sexta-feira, 1 de julho de 2022

Vera Magalhães: Bolsonaro é premiado por sua incompetência

O Globo

Quando historiadores forem analisar o governo Jair Bolsonaro, um dos fatores sobre o qual terão de se debruçar é o fato de como a incompetência extrema do presidente e de seus auxiliares é constantemente premiada com colheres de chá que acabam por premiar a falta de planejamento.

A aprovação de afogadilho de um enorme cheque em branco eleitoral para o presidente distribuir grana viva às vésperas da eleição, ao arrepio flagrante da Constituição, da lei eleitoral, da Lei de Responsabilidade Fiscal e do teto de gastos é só a mais recente dessas incompreensíveis ajudas que Bolsonaro, mesmo deixando claras suas piores intenções, consegue receber de todos, inclusive da oposição.

Foi assim com a PEC que promoveu a pedalada descarada nos precatórios, que nada mais são que dívidas transitadas em julgado; com a mais recente emenda que promoveu uma tunga no ICMS de Estados e municípios apenas para conter o faniquito do presidente para baixar o preço dos combustíveis de forma terceirizada, e que, como previsto não foi efetiva; com as sucessivas e inimagináveis intervenções na direção da Petrobras, que acontecem sem que ninguém tente impedir, entre outros episódios recentes e mais remotos.

Agora o Senado acaba de dar lastro ao desespero eleitoral de Bolsonaro, fornecendo a ele uma vantagem econômica absurda em relação aos adversários. Como cria uma narrativa chantagista de que se trata de combater a fome, a insegurança alimentar e a perda de renda provocada com a inflação — como se todos esses flagelos reais não fossem obra continuada justamente da inoperância do governo e de sua capacidade de planejar medidas de longo prazo — o governo consegue fazer com que  um rombo de R$ 40 bilhões para promover benesses eleitoreiras seja aprovado praticamente por unanimidade, com beneplácito inclusive do PT.

Míriam Leitão: Oposição caiu na armadilha do governo Bolsonaro

O Globo

aprovação da chamada PEC 01, com ampla maioria de votos da oposição, mostra que esses senadores caíram na armadilha criada pelo governo Bolsonaro. O presidente ganhou um cheque em branco para ampliar despesas a menos de 100 dias das eleições, desrespeitando as leis fiscais e eleitorais do país.

O único parlamentar com coragem de fazer a coisa certa foi o senador José Serra (PSDB-SP), que foi o voto contrário nos dois turnos de apreciação da matéria no Senado. A ilusão dos senadores oposicionistas é achar que conseguiram melhorar o texto, evitando o pior cenário.

Laura Karpuska*: Instituições avariadas

O Estado de S. Paulo

A classe política se cala para o mais novo golpe às instituições feito por este governo

Desde que assumiu a Presidência, Jair Bolsonaro trabalha para minar a confiança nas instituições brasileiras. Seu foco nunca foi fazer reformas econômicas de natureza liberal, nem mesmo defender uma pauta conservadora nos costumes. Bolsonaro governa pelo caos, usando-o como estratégia de manutenção do poder e de apropriação do Estado por pequenos grupos de interesse.

O foco desta coluna era elencar o risco de Bolsonaro acelerar o derretimento institucional para tentar, a qualquer custo, ganhar as eleições. A pauta do Senado desta semana serviu como exemplo prático disso, mostrando que o governo Bolsonaro não está sozinho nesta empreitada. Enquanto escrevo, o Senado vota uma Proposta de Emenda à Constituição que coloca o País em “estado de emergência” por conta dos aumentos do petróleo. Inicialmente, a proposta previa compensar Estados que decidissem zerar o ICMS dos combustíveis.

Fernando Luiz Abrucio*: O casamento da barbárie com o atraso

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Havia no Brasil uma grande agenda de modernização pela frente, só que o bolsonarismo interrompeu este processo civilizatório

O governo Bolsonaro é o casamento do atraso com a barbárie. Este projeto está levando o país a um enorme retrocesso, que já pode ser contado em termos de décadas. O Brasil tinha tido vários avanços institucionais e sociais desde a redemocratização, especialmente com a Constituição de 1988, mas também por meio de melhorias ocorridas em diversos mandatos. Ainda havia uma grande agenda de modernização pela frente, só que o bolsonarismo interrompeu este processo civilizatório e se corre o risco agora de sobrar apenas um Estado destruído e uma sociedade dominada pela lógica da violência.

A modernização brasileira ocorreu em múltiplas dimensões desde o final do regime militar. O primeiro ganho foi político. O país tornou-se democrático, realizando oito eleições presidenciais livres e com alternâncias de poder. Houve uma ampliação dos mecanismos de participação popular e fiscalização dos governantes, de modo que o Estado se tornou mais aberto à sociedade e transparente. A democracia brasileira tinha ganhado uma forma inédita, pois escolhia livremente os seus representantes por um método limpo de seleção e podia controlá-los para evitar o arbítrio, o pior dos males de qualquer regime político.

O segundo ganho desse processo civilizatório foi social. Houve enormes avanços em indicadores de saúde, num país historicamente marcado pela desassistência aos mais pobres, especialmente as crianças, mulheres e idosos. Sinal disso foi a melhora substancial nas taxas de mortalidade infantil, expectativa de vida, saúde materna, entre outros.

José de Souza Martins*: O poder paralelo e do avesso

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Garimpo, madeireiros, pesca, invasão de terras indígenas, grilagem e devastação ambiental são indicações de que o Estado pode ter perdido o controle de uma parte do território

O assassinato do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista Dom Phillips mostrou-nos que, na estrutura social e política da sociedade brasileira, transformados, persistem dois Brasis. O Brasil legal, que é aquele em que supomos viver e do qual supomos ser cidadãos, e o Brasil paralelo e clandestino, das formas disfarçadas de violação das leis e de minimização adaptativa das instituições aos requisitos de preservação e reprodução do atraso.

As eleições de 2018 acordaram e deram força ao Brasil retrógrado e sobrevivente de todos os nossos atrasos acumulados e represados desde as escravidões, a indígena formalmente encerrada em 1755 e a africana, em 1888. Esse Brasil acordou pós-moderno, na definição de Néstor García Canclini, sem moderno ter sido.

Arcaica concepção de poder e cômica tirania desenham um modelo de atraso lucrativo, o do poder pessoal e dos misticismos híbridos que desaguaram nas seitas e religiões de negócio. Nossas misérias se juntaram numa conspiração alienadora para usurpar o direito de expressão democrática do povo.

Eliane Cantanhêde: Tensão pré-eleitoral

O Estado de S. Paulo

Com ex-ministro preso e presidente da CEF atacando moças, Bolsonaro prepara planos B e C

O presidente Jair Bolsonaro está no seu inferno astral, ou com tensão pré-eleitoral, empilhando notícias negativas, uma em cima da outra, o tempo todo. É aquela história: o candidato à reeleição tem vitrine, caneta, verbas, cargos e puxa-sacos, mas também é vidraça. Tem de responder pelo que acontece.

Não bastassem inflação, gasolina, diesel, gás e 33 milhões de famintos, temos o assassinato de Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira jogando luzes na implicância de Bolsonaro com indígenas e o ex-ministro Milton Ribeiro preso pela PF. Além de revelar que o presidente pôs os dois pastores vigaristas no MEC e lhe passou informação privilegiada sobre a busca e apreensão.

Agora vêm os relatos de mulheres sobre ataques, mãos bobas e convites indecorosos do ex-presidente da Caixa Econômica Federal Pedro Guimarães, bolsonarista roxo e arroz de festa nas tais lives de quintafeira e em viagens dentro e fora do País. Se Bolsonaro já faz piadas sexistas e grosseiras com o presidente de Portugal, imagine-se com o machão amigo.

Bernardo Mello Franco: O malandro e os otários

O Globo

Todo dia, um malandro e um otário saem de casa. Quando eles se encontram, sai negócio. Na sabedoria popular, é comum que um político assuma o lugar do malandro. Mas os papéis podem se inverter: basta que ele cruze com o apresentador José Luiz Datena.

Há dez anos, o âncora do Brasil Urgente ameaça disputar algum cargo público. Há dez anos, ele anuncia que mudou de ideia, fazendo de trouxas todos os políticos que o cortejaram.

A lenga-lenga começou em 2012, quando o apresentador ensaiou concorrer à Prefeitura de São Paulo. “Às vezes, tenho vontade de me candidatar para corrigir as coisas de dentro”, declarou. A frase deflagrou uma guerra entre partidos interessados em filiá-lo.

Meses depois, Datena anunciou que continuaria na TV. E ainda ironizou as celebridades que trocam o estúdio pelo palanque: “O fato de o cara ter popularidade não vai necessariamente significar que ele é um bom administrador ou que tenha credibilidade”.

Cristian Klein: Caixa de surpresas do bolsonarismo

Valor Econômico

Desistência de Datena reforça isolamento eleitoral de presidente

A força e a fraqueza do radicalismo político estão na rigidez de ideias e de métodos. De tão contundentes e persistentes são capazes de dobrar e solapar instituições e adversários - transformados em inimigos - assim como podem ser vítimas da própria intransigência e isolamento. O desempenho da popularidade do presidente Jair Bolsonaro (PL) expressa o saldo desses resultados contraditórios.

Pesquisas eleitorais, uma atrás da outra, mostram a resiliência das intenções de votos de Bolsonaro, a despeito de uma sequência de fatos políticos negativos nas últimas semanas: comoção pela morte de dois defensores da Amazônia e dos povos indígenas, em meio à política de descaso do governo em favor de grileiros, garimpeiros e madeireiros ilegais; a alta da inflação e do preço dos combustíveis; o agravamento do escândalo de corrupção no Ministério da Educação; as acusações de assédio moral e sexual contra o presidente da Caixa Econômica Federal etc.

Claudia Safatle: Quebrando tabus

Valor Econômico

Solução para preços é privatizar as refinarias da Petrobras

A discussão sobre os preços dos combustíveis no país já deu um importante fruto: quebrou o tabu sobre a eventual privatização da Petrobras. E no debate interno do governo há posições técnicas que não são necessariamente as mesmas da empresa estatal, que advoga com unhas e dentes a necessidade de seguir o preço internacional do petróleo, que é uma commodity.

O que o governo quer da empresa, no curto prazo, é que ela segure os reajustes de preços por uns três a quatro meses, até passar as eleições. Mas, para que haja espaço no mercado de combustíveis para um regime concorrencial, em que os preços podem cair, é preciso fazer mudanças estruturais. E essas começam pela privatização da área do refino.

Flávia Oliveira: Um governo contra as mulheres

O Globo

Três horas antes de as denúncias de assédio sexual a funcionárias por Pedro Guimarães, agora ex-presidente da Caixa, tornarem-se públicas pelo site Metrópoles, na terça-feira Jair Bolsonaro celebrava numa rede social a geração de 277 mil vagas formais no Brasil em maio e a primeira taxa de desemprego de um dígito em sete anos. O saldo positivo do emprego com carteira assinada fora divulgado na véspera, com base de dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). A taxa de desocupação de 9,8% no trimestre março-maio —de fato, a primeira abaixo de 10% desde o mesmo período de 2015 — só seria oficialmente conhecida ontem de manhã, quando o IBGE apresentou os resultados da Pnad Contínua.

Ruy Castro: Bolsonaro derrete

Folha de S. Paulo

E daí?, diz ele. Está certo de que, se não ganhar, tem bala para levar assim mesmo

Os marqueteiros de Jair Bolsonaro devem estar cortando os pulsos. Seu candidato se dedica a melar a imagem que tentam vender dele, baseada na potoca de 2018 e que poderia dar certo de novo: seus discursos sobre Deus, pátria, família e corrupção. Todas essas palavras já derreteram. Os profissionais se desesperam, porque o Bolsonaro de comício é um fantasma diante do Bolsonaro real.

Deus, por exemplo. Seu nome disputa em incidência com "porra" na boca de Bolsonaro. Às vezes Bolsonaro usa "porra" no lugar do ponto e outras no lugar da vírgula. Antes dele, nunca houve um presidente, nem João Batista Figueiredo, o mais grosso até então, que concluísse suas manifestações públicas com "porra". Sendo "porra" o chulo de "esperma", imagina-se como reagem as famílias católicas e evangélicas que se pautam por certo recato. E como estará Deus se sentindo nessa vizinhança verbal? Não esquecer que Ele ainda é um poderoso cabo eleitoral.

Hélio Schwartsman: Corrupção insignificante

Folha de S. Paulo

Qual valor abaixo do qual os casos de corrupção não devem nos preocupar?

Embalado pela prisão de Milton Ribeiro, escrevi na semana passada uma coluna sobre a corrupção no entorno de Jair Bolsonaro. Vários leitores me recriminaram por não ter feito uma comparação entre os valores que teriam sido desviados na atual gestão e os surrupiados sob a administração petista. De fato, não me debrucei sobre o problema. Até onde é possível analisar, o esquema do petrolão era mais amplo e sofisticado e deve ter resultado em montantes maiores. A proverbial incompetência do governo Bolsonaro vale também para a corrupção.

Reinaldo Azevedo: Um pastelão amador e sangrento

Folha de S. Paulo

Se bolsonarismo fosse obra de ficção, pecaria por falta de verossimilhança

Se fosse obra de ficção, o governo Bolsonaro não passaria pelo crivo de críticos exigentes. Falta-lhe verossimilhança, esse conceito tão caro à literatura e ao drama. Tudo é tão caricatural e grotesco que um editor de livros ou um diretor de teatro ou cinema diriam: "Não dá para aceitar essa porcaria. Se a arte não reproduzir minimamente os critérios de razoabilidade e plausibilidade do mundo real, é impossível haver comunicação com o público". Antes de jogar o texto no lixo, esse meu crítico imaginário pensaria, com ar aborrecido: "Vá ler Aristóteles e não me amole. Ou escolha o caminho da literatura fantástica".

Os contrastes exagerados; a falta de nuances de caráter; o lobo que não disfarça a sua natureza mesmo em pele de cordeiro; a hipocrisia rasgada; o sujeito que vocaliza o contrário daquilo que pensa e que pratica o oposto do que diz... Nada disso rende boas histórias. Há bem mais do que 50 tons de maldade e de bondade nas pessoas. Sem ambiguidade não se constroem boas personagens. Vivemos, no entanto, um pastelão amador e sangrento. O bolsonarismo é um vilão sem imaginação. A personagem principal faz troça de doentes que morrem sufocados.

Vinicius Torres Freire: Bolsonaro coloca bomba no futuro do país

Folha de S. Paulo

Governo e Congresso aprovam leis que estouram orçamento e o crédito público

A única emergência nova no Brasil é o momento crítico da candidatura de Jair Bolsonaro. Mas não há lei que autorize o arrombamento dos cofres e das leis do Orçamento em caso de perigo para a reeleição. Como se sabe, é para isso que serve essa PEC dos Auxílios, a dita "Kamikaze". PEC: Proposta de Emenda à Constituição.

O que menos gente percebe é o efeito duradouro que os arrombamentos terão sobre as taxas de juros e, pois, sobre o crescimento e, portanto, sobre pobreza e miséria e o futuro do periclitante próximo governo.

A inflação está acima de 10% desde setembro de 2021. A inflação da comida estava perto dos recordes do século no final de 2020, FAZ UM ANO E MEIO. A miséria explodiu em 2021. É possível que até tenha caído um tico em 2022, embora quem sofra de fome, frio e desespero não deva ter notado a diferença.

Por que oposição no Senado votou a favor da PEC Eleitoral, que dá ‘cheque em branco’ para Bolsonaro

Parlamentares fizeram duras críticas, mas não tiveram coragem de figurar em lista contra a proposta que aumenta verbas públicas para programas sociais, mesmo dando vantagem eleitoral ao presidente

Por Manoel Ventura, Camila Zarur e Alice Cravo / O Globo

BRASÍLIA - O Senado aprovou ontem, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (PEC) Eleitoral, que institui até o fim do ano um estado de emergência no Brasil. O objetivo é viabilizar a criação e a ampliação de uma série de benefícios sociais a três meses das eleições.

A aprovação dessa PEC em tramitação acelerada, segundo juristas, abre um precedente perigoso e irreversível, pois pode permitir que qualquer pretexto seja usado tanto para driblar a lei eleitoral como para afrontar a Constituição, criando um “vale-tudo eleitoral”. Além disso, a medida provoca um impacto bilionário nas contas públicas.

Senadores da oposição admitem os riscos da PEC e que ela dá um "cheque em branco" para Bolsonaro em plena corrida eleitoral. O presidente está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto e aposta nos gastos públicos para tentar superar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na liderança. Mesmo assim, praticamente todos os senadores da oposição votaram a favor da PEC.

No primeiro turno, a PEC foi aprovada por 72 votos a favor e 1 contrário. No segundo turno, por 67 votos a favor e 1 contrário. Até mesmo a senadora Simonte Tebet (MDB-MS), pré-candidata à Presidência da República, votou a favor, apesar de criticar o texto da PEC como feito "na coxa".

Tasso Jereissati (PSDB-CE), cotado para ser vice de Tebet, também votou a favor. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos mais aguerridos oposicionistas, votou a favor no primeiro turno e ausentou-se no segundo. O único voto contra foi o do senador José Serra (PSDB-SP).

José Serra: ‘Há apenas poucas semanas o Senado descobriu que as famílias passam fome'

‘Pacote de bondades’ é eleitoreiro e compromete o futuro das contas públicas, afirma parlamentar em rede social

Por O Globo

Único voto contra a PEC Eleitoral, que liberou gastos de R$ 41,2 bilhões a três meses das eleições numa clara afronta à Constituição, o senador José Serra (PSDB-SP) criticou no Twitter a medida:

“Há apenas poucas semanas o Senado descobriu que famílias passam fome e que esperam na fila dos benefícios?” escreveu o senador.

A PEC foi aprovada no Senado em primeiro turno por 72 votos a favor e um contra, de Serra. No segundo turno, foram 67 votos a favor. O texto segue agora para a Câmara dos Deputados.

Ao justificar o voto contra a medida, que vai aumentar o valor do Auxílio Brasil para R$ 600, além de criar um vale-caminhoneiro de R$ 1 mil por mês e um benefício de R$ 200 para taxistas, Serra destacou que “o ‘pacote de bondades’ é eleitoreiro, só vai até dezembro de 2022 e compromete o futuro das contas públicas”.

PEC das Bondades é inconstitucional e afronta à democracia, diz ex-presidente do STF

Proposta foi aprovada em 1º turno no Senado nesta quinta-feira e institui até o fim do ano um estado de emergência, o que libera o governo para aumentar gastos públicos às vésperas da eleição

Por Mariana Muniz / O Globo 

Brasília - Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e por duas vezes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro aposentado Carlos Velloso avalia como "inconstitucional" e uma "afronta à democracia" a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui até o fim do ano um estado de emergência para viabilizar a criação e a ampliação de benefícios sociais a três meses das eleições. O texto foi aprovado em primeiro turno no Senado no início da noite de hoje.

— Essa PEC é flagrantemente inconstitucional, porque atinge o direito à Democracia, que é uma cláusula pétrea da nossa Constituição. A proposta prejudica a eleição, o voto periódico, que é o fundamento da nossa Democracia —, afirma Velloso ao GLOBO.

O ministro, que hoje atua como jurista e advogado, foi presidente do STF de 1999 a 2001, e atuou na Corte de 1990 a 2006, quando se aposentou. Para ele, há uma parcela de responsabilidade do Legislativo em permitir que uma PEC driblando a lei eleitoral seja analisada e, talvez, aprovada.

— É preocupante que o Legislativo brasileiro assuma a responsabilidade, o ônus, de aprovar uma PEC que pode ter consequências tão graves —, disse.

Senado aprova PEC que autoriza bilhões para caminhoneiros, taxistas e Auxílio em ano eleitoral

Custo de pacote cresce para R$ 41,25 bi; texto institui estado de emergência

Renato Machado, Idiana Tomazelli / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Senado aprovou nesta quinta-feira (30) a PEC (proposta de emenda à Constituição) que institui um estado de emergência para permitir que o presidente Jair Bolsonaro (PL) fure o teto de gastos e abra os cofres públicos a pouco mais de três meses das eleições.

O texto dá aval ao governo para turbinar programas sociais até o fim do ano sem esbarrar em restrições da lei eleitoral, que existem para evitar o uso da máquina pública em favor de algum candidato. Bolsonaro ocupa o segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As medidas terão um custo total de R$ 41,25 bilhões —valor maior que os R$ 38,75 bilhões acertados na véspera, em mais um movimento de aumento da fatura. Quando as medidas para atacar a alta de combustíveis começaram a ser discutidas, o gasto extra era projetado em R$ 29,6 bilhões.

A PEC prevê a ampliação temporária do Auxílio Brasil em R$ 200, levando o benefício mínimo a R$ 600 até o fim do ano. O texto também autoriza o governo a zerar a fila do Auxílio Brasil, criar um auxílio para caminhoneiros autônomos e dobrar o valor do Auxílio Gás.

De última hora, as lideranças do governo fecharam um acordo para incluir um benefício de R$ 2 bilhões a taxistas e ampliar em R$ 500 milhões os recursos para o programa Alimenta Brasil, que financia a aquisição de alimentos para doação a famílias carentes.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente da República, reconheceu que a ampliação da fatura enfrentou oposição do Ministério da Economia. "O presidente Bolsonaro teve que entrar no circuito por uma certa resistência da parte da Economia", disse durante a sessão.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

PEC aprovada no Senado é afronta à democracia

O Globo

O Senado aprovou ontem, num congraçamento raro entre governo e oposição, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que desfere um ataque frontal à democracia brasileira. Na superfície, essa PEC da Bondade permite apenas instituir um estado de emergência temporário, até o fim do ano, para ampliar o valor do Auxílio Brasil a R$ 600, beneficiar caminhoneiros, taxistas e consumidores de gás. Seriam medidas eleitoreiras, condenáveis em razão do impacto fiscal no Orçamento, mas até defensáveis diante da alta dos combustíveis e da atual calamidade social — obviamente a situação exige medidas do Congresso. Mas a PEC faz isso do jeito errado e traz consequências inaceitáveis.

Com um olhar mais atento, logo se percebe que o novo instrumento acaba com o equilíbrio na disputa eleitoral e fere, segundo juristas, princípios fundamentais da Constituição. É por isso que, se confirmada a aprovação na Câmara na semana que vem, ele precisará ser revisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As mudanças equivalem a anotar um gol de mão para o time da casa na final do campeonato.

Poesia | Bertolt Brecht: Nada é impossível de mudar

 

Música | MPB4 e Roberta Sá: Cicatrizes (Miltinho e Paulo César Pinheiro)

 

quinta-feira, 30 de junho de 2022

Merval Pereira: Pedras no caminho

O Globo

O caso de Pedro Guimarães, que não à toa era conhecido como “Pedro Maluco” no mercado financeiro, de onde veio para a equipe de Paulo Guedes para dirigir a Caixa Econômica Federal, é típico da política brasileira. Ela guarda surpresas a cada eleição presidencial. Recentemente tivemos o escândalo do mensalão, que deu ao então tucano Alckmin inacreditáveis 41% no primeiro turno contra Lula em 2006, e a morte trágica do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, que poderia ter sido a surpresa da eleição de 2014, papel que Marina Silva assumiu em seu lugar para ser destroçada por uma campanha sórdida dos dois principais concorrentes, a petista Dilma e o tucano Aécio.

O Plano Real pegou de surpresa Lula em 1994 e elegeu Fernando Henrique Cardoso no primeiro turno. O caçador de marajás Collor de Mello atropelou dois políticos tradicionais da esquerda, Lula e Brizola. Surgem fatos que retiram as chances de candidatos, como Roseana Sarney, abatida em pleno voo por pacotes de dinheiro vivo, e outros que quase atrapalham, como a prisão dos “aloprados” petistas comprando dossiês contra tucanos.

Tudo indica que novos fatos surgirão no caminho durante a campanha, outros serão relembrados na propaganda oficial, levando a que dificilmente Lula vença no primeiro turno. Mas ele está se esforçando. Começou a campanha anunciando várias medidas e posições não radicais, parecia querer ressuscitar o “Lulinha Paz e Amor” de 2002, mas provocou a ira da esquerda extremista do PT, a que teve de dar espaço na campanha.

Malu Gaspar: Mulheres contra o cinismo do governo

O Globo

A história da saída de Pedro Guimarães do governo, concretizada com uma carta de demissão lamuriosa, fornece um bom símbolo da gestão Bolsonaro. E não só porque todo mundo que interessava em Brasília sabia das denúncias de assédio sexual e moral contra o presidente da Caixa e, mesmo assim, ninguém fez nada.

Nas 24 horas entre a divulgação das denúncias e a saída de Guimarães, deu-se um jogo de pressão. De um lado, o Centrão aflito com o estrago político, tentando fazer o presidente da República demitir o subordinado o mais rápido possível e se posicionar de forma enfática contra qualquer tipo de assédio, em solidariedade às vítimas.

De outro, o próprio Guimarães e a ala ideológica lutando para que ele fosse mantido, uma vez que se diz inocente e atribui as denúncias a intrigas e armações de inimigos.

Ao final, venceu a política. Mas a demora em chegar a esse desfecho autoriza desconfiar que, não estivéssemos às vésperas de uma eleição em que Bolsonaro precisa reduzir sua rejeição entre as mulheres a todo custo, muito provavelmente Guimarães continuaria no cargo, apesar dos relatos aterradores que surgiram nos últimos dois dias sobre o que se passava no banco.

Foi o próprio Pedrão, como Bolsonaro o chama, quem escreveu: “Não posso prejudicar a instituição ou o governo sendo um alvo para o rancor político em um ano eleitoral”.

William Waack: Esta, sim, uma herança maldita

O Estado de S. Paulo

O desespero de Bolsonaro para se reeleger compromete a recuperação do País

Tanto faz se o pacote para turbinar benefícios sociais é tratado por “do desespero” ou “de emergência”. O que ele traduz é apenas desesperada tentativa de Jair Bolsonaro de organizar uma “virada” nas eleições.

Essa atabalhoada operação política faz parte também do modo de fazer negócios do Congresso. Outros países, como a Alemanha, recorreram a subsídios para atenuar o impacto dos preços dos combustíveis. No Brasil se alteram a Constituição, as regras fiscais e as normas para ano de eleições.

O economista Marcos Mendes listou 95 medidas aprovadas pelo Congresso desde 2015 que ele considera bastante prejudiciais do ponto de vista fiscal – o atual pacote é apenas o exemplo mais recente. Não se trata apenas da concessão de benefícios a setores diversos (taxistas, usineiros, turismo). Nesse “estado de emergência” causado pelos preços de combustíveis o Congresso interferiu também na capacidade dos governadores de arrecadar.

Eugênio Bucci*: Ora, a ‘natureza humana’ está na cultura

O Estado de S. Paulo

Tal como a pronunciam, ela tem servido de camburão para uma ideologia da monstruosidade – que poderíamos chamar de natureza desumana.

Aprendemos a pensar que, se é natureza, não é cultura – e, inversamente, se é cultura, não pode ser natureza. A força que impele os animais ao acasalamento e à reprodução brota de pulsões naturais, ditas instintivas; já a instituição do matrimônio entre as pessoas de carne e osso, ditas pessoas físicas, decorre de construções simbólicas, ou seja, culturais. A fúria selvagem corresponderia à natureza bruta; o diálogo pacífico e harmonioso, capaz de gerar o entendimento, seria uma conquista da cultura. Em suma, temos o costume de opor a natureza à cultura mais ou menos como opomos a barbárie à civilização.

Caprichosamente, essa oposição se instala no interior de cada subjetividade, de cada um e cada uma de nós aqui. É como se fosse uma tensão interna, uma polaridade inevitável que estrutura a essência do que somos. Quando alguém levanta a mão para falar de “natureza humana”, é isso que acontece: somos natureza (portanto, bichos) e, simultaneamente, somos humanos (portanto, seres de linguagem e de cultura). Uma contradição ambulante.

Antonio Cláudio Mariz de Oliveira*: A violência estimulada se alastra

O Estado de S. Paulo

As arengas criminosas e as blasfêmias não respeitam pessoas, instituições do Estado nem algumas religiões e credos.

Antes de ser guilhotinada, Manon Roland afirmou: “Oh, liberdade, quantos crimes se cometem em seu nome!”. Eu me permito perguntar: segurança, quantos crimes e barbaridades têm você como pretexto, desculpa e até aplausos? Até quando se vão matar inocentes ou culpados, não importa. Não se pode matar. Só se pode matar em legítima defesa, circunstância prevista em lei e que justifica a conduta. No entanto, mata-se porque se quer matar. Invade-se uma comunidade, tiros são disparados sem que outros tiros tenham sido desferidos. E as balas atingem não só os alvos desejados, como quem está nas ruas, ou em casa, ou num bar, numa loja, dentro de um carro, seja lá onde for, as balas alcançam qualquer um. Dizem que são balas perdidas. E daí? É pior, pois isso demonstra que as armas foram acionadas a esmo. O atirador assume o risco consciente de matar quantos forem alcançados por seus projéteis. Ele aciona sua arma sabendo que ela poderá ser letal para qualquer um. Isso não o preocupa.

Deve-se ter presente um pensamento do Prêmio Nobel Aleksandr Soljenítsin no sentido de que a violência está sempre acompanhada da mentira. Com efeito, inverdades e invencionices servem para justificar os abusos e inverter as responsabilidades. As vítimas se tornam culpadas.

Adriana Fernandes: Queda do PG2

O Estado de S. Paulo

Guimarães, que ‘sonhou’ com o lugar de Guedes (o PG1), acumulou polêmicas na gestão da Caixa

Pedro Guimarães, o presidente demitido da Caixa por assédio sexual, era chamado em Brasília de PG2. Foi nomeado pelo PG1, o ministro da Economia, Paulo Guedes, com a chancela do “porteira fechada”. Na época, isso significava “sem interferência política”. Era o começo do governo do presidente que proclamava ter sido eleito para enterrar a velha política.

O PG2 não fugia desse receituário inicial bolsonarista. Vindo do mercado financeiro, Guimarães se portava com prepotência e ar de superioridade em relação aos agentes públicos.

Na grande sala onde se instalou no QG da transição, no CCBB, ele se dizia perseguido pelos políticos, integrantes do mercado e pela mídia por ser genro de Léo Pinheiro, ex-executivo da empreiteira OAS, condenado por pagar propinas na Lava Jato. Era comum nas conversas cair em prantos, situação que deixava desconfortáveis os seus interlocutores.

Vinicius Torres Freire: Governo Bolsonaro é uma carreata de aberrações

Folha de S. Paulo

Indecência e desumanidade eram sabidas, mas essa gente consegue ser caricatura de si mesma

Até agora, seis mulheres acusam com detalhes o presidente da Caixa de assédio sexual, de ser um tarado agressivo, pelo menos. Amigão de Jair Bolsonaro, Pedro Guimarães era chamado de "Pedro Maluco" até por assessores do Planalto.

Era um eufemismo.

Um secretário da Cultura bolsonariano fantasiou-se de nazista, de Goebbels, em vídeo promocional. Um tipo que ora ocupa a mesma cadeira diz que seu modelo de família é o da máfia e publica fotos segurando uma pistola.

Milton Ribeiro, pastor e dito teólogo um dia aboletado no ministério da Educação, deixou que distribuíssem Bíblias com uma foto da fuça dele. Em termos de vulgaridade bolsonarista é café pequeno, vaidade blasfema, negócio comezinho em um governo que usa santos nomes em vão e em pecados ainda piores. Mas o tipo é pastor e fez mais.

Disse uma vez que crianças tinha de ser educadas com "severidade", até que sentissem dor, insultou homossexuais e afirmava que crianças com deficiência tinham de ser apartadas na escola. Sim, fez parte da linhagem de gente inacreditável que arruinou o MEC. Quem liga?

Quando achava que ninguém estava ouvindo, dizia que acobertava pastores traficantes de influência por indicação de Bolsonaro, uma gente acusada de cobrar propina a fim de liberar verbas para prefeituras. Fora do governo, insinuou que era acobertado por Bolsonaro, que o alertou de uma operação da Polícia Federal.

Bruno Boghossian: Do assédio ao escândalo

Folha de S. Paulo

Pedro Guimarães só virou problema quando passou a representar perigo para Bolsonaro

Jair Bolsonaro entregou uma operação financeira na casa dos trilhões de reais, conferiu prestígio singular e abrigou por mais de três anos um sujeito conhecido como Pedro Maluco. É difícil acreditar que gente importante do governo não soubesse exatamente quem era o homem instalado no comando da Caixa.

Assim que as acusações de assédio envolvendo Pedro Guimarães foram divulgadas, surgiram os indícios de que aqueles relatos já circulavam nos corredores de Brasília. Algumas histórias eram conhecidas desde que ele foi escolhido por Bolsonaro e pelo ministro Paulo Guedes para chefiar o banco.

O economista ganhou o apelido na iniciativa privada. Segundo o jornal O Globo, funcionárias de dois bancos em que ele trabalhou antes de chegar ao governo dizem que Guimarães protagonizou situações de assédio moral e sexual. A conduta, segundo elas, se repetia em público, na frente de testemunhas.

Conrado Hübner Mendes*: Corrupção bolsonarista, capítulo 4

Folha de S. Paulo

E pensavam que a Bíblia do MEC era 'guerra cultural'

Enquanto alguns se excitam no grito "abaixo Paulo Freire", "por uma Escola sem Partido" ou "contra a ideologia de gênero"; enquanto alguns se masturbam nos gritos pela liberdade, segurança e soberania, pela "inocência das crianças" e pelo "povo armado não será escravizado", sem receber nada em troca, outros enriquecem ilicitamente com dinheiro público.

O país distraído vai se deixando deseducar. Mal notou que a "guerra cultural" é coreografia que mascara corrupção. Ninguém sai mais livre, seguro e soberano. Muitos morrem por ação ou omissão estatal. Muitas crianças são abusadas no núcleo familiar sem escola ou serviço social que as socorra. Tem até juíza que tenta forçar criança grávida por estupro a parir.

Ricos e felizes, mesmo, ficam centrão, pastores da "rachadinha" e milicianos das periferias e das florestas. Sob a regência de Bolsonaro. A inversão ilegal de políticas públicas, assim como a produção institucional da ignorância, é prática consistente do atual governo.

O governo faz assim: nomeia ministro e equipe cuja missão é desentranhar a política pública; corta recursos, assedia e ameaça burocratas e fiscais independentes (veja livro "Assédio Institucional no Brasil", organizado por José Celso Cardoso Jr.); e incita inimigos da política respectiva a delinquir sob a promessa de que sairão ilesos.

Maria Cristina Fernandes: As vias do vale-tudo

Valor Econômico

Excessos do bolsonarismo afunilam contraponto

Sob um estado de emergência, criado ao arrepio de leis eleitorais que sobreviveram até à ditadura, o presidente Jair Bolsonaro protagoniza a campanha do vale-tudo pelo voto. Ainda que faltem três meses para a eleição, o poder de agenda do bolsonarismo, do tumulto à escandalogia, passando pelo abuso da máquina pública, arrisca sair pela culatra. A cada excesso, o contraponto a seu governo mais se concentra. No lulismo.

Enquanto a PEC do vale-tudo se ultimava no Senado um grupo de marqueteiros reunidos pela Secretaria de Comunicação da Presidência esta semana analisou as pesquisas registradas no TSE e chegou a conclusões negativas para as perspectivas eleitorais de Bolsonaro. Entre a benesse e o eleitor, há o muro da rejeição a ser transposto. Por isso, o presidente depende mais do que gostaria da terceira via para garantir um segundo turno.

Debruçaram-se sobre as pesquisas atuais mas ficariam ainda mais preocupados se revisitassem o histórico da terceira via. Das oito eleições presidenciais pós-ditadura, apenas duas findaram no primeiro turno. Desde 1994, porém, os candidatos que buscam furar a polarização nunca tiveram tão fraco desempenho quanto nesta campanha.

O melhor levantamento da praça sobre este histórico foi feito pelo decano da opinião pública brasileira, Orjan Olsen. Os 13 pontos percentuais somados por Ciro Gomes (8%), André Janones (2%), Simone Tebet (1%), Pablo Marçal (1%) e Vera Lúcia (1%), de acordo com o último Datafolha, apenas superam a soma das candidaturas alternativas da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso.

Naquele ano de 1994, não por acaso um dos dois únicos casos de eleição de turno único, as candidaturas de Heloísa Helena, Cristovam Buarque, Ana Maria Rangel, Eymael e Ruy Pimenta somaram 9,8%.

Cristiano Romero: O debate da isenção de dividendos

Valor Econômico

Livro da FGV debate da progressividade tributária

Não há nada que expresse melhor a desigualdade social e econômica no Brasil do que o regime tributário nacional, que taxa excessivamente o consumo e muito pouco a renda dos mais ricos. Os tributos sobre consumo de bens e serviços _ ICMS, PIS e Pasep _ são pagos por todos de forma indistinta, a alíquotas entre as mais altas do mundo, senão, as maiores, no caso de serviços como energia e telefonia e de bens como os combustíveis. Já o imposto sobre a renda das pessoas físicas (IRPF) é pago por quem tem renda acima de um limite modesto de isenção (hoje, de R$1.903,98 por mês), sendo que quem ganha mais paga mais, embora o grau de progressividade seja muito baixo, o que beneficia os ricos.

Como as classes de baixa renda, por razões óbvias, jamais atendem plenamente às suas necessidades de consumo, elas gastam mais com mercadorias e serviços, como proporção da renda, do que as classes média e alta. Tudo isso faz deste país um lugar onde os pobres pagam mais impostos do que os ricos.

A maior alíquota do IRPF, de 27,5%, incide sobre renda mensal superior a R$ 4.664,68. Portanto, para a Receita Federal, tanto faz se um cidadão recebe R$ 5 mil mensais e outro, R$ 30 mil. Ambos deduzirão a mesma parcela _ R$ R$ 869,36 _ da base de cálculo do imposto e pagarão alíquota idêntica de 27,5% sobre a diferença. Numa sociedade cuja desigualdade é a principal característica nacional desde sempre _ não sairíamos incólumes de quase quatro séculos de escravidão como fator de acumulação de capital e dos 134 anos subsequentes em sua versão 2.0 (dissimulada, covarde e violenta) _, o sistema tributário reflete o despropósito do nosso “projeto” de nação.

Vinicius Torres Freire: Lula e Alckmin combinam seu programa

Folha de S. Paulo

Em jantar com donos do dinheiro, os dois mostram afinidade mais do que pessoal

Em mais um jantar de Lula da Silva com donos do dinheiro grosso, um empresário disse que perguntou "com jeito" ao ex-presidente se as diretrizes de programa que o PT lançou na semana passada eram para valer.

Lula nem disse sim nem não. Perguntou se o empresário tinha ouvido o discurso de Geraldo Alckmin (PSB), seu vice, no começo da reunião. Para quase todo mundo, disse que ele e Alckmin aprenderam com "anos de cadeira" e erros no governo. A crise que explodiu em 2015 teve "muitos motivos": baixa do preço das commodities e na economia mundial e também "erros de políticas de gente nossa".

Alckmin falara em detalhes da continuidade de FHC a Lula nas políticas sociais e de controle de dívida e inflação etc. Disse que "eleição é comparação" e que a alternativa é alguém que "rompeu" com o progresso dos anos tucano-petistas e ameaça ruptura maior, com a democracia.

Alguns poucos petistas têm dito coisa parecida sobre o papel de Alckmin, assim como pessoas com quem Lula conversa com certa frequência, de fora do partido. Mais do que desanuviar ambientes de direita para Lula e mais do que um vice "fiador", como o empresário José Alencar (1931-2011), viria a ser um vice "formulador", que faria parte do governo.

Sabe-se lá, mas é o que diz gente em condições de ver algo além da névoa espessa que encobre o projeto de um eventual Lula 3. Projeto: planos específicos, quadros capazes de executá-los, apoio político e articulação social para apoiá-los.