sexta-feira, 1 de julho de 2022

Hélio Schwartsman: Corrupção insignificante

Folha de S. Paulo

Qual valor abaixo do qual os casos de corrupção não devem nos preocupar?

Embalado pela prisão de Milton Ribeiro, escrevi na semana passada uma coluna sobre a corrupção no entorno de Jair Bolsonaro. Vários leitores me recriminaram por não ter feito uma comparação entre os valores que teriam sido desviados na atual gestão e os surrupiados sob a administração petista. De fato, não me debrucei sobre o problema. Até onde é possível analisar, o esquema do petrolão era mais amplo e sofisticado e deve ter resultado em montantes maiores. A proverbial incompetência do governo Bolsonaro vale também para a corrupção.

Não é esse, porém, o ponto que me parece mais interessante. Podemos criticar a corrupção tanto pelo aspecto moral como pelo pragmático. Sob o primeiro critério, valores são irrelevantes. Vale lembrar que uma prostituta que cobre R$ 1 milhão pelo programa não é ontologicamente diferente de uma que cobre R$ 100. Quem discorda dessa avaliação precisa apontar qual é o valor abaixo do qual casos de corrupção envolvendo presidentes e seus familiares não precisam nos preocupar. R$ 100 mil? R$ 1 milhão?

Do ponto de vista pragmático, cifras não chegam a ser desimportantes, mas tampouco são a história toda. É claro que cada centavo de dinheiro público que vai indevidamente parar em bolsos privados é um centavo a menos em saúde, educação e outros serviços relevantes.

A questão é que o montante desviado é só uma parte —e não a maior— dos males causados pela corrupção. Ela também perverte a lógica dos investimentos. Você faz a melhoria A na escola B não porque é dela que a população mais precisa no momento, mas porque esse é o interesse do clérigo C que entrou em conluio com o político D. Paga-se caro por coisas de que não há necessidade. É difícil calcular o custo dessas oportunidades perdidas, mas ele é enorme.

Em qualquer caso, não penso que o princípio da insignificância se aplique a altas autoridades metidas com corrupção.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

O atual governo é tão ruim que a corrupção passou a ter uma importância irrelevante.