domingo, 19 de abril de 2020

Entrevista | Rodrigo Maia: Equívocos fatais

Bolsonaro minimiza a pandemia e Guedes ‘não é sério’, diz Rodrigo Maia

O presidente da Câmara critica duramente o governo e ataca o ministro da Economia por 'misturar a cabeça das pessoas'

Por Cássio Bruno, Daniel Pereira | Revista Veja

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), está em rota de colisão com o chefe da equipe econômica, Paulo Guedes. O motivo é o seguinte: em meio à pandemia de coronavírus, o “primeiro-ministro”, como o deputado é chamado por colegas, está prevalecendo sobre o “Posto Ipiranga” de Jair Bolsonaro na elaboração de medidas destinadas a atenuar os efeitos econômicos da crise. O mais recente embate entre os dois envolve o projeto de socorro financeiro a estados e municípios. Guedes tachou a proposta defendida pelo parlamentar de bomba fiscal e disse que, se aprovada, teria um impacto de 285 bilhões de reais. Deixando o tom moderado de lado, Maia afirma que o ministro está distribuindo informação falsa à sociedade. E emenda, num ataque frontal: “Ele não é sério. Se fosse sério, não tentaria misturar a cabeça das pessoas”. O deputado também critica o presidente da República, que estaria empenhado em segurar a ajuda financeira a governadores como forma de enfraquecê-los, especialmente aqueles que podem disputar com ele o Planalto em 2022. A seguir os principais trechos da entrevista, concedida por videoconferência, como manda a cartilha em tempos de distanciamento social.

• Como o senhor avalia a atuação do presidente Jair Bolsonaro diante da pandemia de coronavírus?

O presidente minimiza o problema, o que pode ter consequências enormes num país continental como o Brasil. Outro dia, ele disse numa live que teríamos menos mortes com o novo coronavírus do que com a H1N1, o que, em poucas semanas, foi desmentido pelos dados oficiais. O presidente segue a linha daqueles que, em outros países, entenderam que o custo do não isolamento era menor que o custo do isolamento. A diferença é que a maioria dos governantes que seguiram esse caminho já recuou. A postura de Bolsonaro de minimizar a pandemia levou a equipe econômica a demorar muito tempo para se convencer de que o impacto seria grande. Essa postura também provoca conflitos.

• Que tipos de conflito?

Todos os problemas enfrentados pelo presidente são resultado de seu diagnóstico errado. Todos os conflitos partem de uma divergência dele com a maioria da sociedade brasileira. É uma coisa estranha porque parece que o Bolsonaro sai da posição de presidente e fica sendo o comentarista e crítico, como se não tivesse responsabilidade sobre determinada decisão ministerial. Outro dia, a esposa do ministro Sergio Moro postou um apoio a Mandetta e, depois, o apagou. Há um mal-estar não só com o Ministério da Saúde, mas com o segmento mais racional do governo.

• O senhor disse recentemente que o governo dá coice.

Toda vez que você diverge, como ocorreu em relação ao Ministério da Economia, o governo parte para o ataque. Em vez de fazerem um debate transparente e sério, o ministro (Paulo Guedes) e sua equipe passam informações falsas à sociedade em relação ao que deve ser a crise de estados e municípios nos próximos meses. Da forma como Guedes faz, a impressão que dá é que ele quer impor a posição dele — e, numa democracia, isso não existe. Tínhamos uma proposta de como ajudar estados e municípios, fomos convencidos de que parte dela estava equivocada, mudamos o texto e aprovamos uma versão muito equilibrada. Chegou a ponto de ele dizer que o impacto do projeto pode ser de 285 bilhões de reais. Sabe o que significa? Queda de 100% na arrecadação do ICMS e do ISS. Se ele acha que pode ser isso, o que não será nunca, está dizendo que a crise é muito mais grave do que estamos imaginando. Ou seja: ele não é sério. Se fosse sério, não tentaria misturar a cabeça das pessoas.

Entrevista | FHC: ‘Huck fica menor na crise. Doria tem maior projeção’

Para ex-presidente, ao se opor a Bolsonaro no enfrentamento do novo coronavírus, governador de SP ganha visibilidade

Pedro Venceslau | O Estado de S.Paulo

Cumprindo o isolamento social em seu apartamento em Higienópolis, região central da capital paulista, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tem dividido o tempo entre o trabalho em novo livro sobre sua trajetória intelectual, releituras de Machado de Assis e reuniões e debates virtuais do seu instituto. Eventualmente, faz rápidas caminhadas pelo bairro, sempre de máscara. O cardápio de filmes e séries fica por conta de sua mulher, Patrícia. Mas FHC confessa que não é muito fã de “maratonar” em plataformas de streaming.

Nesta entrevista ao Estado, FHC fez um uma análise do cenário político em tempos de covid-19 e disse que o presidencialismo de coalizão deu lugar a um sistema precário de governo compartilhado entre Câmara, Senado e Supremo Tribunal Federal. Na avaliação dele, o governador João Doria (PSDB) ganhou espaço durante a crise, enquanto o apresentador e possível presidenciável Luciano Huck, de quem é amigo, ficou politicamente menor.

• Alguns especialistas falam em ampliar o isolamento para combater a covid-19, enquanto empresários e a Fiesp defendem a abertura lenta e gradual da atividade econômica. O sr. acha que é o caso de abrir ou fechar mais?

Não sou médico, mas devemos ouvir os especialistas. O único remédio nesse momento é ficar em casa. Não há vacina nem medicamento específico. Qual a objeção de ficar em casa? É dizer que estão olhando mais para o sistema hospitalar, enquanto precisamos da economia funcionando. Vi uma entrevista de um general dizendo que há municípios onde não entrou a epidemia. Tudo bem, mas quem decide isso? Tem que ser uma coisa feita pelo governador e o município. Em tese eu sou mais favorável a manter por mais tempo o regime de ficar em casa.

• O sr. concorda com a medida provisória que permite redução salarial durante a pandemia?

Essa MP foi precipitada. Vai chegar um momento que talvez seja necessário, mas por que começar a apertar quem mais precisa? Quem está empregado quer manter a renda. Vai se mexer nisso? Me parece provocação. Não acho adequado.

• Por que não há um movimento articulado ‘Fora, Bolsonaro’?

A oposição não sabe bem o que fazer. Pedir o impeachment agora com base em quê? O impeachment ocorre quando o governo perde maioria no Congresso e não passa mais nada. Quando perde a capacidade de governar. Segundo, quando há gente na rua e a situação econômica está ruim. Nesse momento, o governo não tem maioria sólida, nem nunca teve porque sempre desprezou a maioria no Congresso, mas continua governando. Não tem gente na rua. Está todo mundo em casa, com medo. O momento é de coesão, de apelar para unidade. E esse é o erro do governo. O impeachment é traumático, deixa marcas. Não vejo que se aplique ao caso atual. Se o presidente começar a errar muito, ele mesmo vai provocar seu autoimpedimento. Tirar o ministro da Saúde foi uma coisa insensata. Um erro grave. Isso vai acumulando e mostrando pouca capacidade de liderança.

• Como o sr. avalia a atuação da oposição neste momento?

Não há oposição organizada. Estamos passando por uma situação curiosa politicamente no Brasil. Tínhamos um sistema baseado em coalizão, que não foi planejado pela Constituinte, mas foi acontecendo. É a coligação de vários partidos para poder governar. O presidente atual despreza os partidos, mas está acontecendo uma coisa curiosa, uma espécie de governo compartilhado. A Câmara e o Senado estão atuando mais efetivamente. O STF também. Não se sabe muito bem o que vai acontecer de tudo isso, mas há outro sistema em funcionamento que não é mais o de coalizão.

Entrevista | André Lara de Resende: ‘Trata-se da oportunidade de revalorizar a política’

“É preciso transformar o Estado cartorial e patrimonialista num Estado eficiente e a favor da população”

Cássia Almeida | O Globo

André Lara Resende, um dos autores do Plano Real, avalia que, no mundo póspandemia, abre-se a oportunidade para a revalorização do Estado, tornando-o “mais eficiente e a favor da população”. Em entrevista por email, ele prevê um reequilíbrio entre produção nacional e externa e que “o liberalismo econômico primário” será “imperiosamente revertido”.

• O Estado pós-pandemia ficará mais presente na economia?

Diante de uma crise dessas proporções, o sistema de mercado é incapaz de dar as respostas adequadas. Ao contrário, corre o risco de se tornar disfuncional. Om ercadoé baseadonacompetição e no individualismo, mas o momento, mais doque nunca, exige coordenação e cooperação. O liberalismo econômico primário que pauta apolítica econômica no país será imperiosamente revertido. Será uma oportunidade para revalorizar o Estado e apolítica, para transformar o Estado cartorial e patrimonialista num Estado eficiente e a favor da população. É uma oportunidade para que a vida pública volte a atrair pessoas bem intencionadas e qualificadas. Infelizmente, haverá sempre risco de que acrise venha a reforçar o apelo do autoritarismo, como sacrifício das verdadeiras conquistas do liberalismo ilustrado. O Estado, chamado a intervir, pode vira se tornar ainda mais burocrático e policialesco.

Vera Magalhães - Paranoia de Estado

- O Estado de S.Paulo

Instrumentos públicos não podem ficar à mercê de delírios do governante

Derrubado Luiz Mandetta, o inimigo interno que Jair Bolsonaro resolveu combater em meio à maior emergência de saúde do planeta, os esforços do presidente da República se voltam agora para uma tríade de adversários: Rodrigo Maia, João Doria e o STF, com menor intensidade (até porque, desde que assumiu, ele mostra certo temor de atacar o Judiciário com a sem-cerimônia com que atinge outros Poderes e instituições).

A razão é a velha paranoia presidencial. Acossado por fantasmas persecutórios desde muito antes de ser presidente, Bolsonaro vê um complô para derrubá-lo. O foco do momento é o presidente da Câmara, até pela importância do cargo para um eventual processo de impeachment.

Para atiçar ainda mais o medo do capitão, a sexta-feira foi o aniversário de quatro anos da queda de Dilma Rousseff. À parte pedaladas e economia em frangalhos, a condição definitiva para o impeachment avançar foi a decisão de Eduardo Cunha, então presidente da Câmara, de levá-lo a cabo depois de a presidente o desafiar.

Eliane Cantanhêde - De caminhões a aviões

- O Estado de S.Paulo

Fim de isolamento com mortos de 9 Boeings e corpos na rua? Teich e governadores não farão

O Brasil ainda não chegou na fase de “caminhões do Exército transportando corpos pelas ruas”, como advertia o agora ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, mas já exibe cenas horripilantes de caminhões frigoríficos à saída de hospitais em Manaus para evitar outras cenas horripilantes, de corpos e pacientes, lado a lado, pelos corredores. Preparem suas almas e estômagos, porque o Brasil não é uma bolha e essas imagens vão se repetir.

Por ora, alternam-se números da realidade com imagens da realidade paralela em que habitam milhões de brasileiros e o presidente da República. São mais de 2 milhões de contaminados e 150 mil mortos no mundo, mais de 33 mil e 2 mil no Brasil, mas incautos amontoam-se pelas ruas, sem máscara, cuidado e medo. “Indo para o matadouro”, definiu a jornalista Monica Waldvogel.

Na mesma reunião com Bolsonaro e ministros em que falou dos “caminhões do Exército”, Mandetta comparou: se morressem mil pessoas, seria o correspondente à queda de quatro Boeings. Logo, hoje já seriam nove. Em frente ao aeroporto de Congonhas, o Memorial 17 de julho lembra os 199 mortos do voo TAM 3054, em 2007, meses depois que um Legacy se chocou no ar com o Gol 1907, deixando 154 vítimas. Foram os dois maiores acidentes aéreos brasileiros, com grande comoção nacional. Hoje, a Covid-19 já faz 2.347 mortos e famílias destroçadas, quase 12 vezes que em cada acidente, num só mês.

José Roberto Mendonça de Barros* - Da tragédia para as novas perguntas

- O Estado de S.Paulo

Na crise, crescem os segmentos onde a ciência e a tecnologia foram aplicadas

Este é o terceiro artigo desde o aparecimento do novo coronavírus no Brasil.

Vimos que a pandemia se tornou uma ameaça global e provocou a parada súbita no sistema econômico, o que precipitou uma recessão.

Nesta semana, o Fundo Monetário Internacional (FMI) deu uma ideia da dimensão do problema, que é, sem dúvida, a maior ameaça para a economia mundial desde a 2.ª Guerra. No caso básico, o PIB global cairá 3%, sendo que os números serão muito piores para as economias ricas: -5,9% nos EUA, -7,5% na zona do euro, -5,2% no Japão. China e Índia, os gigantes emergentes crescerão 1,2% e 1,9%, respectivamente.

A América Latina vai na mesma direção, encolhendo 5,2%. Um show de horror.

A pergunta é o que acontece no ano que vem, isto é, se a recuperação será rápida ou relativamente lenta. No modelo do FMI, a recuperação será bem significativa, com o PIB global, crescendo 5,8% em 2021.

Tenho grande dificuldade em aceitar essa projeção, uma vez que ela tem como base algumas hipóteses que são heroicas para mim, a começar da ideia de que não haverá uma segunda onda do ataque do vírus. Em segundo lugar, haverá um número enorme de quebra de empresas de todos os tamanhos, em muitos lugares do mundo, especialmente, nos Estados Unidos, onde a dívida corporativa é a maior da história. Em terceiro lugar, o crescimento do desemprego e o grande desarranjo que acontecerá nos orçamentos familiares.

Depois de sairmos de uma experiência tão dramática, colocam-se algumas perguntas a respeito de para onde irá a economia global.

Nesta semana, duas reuniões patrocinadas pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) foram particularmente úteis para ter uma visão do problema. Na segunda-feira, participei de um debate com Demétrio Magnoli e Pedro Malan e na quarta-feira assisti a um belíssimo diálogo entre Fernando Henrique Cardoso e o embaixador Marcos Azambuja. Desses eventos saem quatro grandes questões:

Hélio Schwartsman - Previsões pós-pandêmicas

- Folha de S. Paulo

Temos a tendência de reagir exageradamente a crises que evoquem ameaça existencial

Leio com doses iguais de interesse e ceticismo as opiniões de filósofos, cientistas políticos e economistas sobre as grandes mudanças sociais que a pandemia deixará como herança. É claro que algumas coisas vão mudar. Como dizia Heráclito, nunca tomamos banho duas vezes no mesmo rio. Mas receio que previsões feitas no olho do furacão carreguem uma probabilidade ainda maior do que o normal de dar com os burros n’água.

Humanos temos a tendência de reagir de forma exagerada a crises que evoquem algum tipo de ameaça existencial. E temos bons motivos para isso. Todos os que caminhamos hoje sobre a Terra somos descendentes diretos daqueles que não brincavam com o perigo, ainda que eventualmente tenham pagado mico por correr da própria sombra. Nossos parentes mais relaxados não deixaram progênie.

Janio de Freitas - Festa no hospício

- Folha de S. Paulo

Bolsonaro e seu incentivo mortífero estão configurados na legislação criminal

A substituição, em meio a uma pandemia, de um ministro que segue a Organização Mundial da Saúde e as práticas bem-sucedidas em numerosos países é, em qualquer caso, jogar a vida alheia em uma aposta cega e cruel. Homicida ou genocida, potencialmente. No caso brasileiro, o ato é ainda mais grave no desprezo egoísta por todos os demais, todo um povo.

O ministro que chega traz muita incerteza e confiança rala. Está há muito afastado da prática médica (“fui médico”, disse na posse), nem teve, jamais, alguma experiência com serviços de medicina pública. Como pessoa, sua fala de escolhido foi uma enrolação ininteligível.

Afundou na dupla má intenção: pôr-se tanto como adepto do isolamento recomendado pelas melhores competências médicas —e também por ele defendido em texto de 13 dias antes— como anunciar-se “em alinhamento completo” com Bolsonaro, ou contra aquelas recomendações.

Essas credenciais inversas foram as aprovadas pelo trio de autoridades no assunto que, escolhidas por Bolsonaro, submeteram Nelson Teich a avaliação: um dono de construtura, Meyer Nigri; o publicitário Fabio Wajngarten, tido como distribuidor do coronavírus na Casa Branca e no Planalto, e um dos três vice-presidentes informais-efetivos, Flávio Bolsonaro.

Bruno Boghossian- Jogo de espera mórbido

- Folha de S. Paulo

Presidente faz ameaça vazia enquanto aguarda consequências econômicas da pandemia

Há três semanas, Jair Bolsonaro acordou “com vontade de baixar um decreto” para atropelar governadores, forçar a reabertura do comércio e derrubar medidas de isolamento contra o coronavírus. Ele explicou, dias depois, que o documento estava “pronto para assinar”, mas disse que ainda estava “esperando o povo pedir mais”.

Para um presidente acostumado a jogar para a plateia, a espera foi um tanto frustrante. Desde então, Bolsonaro assistiu ao agravamento da epidemia, foi proibido pelo Supremo de interferir nas restrições impostas pelos estados e viu pesquisas que mostraram que mais de 70% dos brasileiros apoiam essas decisões.

Ao sustentar a ameaça por tanto tempo, o presidente aposta num jogo de espera mórbido. Bolsonaro sabe que um plano de retorno imediato à normalidade é inexequível e não tem apoio dos cidadãos, mas ele espera que o jogo mude quando, inevitavelmente, as consequências econômicas da crise se tornarem cada vez mais dramáticas para a população.

A intimidação já nasceu vazia. Quando o presidente lançou a ideia de desmantelar o isolamento, governadores e prefeitos discutiram uma reação conjunta. Muitos combinaram que, se aquilo ocorresse, manteriam as medidas e ignorariam Bolsonaro. Na sequência, o STF ainda decidiu que os gestores locais têm autonomia para aplicar essas regras.

Ruy Castro* - Os mortos de Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

O presidente luta pela sua reeleição e o país se torna um jazigo ao ar livre

Jair Bolsonaro não é economista, historiador, sociólogo, advogado ou médico, o que lhe daria pelo menos instrução básica. Também não é empresário, fazendeiro ou banqueiro, com o que teria alguma visão do país. Sempre foi um político menor e da Velha Política —que, como candidato, fingia combater e, no Planalto, pratica nas barbas de seus seguidores.

Velho político, Bolsonaro deveria perceber uma oportunidade quando ela se apresentasse. Com a dissolução da economia, do meio ambiente, das relações exteriores, da educação e da cultura em seu governo, a Covid-19 seria um inimigo ideal a enfrentar —numa luta em que ele teria o país a seu favor e que, caso vitoriosa, apagaria as brutalidades que já cometeu.

Vinicius Torres Freire – O 1º programa de caça ao coronavírus

- Folha de S. Paulo

Governo federal vai fazer testes de pessoas sob risco, analisadas por robôs

O governo federal vai começar o primeiro programa de rastreamento de possíveis doentes de Covid-19 casado com testes da doença.

O rastreamento já existe, argumenta Erno Harzheim, secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde. A novidade é que a procura de doentes deve ser associada à realização de até 30 mil testes por dia.

O governo firmou uma parceria público-privada com uma rede de laboratórios para fazer os exames.

Desde o início de abril, existe um sistema em que o governo procura possíveis doentes pelo telefone e oferece consultas automáticas por meio de um aplicativo de celular, por ligações telefônicas ou por um “chat”. É o TeleSUS.

Em um primeiro momento, as pessoas falam com um robô. Se o sistema de inteligência artificial identifica um caso grave, a gente é automaticamente encaminhada para falar com enfermeiros ou médicos.

Luiz Carlos Azedo - Os “dinossauros”

- Nas entrelinhas | Correio Braziliense

“Bolsonaro acha que 70% da população terão a doença de forma branda, porém, devem voltar logo ao trabalho para não perderem os empregos”

Ninguém sabe como os dinossauros foram extintos. Entre 208 e 144 milhões de anos atrás, esses animais dominavam os ambientes de terra firme: eram herbívoros, em sua maioria, mas havia algumas espécies carnívoras que se alimentavam de anfíbios, insetos e até mesmo de outros dinossauros. No final do período Cretáceo, foram extintos juntos com diversas outras espécies de animais e plantas. Uma das teorias sobre essa extinção é a de que certos movimentos sofridos pelos continentes provocaram mudanças nas correntes marítimas e também no clima do planeta. Isso teria feito a temperatura baixar, o que causou invernos mais rigorosos. Outra, de que um asteroide colidiu com a Terra e provocou uma catástrofe, com terremotos, tsunamis e incêndios gigantes, que liquidaram a cadeia alimentar. Não existe nenhuma teoria de que tenham sido extintos por uma superbactéria ou um vírus mortal.

Já foram identificadas aproximadamente 3,6 mil espécies de vírus, que podem infectar bactérias, plantas e animais, bem como se instalar e causar doenças ao homem. Gripe, catapora ou varicela, caxumba, dengue, febre amarela, hepatite, rubéola, sarampo, varíola, herpes simples e raiva são as doenças viróticas mais conhecidas. Nenhuma delas se equipara, por exemplo, ao ebola, cuja letalidade é de 90%, ou ao HIV, que já foi de 100% e hoje está sob controle. Ambas não têm vacina reconhecida.

Uma epidemia acontece quando um determinado número de pessoas fica doente e o vírus se propaga exponencialmente. Para os epidemiologistas, o número mágico é 400 para cada 100 mil indivíduos. Esse é o rubicão natural de propagação de um vírus, a partir do qual, na linguagem dos sanitaristas, a epidemia “decola”. As gripes são as epidemias mais comuns, porque seus vírus sofrem permanentes mutações, exigindo campanhas anuais de vacinação. Os antibióticos são utilizados para combater infecções causadas por bactérias, que muitas vezes se propagam em simbiose com os vírus, mas não eliminam os vírus. Por isso, deveriam ter outro nome, talvez antibacterianos, o que facilitaria a vida dos médicos com seus pacientes, que não entendem a diferença entre uma coisa e outra e ficam querendo a medicação.

Dorrit Hazazim - Agora é pra valer

- O Globo

Brutalidade da disseminação da Covid-19 no Brasil começa a exibir suas entranhas

‘Tudo sob controle... Não sabemos de quem”, gracejou o vice-presidente Hamilton Mourão para jornalistas à saída da cerimônia de posse do novo ministro da Saúde. Comentário ligeirinho, espirituoso e ferino de quem sabe que não pode ser demitido do cargo pelo presidente da República. Nesta toada a autofagia em Brasília avança mais rápido do que o coronavírus. Em tempos normais, os embates intestinos no poder federal talvez fossem o mais alarmante para este momento de calamidade. Em tempos anormais como agora, eles consomem o resquício de lucidez que o país algum dia achou que tinha.

Quem fica mais nu a cada dia não é apenas o chefe da nação que se pensava rei — é o Brasil cru, sem fantasia, que vai emergir da pandemia. “Vai ser a devastação de uma raça chamada favela”, alerta Celso Athayde, fundador da Central Única das Favelas (Cufa), do Data Favela e da FHolding. Athayde nada tem de incendiário. Ele se faz ouvir por conhecer o universo do qual fala. Em recente entrevista ao “Jornal do Commercio”, elencou as duas únicas opções para os 13,5 milhões que moram em favelas no Brasil — correr ou morrer afogado. “A favela está se contaminando. É gente que não pode parar, mas que ninguém vê...”, disse, referindo-se à base da pirâmide de serviços essenciais sem a qual o resto do país em quarentena entra em colapso. Athayde preferiria não falar de convulsão social, mas adverte que “as pessoas não vão morrer de sede do lado de uma caixa d’água porque ela tem dono”. E conclui: “A pior crise é a crise de perspectiva. A favela não quer desordem, sabe que é ela quem vai tomar o tiro de borracha. Mas ela perde a capacidade de sonhar. Por não ter mais nada, vai fazer o quê?”

Míriam Leitão - Nordeste aposta na ciência como arma

- O Globo

Nordeste criou comitê científico que integra pesquisadores dos nove estados e defende que a guerra contra o vírus será vencida pela ciência

Os estados do Nordeste formaram um Comitê Científico, que criou nove áreas temáticas integrando pesquisadores de todos os estados, e montou uma sala de situação. Assim, preparados para guerra, estão unificando as ações. O neurofisiologista Miguel Nicolelis, um dos maiores cientistas do mundo, está na frente do Comitê. Sistemas de monitoramento estão sendo montados e estudos sendo realizados. O Nordeste quer a ciência no primeiro plano no combate à pandemia.

Em duas entrevistas concedidas esta semana ao Edição das 10 da Globonews, Nicolelis falou com entusiasmo sobre o trabalho e com lucidez sobre o tamanho do risco que está diante de nós neste momento:

– Esta é uma guerra biológica, uma guerra multidimensional, híbrida, diferente de todas as tradicionais. O front da guerra muda constantemente. E você tem que ter a habilidade de se mover no tempo do vírus. É um inimigo centrado em atingir seu objetivo, que é sobreviver às nossas custas. E nós deveríamos estar centrados no objetivo de eliminar essa invasão a qualquer custo.

Elio Gaspari - Mandetta fritou Bolsonaro

- O Globo | Folha de S. Paulo

Até a semana passada presidentes fritavam ministros. Desta vez, foi o contrário

Até a semana passada presidentes fritavam ministros. Desta vez, foi Luiz Henrique Mandetta quem fritou Jair Bolsonaro. Ele saiu maior e o capitão ficou menor. Tendo-se colocado numa posição teatral que ofendeu a ciência e a opinião pública, o presidente abandonou a piada da “gripezinha”. Boa notícia.

Bolsonaro fritou-se porque quis. Conduziu-se de maneira leviana e criou um antagonismo desnecessário com Mandetta. Em nenhum país a discussão da calibragem do isolamento, bem como a das virtudes da cloroquina levaram a fricções como as que Bolsonaro produziu. (Se Donald Trump pudesse, teria cortado a língua do doutor Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Doenças Infecciosas desde 1984, mas preferiu calibrar seus próprios delírios.)

Pode-se atribuir as falas da “gripezinha” a um estilo próprio de Bolsonaro, mas no domingo passado, quando ele disse que “parece que o vírus começa a ir embora”, lidou com fatos. Até aquele dia haviam morrido 1.233 pessoas, o contágio estava em expansão e como se esperava, poderia bater a marca dos 2 mil óbitos.

Bolsonaro vive numa realidade paralela. Isso não é de hoje. Em maio do ano passado ele disse o seguinte: “Brevemente, estará sendo apresentado aos senhores um projeto que, com todo o respeito ao Paulo Guedes, a previsão é de termos dinheiro em caixa maior do que a reforma previdenciária em dez anos”. Cadê? (Provavelmente, era a ideia de se legalizar o jogo.)

Gaudêncio Torquato* - Crise: Estado liberal x Estado autoritário

Democracias ocidentais surpreendidas pelo Covid-19

Ponto um: o Estado nas democracias ocidentais foi surpreendido pelo Covid-19 e, com poucas exceções, tem sido incapaz de dar respostas mais urgentes à pandemia. O Estado liberal e o Estado do bem-estar social estão no banco dos réus. Ponto dois: a China, de onde o vírus se espalhou, deu respostas mais eficazes por causa das ordens de seu poder central – o partido comunista-, e acatadas pela população. O Estado-autoritário até aqui está na vanguarda dessa guerra.

Aqui surge a questão: o Estado forte é mais apropriado para enfrentar crises do que o Estado liberal democrático?

Vejamos. No Brasil, temos à frente da economia um perfil liberal, o ministro Paulo Guedes, que prega deixar com o Estado apenas obrigações como educação, segurança pública e saúde. Empresas estatais deverão ser privatizadas.

No mundo, discute-se a ideia de dar mais força ao Estado para resolver situações críticas e vitais, enfim, os desafios de um mundo em transformação.

Seria o caso de se imitar a China? Não. Ali se vê um capitalismo de Estado tentando se tornar a primeira potência econômica do mundo. A par disso, trata-se de um Estado autoritário, que sufoca as liberdades individuais e sociais, censura o pensamento, a livre expressão e associação – de partidos políticos, por exemplo – , valores incompatíveis com os direitos humanos.

Ricardo Noblat - Por quem os sinos dobram

- Blog do Noblat | Veja

Uma política genocida
Para sujeitos como Donald Trump e Jair Bolsonaro, fora a deles não existe verdade. E a deles, naturalmente, pode ser uma, hoje, e outra amanhã de acordo com as circunstâncias. Há uma quantidade expressiva de pessoas que pensam e agem como eles – aqui, no momento, os que, por exemplo, defendem a salvação da Economia à custa da morte dos vulneráveis ao coronavírus.

Os vulneráveis não são poucos no Brasil. E não incluem só os idosos, como tanto se destacou de fevereiro último para cá. Vulneráveis são também aqueles que têm ao menos um dos cinco fatores que podem agravar o Covid-19: hipertensão, diabetes, doenças cardíacas e pulmonares. Sabe quantos são? Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz foram atrás da resposta.

Estimam que sejam cerca de 50 milhões de pessoas acima de 18 anos de idade. Um em cada três brasileiros. O vírus não discrimina entre jovens e velhos. Até ontem, eram 36.599 os casos confirmados, e 2.347 o de mortos que dobrou em uma semana. À legião dos que podem ser alvos da doença devem ser juntados os que padecem de condições de vida precárias.

Os desempregados – 12 milhões. Os sem tratamento de rede de esgoto – 10 milhões. Os sem água – 35 milhões. Os analfabetos – 12 milhões. Os sem educação de base – 70 milhões. Os invisíveis – assim chamados os que esperam receber o auxílio emergencial de 600 reais por mês -, seriam 54,5 milhões. Na verdade, devem passar dos 70 milhões. É por toda essa gente que os sinos dobram.

Mundo pós-pandemia exigirá um novo papel do Estado, avaliam especialistas

Maior crise sanitária e econômica desde o início do século XX acelerou o debate aumento das desigualdades e falta de serviços de qualidade, como saúde

Cassia Almeida e Henrique Gomes Batista | O Globo

RIO - Em meio às dúvidas provocadas pela maior crise sanitária e econômica atravessada pelo planeta desde o início do século passado, surge uma certeza: a visão dominante até agora sobre o papel do Estado vai mudar substancialmente. Especialistas concordam que, a partir da pandemia de coronavírus, serão cobrados dos governos no mundo soluções para mazelas sociais, políticas de redução da desigualdade de renda, uma ação mais estratégica no suprimento de itens essenciais e o fortalecimento de serviços públicos, como os de saúde, forçando mudanças no gasto público e no sistema tributário. Uma nova realidade que poderá favorecer o nacionalismo e o protecionismo.

— A pandemia pressionará os governos a aumentar a tributação e diminuir a desigualdade. O sofrimento social em todo o mundo está subindo rapidamente. Após a Covid-19, qualquer governo que não ajude grupos de baixa renda arriscará a estabilidade social — afirma Cliff Kupchan, presidente da Eurasia Group, maior consultoria econômica e política do mundo.

A transferência maciça de recursos para trabalhadores informais e mais vulneráveis acelerou o debate sobre a necessidade de renda mínima universal, na visão do sociólogo Pedro Ferreira de Souza, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ganhador do Prêmio Jabuti com livro sobre tendências históricas da desigualdade brasileira:

— O debate avançou 15 anos. Medidas que sequer se poderia imaginar há muito pouco tempo, como a nacionalização de hospitais na Espanha (que já soma 20 mil mortes decorrentes da Covid-19), começam a aparecer. Os sistemas públicos saem fortalecidos. São marcos civilizatórios. Quem levantar essa bandeira vai ter boa receptividade.

O que a mídia pensa - Editoriais

• A crise global e as peculiaridades brasileiras – Editorial | O Globo

Demais poderes cumprem suas funções, e isso compensa em parte a falta de articulação do Executivo

O pacote de dificuldades que a pandemia deste coronavírus entrega ao mundo é de alto poder destrutivo, mas pode ser confrontado pelo arsenal de conhecimentos acumulados nas crises econômicas do século XX, sem deixar de lado preocupações com as instituições políticas.

A paralisação das economias pelo isolamento forçado de parte da população do planeta causada pelo vírus tem, é claro, de ser revertida, evitando-se que o travamento da grande engrenagem produtiva instalada pela interconexão das economias no pós-guerra provoque duradouras recessões por toda parte. Os PIBs se retraem, mas é preciso reduzir ao mínimo as perdas, que não deverão ser pequenas, e apressar a volta do crescimento.

Pelo que indicam as previsões do Fundo Monetário Internacional, o “ponto de não retorno” para uma crise histórica que, segundo o próprio FMI, rivalizará com a Grande Depressão de 1929/30, já foi ultrapassado. O relatório divulgado na terça-feira pela economista-chefe da instituição, Gita Gopinath, prevê uma retração da economia mundial de 3%. Considerando-se que a estimativa anterior do Fundo era de um crescimento de 3,4%, significa que, em relação a seus cálculos anteriores, o FMI estima uma retração de mais de 6%, maior que na Grande Recessão de 2008/9, a mais vertiginosa queda da produção mundial desde 1929/30. No primeiro trimestre, o PIB da China encolheu 6,8%, taxa negativa jamais alcançada nos 28 anos em que o índice é calculado.

Numa economia globalizada, muito integrada, as ondas de impacto da crise se expandem, e causam estragos mais rapidamente do que no primeiro terço do século passado, na Grande Depressão. Em contrapartida, a própria integração entre os países e a existência de instituições multilaterais facilitam ações conjuntas contra as forças da depressão, apesar do aumento do poder político de partidos e grupos de ultradireita, nacional-populistas, xenófobos, contrários à globalização. Há ajustes a se discutir nesta integração, porém é irrefutável o poder demonstrado pelo avanço do capitalismo na Ásia, capaz de, na China, resgatar da miséria 800 milhões de pessoas desde 1978, início do programa de reforma do modelo maoista fracassado.

Música | Casuarina - Murmúrio

Poesia | Vinicius de Moraes - O velho e a flor

Por céus e mares eu andei,
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber
O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,
Eu já queria até morrer
Quando um velhinho
Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,
É o espinho que não se vê em cada flor.
É a vida quando
Chega sangrando aberta
em pétalas de amor.

sábado, 18 de abril de 2020

Alberto Aggio* - Isso é Bolsonaro

- O Estado de S.Paulo

Com recessão à porta, presidente combate as lideranças que ameaçam seu caminho para 2022

É traço comum das análises sobre o Brasil atual buscar entender o que melhor caracterizaria Jair Bolsonaro e seu governo. Bolsonaro é efetivamente um personagem singular, minimamente letrado, um tanto tosco, que numa circunstância especialíssima chegou à Presidência da República. Não estaria errada essa descrição, mesmo reconhecendo sua insuficiência.

Dizer que ele representa os militares seria uma generalização absurda e um desprestígio da categoria. Os militares compõem uma camada intelectual de relevância incontestável para o Estado brasileiro. Como se sabe, Bolsonaro foi afastado do Exército por indisciplina. Tornou-se político profissional com votos da corporação militar por longos 28 anos. Como parlamentar e agora como presidente permanece um defensor das demandas dos militares – vide a reforma da Previdência. É certo que recheou o Ministério com muitos deles, o que não garantiu identidade absoluta entre o presidente e os militares convidados.

Não há novidade também na caracterização de Bolsonaro como representante da extrema direita. Não apenas ele, mas seus filhos – igualmente políticos profissionais, vale ressaltar – não escondem isso de ninguém, até mesmo as ligações internacionais com essa corrente política. Tal posição, distinta de outras correntes e personalidades desse campo, acabou por definir mais precisamente Bolsonaro como expressão de uma facção da direita que tem cultivado um comportamento fascistizante.

Merval Pereira - Instituições funcionam

- O Globo

Constituição prevê o direito ao trabalho e uma série de garantias para a proteção do emprego, o objetivo da MP

Duas das instituições mais atacadas pelo presidente Bolsonaro nos últimos dias, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso, deram ontem demonstrações de que atuam nesse momento dramático do país sem viés ideológico, ajudando o governo a enfrentar a Covid-19.

O Supremo aprovou por maioria ampla (7 a 3) a permissão de acordos individuais entre empregados e empregadores sem a participação dos sindicatos. O Senado, por sua vez, aprovou a proposta de emenda constitucional (PEC), que já havia sido aprovada pela Câmara, que institui o chamado “orçamento de guerra”, que dá licença ao governo de gastar verbas não previstas no orçamento-geral da União no combate à Covid-19. Acertos terão que ser feitos, pois o Senado alterou o texto que veio da Câmara, mas nada que a inviabilize,

Bolsonaro, que acusara quinta-feira o presidente da Câmara de conspirar para derrubá-lo, recebeu poderes nunca antes dados a um presidente da República, e por iniciativa do próprio Rodrigo Maia.

Pelo “orçamento de guerra”, o governo não terá as limitações da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o Banco Central fica autorizado a comprar e vender títulos públicos nos mercados financeiros de empresas que necessitem ajuda, sem passar pelo mercado bancário. Uma maneira de injetar dinheiro com rapidez nas empresas privadas, sem entraves que a legislação atualmente impõe.

Ricardo Noblat - A chance desperdiçada por Bolsonaro

- Blog do Noblat | Veja

Onde você estava e o que fez no ano do coronavírus

Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, prestaria um grande favor ao presidente Jair Bolsonaro se aceitasse em breve um dos muitos pedidos de impeachment contra ele que guarda na gaveta. Seria um político amador se o fizesse. E Maia, apesar da juventude, tem se revelado um político ajuizado e esperto.

Por mais que Bolsonaro o pressione e ataque como tem feito, Maia não cairá na armadilha. O deputado diz que está acostumado com pressões desde antes de nascer. No útero da mãe, foi pressionado pela irmã gêmea. Depois de nascido, aprendeu com o pai, Cesar Maia, ex-prefeito do Rio, como lidar com situações difíceis.

A presidência da Câmara por três mandatos consecutivos foi a melhor escola que Maia poderia ter-se matriculado para neste momento encarar com sensatez o presidente mais belicoso que pôs os pés no Palácio do Planalto desde a redemocratização do país em 1985. O temperamento irritado de Maia é coisa do passado.

Se Bolsonaro o desafia dizendo que ele quer derrubá-lo, não é um patriota, nem tem “um coração verde amarelo”, Maia responde: “Enquanto o presidente joga pedras no Congresso, o Congresso lhe manda flores”. Bolsonaro teme a abertura de um processo de impeachment no próximo ano – por isso deseja antecipá-lo.

Não se tira presidente em meio a uma pandemia justo quando se pede às pessoas que fiquem em casa. Pode-se tirar depois que a epidemia passe e que as pessoas voltem às ruas. Mesmo assim, a tirá-lo, é preferível que fique onde está sob a tutela do Congresso e da Justiça. Impeachment é sempre um processo traumático.

Eduardo Paes* - Depois da peste

- O Globo

Gerenciamento da recuperação pode mudar o futuro de uma cidade

Temos dois caminhos a escolher: esperar a epidemia passar para pensarmos o que fazer depois — e incorrer nos mesmos erros de falta de planejamento — ou pensar nas saídas para quando a fase mais crítica arrefecer.

O adequado gerenciamento da recuperação de uma crise pode mudar o futuro de uma cidade. Como toda crise é oportunidade, esse processo pode representar o surgimento de soluções para problemas que já vivemos. O caso do Rio é especial. A cidade já vinha atravessando um de seus piores momentos, e a Covid-19 vem torná-los mais desafiadores.

Pandemias tiveram historicamente um impacto muito importante em transformações urbanísticas e econômicas. As pandemias do século XIX ajudaram a acelerar implantação de redes de água e esgotos em diversas cidades do mundo(Alô, Cedae!!!! Estamos no século XXI sem resolver problemas do século XIX!). São Francisco e Chicago se tornaram cidades economicamente mais bem-sucedidas depois de um terremoto e um furacão. Desastres e doenças dão forma a cidades!

Daniel Aarão Reis - A distribuição da dor

- O Globo

Seria viável, sim, lidar melhor com a tragédia, construindo e equipando hospitais, constituindo reservas

Em artigo sobre a atual pandemia, Nick Paumgarten narrou a história de um capitalista que joga na Bolsa de Valores. O homem é esperto e descreveu sua última proeza. Ao perceber o ritmo de expansão do vírus na China, suspendeu as férias numa estação suíça de esqui, investiu firme em ações de uma fábrica de equipamentos médicos nos Estados Unidos, botou dinheiro em empresas cujas ações subiriam com a disseminação universal da doença, e se mandou para sua casa de campo, bem longe da cidade onde mora. No caminho para o autoconfinamento, comprou o que pôde de máscaras cirúrgicas e luvas para si mesmo e para a família — mulher e três filhos — dois bujões de oxigênio e uma sacola de cloroquina. A salvo, comentou que ficaria feliz e em segurança até o próximo mês de outubro, acompanhando pelo computador a valorização dos investimentos. Até o momento, seu lucro era de 2.000%. Tudo na perfeita paz, dentro da ordem, respeitando a lei.

Ainda há quem ouse dizer que estamos no mesmo barco. Como se sabe, há metáforas que iluminam, outras obscurecem. A do barco pertence ao segundo tipo. Flávia Oliveira colocou o dedo na ferida.

Se a tempestade é a mesma, as condições de seu enfrentamento são diversas, havendo barcos de diferentes tipos: dos poderosos navios de casco de ferro aos barquinhos de papel que podem afundar a qualquer momento. Sem contar os que nem barcos têm e boiam no mar revolto, agarrados a pedaços de madeira encontrados ao léu.

Este é o mundo que nos foi concedido viver.

Ascânio Seleme - O negacionismo e a boa notícia

- O Globo

Não se pode negar que Nelson Teich tem um bom currículo. Seu problema é o “alinhamento completo” que disse ter com o presidente Jair Bolsonaro

Não se pode negar que Nelson Teich tem um bom currículo. Até porque, como ele próprio fez questão de lembrar na reunião em que foi convidado para o Ministério, estudou em Harvard. Aliás, parece que todo ex-aluno de Harvard precisa dizer nos primeiros dez minutos de conversa com uma pessoa que acaba de conhecer que estudou naquela universidade americana. Por isso, pelo currículo, que além da medicina tem graduações e mestrados em economia, gestão e negócios da saúde, Teich tem tudo para ser um bom ministro da Saúde. Seu problema é o “alinhamento completo” que disse ter com o presidente Jair Bolsonaro.

Não é possível se produzir uma boa gestão da epidemia do coronavírus usando o mesmo caminho de Bolsonaro. Ao contrário do que afirma, o presidente tem uma visão reduzida do cenário. Ele nega a importância da crise sanitária em favor da economia. Diz ter uma visão mais ampla do que os ministros que estão focados nas suas pastas enquanto ele pensa no todo. Não é verdade. No caso da saúde, Bolsonaro acha que o coronavírus pode gerar em pessoas como ele apenas uma “gripezinha”, desrespeita regras de distanciamento social de maneira deliberada e insiste em reabrir já a economia.

Se Teich seguir este caminho e sair por aí abraçando pessoas, cobrando de prefeitos e governadores a reabertura do comércio e debochando do vírus, o colapso hospitalar será inevitável. Claro que ele não chegará a este ponto, apesar do anunciado alinhamento total com Bolsonaro. Até porque, para seu constrangimento, o próprio presidente lhe pediu que seja um meio-termo entre ele e o demitido Luiz Henrique Mandetta, como se dissesse “nem tanto ao mar, Teich”.

Míriam Leitão - O ministro ainda não se explicou

- O Globo

O novo ministro da Saúde tem que dizer a que veio, o que pensa e qual é a sua estratégia para não virar um joguete político

O ministro da Saúde, Nelson Teich, foi genérico. No seu discurso de posse, nem falou a expressão “distanciamento social”. Tentou contornar o incontornável. O assunto está no centro das atenções, e o presidente Jair Bolsonaro não fugiu dele. Disse, logo em seguida, ao explicar as razões de ter trocado o ministro, que quer “essa briga de começar a abrir o comércio”. O presidente sabe que não poderá decidir isso, já que o STF foi claro sobre as competências dos governadores e prefeitos, mas continua jogando politicamente. O novo ministro, se não quiser ser um joguete na mão do presidente, terá que marcar o território sendo mais claro sobre o que pensa e sobre qual é a sua estratégia.

Teich falou sobre a importância de termos mais informações sobre o coronavírus. Isso é óbvio. Todos querem no mundo inteiro mais informações sobre o vírus e isso só se conseguirá com aposta maior na ciência, coisa que seu antecessor defendia. O presidente, contudo, é um negacionista da ciência em todas as áreas. Teich disse que é preciso a integração as várias pastas do governo. Claro. É isso que o chefe da Casa Civil, Braga Neto, tem tentado demonstrar que já existe com aquelas entrevistas no Palácio do Planalto em que diariamente se alternam os ministros de diversas áreas. O novo ministro disse que precisa montar seu time. Certo. É isso mesmo que fazem todos os que chegam aos seus postos. Ou seja, ele assume falando platitudes e sem dizer qual será a sua estratégia. Não fez referência à cloroquina, mas falou de um antiviral como promissor. Essa notícia animou as bolsas há dois dias, mas é dessas informações que vêm e somem ao sabor das cotações. Há uma corrida dos laboratórios por remédios e vacinas e, claro, a torcida geral é para que logo se chegue ao bom resultado, mas o que temos até agora é nada.

Hélio Schwartsman - Dá para ignorar o presidente?

- Folha de S. Paulo

Não é simples para a imprensa aderir à estratégia de tornar Bolsonaro insignificante

Respondo hoje à provocação do leitor Jean Claude Villari: “Está muito claro que nosso presidente não é capaz de fazer leituras de cenários, por mais simples que sejam. Comete erros muito graves e inadmissíveis. A minha pergunta é por que a imprensa cede tanto espaço a essa figura?”.

Villari está entre os que acham que a mídia deveria somar-se a forças como Congresso, STF e até parte dos ministros que promovem uma espécie de boicote informal da Presidência, fazendo gestões para minorar os estragos que o voluntarismo irresponsável de Bolsonaro produz.

A causa é justa, mas receio que o papel institucional da imprensa seja um pouco diferente do das outras forças citadas. Não é tão simples para os meios de comunicação aderir à estratégia de tornar o presidente insignificante.

Julianna Sofia - Dez anos na UTI

- Folha de S. Paulo

Guedes entregará ao próximo presidente eleito um rombo

Há um rombo errante nas contas públicas federais neste ano. Segundo cálculos oficiais, já está em R$ 600 bilhões e com tendência a se aprofundar. Frente à catástrofe generalizada provocada pela pandemia na vida das famílias e nas empresas, é mais que aceitável romper os limites fiscais, mesmo com o custo elevado que será apresentado à sociedade brasileira nos anos que se seguirão.

Diante das incertezas sobre o impacto da crise, o governo de Jair Bolsonaro foi obrigado a abandonar uma meta fixa para o resultado primário em 2021 (sem os encargos da dívida). A impossibilidade de projetar o comportamento da arrecadação levou a equipe econômica a ancorar sua política fiscal no teto de gastos --dispositivo que limita o avanço das despesas à inflação.

Espera-se um déficit de R$ 127,5 bilhões para 2022, último ano do mandato de Jair Bolsonaro. Nada mais irônico para um ministro da Economia, de orientação ultraliberal e que chegou a prever zerar o déficit público já no primeiro ano da gestão bolsonarista, não conhecer o azul de perto.

Alvaro Costa e Silva - Destino: rua do Jogo da Bola

- Folha de S. Paulo

A literatura de Rubem Fonseca é um mapa geográfico e humano do Rio

Ao fim da pandemia, eu quero ser o Epifânio. É o personagem esquisitão do conto “A Arte de Andar nas Ruas do Rio de Janeiro”, com que Rubem Fonseca —o Prêmio Camões que morreu na quarta-feira (15), aos 94 anos— atualiza o clássico “Um Passeio pela Cidade do Rio de Janeiro”, de Joaquim Manuel de Macedo, e do qual tira a epígrafe terrível e atual: “Em uma palavra, a desmoralização era geral”.

Epifânio mora num sobrado, em cima de uma chapelaria feminina, na rua Sete de Setembro, no velho Centro, e anda nas ruas o dia inteiro e parte da noite. Acredita que ao caminhar pensa melhor e encontra soluções para seus problemas. Olha com atenção tudo o que pode ser visto: fachadas, telhados, portas, janelas, latas de lixo, bueiros, passarinhos bebendo água nas poças, o cinema que é ocupado pela igreja Jesus Salvador das Almas —como a fixar uma cidade que por milagre ainda existe, mas vai desaparecendo, ou se transformando em outra.

Visionário, o personagem ensina o caminho das pedras: você segue até o largo de Santa Rita, onde termina e começa a Marechal Floriano, vai até a rua dos Andradas, entra na Júlia Lopes de Almeida, segue até chegar à Senador Pompeu, entra pela direita numa travessa e, pronto, chega à rua do Jogo da Bola.

Na rua do Teatro, ele para e fica olhando para o último andar de um edifício. Logo outras pessoas se juntam em torno dele, ficam também olhando para o alto e perguntam: “Que foi? Ele já pulou?”. Nesse momento é como se Epifânio, por vontade própria, se transmudasse para outro relato do escritor, “A Força Humana”, no qual uma pequena multidão se posta em frente a uma loja de discos para ver um homem sambar. A literatura de Rubem Fonseca é um mapa geográfico e humano do Rio.

O bater pernas de Epifânio termina na rua do Ouvidor, direção do mar. Aonde também eu quero chegar, assim que puder. De longe, já dá para sentir o cheiro.

Demétrio Magnoli* - O médico e o monstro

- Folha de S. Paulo

Polarização política no Brasil e nos EUA destila polêmica estúpida, mas não é assim na Alemanha

Nos EUA, é Anthony Fauci; no Brasil, Mandetta. Os dois médicos ocuparam o centro dos palcos, ofuscando Trump e Bolsonaro. O presidente americano resiste prudentemente ao perigoso instinto de demitir o diretor dos Institutos Nacionais de Saúde. O brasileiro, comandado por sua própria seita de sicários de redes sociais, acaba de dispensar o ministro da Saúde.

Lá, como aqui, ainda que em tons menos primitivos, a polarização política destila uma polêmica estúpida que contrapõe saúde pública e economia. Não é assim na Alemanha, onde ninguém discute que os dois elementos pertencem à mesma equação.

A pandemia oferece um curso inteiro sobre os efeitos do populismo. Trump e Bolsonaro falaram numa "gripezinha". As sociedades reagiram, atemorizadas pelos monstros, entregando sua sorte aos médicos.

Nesse passo, enquanto a direita populista agrupava-se atrás do estandarte da "economia", todos os demais constituíam uma frente ampla em defesa da "vida". A quarentena converteu-se em programa político e, quanto mais à esquerda, mais radical é a convocação ao isolamento social.

Há uma certa lógica na atração da esquerda pela quarentena. A China fez a mais completa delas. Quarentenas reforçam o poder estatal, em detrimento das liberdades públicas e individuais. É a hora da polícia: a emergência propicia o controle da informação, a mordaça à imprensa. A paralisia econômica demanda agressivas políticas de distribuição de fundos públicos. A "mão invisível" do mercado cede lugar à mão bem visível do Estado. O fechamento de fronteiras promove desglobalização.

Ligia Bahia* - Aumentar a escala da rede

- Folha de S. Paulo

Medida pode salvar vidas e nos tornar menos desiguais

O novo coronavírus é repentino, devastador e universal. Já houve crises sanitárias mais letais, mas a maioria permaneceu territorialmente circunscrita, e registram-se aquelas disseminadas, porém, quase sempre, com menores taxas de mortalidade.

A surpreendente ameaça à saúde vem sendo respondida com medidas também inusitadas. Estratégias de distanciamento social se conjugaram com a reorganização de recursos assistenciais.

Países como a Austrália, Irlanda, Espanha, Reino Unido procuraram reunir de forma coordenada insumos estratégicos. Barreiras de natureza jurídica foram rompidas pela celebração de acordos para uso comum de estabelecimentos privados durante a pandemia.

A maior parte dos termos de cessão de uso prevê o pagamento de valores compatíveis com a manutenção dos hospitais, deduzindo o lucro. É vantajoso para ambas as partes porque evita a ociosidade decorrente das recomendações de adiamento de exames e internações eletivas e permite a necessária expansão de leitos por preços justos. O uso compartilhado de leitos, acrescido com a montagem de hospitais de campanha, conforma uma escala adequada para a magnitude da pandemia.

Adriana Fernandes - Quem paga a conta?

- O Estado de S. Paulo

Certamente falta foco nos gastos, que pode levar ao mau uso do dinheiro

A coluna do dia 4 de abril alertou para o risco de a falta de uma coordenação nacional nas medidas de combate ao coronavírus provocar um rombo irreversível no chamado pacto federativo brasileiro.

De lá para cá, avançamos a passos largos na direção de um racha que coloca em lados opostos 25 governadores, centenas de prefeitos de todo o País e lideranças parlamentares contra o governo Jair Bolsonaro.

Não dá mais para fazer vista grossa ao problema.

A crise federativa está no centro da velocidade de reação do Brasil à pandemia da covid-19 e pode ter consequências ainda mais graves no combate da disseminação do vírus mortal (sim, é preciso repetir mais um vez: não se trata de uma gripezinha) nas próximas semanas no País, mas também na fase que se seguir ao fim da quarentena.

É no pós-crise que o Congresso poderá votar projetos importantes alterando a ordem das coisas e desmanchando o modelo atual de distribuição do bolo dos tributos cobrados da sociedade que baliza o pacto federativo. Propostas não faltam nas duas Casas – Câmara e Senado. Tudo isso sem nenhuma articulação e debate aprofundado. Na base mesmo da retaliação.

Sem dúvida, o trauma da disputa com os governadores traz mais confusão à vista quando o que se deveria esperar é uma agenda de recuperação nacional após o baque da recessão economia já contratada pela covid-19.

Marcus Pestana - Crise e intervenção estatal

A crise que estamos vivendo – sanitária e econômica – recoloca um debate recorrente ao longo da história do capitalismo: o papel do Estado na economia e na sociedade. Qual seria o nível ideal de intervenção estatal para assegurar os objetivos nem sempre convergentes de crescimento econômico, estabilidade interna e externa, desenvolvimento social e fortalecimento da democracia?

Nas eleições presidenciais de 2018 houve uma escolha que anunciava um programa ultraliberal, na medida em que o presidente eleito deu carta branca a seu ministro da economia, Paulo Guedes, materializada na figura do “posto Ipiranga”. A partir do diagnóstico da crise herdada dos governos do PT, previam-se reformas estruturais, amplo programa de privatizações, enxugamento da máquina estatal, austeridade fiscal, abertura externa e a liberalização radical da economia de mercado. Paulo Guedes, um economista com sólida formação teórica e experiência empresarial no mercado financeiro, se coloca alinhado com a tradição de economistas liberais como Eugênio Gudin, Otávio Bulhões e Roberto Campos, que nunca tiveram muito sucesso político na implantação de suas ideias no Brasil. Com grande protagonismo e cooperação do Congresso Nacional, avanços importantíssimos foram feitos desde 2017. A agenda de reformas foi abruptamente interrompida pela pandemia do coronavírus.

Cabe registrar que o agigantamento do Estado brasileiro não é obra de governos socialdemocratas e de esquerda. A construção do intervencionismo estatal pós-1930 passou por Vargas, JK, mas teve momentos expressivos nos governos militares, sobretudo no 2o. PND de Geisel, e, posteriormente, nos governos do PT. Muito ao contrário, os governos socialdemocratas de Itamar Franco e FHC privatizaram a EMBRAER, as telecomunicações e a Vale do Rio Doce e estabilizaram a economia com o Plano Real e a introdução da responsabilidade fiscal, do câmbio flutuante e da autonomia da política monetária.

Senado barra minirreforma trabalhista de Bolsonaro

Texto caduca na segunda-feira e proposta da equipe econômica volta à estaca zero

Iara Lemos – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Os líderes partidários do Senado fecharam acordo na manhã desta sexta-feira (17) para não votar a medida provisória do Emprego Verde e Amarelo, que reduz encargos para patrões que contratarem jovens no primeiro emprego e pessoas acima de 55 anos que estavam fora do mercado formal.

Se não for votada, a medida perde a validade na próxima segunda-feira (20). Sendo assim, caberá ao Congresso definir, por meio de projeto de decreto legislativo, as regras para os atos ocorridos na vigência da medida, que tem prazo de 120 dias.

Há um clima de rebelião no Senado na manhã desta sexta fruto principalmente dos ataques feitos pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, contra o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

“O MDB apoia a democracia. O presidente da República não pode fazer acusações sem provas”, disse o líder do MDB, Eduardo Braga (AM).

A PEC do orçamento de guerra, que tem segundo turno previsto para essa sexta-feira, também teve a votação questionada pelos senadores, mas acabou sendo colocada em apreciação no final da manhã.

Bandeira do governo neste período de pandemia, a MP já chegou no Senado sob polêmica dos líderes, que questionam o fato de ela alterar regras trabalhistas na esteira do estado de calamidade decretado pela pandemia causada pelo coronavírus.

Os líderes também criticam o tempo para a apreciação da medida, já que foi votada na terça-feira (14) pela Câmara e logo encaminhada para apreciação no Senado, sem que os parlamentares tivessem tempo para análise.