o signo da inflação crônica.

Modelo. Na última década, o Brasil se beneficiou do ganho nas relações de troca com o exterior. A alta dos preços dos produtos primários, provocada pela demanda da China, significou uma expressiva transferência de renda para o Brasil. Os governos do PT foram suficientemente inteligentes para manter as bases da política macroeconômica, mas passaram a desmontar as reformas que viabilizaram a estabilidade monetária. O processo se acelerou a partir ; da crise de 2008. Aparelharam o Estado, criaram novas estatais e elegeram parceiros privados incompetentes. Com a desculpa de praticar uma política anticíclica, expandiram o gasto corrente do governo, mas não investiram em infraestratura. O resultado é conhecido: baixa produtividade, uma economia que não cresce e contas públicas que se deterioram.

I Não é possível saber se o capitalismo de estado chinês continuará bem-sucedido, mas uma coisa é certa: o capitalismo chinês requer um - Estado competente e autoritário. No Brasil, não temos a requerida competência, nem desejamos - quero crer - o autoritarismo. Diante da complexidade do mundo contemporâneo, a tentação da solução autoritária estará sempre presente, mas o caminho mais promissor é o da alternativa delineada na conferência de Viena: não insistir na tradicional gestão centralizada, de comando e controle, mas avançar na descentralização. Um Estado autoritário e patrimonialista, sustentado pela demagogia, o marketing e a intimidação, onde apenas as aparências democráticas são respeitadas, é o caminho mais rápido para volta ao subdesenvolvimento. A fórmula, como demonstra sua aplicação na Argentina e em outros países vizinhos, é devastadora.

Não há como bem governar com o Estado disfuncional. A primeira tarefa de quem pretende fazer um bom governo será a de reconstruir o Estado. No lugar de insistir numa reforma de cima para baixo, de comando e controle, deveríamos experimentar a descentralização. Deveríamos voltar à federação, dar autonomia aos Estados e aos municípios em todas suas esferas, desde a fiscal, até a segurança, a saúde e a educação. Como escreveu Hirschman, no prefácio da edição alemã do seu Exity Voice and Loyality: "Assim como os economistas, com a ênfase nas virtudes da competição (i.e. da "saída"), não deram atenção à contribuição da "voz", os cientistas políticos, com seu interesse na participação política e no protesto, negligenciaram o possível papel da "saída" na análise do comportamento político." Tenho a impressão de que mais possibilidade da opção de "saída" em relação à "Voz", isto é, de ter a opção de se mudar ao invés de protestar, é mais importante do que nunca, num mundo complexo e interligado.

Os mercados não são milagrosos, mas um pouco de competição no sistema político, sob o guarda-chuva de uma verdadeira federação, pode ser a única forma de viabilizar a complexidade contemporânea com a democracia e a existência de Estados eficientes e com mais respeito pelos contribuintes.

Economista e ex-presidente do BNDES

Fonte: O Estado de S. Paulo

Painel - Vera Magalhães

Feliz Natal
Dilma Rousseff fará seu último pronunciamento em rede nacional de rádio e TV amanhã à noite. A presidente fará balanço otimista de 2013, apesar de terminar o ano com aprovação (41%) bem abaixo do pico de março (65%). Vai ressaltar o recorde da menor taxa de desemprego e os cinco pactos propostos após os protestos de junho. Segundo auxiliares, orientada por pesquisas qualitativas, a petista irá falar do Mais Médicos, o programa mais popular criado em seu governo.

Pé... Tucanos que acompanharam a novela atribuem a Andrea Neves, irmã de Aécio Neves, a decisão final de romper a parceria do presidenciável tucano com o marqueteiro Renato Pereira.

... do ouvido Aliados de Aécio dizem que Andrea, que cuida da imagem do senador mineiro e coordena as questões de comunicação de suas campanhas, reclamou em várias ocasiões da tentativa de Pereira de "impor sua visão" sobre a pré-campanha.

Próspero... Chamou a atenção da cúpula petista artigo do ex-governador Paulo Hartung (PMDB-ES) com críticas ao governo federal e previsões pessimistas para o desempenho da economia nacional em 2014.

... Ano Novo? O ex-presidente Lula e o vice-presidente, Michel Temer, tentam convencer Hartung a ser candidato ao governo capixaba, com apoio do PT, contra Renato Casagrande (PSB). O tom das críticas indica que ele não vai topar entrar na bola dividida com o aliado.

Trinca O PT procura alguém para ser responsável pela criação de TV da propaganda de Alexandre Padilha na campanha. Essa pessoa, que deverá passar pelo crivo de João Santana, dividirá o comando da comunicação com os jornalistas Eduardo Oinegue e Valdemir Garreta.

Habitué Colaboradores garantem que Geraldo Alckmin (PSDB) ainda não escolheu Nelson Biondi como seu marqueteiro. Mas, entre segunda e sexta-feira, o publicitário esteve três vezes no Palácio dos Bandeirantes.

Às claras Biondi, que tem contrato com o PSDB, mas nenhum vínculo formal com o governo, circula com desenvoltura pelo palácio.

Poço Em conversa recente com um governista, a presidente da Petrobras, Graça Foster, se queixou dos ruídos na definição da política de preços dos combustíveis.

Cotação Graça demonstrou insatisfação com o desfecho do episódio e confessou que teme que haja nova onda de rebaixamento da classificação de risco da empresa nos próximos meses.

Dois em um Às vésperas da reforma ministerial, a cúpula do PMDB diz que indicar Vital do Rêgo (PB) para a Integração Nacional atenderá às duas bancadas do Congresso. A mãe do senador, Nilda Gondim, é deputada federal. "Melhor e mais econômico", diz um cacique.

Clima... Durante confraternização no Palácio da Alvorada, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reclamou com Ideli Salvatti, diante de testemunhas, que a ministra garante a deputados a liberação de emendas, mas não avisa os titulares das pastas.

... quente Irritados com o ruído, parlamentares se queixam ao líder do partido, e atribuem a culpa aos ministros, que não têm recursos do Orçamento para fazer a liberação. A estratégia é chamada por parlamentares de "cheque sem fundo''.

Que tal? Em tentativa de aproximação com o PR, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, indicou recentemente a dirigentes do partido que abrirá espaço para a sigla em seu governo na reforma do secretariado que deve fazer no início do ano.

Hoje, não A legenda se reuniu e decidiu que não quer cargos por enquanto, mas aceita reabrir o debate a partir de fevereiro. O objetivo é incluir na negociação a aliança para a eleição estadual.

TIROTEIO

"Lula quer morar no Recife porque o IPTU e a passagem de ônibus dos governos do PSB são mais baratos que os de Haddad, do PT."
DO LÍDER DO PSB NA CÂMARA, BETO ALBUQUERQUE (RS), sobre o ex-presidente dizer que vai se "mudar" para Pernambuco para enfrentar Eduardo Campos.

CONTRAPONTO

Apertem os cintos
Fernando Collor (PTB-AL) contou aos colegas da Comissão de Infraestrutura do Senado, no dia 12, sobre a viagem que fez à África do Sul com Dilma Rousseff e outros ex-presidentes. Collor revelou que um dos assuntos do avião presidencial foi a proibição de doações eleitorais por empresas, mas evitou dar detalhes sobre a conversa.

--Estivemos 23 horas voando, conversando sobre assuntos os mais variados. Naturalmente, assuntos que, por mim, ninguém jamais ficará sabendo! --disse Collor, rindo.

Fonte: Folha de S. Paulo

Brasília-DF - Denise Rothenburg

E Cardozo diz não
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, recebeu oito deputados do PT para tratar da Proposta de Emenda Constitucional nº 15, um texto em análise na Câmara que transfere para o Congresso a prerrogativa de decidir sobre a demarcação de terras indígenas. O encontro foi cercado de sigilo porque os parlamentares saíram de lá com a missão de fazer tudo o que estiver ao alcance deles para evitar que a PEC 15 seja aprovada. Em tempo: na Casa, prevalece o argumento de que, se um município, para ser emancipado, precisa de autorização legislativa estadual, o mesmo deve ocorrer, no plano nacional, com as reservas indígenas.

A comissão especial que analisará essa proposta foi instalada no finzinho do semestre legislativo, depois de muita pressão por parte da expressiva da bancada ruralista. Com a firme decisão do governo de enterrar o projeto, pode começar por aí o grande êxodo do setor agropecuário da campanha pela reeleição da presidente Dilma Rousseff.

Ele não
Embora os cearenses citem Ciro Gomes como futuro ministro da Saúde, o PT encontrou um meio de convencer a presidente Dilma Rousseff a não entregar o cargo ao representante do Pros. Ciro, na opinião dos petistas e até dos peemedebistas, seria "indemissível" — uma vez fora do governo, viraria adversário no minuto seguinte. E ninguém nomeia alguém que não possa demitir.

Ele sim
O fato de o governador Cid Gomes ter sido um dos precursores do projeto Educação na Idade Certa em Sobral (CE) faz dele uma aposta para o MEC no lugar de Aloizio Mercadante. Por enquanto, não passa disso, uma vez que o PT não aceita abrir nenhuma de suas vagas aos aliados.

Assiduidade
Dos 513 deputados federais, apenas seis compareceram às 311 sessões deliberativas que a Câmara teve desde o início da legislatura, em fevereiro de 2011. São eles: Alexandre Leite (DEM-SP), Lincoln Portela (PR-MG), Manato (SDD-ES), Pedro Chaves (PMDB-GO), Reguffe (PDT-DF), e Tiririca (PR-SP). Nas comissões, Reguffe reinou absoluto. Foi único a ter 100% de presença nos colegiados que faz parte.

Convers@
de Domingo
No site www.correiobraziliense.com.br, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) defende o fim do financiamento das empresas às campanhas eleitorais. "O STF não está interferindo nas atribuições do Congresso ao analisar esse tema", diz ele.

Santinho!/ A presidente Dilma Rousseff ficou brava quando soube que seu discretíssimo chefe de Gabinete, Giles Carriconde (foto), seguindo a praxis normal de anos anteriores, tinha convidado o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, para o coquetel de fim de ano no Alvorada. O problema era o mal-estar que se criaria com o Partido dos Trabalhadores, que não engole a postura de Barbosa em relação ao mensalão.

Docinho!/ Para abrandar o constrangimento do PT por conta da presença de Joaquim Barbosa no coquetel, a saída foi convidar todos os integrantes da Suprema Corte. A presença maciça terminou por ajudar Dilma perante o eleitorado. Ela saiu da quase crise petista com ares de quem está acima de todas essas rusgas partidárias. E assim, o limão do convite a Barbosa virou uma limonada docinha, docinha...

Rio via Paris?!/ Os parlamentares estão assustados com os preços das passagens aéreas neste fim de ano. Quem teve algum imprevisto e precisou mudar a passagem encontrou valores em torno de R$ 3 mil para voar direto de Brasília até o Rio de Janeiro, na próxima sexta-feira. Daqui a pouco, se algum resolver ir ao Rio, via Paris ou Miami, por essas datas poderá dizer que escolheu o trecho por ser mais econômico.

Pegou/ O "vamos conversar?" com que Dilma Rousseff abordou a senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS), na semana passada no Senado, deixou os tucanos meio bicudos. Alguns acham que a presidente usou de propósito o bordão que o senador Aécio Neves fez ecoar nos programas de rádio e tevê do PSDB.

Fonte: Correio Braziliense

Política - Cláudio Humberto

Congresso, STF e os atos
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Marco Aurélio, advertiu que o Congresso não tem poder de cassar ato jurisdicional. Ele se referiu a ameaça do presidente da Câmara, deputado Henrique Alves (PMDB-RN), de anular decisão do Supremo Tribunal Federal por meio de um decreto legislativo, caso os ministros confirmem a tendência de proibir doações financeiras de empresas privadas para campanhas políticas. Marco Aurélio explicou que a decisão do TSE redefinindo o número de deputados, derrubada por decreto legislativo, era um ato administrativo. O presidente do TSE não crê em crise entre os poderes: "A não ser que vingue a Babel, e aí veremos o estágio democrático em que estamos". Marco Aurélio chama de "arroubo de retórica" as críticas de Henrique Alves: "O STF cumpre seu dever de guardião da Constituição". Além de Henrique Alves, Renan Calheiros criticou o STF e também o TSE, reclamando da "usurpação" do papel legislativo do Congresso.

Dirceu, o bibliotecário
José Dirceu (foto), 67 anos, terá que trabalhar até os 150 anos para pagar a multa imposta pelo STF no processo do mensalão, com os 30% recolhidos do salário de bibliotecário no escritório do advogado José Gerardo Grossi.

Caças
O surrealismo é parte do cotidiano cruel na ditadura comunista da Coreia do Norte, agora interessada nos caças Mirage "aposentados" pela FAB e que serão substituídos pelos suecos Gripen. Quem garante é o jornalista francês Franck Guillory, da revista on-line JOL Press, de Paris. O ditador Kim Jong-un quer montar um "esquadrão kamikaze" à moda japonesa, com suicidas levando bombas nos caças franceses.

Segredo
A negociação, diz ainda o site, é sigilo total, por conta das sanções da ONU contra a Coreia do Norte, desafiando Washington e Moscou.

Pechincha
Um general representante do maluco-filho da Coreia do Norte viria a Brasília nos próximos dias, para oferecer US$ 7 milhões por 12 caças.

Pressão
Pyongyang não revelou ao Brasil o objetivo da aquisição, mas exigiu a preservação dos sistemas de voo e ataque dos caças pra lá de usados.

Autistas
O ex-presidente Lula já nem se surpreende: escuta de ministros, lideranças partidárias, movimentos sociais e sindicalistas reclamações sobre a falta de diálogo no governo Dilma Rousseff.

Remédio
O especialista em turismo Geraldo Bentes ficou preocupado quando o barbeiro, em Brasília, disse que seus cabelos estão caindo. Mas caiu na gargalhada com o "remédio" sugerido: "Use boné do Fluminense..."

Bem na fita
O líder do PRB, George Hilton (MG), é cotado no Planalto para o cargo de vice-líder do governo em 2014 após defender, nas reuniões, a ordem da presidente Dilma de engavetar projetos que custam caro.

Na Morales
Já invejamos a Bolívia, que lançou um satélite segurado contra micos explosivos e exibiu o lançamento. O Brasil nem sabe onde caiu o seu.

Frase
"Não ofereci trabalho para o ministro, mas para o presidiário"
José Gerardo Grossi, advogado que está disposto a empregar José Dirceu

Contradição
O senador Paulo Bauer (PSDB) ironiza o fato de o PT ter perdido as últimas eleições em Santa Catarina, onde o comércio responde por 59% do PIB: "Onde tem gente trabalhando, Partido dos Trabalhadores não tem vez."

Soberba
Líder do PTB, Jovair Arantes (GO) critica a "soberba do governo" que, para ele, pode levar Dilma a perder apoio: "Eles dizem querer nossa participação, mas não adianta dar ministério um mês antes da eleição."

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

Direto de Brasília - João Bosco Rabello

A camisa de força do marketing nas campanhas é, senão causa única, a principal na dificuldade da oposição de assumir o protagonismo das mudanças desejadas pelos 60% dos eleitores entrevistados na última consulta popular.

A ditadura do marketing, classificação adotada como síntese desse processo, leva a classe política a fazer programas para ganhar eleições, produzindo peças de campanha para agradar aos eleitores, sem vínculo com a realidade do país. Uma espécie de manual do bem estar e da felicidade, que reúne as aspirações de todos os segmentos sociais.

Sua aplicabilidade é inviável, mas, como as campanhas são assentadas em promessas palatáveis a todos os gostos, pouco importa o compromisso com sua execução. Opera-se com base num cardápio cuja leitura emprenha pelos ouvidos. O depois é futuro.

Como todos tendem a focar os desejos e valores do eleitor médio, as campanhas ficam pasteurizadas, como bem assinalou o analista político Leonardo Barreto, em artigo para o broadcast político, da Agência Estado.

É um contexto que favorecerá sempre candidatos oficiais com índice de aprovação sustentável, acima dos 40%, porque ocuparão o vácuo de insatisfação com a visibilidade dada a atos de governo de grande impacto eleitoral.

É o que se testemunha no estágio atual cinicamente denominado de pré-campanha, cujo fato mais recente é a saída de cena do marqueteiro do PSDB, Renato Pereira, defensor de uma linha de trabalho aparentemente em oposição a esse círculo vicioso.

A saída da oposição pode estar no desafio de traduzir para a compreensão popular temas de média e grande importância para o país, excluídos dos debates de campanha pela complexidade que os tornam monótonos e desinteressantes, diante do modelo superficial imposto pelo marketing de resultados.

São temas, no entanto, que podem sensibilizar o eleitorado se eficientemente vinculados aos dia-a-dia do cidadão. Tamanho do Estado, choque de gestão, reforma tributária e Pacto Federativo soam como aramaico para o cidadão comum - e, em alguma profundidade, mesmo para iniciados na política.

Porém são de vital importância para todos. O pacto federativo, para ficar num exemplo, já merece há muito tempo a tradução de independência de gestão dos Estados, mostrando os benefícios que pode gerar para a solução de problemas que afetam o cotidiano de regiões cujas peculiaridades e interesses específicos não sensibilizam o governo central.

É muito mais que isso, mas a síntese é indispensável para se impor nos debates eleitorais sem espantar o eleitor .

Fonte: O Estado de S. Paulo

Panorama político - Ilimar Franco

A chapa Eduardo/Marina
O candidato do PSB, Eduardo Campos, espera convencer Marina Silva a ser sua vice. Ele quer fechar a chapa em janeiro. As suas intenções de voto dobram com a presença dela na chapa. A Federação das Indústrias de Brasília tem pesquisa, na qual, diante desta informação, Eduardo empata com Aécio Neves. Os tucanos estão apreensivos e os petistas com os olhos bem abertos. (Foram ouvidos 1.128 eleitores de 22 a 27 de novembro no Distrito Federal.)

A sorte está lançada
A oposição aposta na volta dos protestos na Copa e no desgaste da presidente Dilma, como em junho. O custo de sua realização e o preço dos ingressos seriam o combustível. O governo acredita que o fenômeno não se repetirá. A população estaria com medo de voltar às ruas depois que o movimento foi apropriado pela violência dos radicais. E, mais interessada no futebol e no desempenho do Brasil. Ninguém sabe o que vai acontecer. Mas a população está dividida sobre a validade de novos protestos na Copa. A Gazeta do Povo (PR) publicou pesquisa nacional do Instituto Paraná Pesquisas, na qual 47,6% apoiariam estas manifestações e 47,2% não.

“Não há como virar a página, porque é um fato relevante (o mensalão) que nossos adversários vão explorar. O PT vai ter que conviver com isso”.
Ricardo Berzoini
Deputado federal (PT-SP) e ex-presidente nacional do partido

O plano de voo de Lula
A manutenção da aliança PT/PMDB no Rio é o objetivo do ex-presidente Lula. Para segurar o PT no governo Sérgio Cabral (RJ), ele defendeu junto aos petistas que, até março, o próprio aliado vai se convencer que a candidatura Pezão é inviável.

O especialista
O vice Michel Temer convidou semana passada o presidente da Fundação Ulysses Guimarães, deputado Eliseu Padilha (RS), para integrar a coordenação da campanha à reeleição da presidente Dilma. Em 1998, Padilha foi um dos coordenadores, ao lado de Eduardo Jorge, da campanha à reeleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Bola fora
Desfeito o mistério. Na Esplanada dos Ministérios o comentário é que o gelo entre o ministro do STF, José Dias Toffoli, e a presidente Dilma é porque ela estaria preterindo suas indicações e sugestões para vagas no STJ e tribunais federais.

Aposentados querem mais
O presidente do Solidariedade, deputado Paulo Pereira da Silva (SP), está marcando conversas do tucano Aécio Neves com sindicalistas. A primeira delas será com os aposentados, dia 18 de janeiro. "Ele vai se comprometer com garantia de aumento real de salário", garante Paulinho. Na fila, reunião com José Rainha, do MST da Base.

Na lista de espera
Apesar de ministro, Moreira Franco (Aviação Civil) não tem a mesma relação com a presidente Dilma que Gustavo do Vale (Infraero). É com este que Dilma trata do setor. Vale era um dos poucos assessores do 2º escalão na recepção no Alvorada.

Espelho, espelho meu
No café da manhã com jornalistas, a presidente Dilma pediu para a repórter Luciana Lima: “Me imita agora!”. Dilma gostou, riu muito e partiu para o abraço. Dizem que o humorista Gustavo Mendes, imitador oficial, ficou no chinelo.

A bancada do PMDB no Senado vai aumentar. Depois de longo processo, é uma questão de dias o ex-governador Marcelo Miranda (TO) assumir.

Fonte: O Globo

O que pensa a mídia - editoriais de alguns jornais

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Demônios da Garoa - Trem das onze

Morte e Vida Severina – João Cabral de Melo Neto

O retirante explica ao leitor quem é e a que vai

— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.

Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.

Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,

a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.