sábado, 13 de setembro de 2014

Equipe de Marina muda propaganda para poupar Aécio

• Anúncio original criticava tanto o tucano quanto Dilma; nova versão só mantém menção à petista

• Nos últimos dias, aliados de Marina reclamaram dos ataques com pessoas vinculadas ao PSDB

Daniela Lima – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A campanha da presidenciável Marina Silva (PSB) mudou na última hora um anúncio produzido para o horário eleitoral, para centrar críticas na presidente Dilma Rousseff (PT) e poupar Aécio Neves (PSDB-MG), que aparece em terceiro lugar nas pesquisas.

O anúncio que a pessebista vai exibir na TV a partir deste fim de semana diz que "os jornais mostram que Dilma e o PT estão se desesperando e começando a apelar".

O texto é ilustrado com uma série de reportagens de diferentes veículos que mostram a ofensiva petista sobre Marina nos últimos dez dias.

Filme quase idêntico havia sido registrado na quinta-feira (11) na Justiça Eleitoral pela campanha de Marina.

A primeira versão incluía Aécio Neves entre os "desesperados". "Os jornais mostram que os adversários da Marina estão se desesperando e começaram a apelar", dizia o texto original.

Assim como na versão final, reportagens publicadas em jornais emolduravam a frase, mas, neste caso, os textos também traziam relatos da ofensiva tucana contra Marina Silva.

O final dos dois comerciais é o mesmo: "Tome muito cuidado com o que dizem por aí. Porque quanto mais a Marina subir, mais o nível dos adversários vai descer". As duas peças foram antecipadas pelo site da Folha.

Trégua
A alteração na propaganda ocorre no momento em que Marina reclama que os adversários estão trabalhando para "desconstruir" a sua imagem com ataques pessoais e que integrantes da cúpula de sua campanha trabalham para dissuadir o PSDB de dar continuidade aos ataques à ex-senadora.

Na última semana, diversos aliados de Marina fizeram contato com pessoas vinculadas à campanha de Aécio reclamando que, ao atacar a ex-senadora, o tucano estaria, na verdade, favorecendo a candidatura de Dilma.

Integrantes do comitê tucano responderam que Aécio briga pela vaga no segundo turno e não tem outra opção a não ser debater e estabelecer comparações entre a trajetória dele e a das rivais.

O tucano está quase 20 pontos percentuais atrás de Dilma e Marina nas pesquisas de intenção de voto.

Nesse cenário, a mudança no anúncio de Marina tem duas utilidades. Primeiro, faz um ajuste de foco mirando apenas Dilma, contra quem ela hoje efetivamente trava uma disputa. Segundo, faz um gesto público pela trégua com o mineiro.

Bandeira branca
O movimento dos marineiros pela bandeira branca tem incomodado alguns tucanos. A interlocutores Aécio se queixou do que chamou de "plantação excessiva" de notícias sobre acenos que o PSDB teria feito a Marina, prometendo apoio no segundo turno se Aécio ficar fora.

Publicamente, o tucano externou a contrariedade de outra forma. Disse, em sabatina do jornal "O Globo", na quarta-feira (10), que só enxerga dois caminhos: ou vence as eleições, ou será oposição.

Marina cobra programas de governo de Dilma e Aécio: 'assinar cheque em branco é perigoso'

• A presidenciável pelo PSB falou para empresários na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro

Juliana Castro – O Globo

RIO - Em discurso para empresários do Rio, a candidata do PSB à Presidência, Marina Silva, manteve o tom de críticas à presidente Dilma Rousseff (PT), lembrando o escândalo da Petrobras, e citando que o programa da petista no horário eleitoral mostra uma ilha de fantasia onde tudo funciona. Marina cobrou de Dilma e, também de Aécio Neves, candidato pelo PSDB, a apresentação de seus programas de governo.

— Assinar cheque em branco é perigoso. Onde estão os programas dos meus adversários? Que apresentem para que possamos fazer comparação — cobrou a candidata do PSB, durante o evento na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan).

Acompanhada do vice na chapa, Beto Albuquerque, Marina disse que está em jogo algo grandioso e que o eleitor vai escolher se vai votar em quem tem programa ou naqueles que têm promessas genéricas:

— Nesse momento, o que está em jogo é algo muito grandioso: se vamos ou não eleger um presidente com base em um programa ou com base apenas em promessas e diretrizes genéricas. Os dois candidatos não apresentaram programa e repetem que leram minuciosamente o nosso. Mas, por que não apresentam suas ideias para que possamos fazer o debate?

Marina disse ainda que o país está vivendo um caos no setor elétrico:

- Acho que o lugar mais simbólico desse colapso (na infraestrutura) é o setor de energia, porque se temos a pessoa mais importante nos postos mais importantes da República cuidadando deste setor e, desde 2010, ele vive à beira de um apagão, vamos imaginar o que acontece com os demais. A presidente dilma foi ministra de Minas e Energia, chefe da Casa Civil, e presidente da República e estamos vivendo um caos no setor elétrico.

'Dilma usa comigo a mesma tática que Collor usou com Lula'
Marina disse que a campanha do PT está usando com ela a mesma tática que Fernando Collor usou na campanha de 1989 contra Lula.

- Não vale tudo para ganhar uma eleição. Vi o Collor de Mello ganhar uma eleição do Lula usando a mesma estratégia que a presidente Dilma está usando e não foi um resultado bom para o país, porque dividiu o país. Quero ganhar uma eleição com base no debate, nas propostas e não na indústria da calúnia e da mentira, do boato, do preconceito, da difamação. Lutei muito quando faziam a mesma coisa que estão fazendo comigo na época que o Lula era candidato. O mesmo punhal enferrujado está sendo usado contra mim - afirmou.

Tecnicamente empatada com Dilma nas pesquisas, Marina centrou suas críticas mais na presidente do que em Aécio. A candidata do PSB disse que com o tempo de TV de Dilma dá para fazer um curta-metragem.

— Mas o discurso num programa eleitoral de onze minutos, que dá para fazer um curta-metragem, é onde se cria uma ilha da fantasia em que tudo funciona — criticou. - Foi dito para as mulheres que teriam 6 mil creches para seus filhos. Apenas 400 foram feitas em quatro anos e estão sendo feitas 700.

Meus adversários estão desesperados, diz Marina

Sem citar o PT, Marina declarou que aqueles que diziam querer proteger as empresas estatais da privatização faziam o discurso dissociado da prática porque depois envolveram a Petrobras em um escândalo. A candidata afirmou ainda estar sofrendo todo tipo de calúnia. E chegou a se comparar a líderes como o ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela e Martin Luther King, dizendo que ninguém lembra de seus algozes.

- Estas eleições estão difíceis, mas nunca tive tão animada. Mandela ficou 25 anos na prisão. Eu pergunto a vocês: vocês sabem os nomes dos algozes? Não sabemos. É preciso pesquisar, mas todo mundo sabe quem é Mandela. Houve um tempo em que ele era vendido como se fosse o supremo mal. Luther king a mesma coisa, Gandhi a mesma coisa - afirmou.

— Estou sofrendo todo tipo de calúnia, mas estou tranquila e serena porque eles estão apavorados pela possibilidade de perder e estamos apenas animados, mobilizados com a possibilidade de ganhar.

Marina lembrou também o escândalo na Petrobras para criticar Dilma:

- Não pode ter alguém para ter apenas pedaço do estado ou fazer o que esta sendo feito com a Petrobras. Queremos governabilidade programática.

A candidata disse querer governar com brasileiros tendo assumindo compromisso de que ficará apenas por quatro anos e "sabendo que vamos dialogar com aqueles que deveriam ter responsabilidade com nova república.

- Vai ser mais fácil dialogar com Fernando Henrique, com Lula, do que deve ter sido com o Antônio Carlos Magalhães, com (José) Sarney. A velha república precisa ser aposentada e nova república precisa assumir responsabilidades.

Comitê de buscas
Para o empresariado fluminense, Marina falou sobre o modelo de comitê de buscas para acabar com as denúncias de corrupção nas agências reguladoras. No comitê de buscas se inscreveriam técnicos experientes para exercer funções importantes nas agências. Com isso, os profissionais não teriam que se submeter às indicações políticas.

- O que vamos fazer é aperfeiçoar o sistema com a nomeação de pessoas que sejam quadros técnicos, que possam ir para esses postos pelo mecanismo do comitê de busca, onde poderemos, assim, colher quadros competentes, independente e com a visão republicana na função que a sociedade está reclamando que é a melhoria da qualidade dos serviços, para que os investimentos possam ser feitos adequadramente.

Aos empresários, a candidata disse ainda que o país vive um apagão de inovação, sendo preciso investir nas áreas de pesquisa, inovação e tecnologia.

Vice de Marina cita Goebbels ao falar de Dilma
O vice de Marina, Beto Albuquerque, citou Joseph Goebbels, ministro da Propaganda do Reich na Alemanha de Adolf Hitler, ao falar da presidente Dilma.

— Precisamos virar esse jogo onde Goebbels é o principal marqueteiro ao transformar a mentira numa afirmação permanente. Como poderia uma mulher como a Marina, que nasceu na floresta, teve cinco malárias, fez o Mobral, acabar com o Bolsa Família, como diz a Dilma?

Albuquerque afirmou também que ele e Marina vieram ao Rio para dizer que não são contra o pré-sal:

- Viemos ao Rio para dizer em alto e bom sol aos brasileiros que somos a favor do pré-sal. Seria impensável algum brasileiro ser contra o pré-sal. Viemos ao Rio dizer que somos favoráveis a indústria naval, vamos seguir fazendo contratos, fazendo leilões. Mas somos contra a corrupção.

Aliados de Marina articulam frente anti-PT

• Objetivo é ter apoio de candidatos a governos estaduais que enfrentarão petistas no segundo turno

Sérgio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - Aliados da candidata do PSB à Presidência da República, Marina Silva, já começam a articulação de uma frente anti-PT para o segundo turno da eleição. A ideia é ter apoio de candidatos que enfrentarão petistas nos estados e contar com essas estruturas para a campanha presidencial.

A proposta é defendida por lideranças do PSB e do PPS e vem sendo tratada com cuidado para evitar problemas com a presidenciável. Caso a frente seja formada, Marina teria que subir em palanques como o de Ana Amélia (PP), candidata ligada ao agronegócio, no Rio Grande do Sul.

Eduardo Campos, que era o candidato do PSB a presidente e morreu no dia 13 de agosto num acidente aéreo em Santos, chegou a negociar uma aliança com Ana Amélia, mas o acordo foi rejeitado no final, em parte por pressão dos aliados de Marina, então vice da chapa, e a legenda optou pelo candidato do PMDB, José Ivo Sartori. Pelas pesquisas, o segundo turno no Rio Grande do Sul deve ter Amélia e o atual governador, o petista Tarso Genro.

Caso não aceite a frente anti-PT, Marina deve ficar sem nenhum palanque, no segundo turno, nos dez maiores colégios eleitorais do país.

Publicamente, os aliados da presidenciável do PSB negam que já estejam cuidando das articulações, mas reconhecem que o eleitor que optar por um adversário do PT nos estados deve acabar escolhendo Marina na disputa presidencial.

- Mesmo sem aliança formal, a tendência é que o eleitor polarize as disputas. Quem for contra o PT no estado, deve escolher a Marina - afirma Roberto Freire, presidencial nacional do PPS, segundo maior partido da aliança.

Aliados cogitam apoio a PSDB
A torcida no PSB é pelo maior número de segundo turnos nos estados. A avaliação é que isso ajuda a manter a eleição mais presente, principalmente nas cidades de interior. Sem a disputa estadual, a campanha nesses locais fica restrita aos programas de rádio e televisão. Para colaborar com essa estratégia, a presidenciável deve intensificar agendas em estados em que o candidato do PSB tem chance de crescer. É o caso de Minas, por exemplo.

No estado, a disputa está polarizada entre Fernando Pimentel (PT) e Pimenta da Veiga (PSDB). Hoje, as pesquisas indicam vitória do petista no primeiro turno. Mas, se Tarcísio Delgado (PSB) subir, pode provocar segundo turno. Um eventual apoio de Marina ao candidato do PSDB poderia entrar nas negociações para adesão dos tucanos no segundo turno da campanha presidencial.

As lideranças do PSB e do PPS também sonham com uma adesão de Marina ao tucano Beto Richa no Paraná num eventual segundo turno contra Roberto Requião (PMDB). No Mato Grosso do Sul, haveria chance de uma união com Reinaldo Azambuja (PSDB), possível adversário de Delcídio Amaral (PT).

O apoio a candidatos do PSDB poderia pavimentar a aproximação com a lideranças nacionais da legenda. Há uma preocupação sobre os termos dessa união no segundo turno.

Na avaliação de aliados, uma adesão tradicional, com subida no palanque, pode enfraquecer o discurso de renovação política. Já uma rejeição aos tucanos pode reforçar a imagem junto ao eleitor de que Marina tem dificuldade para composições e se isolaria num possível governo. Daí, a cautela dentro do partido para tratar do assunto.

No momento, a liderança tucana que tem mais chance de declarar apoio a Marina no segundo turno, na avaliação dos aliados da candidata do PSB, é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Além da união com os tucanos, os articuladores da frente anti-PT acreditam que podem até provocar deserções em candidatos que hoje estão com Dilma.

No Ceará, o sonho é de uma aproximação com Eunício Oliveira (PMDB), que deve enfrentar Camilo Santana (PT) no segundo turno. Os dois apoiam a petista na eleição presidencial. Há, no entanto, dúvidas no PSB sobre a disposição de Marina de se unir ao peemedebista.

No Rio, com os quatro principais candidatos muito ligados a Dilma, as chances de Marina optar por algum candidato no segundo turno são quase nulas.

Em São Paulo, o segundo turno por enquanto é improvável. Mas, caso Geraldo Alckmin enfrente Paulo Skaf (PMDB), Marina, mesmo tendo criticado rotineiramente o governador tucano, teria que se unir a ele, já que o vice da chapa, Márcio França, é do PSB.

BA, PE, SC: 2º turno improvável
Entre os maiores estados, Bahia, Pernambuco e Santa Catarina não devem ter segundo turno. No Pará, as chances de Marina optar por algum candidato no segundo turno são remotas.

A construção dos palanques é apenas uma das questões a serem definidas para o segundo turno. A campanha de Marina divulgou ontem uma nota para afirmar que o argentino Diego Brandy permanece no comando de "comunicação audiovisual".

O GLOBO mostrou ontem que há entre os aliados da presidenciável a intenção de contratar um novo marqueteiro para o segundo turno, quando o tempo de propaganda da candidata passará de dois minutos e três segundos para dez minutos. "Não procedem as especulações de mudanças nessa chefia", afirma a nota.

Marina muda peça de TV e mira em Dilma

Isadora Peron, Ana Fernandes.e Felipe Werneck – O Estado de S. Paulo

O PSB vai começar a veicular na TV uma nova propaganda para defender a candidata da sigla à Presidência, Marina Silva, dos ataques que vêm sofrendo. Num primeiro momento, o comercial registrada pelo partido na Justiça Eleitoral dizia que "os adversários" de Marina estavam "se desesperando" e começavam "a apelar". A segunda versão, porém, trouxe uma pequena mudança e concentra as críticas na figura da presidente Dilma Rousseff (PT).

"Os jornais mostram que Dilma e o PT estão se desesperando e começando a apelar", diz o novo texto da inserção. O final da peça não foi alterado: "Tome muito cuidado com o que dizem por aí. Porque quanto mais a Marina subir, mais o nível dos adversários vai descer". Um spot de rádio também foi produzido pela campanha do PSB, com citação nominal à candidata do PT. "Dilma tem pelo menos 11 minutos no programa de rádio e TV. Você já notou que nesse tempo todo ela só fala mal da Marina?"

A avaliação da coordenação da campanha é que as críticas têm de ser concentradas em Dilma, já que os ataques mais duros contra Marina têm vindo do PT. Nesta semana, a campanha da petista começou a veicular na televisão propagandas que criticam a proposta de independência do Banco Central de Marina e dizem que, se ela for eleita, a exploração do pré-sal será deixada em segundo plano, o que tiraria recursos da saúde e da educação.

"Estamos indignados com a postura do PT de explorar a mentira na TV", disse Walter Feldman, coordenador-geral da campanha do PSB. Segundo ele, que foi filiado ao PSDB antes de aderir ao grupo de Marina, como Aécio Neves está em terceiro lugar e a campanha de Dilma tem sido mais agressiva, é natural que o PSB responda diretamente a Dilma e poupe o tucano.

O próprio Aécio tem amenizado as críticas à adversária do PSB. Ontem, o tucano se disse solidário a Marina "em relação a essas críticas pessoais que têm sido feitas a ela". Um eventual apoio do PSDB a Marina tem sido discutido discretamente pela legenda.

Pesquisas. Feldman admitiu que os ataques do PT surtiu efeito e atingiu as intenções de voto de Marina, mas disse acreditar que a tática do "medo" terá papel limitado. "Nossa teoria é que isso pode ter um efeito rebote para a Dilma", disse.

Temer diz que PMDB será oposição em um primeiro momento, caso Marina seja eleita

• Para candidato a vice de Dilma Rousseff, Marina tem critérios ‘subjetivos’

- O Globo

SÃO PAULO - O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), candidato à reeleição de Dilma Rousseff, afirmou que, em eventual vitória de Marina Silva (PSB), “a primeira ideia” é que o PMDB seja oposição.

— O que vai acontecer com o PDMB se eles (PSB) ganharem, a primeira ideia é que fique na oposição, porque (o PMDB) vai ter perdido a eleição — afirmou Temer durante sabatina, nesta sexta-feira, do jornal “O Estado de S.Paulo”.

O vice afirmou que o objetivo do partido é continuar no governo, e que isso não deve acontecer caso Marina vença as eleições.

— O que vai acontecer no futuro, eu não vou trabalhar com hipóteses, mas se essa hipótese se verificar (derrota), é claro que o PMDB será procurado (pelo novo governo). A não ser que seja a candidata Marina.

Temer também fez críticas ao PSB e a proposta de Marina de governar com pessoas e não com partidos.

— A candidata Marina parece que não vai utilizar partidos, vai utilizar pessoas. Ou seja, na subjetividade natural dela, ela vai escolher quem são os melhores, por critérios absolutamente subjetivos, e vai escolher pessoas e não partidos. Aí, talvez, nenhum partido participe do governo.

Temer também disse que o PMDB tem sido “fiador da governabilidade” no país e que é difícil governar sem o apoio de sua sigla.

— O PMDB tem sido fiador da governabilidade. Não houve fato enaltecedor da política brasileira que não tivesse a participação do PMDB. O PMDB é um fortíssimo partido congressual e as coisas se fazem com apoio do Congresso. Eu não sei dizer se o PMDB faria base para Marina, eu não sei dizer se ela chamaria partidos ou pessoas, num descrédito absoluto das instituições. O partido é o canal de comunicação entre o povo e poder público.

O vice-presidente também disse que é "impossível" para o PMDB não ter candidato próprio ao Palácio do Planalto em 2018.

Temer afirma que PMDB será oposição 'em primeiro momento' em caso de derrota

• Candidato a vice de Dilma Rousseff afirma que em 2018 partido terá candidatura própria ao Palácio do Planalto

Valmar Hupsel Filho, Mateus Coutinho e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

O vice-presidente Michel Temer (PMDB), candidato à reeleição na chapa da presidente Dilma Rousseff (PT), disse ontem que "a primeira ideia" da legenda seria ir para a oposição em caso de derrota nas eleições. O peemedebista, que reassumiu neste ano a presidência da sigla, lembrou que o PMDB é "o partido da governabilidade". "Não se governa sem o PMDB", afirmou Temer.

"Se essa hipótese (de derrota) se verificar, é claro que o PMDB será procurado (pelo novo governo)", disse o vice-presidente, ao participar da série Entrevistas Estadão. Essa situação só seria incerta, afirmou, se a vitoriosa for Marina Silva (PSB). "Penso que (o PMDB) será procurado, a não ser que seja a candidata Marina, porque, ao que parece, ela não vai utilizar os partidos, vai utilizar as pessoas", disse. "Aí talvez, nenhum partido participe do governo."

Para Temer, a "nova política" pregada por Marina é um "descrédito absoluto das instituições". "Quem não governa com os partidos, quem não governa com o Congresso Nacional, não consegue governar."

Na entrevista, Temer frisou que ele e a maior parte do PMDB trabalham pela reeleição da chapa da qual faz parte. Em discurso alinhado ao de Dilma, o vice-presidente defendeu a condução da economia, um dos principais temas de críticas ao atual governo. Temer elogiou a atuação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que Dilma confirmou em entrevista ao Estado, na segunda-feira, que não continuará no governo em caso de reeleição. "O que a equipe econômica fez deu certo", disse.

Temer também concordou com a ideia de "governo novo, equipe nova" anunciada por Dilma. "Mudanças serão necessárias, mas não em todos os ministérios", disse, esquivando-se de dizer onde deveriam ocorrer as alterações.

O vice-presidente criticou a proposta de Marina de dar autonomia formal do Banco Central. "É preciso ter um certo controle." Segundo Temer, as propagandas do PT, com fortes críticas a Marina, não são ataques pessoais à candidata, mas sim "embate" político.


Para o peemedebista, a autonomia formal do BC oferece o "risco de um determinado grupo da sociedade brasileira tomar conta daquele setor sem nenhum controle e pode prejudicar as políticas sociais". Temer defendeu a manutenção da fórmula adotada pelo governo, chamada de "independência operacional". "Sou a favor de manter a fórmula atual porque é uma independência operacional que tem dado resultado."

Petrobrás. Questionado sobre qual a responsabilidade do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão - que é do PMDB, foi citado na delação feita pelo ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa e nega irregularidades - sobre os recentes escândalos na estatal, Temer disse o titular da pasta não tem "controle geral" do setor.

"Formalmente ele é o responsável, mas na realidade ele não tem o controle geral", argumentou. Para Temer, a responsabilidade sobre os "problemas" na Petrobrás deve ser "compartilhada". "O partido enquanto instituição não tem nada a ver com a história."

Temer disse acreditar que o próximo Congresso terá de promover uma reforma política e deu apoio à proposta de Dilma de convocar um plebiscito para tanto.

O vice-presidente reiterou a defesa de candidatura própria à Presidência na próxima disputa. "Impossível a essa altura o PMDB não indicar candidato em 2018."

Aécio: PT perdeu oportunidade de fazer projeto renovador

Elizabeth Lopes – O Estado de S. Paulo

O candidato do PSDB à Presidência da República, Aécio Neves, afirmou nesta sexta-feira, 12, em sabatina promovida pela Rede TV e portal IG, que já havia denunciado há muito tempo, antes da delação premiada do ex-diretor Paulo Roberto da Costa, as irregularidades na Petrobras. "Não dá mais para vir com essa ideia de que não sabiam de nada, o PT perdeu a oportunidade de realizar um projeto renovador para o País, apenas para realizar um projeto de poder."

Indagado sobre o chamado mensalão mineiro, o presidenciável tucano descartou qualquer semelhança com o escândalo federal e que levou para a prisão ex-dirigentes do PT. Mas, adiantou que se ficar comprovada alguma irregularidade, o PSDB não vai passar a mão na cabeça de ninguém.

Ainda sobre a Petrobras, Aécio disse que não estava fazendo julgamentos baseados apenas na delação premiada de Paulo Roberto. "Não estou acusando os nomes revelados pelo ex-diretor da estatal, mas o que a própria Polícia Federal apurou." E voltou a dizer não crer que Dilma tenha se beneficiado desse imbróglio, mas garantiu que ela ficou refém desse esquema do PT.

Ao falar da dianteira que a adversária do PSB, Marina Silva, está tendo nas recentes pesquisas de intenção de voto, Aécio voltou a falar na crença de que vai disputar o segundo turno porque sua candidatura é a que tem mais condições de fazer as reformas que o Brasil necessita. "Sou realista, claro que eu gostaria de estar em primeiro lugar nas pesquisas. Mas não vejo condições (de Marina administrar a nação), porque vamos enfrentar um momento difícil pela frente."

Na entrevista, o presidenciável tucano disse que não concorda com os ataques pessoais que a campanha do PT faz contra Marina. Mesmo assim, voltou a dizer que a socialista não tem condições de fazer as mudanças necessárias e nem vencer a presidente Dilma na corrida pela reeleição. "Quem tem condições de ganhar da Dilma somos nós (sua coligação)."

"Caras vazias" em ação

Entrevista. Em crise, o presidencialismo cede à personalização da política e ao declínio do debate público, adverte o filósofo italiano Michelangelo Bovero.

• "Não se extrai a substância da posição dos políticos 'caras vazias' sobre temas cruciais. Dilui-se a dicotomia esquerda e direita"

• "Tudo se move no campo da aparência. Fala-se aquilo que é cativante. É a transformação do debate político em marketing"

Jorge Felix – Valor Econômico - Eu & Fim de Semana

SÃO PAULO - Quando o Congresso Nacional debateu as regras para o último referendo ocorrido no Brasil, em 2005, sobre a proibição de venda de armas de fogo e munição, os parlamentares gastaram mais tempo discutindo a formulação da pergunta do que qualquer outra questão relativa àquela consulta popular. Não à toa. Um dos mais renomados filósofos políticos da atualidade, o italiano Michelangelo Bovero, discípulo e sucessor de Norberto Bobbio (1909-2004) na cátedra de filosofia política da Universidade de Berlim, lembra que quem detém o poder num plebiscito ou referendo não é quem vota, mas quem formula a pergunta. Esse é um dos motivos pelos quais ele condena a utilização de plebiscitos como remédio para fortalecer a democracia e solucionar a crise de representatividade política que vivem as sociedades contemporâneas. "O remédio é pior do que a doença. O plebiscito é uma inversão da democracia", diz ele nesta entrevista ao Valor, ao som de passarinhos, na casa onde se hospedou, em São Paulo.

O tom de Bovero, porém, destoa do ambiente idílico quando critica a usurpação do meio político pela esfera econômico-financeira, que, segundo ele, levou o sistema presidencialista, em todo o planeta, a uma crise aguda. A convite do Instituto Norberto Bobbio, Bovero fez palestras em quatro universidades na capital paulista. Em sua visão, o poder econômico reforça os males do presidencialismo ao enfraquecer o Poder Legislativo em benefício do fácil diálogo com o Poder Executivo e, para isso, alimenta a personalização da política, que passa a ser dominada pelos "caras vazias", responsáveis pelo esvaziamento do debate público. "O liderismo é a enfermidade terminal da democracia", sentencia.

Valor: A política tem sido vista, cada vez mais, como espaço aético. O senhor acredita que as pessoas estão dispostas a entrar nesse espaço?

Michelangelo Bovero: Isso não é um sentimento dos tempos recentes. Desde sempre, a maior parte do tempo vivido pelas pessoas é um tempo de desconfiança da política. Os indivíduos ou grupos que se apoderam dos mecanismos das decisões coletivas são considerados maus. "A política é uma coisa suja" é frase recorrente desde os tempos da crise da democracia ateniense, de Roma, dos tempos de Maquiavel e por aí vai. No entanto, são duas as faces da nobre arte da política: a face de sangue e a face de lama. Nós estamos afogados na lama.

Valor: Uma das características das manifestações sociais, como aqui no Brasil, foi a rapidez com que se formaram e se desfizeram, sem muita consequência em termos políticos. Por quê?

Bovero: Em primeiro lugar, é preciso destacar que há uma potencialidade concreta: a era digital. Ela oferece a potencialidade. Sobre isso, me ocorre fazer uma comparação entre o que dizia um grande personagem da revolução russa, opositor dos bolcheviques: "Com a violência se pode liberar o espaço, nada mais do que isso". Com a convocatória digital se pode organizar protestos, liberar o espaço, derrubar ditadores, mas não se organiza nada. Política, qualquer forma de política, no ambiente democrático, requer organização, discussão, segmentação, sujeitos coletivos. Os chamados partidos estão desgastados? Não gostam da palavra partido? Encontremos outra. O que importa são sujeitos coletivos, que tenham uma orientação e capacidade de enfrentar os problemas com uma linha analítica ideal. Isso não emerge da internet e das grandes convocatórias.

Valor: O senhor não vê problema no desmerecimento da denominação "partido"?

Bovero: O que é partido? Parte. Um pedaço de torta. Uma parte do todo. Tem que funcionar como partido. Pode chamar de outra coisa, é mera retórica. Vai funcionar como partido. Para qualquer processo decisório é necessário que existam partidos. Do contrário, sem partidos para articularem as questões importantes ao debate, como desigualdade social, direitos sociais, crise financeira, saúde, educação, vão surgir, vão ocupar espaços esses "caras vazias". O confronto entre eles se transforma em um "canto" para agradar a opinião pública, e não um debate político com consequências. Nas eleições isso se faz mais evidente. Mas no debate público, nos últimos 20 anos, a cara mais vazia consegue obter a atenção maior, acaba aparecendo mais, distorce o debate sobre o essencial. Emerge daí o governo dos piores e não dos melhores. Ou seja, em vez da aristocracia prevalece a "kakistocracia" [conceito do historiador grego Políbio, que Bovero desenvolveu em seu livro "Contra o Governo dos Piores", publicado em 2002 em português, pela Editora Campus].

Valor: Depois das manifestações, aqui no Brasil, e considerada a crise do presidencialismo de coalizão, aponta-se, sobretudo agora, na campanha eleitoral, um remédio: o plebiscito. Como vê esse tratamento para a crise da democracia representativa?

Bovero: O remédio é pior do que a doença. Medicina, em grego antigo, é fármacon. E o primeiro significado de fármacon é veneno. Há vários exemplos na história. O remédio para o presidencialismo é o hiperpresidencialismo à De Gaulle. Podemos acrescentar que o instituto próprio do referendo não é compatível, em si mesmo, com a democracia. Democracia quer dizer autodeterminação coletiva de indivíduos iguais em condição de poder e de participação nas decisões coletivas. O referendo ou o plebiscito, o que é? É uma pergunta sobre temas específicos. Se não é sobre temas específicos é um engano. Um plebiscito tem sentido, em primeiro lugar, quando se coloca uma alternativa clara entre o "sim" e o "não". Quais são exatamente os problemas que podemos reduzir a alternativas simples entre "sim" e "não"? Ademais, a democracia pressupõe a discussão pública - a discussão pública, não como propaganda, mas como elaboração mesma do problema. Quem tem o poder no plebiscito? Não é quem dá a resposta. É quem formula a pergunta. O plebiscito é uma inversão da democracia. A solução dos problemas só pode sair de uma discussão dentro de um órgão plural, no qual se pode concretamente debater. Não há debate entre 100 milhões de pessoas.

Valor: A questão também é o que se debate. Como vê a questão de o debate político ser tomado de temas como sexualidade, religião, aborto?

Bovero: Não quero dizer que estes não sejam temas importantes. Deixo bem claro isso. Mas se verifica uma troca de prioridade, o que vem antes e o que vem depois. Isso, porque não se discutem os problemas verdadeiros da sociedade, os substanciais. Por várias razões. Destaco duas. Uma, porque a própria política, nesses problemas, foi desautorizada pela oligarquia econômico-financeira global. Não há recursos; então, não podemos falar de benefícios. A política foi claramente desautorizada. Vivemos em tempos de "role of capital" [protagonismo do capital] e não de "role of law" [protagonismo do direito]. O "role of capital" destronou o "role of law". Outra razão é o caráter persuasivo e aparente, tudo se move no campo da aparência. A dialética política, sobretudo, mas não só, nos momentos eleitorais. Aquilo que é cativante, que é agradável, então se fala. É a transformação do debate político em marketing. Nesse quadro, emergem pessoas de certas aparências, de certos apelos populares. Os problemas verdadeiros não podem ser enfrentados por aqueles que são ou de direita ou de esquerda, igualitários ou anti-igualitários. E como não se trata desses temas, trata-se de outros. Entram em cena os que chamo de políticos "caras vazias" por trás dos quais não há nada. Não se extrai a substância da posição deles sobre os temas mais cruciais. Dilui-se a dicotomia esquerda e direita.

Valor: Há uma discussão sobre a funcionalidade da ciência política. De que modo a ciência política pode contribuir para enfrentarmos os desafios da democracia contemporânea?

Bovero: A ciência política, sobretudo americana, que é a dominante, se encontra hoje no papel de "conselheira do príncipe". Os filósofos, principalmente da escola à qual pertenço, a escola de Turim, a escola bobbiana, não são "conselheiros do príncipe" mas, sim, "críticos do príncipe". Nossa escola é de teoria política com a perspectiva de análise crítica para ajudar nas coisas concretas. Mas, se formos falar de uma função da teoria política, é, principalmente, a de educação para a cidadania. É a influência sobre a opinião pública. Por exemplo, eu gosto muito, profissionalmente falando, das causas perdidas. Uma delas é a crítica ao presidencialismo. Aos tipos de presidencialismo, incluindo o brasileiro.

Valor: Qual a capacidade da democracia presidencialista para resolver os problemas de crise financeira, de fronteiras, religiosos que se colocam para a humanidade?

Bovero: Qual democracia? Os regimes contemporâneos que estamos acostumados a chamar de democracia são todos, umas mais e outros menos, apenas democracias aparentes. Uma coisa é o problema do tipo de regime de governo, democracia ou não democracia. Os problemas que você coloca são problemas da política. Problemas do papel da política. Seja qual for a forma de governo. O que a política pode fazer para enfrentar os grandes problemas? São duas coisas distintas. Correndo o risco de uma certa simplificação, precisamos ver quais podem ser os cruzamentos, as conexões. A chamada crise financeira não é somente isso. É uma crise econômica e social de proporções gigantescas. O desemprego na Itália, na Espanha, na França e também na Alemanha é um problema social enorme. São efeitos da chamada crise. Isso convida o teórico analítico, o filósofo, a perguntar-se o que é essa crise. O que entendemos ser essa crise? É a quebra do Lehman Brothers? Talvez esse seja o ponto de partida. Mas é algo muito mais profundo. Em linhas gerais, pode-se dizer que o problema é a usurpação do poder político pelo poder econômico. O que pode fazer a política? Várias foram as classes políticas dos últimos 20 anos e todas se colocaram servas do poder econômico-financeiro global. A liberação dos movimentos do capital foi uma decisão política de quem era apontado como o mais progressista dos presidentes americanos, Bill Clinton. Estamos diante de algo que podemos conceituar como a desautorização da política por parte do establishment econômico-capitalista-financeiro.

Valor: Isso aconteceria, portanto, no presidencialismo ou no parlamentarismo...

Bovero: Sim. Antes, é preciso estabelecer as conexões. Essa situação é consequência do que chamo de meta-ideologia do nosso tempo, o neoliberalismo, que foi estabelecido pelo relatório da comissão multilateral de 1975 e, curiosamente, quando lemos um documento pequeno, de apenas oito páginas, publicado no ano passado por economistas-chefes de um grande banco americano, e comparamos, constatamos que a análise e as indicações terapêuticas são, em substância, as mesmas. Primeiro: a política, os dirigentes políticos estão orientados por esse receituário que vem desde 1975. Ele diz que os governantes não devem atender a todas as demandas dos cidadãos. As demandas sociais devem ser, segundo eles, filtradas, selecionadas. Caso contrário, a democracia vai quebrar porque é insustentável atender às demandas. Um segundo ponto: os direitos. Nosso mestre Norberto Bobbio, um otimista, escreveu em 1990, que nossa época é "a era dos direitos". E o que dizem os porta-vozes da meta-ideologia global? Os direitos, especialmente os direitos sociais, não são direitos, são apenas benefícios sociais que podem ser satisfeitos em certa medida, quando se tem recursos abundantes. Quando não temos, não se pode atender a esses benefícios. Aqui, vamos estabelecer as conexões. As próprias classes políticas, como eles dizem, devem ser postas em quarentena. Então, deve-se enfraquecer os órgãos da representação política, como os parlamentos. Os parlamentos, dizem, são um desastre, são veículos de demandas sociais das mais absurdas, que não se pode satisfazer porque não há recursos. De acordo com essa concepção, deve-se fortalecer os poderes de vértice: o Executivo ou as lideranças. O liderismo é a enfermidade terminal da democracia.

Valor: Isso estimula a personalização da política?

Bovero: Exato. A personalização da política tem uma face institucional que se chama presidencialismo.

Valor: Se o plebiscito é um remédio pior do que a doença, quais seriam os melhores remédios para o presidencialismo?

Bovero: Se eu soubesse, seria presidente do mundo [risos]. O que pode dizer um teórico da democracia? Os movimentos de protesto devem ocupar o lugar de não movimentos de decepção. O sentimento de falta de atenção deve ser canalizado para formas de reconquista da cena pública. Isso é muito difícil e, muitas vezes, enganoso. A chamada Primavera Árabe, por exemplo. Sabemos como foi. Engano dentro do engano. A democracia digital tem produzido "caras vazias". Elas emergem dentro desse contexto. A democracia pode ser o único remédio para a crise da própria democracia.

Valor: Há duas correntes entre os pensadores políticos: uma, que detecta uma crise de poder, que é difícil exercer o poder, e outra, em que a questão é que o poder está muito concentrado em determinado segmento, por exemplo, o financeiro. O que o senhor pode dizer a esse respeito?

Bovero: Qual poder? O conceito de poder mais básico é de Thomas Hobbes. O poder são os meios de que uma pessoa ou grupo pode dispor. São três os grandes poderes: o econômico, o que Bobbio chamava de ideológico, que tem controle sobre as consciências - antigamente, as igrejas, hoje os meios de comunicação, ampliado para abranger aqueles que controlam o enorme mundo da internet - e o poder político, a lei ou as normas. Qual poder pesa mais hoje? O econômico, porque as classes políticas que se formaram durante os anos que chamo de "os 40 não gloriosos" [parodiando a denominação "os 30 gloriosos" de Jean Forastié, amplamente aceita pela literatura econômica, para definir o intervalo entre 1945 e 1975, quando o mundo viveu seu período mais longo de crescimento], de 1975 até agora, se transformaram em servos dos grandes poderes econômicos. Como falei, aceitaram a desautorização do poder político. Além da questão de como se organiza o poder político, as formas de articulação do poder político empurram para mais liderismo, personalização e crescimento dos poderes executivos. De um lado, esses executivos deixaram de ser aqueles que executam frente ao parlamento e outras formas da representação coletiva. Por outro lado, só esses executivos executam mais facilmente os mandos funcionais do poder econômico.

Valor: E assim chegamos a uma crise de representação.

Bovero: Sim. Isso conduz a um distanciamento das pessoas, que não se reconhecem em seus representantes. Esse distanciamento, essa decepção generalizada, levou o grau de confiança nas classes políticas a ser um dos mais baixos, em todo o mundo, em todas as épocas. Outro aspecto complementar é a corrosão da qualidade dos representantes. Isso, em geral, é favorecido pelos processos que alimentam o liderismo, enfraquecem os legislativos e dificultam o debate público entre opiniões distintas.

Valor: Entre tantas lições e a imensa herança intelectual de Norberto Bobbio, qual ponto destacaria que pode mais nos ajudar a enfrentar os desafios da democracia?

Bovero: É realmente uma imensa obra e difícil de encontrar apenas um ponto entre tantas coisas brilhantes que ele escreveu. Mas é o que Bobbio chamava das "promessas não cumpridas" da democracia. Uma delas, principalmente, a falta da educação política para a cidadania. A construção do indivíduo enquanto cidadão. Acrescento a isso o termo analfabetismo político. O que fazemos, nós, os professores, os formadores de opinião, os intelectuais para alfabetizar essas pessoas? É a pergunta.

Merval Pereira: Convicções

- O Globo

Embora os ativistas da campanha de Dilma tenham querido transformar os números da pesquisa Ibope divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria em uma demonstração de que Marina está sendo deixada para trás na corrida presidencial, eles são semelhantes aos números prévios de pesquisa do Banco Central que mostrou crescimento mais forte do PIB em julho: a tendência não é o PIB se recuperar no 2º semestre, assim como a disputa presidencial está no mesmo ponto em que começou a semana, com empate técnico das duas candidatas, embora a tendência seja favorável a Dilma neste momento da campanha.

Isso porque a pesquisa do Ibope foi realizada antes da do Datafolha, divulgada um dia antes, que dava Dilma com 36% e Marina com 33%. Os números do Ibope variam na margem de erro em relação à sua pesquisa anterior, registrando tendência de alta de Dilma, mas nada que tire a competitividade de Marina.

É bom registrar, por verdadeiro, que não partiu da presidente Dilma a comemoração dos resultados, ao contrário. Ela recebeu com frieza a informação sobre a nova pesquisa Ibope durante nossa entrevista no Palácio da Alvorada e não moveu um músculo. "Eu não me empolgo com pesquisas, mas também não me abato" disse a presidente — que se mostrou, durante todo o debate com os colunistas do GLOBO, de muito bom humor, a ponto de ter feito uma brincadeira conosco quando teve que repetir um comentário porque houve uma falha no sistema de som: "Quer dizer que houve um apagão no GLOBO" disse ela rindo, pois havia sido questionada sobre os problemas da política energética de seu governo.

Muito convicta de suas razões, conseguiu driblar todas as perguntas relacionadas ao PT e ao seu governo, sobretudo nas negociações com os partidos da base aliada, parte mais frágil do seu governo do ponto de vista institucional. É a prática da velha política, o debate que vai pautar o segundo turno.

Ela não conseguiu explicar, por exemplo, a impossibilidade prática de governar-se apenas "com os bons" quase que admitindo que, para garantir a governabilidade, é preciso aceitar certos desvios. Fez uma defesa dos partidos políticos, mas não criticou o toma-lá-dá-cá que os desmoraliza, aproveitando para criticar Marina indiretamente, quando disse que quem chega ao governo sem disposição de negociar está no mau caminho: "Eu não acho que a democracia possa prescindir de partidos. Toda vez que isso aconteceu, nós caímos na mais negra ditadura. Ou tem alguém muito poderoso por trás disso"

A questão da corrupção incomoda a presidente Dilma, embora ela esteja sempre disposta a afirmar que o que aumentou em seu governo foi o combate a ela. Mas quando se refere à Petrobras, fonte de inúmeras denúncias de corrupção nos últimos anos, ela procura banalizar o ocorrido, afirmando que "há corrupção em todas as empresas, públicas ou privadas. A Petrobras tem órgãos internos e externos de controle"

Sobre o fato de que durante vários anos o ex-diretor Paulo Roberto Costa comandou um esquema de negociatas sem ser descoberto, Dilma tergiversa, alegando que a Polícia Federal foi que descobriu, como se a descoberta se devesse a uma atuação de seu governo, e não de um órgão do Estado brasileiro, acima dos governos.

Ela não disse ontem, mas o espírito é o mesmo de quando disse que seu "telhado de vidro" estava protegido pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, quando essas instituições pertencem ao Estado brasileiro, e não ao seu governo.

Ao dizer que demitiu Paulo Roberto Costa por não ter nenhuma afinidade com ele, a presidente procurou dar à demissão um caráter rotineiro, como se a nomeação ou a demissão de uma empresa como a Petrobras dependesse da empatia entre os comandantes da empresa e seus dirigentes, e não da competência e da probidade da atuação.

Os argumentos da presidente Dilma são falhos na maior parte das vezes, e seu governo é uma prova viva dessa fragilidade, mas ela tem disposição de defendê-los. A tal ponto que reluta em anunciar mudanças num eventual segundo mandato. Caberá provavelmente a Marina Silva a tarefa de desconstruí-los no debate que travarão de igual para igual no segundo turno.

Fernando Rodrigues:O horário eleitoral é bom

- Folha de S. Paulo

O Brasil tem eleições a cada dois anos e nunca falha: basta começar a propaganda em rádio e TV para que se forme um senso comum contra o horário eleitoral.

Muitos defendem acabar com os comerciais eleitorais neste período. Acho um erro pensar assim. Até porque o problema desse sistema é mais o conteúdo e menos o modelo.

É claro que os comercias dos candidatos, em geral, são um lixo. Informam sobre quase nada. Os políticos se atacam mutuamente. Quem disputa a reeleição mostra na TV um mundo onírico. O céu é mais azul e os pobres estão sempre felizes.

Mas acabar com o horário eleitoral não resolveria o problema. Numa democracia, os políticos têm de se comunicar com seus eleitores.

Abrem-se então duas possibilidades. Manter o horário sendo pago com dinheiro público (as emissoras hoje são compensadas em grande parte pelo espaço cedido) ou criar um sistema no qual o candidato comprar seu tempo no rádio ou na TV.

Nos EUA, os políticos pagam para ir à TV. É mais caro para a sociedade. O abuso do poder econômico impera.

No Brasil, o tempo é dividido por meio de uma fórmula com base no tamanho da bancada de cada partido na Câmara. Aí está a anomalia na qual prosperam os políticos do aerotrem. Basta um deputado para ir à TV e ter seus candidatos convidados obrigatoriamente para debates. É um desserviço à democracia.

O horário eleitoral é bom na sua concepção, pois democratiza o acesso à TV. Só fica ruim porque trata desiguais como iguais e não estimula o debate. Nanicos teriam de ter uma exposição de fato mínima. Os principais candidatos teriam de debater ao vivo, de maneira regular.

Seria educativo assistir a confrontos apenas entre Dilma Rousseff e Marina Silva (e, vá lá, Aécio Neves), sem a intromissão dos sem voto. É curioso, embora compreensível, que ninguém ouse defender essa proposta em nenhuma campanha.

Zuenir Ventura: A política de bom humor

• Lucia Hippolito e Maria Celina D’Araujo concordam que Marina foi a única a canalizar a insatisfação de junho de 2013. Por isso, leva essa ‘surra da propaganda petista’

- O Globo

Mais de dois anos depois que a síndrome Guillain-Barré provocou a paralisia de seus músculos, permitindo que mexesse apenas os olhos e a cabeça, a cientista política, historiadora e jornalista Lucia Hippolito fez sua rentrée anteontem na Casa do Saber, “feliz que nem pinto no lixo” por ter recobrado a fala e quase todos os movimentos (ainda usa a cadeira de rodas para se locomover) e por aquele encontro em que, junto com a colega Maria Celina D’Araújo, discorreu sobre a campanha eleitoral. Não faltou o bom humor que a acompanhou inclusive nos 47 dias durante os quais esteve imobilizada em uma cama de hospital em Paris.

Por várias vezes, a plateia gargalhou. Sem a retórica e a hipocrisia dos discursos de campanha, as duas ofereceram um espetáculo onde, com franqueza e muita graça, desmistificaram os lugares-comuns e as ideias feitas com que os candidatos procuram angariar votos. Se a propaganda usasse na TV os mesmos recursos, a política obteria mais Ibope.

O formato foi o de uma conversa, na qual convergiram mais do que achavam que iriam divergir, a começar pela “perplexidade” diante de um quadro ainda indefinido e que pode mudar a cada dia. Em matéria de adivinhação, elas, como cientistas políticas, preferiam ficar “em cima do muro”, até porque há o acaso ou, como disse Celina sem medo de ser politicamente incorreta, “tem os aviões que caem”. Só para ser mais irreverente nas suas análises é que Lucia confessou brincando ser também jornalista. A sério, ressaltou a semelhança dos três principais candidatos, que teriam um mesmo “núcleo duro” de propostas: crescimento econômico, inflação sob controle e necessidade de programas sociais. Constatou também que há uma “fadiga do eleitorado com o PT”, provocando risos ao dizer que “quem precisa de gerente é supermercado”.

As duas concordam que Marina foi a única a canalizar a insatisfação da jornada de junho de 2013. Por isso, leva essa “surra da propaganda petista”. Mas Lucia acha que a candidata do PSB não é amadora: “O ar de Madre Teresa de Calcutá não tem nada a ver com ela.” O problema seriam as contradições que carrega e o “romantismo” de acreditar que pode governar sem os partidos — sem o PMDB, por exemplo.

Fizeram então uma análise da real importância da “noiva mais cortejada, um partido que, quando perde, a primeira coisa que faz é aderir”. Quanto ao mau desempenho de Aécio nas pesquisas, atribuíram-no ao que todo mundo já percebeu: ele só passou a fazer oposição agora. Nas duas horas em que dialogaram entre si e com o público, Lucia e Maria Celina falaram muito mais do que cabe aqui e, apesar das críticas ao governo, não manifestaram visão maniqueísta ou catastrófica.

Ao contrário, são otimistas, acreditam que o país avançou nos últimos 20 anos.

Cláudio Couto: Por que Dilma se levanta

- O Estado de S. Paulo

Se voltarmos no tempo alguns meses e observarmos o horizonte do segundo semestre do ano passado e da primeira metade deste, veremos que era possível afirmar plausivelmente que teríamos em 2014 as eleições presidenciais mais disputadas desde 1989. As razões para isto eram, por um lado, a avaliação declinante do governo e o anseio difuso por mudança; por outro, o fato de que, mesmo com a piora de sua avaliação, o governo ainda mantinha fiel uma parcela significativa de aproximadamente um terço do eleitorado, que lhe avaliava como ótimo ou bom.

Diante desse cenário, a incógnita residia na capacidade da oposição de apresentar-se aos cidadãos como uma alternativa palatável. Mantido o padrão que marcara as disputas presidenciais desde 1994, novamente PT e PSDB deveriam polarizar a contenda, com eventuais desafiantes apenas coadjuvando. Tal configuração parecia propícia diante da condição estacionária de Eduardo Campos, que perdia até mesmo para indecisos e para os que pretendiam abster-se - anulando ou votando em branco.

Decerto tal situação poderia mudar com o começo da campanha no rádio e na TV, como sempre ocorre. Contudo, a situação de Campos não era das mais fáceis, tendo ele um partido regionalmente restrito e pouco tempo de propaganda, comparado aos adversários. Portanto, era de se esperar um crescimento maior de Aécio \, impulsionado pela contraposição tradicional ao PT, pela maior implantação nacional de seu partido e pelo maior tempo de propaganda. Foi aí que se deu o inesperado.

A trágica morte do candidato do PSB catapultou às alturas sua substituta, Marina Silva. Num primeiro momento, Dilma perdeu mais votos, porém Aécio perdeu o lugar. Comparadas as pesquisas do Ibope de 21 de julho (ainda com Campos) e 26 de agosto, a presidente perdeu 10 pontos entre os eleitores mais pobres (até 1 salário mínimo), setor no qual Aécio ficou estável. No setor imediatamente acima, Dilma perdeu 4 pontos, contra 2 de Aécio. Esses dois segmentos são os mais numerosos do eleitorado. As perdas de ambos se equivaleram no contingente de 2 a 5 salários mínimos, e Aécio perdeu mais que Dilma no eleitorado mais rico - 5 pontos contra 3. Marina, além de abocanhar os votos perdidos por seus adversários em todos esses setores, também arrebanhou o grosso dos que até pouco antes pretendiam se abster ou não sabiam em quem votar - reduzidos de 25% para 15%.

Nas pesquisas subsequentes parecia inevitável a disparada de Marina, suplantando com facilidade a presidente, principalmente no segundo turno. Porém, a partir daí o jogo começou a virar. Novamente evidenciou-se a importância do horário eleitoral gratuito. A avaliação do governo começou a melhorar e, com ela, as intenções de voto na presidente. Juntaram-se a isso a propaganda negativa contra Marina e os próprios tropeços da candidata, que aumentaram as dúvidas a seu respeito e transmitiram uma imagem de inconsistência. Os recuos no plano de governo e as ambivalências de suas políticas brecaram sua ascensão. Mais do que apenas entender com clareza o significado de cada opção de política pública, o eleitorado busca algumas certezas quanto aos rumos a serem seguidos. Na falta delas, desconfia e procura um porto mais seguro - como o governo do dia.

Esse porto poderia ser também o da oposição estabelecida. Mas o estrago na candidatura Aécio foi tamanho que dificilmente haverá tempo para recuperação - exceto no caso de mais algum evento imprevisto de grandes proporções. Da forma como se deu, a entrada de Marina na campanha desorganizou as referências eleitorais estabelecidas até então, imolando o PSDB. Mesmo que fosse outro o candidato tucano, dificilmente teria destino melhor. Caso Marina se mostre mesmo inconsistente, pode propiciar a Dilma uma disputa mais fácil do que a que ela teria com um oponente mais sólido. E isso, depois de tê-lo volatizado.

Jairo Nicolau: Distribuição desproporcional

- Folha de S. Paulo

Em praticamente todas as democracias, os partidos têm acesso a um tempo de rádio e televisão para apresentar os seus programas durante a campanha eleitoral. A maioria dos países permite ainda que os partidos comprem tempo de propaganda no rádio e na televisão durante a campanha.

Depois de um levantamento da legislação eleitoral de 35 países, não foi encontrado em nenhum deles um tempo tão grande de acesso dos partidos ao rádio e à televisão como no Brasil. São duas horas e dez minutos de transmissão por dia durante seis semanas, 30 minutos de inserção durante o horário comercial e mais uma hora 40 minutos de transmissão em cadeia nacional.

Desde as eleições de 1982, o horário eleitoral tem sido o principal canal de comunicação dos candidatos com o eleitorado. Não sem razão, a campanha começa para valer com sua transmissão e os partidos investem grande parte dos seus recursos na produção dos programas. Quem se der ao trabalho de assistir a um programa completo de 50 minutos --não vale sair de frente da televisão-- provavelmente sentirá o que senti ao fazer o experimento: esse modelo necessita ser reformulado.

O grande número de candidatos a deputado federal e estadual garante a cada um deles poucos segundos por dia. A estratégia utilizada por muitos para se distinguirem da monótona listagem de nomes é apelar para o exotismo. A lista de bufonarias é conhecida --nomes estranhos, paródias, fantasias. Os candidatos com boas propostas ficam submersos em meio à bizarrice.

O horário eleitoral tem sido mais eficiente nos programas para o Executivo. Os candidatos têm mais tempo para apresentar suas propostas e podemos ver programas de excelente qualidade. Minha principal crítica a esse segmento é a desigualdade de tempo entre os candidatos. Não há justificativa para que o tempo dos três principais candidatos à Presidência da República nesta eleição sejam tão diferentes. Dilma Rousseff (PT) tem cinco vezes e meia o tempo de Marina Silva (PSB).

Por que a distribuição do tempo para os candidatos ao Executivo é tão desigual? Porque a legislação é baseada em um critério cumulativo. Cada partido têm um tempo que é definido segundo a votação obtida nas eleições anteriores para Câmara dos Deputados.

Por isso, boa parte das negociações para a formação de coligações eleitorais está associada a não só garantir alguns segundos a mais de tempo de rádio e TV, mas também para evitar que esse tempo se transfira para as coligações adversárias.

O formato eleitoral foi desenhado para um Brasil que não existe mais. Um país no qual tínhamos meia dúzia de canais de televisão e poucos canais de rádio em cada cidade. Assistir ao horário político era compulsório para quem não quisesse desligar a televisão. Pesquisas de opinião mostram que sua audiência cai a cada eleição.

Precisamos pensar em formatos mais eficientes de propaganda eleitoral pública no Brasil. Deixo duas sugestões. A primeira é utilizar o horário em cadeia apenas para os candidatos ao Executivo, transferindo as propagandas de deputado federal e estadual para as inserções no horário comercial. Para estes últimos, o objetivo primordial é o de se fazerem conhecidos pelos eleitores, por isso a difusão durante a programação comercial é mais eficiente.

A segunda sugestão é dividir o horário em cadeia em algumas faixas de tempo. Digamos, oito, cinco, dois e um minuto. O tempo seria distribuindo segundo a votação obtida pelo partido na eleição anterior. Por exemplo, um candidato ou coligação que ultrapassasse 25% de votos ficaria com o tempo máximo. Ou seja, nenhum dos candidatos teria mais de oito minutos, independentemente do número de partidos que participem da sua coligação.

Seja com essas ou outras propostas, o importante é que iniciemos uma ampla discussão para encontrar um formato mais dinâmico para o horário eleitoral.

Jairo Nicolau, 50, professor de ciência política da UFRJ, é autor de "Eleições no Brasil: do Império aos Dias Atuais" (ed. Zahar)

Celso Ming: Déficit de credibilidade

- O Estado de S. Paulo

Mesmo quem tinha lá suas dúvidas sobre o nível de submissão da atual diretoria do Banco Central (BC) ao governo, deixou de ter depois que ouviu o que a presidente Dilma tem a dizer sobre a proposta de autonomia do BC.

Comercial da campanha da presidente Dilma sugere que banco central solto se predispõe a fazer o jogo dos banqueiros, contra os interesses do trabalhador, em benefício de um punhado de aproveitadores.

A presidente Dilma fez declaração semelhante com outros termos: “Esse povo da autonomia do BC quer um baita superávit, aumentar os juros pra danar, reduzir emprego e reduzir salário. (…) Sou contra isso”.

Depois dessa profissão de fé, é mais do que normal que a atual diretoria do Banco Central tenha desistido de puxar a inflação para dentro da meta. Limita-se ao que o governo manda ou ao que deixa fazer. Que também não fique espalhando por aí, nas Atas do Copom ou no Relatório de Inflação, que o governo está gastando demais, que não pode deixar os preços administrados tanto tempo sem reajuste ou que as relações incestuosas entre o Tesouro, o BNDES e a Caixa Econômica Federal minam a saúde das contas públicas. No mais, o BC está autorizado a fazer o teatro que quiser, com a linguagem empolada e vazia da hora, como a de que “o balanço do setor público se desloca para a neutralidade” ou, então, a de que “a inflação tende a entrar em trajetória de convergência para a meta nos trimestres finais do horizonte de projeção”.

Alguém poderá argumentar que este é apenas um discurso de campanha inspirado pelos marqueteiros e que, na prática, as ações do Banco Central se pautam pela racionalidade imposta pela defesa implacável da moeda nacional.

Mas não foi o que aconteceu nestes três anos e pico de mandato Dilma. Ao longo desse período, a credibilidade do Banco Central foi sendo desconstruída aos poucos, mas sistematicamente. A política de juros, de crédito e de câmbio não guardou coerência com o discurso anterior das autoridades monetárias. Mudou aos solavancos, ao estilo Dilma de governar – o que passou a ser entendido como forte indício de que sua ação foi determinada pelo Palácio do Planalto ou pelo Ministério da Fazenda. Foram estes que, em última análise, também impuseram ou suspenderam, como e quando lhes convieram, as disposições macroprudenciais nas operações de crédito.

Em déficit de credibilidade, um banco central não pode administrar adequadamente as expectativas do mercado, fator essencial para o bom funcionamento de um regime de metas de inflação. Essa corrosão vinha acontecendo a partir do crescimento das inconsistências do exercício do mandato e da falta de coerência entre discurso e prática. Mas agora a própria presidente da República adverte que é isso mesmo, que o Banco Central é uma instituição em princípio tendenciosa, que só não faz o jogo do capital contra o trabalhador se for patrulhado, implacavelmente, pela autoridade legitimada pelo voto.

Então, fica avisado. Se a presidente Dilma for reconduzida a um segundo mandato, quem aceitar o cargo de presidente do Banco Central não será cão de guarda contra a inflação. Corre o risco de ser mais totó, que cumpre ordens de quem o tem pela coleira: “Senta”; “levanta”; “pare de latir”…

Miriam Leitão: História revista

- O Globo

Na hiperinflação, em 1989, professores da PUC- Rio lançaram o livro “A Ordem do Progresso”, sobre a política econômica nos 100 anos da República. Agora, passados 25 anos, eles lançam uma segunda versão ampliada com o que aconteceu depois, e com um capítulo sobre a economia do Brasil no Império. O país teve um evidente salto com a estabilização da economia. Algumas sombras voltaram.

O primeiro livro terminava no auge da angústia brasileira com os índices de preços disparados e na véspera do que viria a ser a pior tormenta: o Plano Collor. Portanto, a nova versão, lançado pela editora Campus Elsevier, fala do Plano Collor, do Plano Real, e do grande teste da transição política, em 2002, em que o PT manteve as bases da política econômica do governo do PSDB.

No capítulo sobre a mudança no PT, escrito por Rogério Werneck, o subtítulo diz muito: “tensões da metamorfose.” Ele lembra que nas eleições municipais de 2000, os dirigentes partidários, como José Dirceu, e economistas do partido aderiram à proposta da CNBB de fazer um plebiscito da dívida interna e externa. Apenas dois anos depois, tudo mudou e a “Carta aos Brasileiros” falava em “preservar o superávit primário o quanto for necessário para impedir que a dívida interna aumente e destrua a confiança do governo de honrar seus compromissos”. A história é conhecida, mas revisitá-la agora impressiona pela rapidez da mudança.

O primeiro e o segundo livros foram organizados por Marcelo de Paiva Abreu. Eu entrevistei Abreu e Werneck no meu programa da Globonews, e eles dizem que nos últimos anos do governo Lula começou uma nova mudança na política econômica que se aprofundou nos anos mais recentes. Eles não chegam a analisar o governo Dilma. Na parte final do livro, apenas pincelam que ela aprofundou a proposta do segundo mandato de Lula, de políticas de desenvolvimentismo e afrouxamento fiscal.

Rogério Werneck acha que nenhum dos governos analisados nessa atualização do livro equacionou a questão fiscal, tanto que a carga tributária aumentou nos governos Fernando Henrique, Lula e Dilma. Mas acrescenta que houve uma clara piora no último período presidencial.

Marcelo Abreu acha que o passeio pela economia do Império e pela política econômica da República mostra que o Brasil nunca se abriu completamente ao comércio internacional e continua apostando no projeto autárquico. O embate entre as duas correntes de pensamento — a que é a favor da integração com o mundo e a que prefere elevar as barreiras ao comércio e subsidiar a indústria — é recorrente na história do país, com predomínio da visão do país fechado.

No Império, o Brasil teve baixo crescimento e, na visão de Marcelo, em grande parte pela relutância do país de encerrar a escravidão e iniciar o regime do trabalho assalariado. Ainda que seja muito difícil falar em política econômica do Império, o livro traz um bom resumo do que foi a economia nos dois reinados, mesmo com a falta de dados. Eles projetam o que teria sido o ritmo de avanço do PIB: “Uma taxa de crescimento de 0,3% ou até 0,4% ao ano para o período imperial parece bem razoável”, diz o texto.

Com um novo capítulo sobre o período Jânio-Jango, escrito por Mário Mesquita, o texto inicial sobre o Império e os três capítulos finais, o livro é uma obra indispensável para quem quer entender a história econômica do Brasil independente. Mas o final continua em suspenso. Se a primeira versão dizia que o país estava vivendo em 1989 a pior crise do Brasil independente, agora a obra avisa que a atual conjuntura exige novos ajustes e a reafirmação das bases da estabilização.

Rolf Kuntz: A recessão como produto da incompetência

- O Estado de S. Paulo

A indústria continua em marcha lenta e o emprego nas fábricas encolhe: cerca de 75 mil postos com carteira assinada foram cortados nos 12 meses terminados em agosto, de acordo com o Ministério do Trabalho. Mas a candidata Dilma Rousseff acusa seus principais competidores de planejar uma recessão. Será o resultado, segundo ela, das políticas de ajuste prometidas pela representante do PSB, Marina Silva, e pelo candidato do PSDB, Aécio Neves. Os dois têm prometido, de fato, combater a inflação mais seriamente do que têm feito as autoridades nos últimos anos e pôr em ordem as contas públicas. Pode-se discutir se essas políticas serão necessariamente recessivas.

Essa discussão vai além da competência demonstrada até hoje pela presidente Dilma Rousseff e pelos principais componentes de sua equipe econômica. Sua façanha mais notável, até agora, foi uma rara mistura de economia estagnada com inflação muito acima dos padrões internacionais. Os números do primeiro semestre valem um campeonato. A alta de preços em 12 meses ficou sempre perto de 6,5%, limite de tolerância, enquanto a produção encalhou e o País afundou na recessão.

Com alguma sorte, uma revisão dos dados do segundo trimestre poderá mostrar um resultado pouco menos lamentável que a contração de 0,6%. Mas só com muito despudor - ou quase nenhuma percepção dos fatos - alguém poderá festejar essa notícia. Com ou sem revisão, o filme de 2014 continuará muito ruim, um fecho perfeito para quatro anos de erros devastadores.

Conclusão provisória: dificilmente alguém poderá rivalizar com a presidente Dilma Rousseff na produção de um desastre econômico. Pode-se atribuir alguma responsabilidade à sua equipe e até ao ministro da Fazenda, mas a política econômica foi obviamente comandada no Palácio do Planalto. Nem o Banco Central (BC) escapou desse comando. O erro cometido em agosto de 2011, com a prematura redução dos juros e o afrouxamento do combate à inflação, mostrou já no primeiro ano a subordinação da autoridade monetária à Presidência da República.

Naquele momento, os diretores do BC tentaram justificar sua decisão com uma dupla aposta - na acomodação dos preços internacionais das commodities e na gestão austera das finanças públicas. O erro, evidente já naquele momento, em pouco tempo foi comprovado. A administração do Orçamento ficou longe de qualquer ensaio de austeridade e o balanço passou a depender cada vez mais da contabilidade criativa. Ainda assim, o BC só se mexeu e voltou a elevar os juros, em 2013, quando a inflação disparava e a sua reputação estava em queda acelerada.

O afrouxamento da política monetária somou-se aos desmandos fiscais e à política de crescimento centrada no estímulo ao consumo. Resultado: a inflação anual continua na vizinhança de 6%, apesar do represamento de preços dos combustíveis e da energia elétrica e também de tarifas de transporte urbano. A deflação dos preços das matérias-primas terminou. A partir de agosto a maior parte dos índices voltou a ganhar impulso.

A mistura de inflação com estagnação da indústria dá um caráter especial ao governo da presidente Dilma Rousseff. Muitos países têm entrado em recessão por causa de condições internacionais adversas. Isso ocorreu ao Brasil e a muitas outras economias no fim de 2008, quando se agravou a crise financeira crise nos países mais desenvolvidos. Depois desse impacto, muitos emergentes voltaram a crescer e a exportar com sucesso. Alguns países do mundo rico também tiveram desempenho bem melhor a partir de 2010.

Países têm sido levados à recessão também por outro caminho, quando seus governos decidem apertar as políticas monetária e fiscal para corrigir desajustes. Decisões desse tipo geralmente ocorrem quando se misturam problemas internos, como inflação acelerada e contas públicas deficitárias, com grandes desequilíbrios no balanço de pagamentos. Quando as políticas são bem planejadas e conduzidas com firmeza e seriedade, os desarranjos são controlados em pouco tempo e as condições de crescimento logo são restabelecidas, com inflação derrubada e fundamentos mais sólidos.

A história da atual estagnação brasileira é muito diferente. Do lado externo, as condições são muito melhores do que foram entre 2008 e 2010 ou 2011. Outros países voltaram a crescer depois de superado o impacto inicial. Do lado interno, a norma tem sido a tolerância à inflação, como se a meta anual fosse qualquer ponto entre 4,5% e 6,5%. Nenhum esforço duradouro e sério foi realizado para equilibrar os preços. A política fiscal foi dominada pela gastança, pela concessão mal planejada de incentivos tributários e pela promiscuidade entre o Tesouro e os bancos federais. Só ao Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) o Tesouro passou uns R$ 400 bilhões desde 2009. Sem impacto externo e sem aperto interno para combate à inflação e a outros desajustes, a recessão brasileira só é explicável como resultado de uma incompetência governamental de proporções olímpicas.

Mas empregos, insiste a presidente, continuam sendo criados. Sim, mas empregos de baixa produtividade, em serviços e na administração pública. Nos 12 meses até agosto foram criados 698.475 postos formais. Na área de serviços foram abertos 549.568 (78,68% do total), enquanto na indústria de transformação foram fechados 74.994. É evidente a redução da qualidade do emprego numa economia baseada muito mais no estímulo ao consumo do que no incentivo à produção, ao investimento e ao ganho de eficiência, Nessa estranha comédia de erros e de terror, a recessão é só um episódio, mas é um dos mais incomuns. Há vários caminhos para a recessão e o Brasil chegou lá pelo pior, o da inépcia, da mentira e do populismo.

Jornalista

Roberta Sá - Eu sambo mesmo

Vinicius de Moraes: Receita de mulher

As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de flor em tudo isso
Qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso (ou então
Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República Popular Chinesa).
Não há meio-termo possível. É preciso
Que tudo isso seja belo. É preciso que súbito
Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso, é absolutamente preciso
Que seja tudo belo e inesperado. É preciso que umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Éluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como o âmbar de uma tarde. Ah, deixai-me dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos, então
Nem se fala, que olhem com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) é também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar as pernas, e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente.
Gravíssimo é porém o problema das saboneteiras: uma mulher sem saboneteiras
É como um rio sem pontes. Indispensável
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteia em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de cinco velas.
Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal!
Os membros que terminem como hastes, mas bem haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!)
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior
A 37º centígrados, podendo eventualmente provocar queimaduras
Do primeiro grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro de paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros.
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.