sexta-feira, 1 de julho de 2022

Claudia Safatle: Quebrando tabus

Valor Econômico

Solução para preços é privatizar as refinarias da Petrobras

A discussão sobre os preços dos combustíveis no país já deu um importante fruto: quebrou o tabu sobre a eventual privatização da Petrobras. E no debate interno do governo há posições técnicas que não são necessariamente as mesmas da empresa estatal, que advoga com unhas e dentes a necessidade de seguir o preço internacional do petróleo, que é uma commodity.

O que o governo quer da empresa, no curto prazo, é que ela segure os reajustes de preços por uns três a quatro meses, até passar as eleições. Mas, para que haja espaço no mercado de combustíveis para um regime concorrencial, em que os preços podem cair, é preciso fazer mudanças estruturais. E essas começam pela privatização da área do refino.

Hoje a situação é a seguinte: a Petrobras detém cerca de 75% das refinarias, e o restante é importado. Não há, portanto, qualquer excedente na capacidade de refino da companhia. E, por esta razão, a empresa cobra o preço no óleo no mercado internacional. Não há prova de que essa seja uma situação proposital, mas o fato é que a Petrobras usa do argumento de que é preciso importar parte do refino para indexar os preços internos ao preço do petróleo no mercado externo, argumentam técnicos oficiais.

Por que a estatal não investe em mais refinarias? Se a companhia considera que essa atividade não compensa, então por que não privatizá-la?

Não se trata, aqui, de substituir um monopólio estatal por um monopólio privado. O modelo de privatização, nesse caso, é o das telecomunicações.

A parte de exploração e produção de petróleo, o preço é de uma commodity, “mas não se deve levar isso às últimas consequências”, ponderam. “Carne é commodity, mas o filé que se paga em Paris não tem o mesmo preço do Brasil”, compara uma fonte da área econômica. Há um argumento quase imperial de que commodities têm que seguir os preços do mercado internacional, mas o mercado doméstico importa na formação de preços, principalmente se for um país exportador, defendem alguns. Já sendo importador, é mais complicado. Petróleo é uma commodity, “mas falar que os derivados também o são é licença poética”, advoga um técnico que conhece bem o mercado e a empresa estatal. “Tem oferta excedente de petróleo, mas tenho que importar derivados. Hoje é cerca de 30% importado e aí tenho que pagar o preço internacional”, avalia ele, que tem uma visão crítica da companhia petroleira.

Os investidores veem a Petrobras como uma ameaça. Razão pela qual não há demanda para construir uma planta de refino. Não há vontade de construir, mas comprar uma parte relevante das refinarias da estatal é uma outra coisa. “Se eu faço um plano efetivo de venda de refinarias, vou ter mais players no mercado e via mercado eu não preciso cobrar o preço do petróleo importado. Hoje eu não vejo razão para o refino de petróleo ser uma atividade estatal”, conclui essa mesma fonte.

Não se deve mexer no preços, mas sim nos incentivos econômicos para ter uma possibilidade de concorrência, de competição. “Enquanto eu depender de derivados importados vai se precificar aqui com o preço internacional.”

A análise que se faz hoje é muito simplista, ao atribuir as restrições aos interesses dos acionistas minoritários, sobretudo os estrangeiros. “Você sabendo que tem um competidor que detém 75% da capacidade de refino e que pode despencar o preço do produto de uma hora para outra, você não vai investir no Brasil.”

Se a Petrobras precifica abaixo do preço internacional, os importadores não conseguirão importar e, aí, corre-se o risco de desabastecimento. Para não haver isso, o comando da empresa diz que tem que cobrar o preço de paridade internacional, porque não tem capacidade de refino no Brasil.

É preciso, portando, mudar estruturalmente o cenário. Isso se faz transferindo parte considerável da capacidade de refino da Petrobras para o setor privado, mediante a privatização, assim como o transporte do óleo.

O preço do refino que era, historicamente, US$ 10 o barril hoje está em cerca de US$ 60. Essa margem nunca foi tão alta, por causa da redução da oferta de refinarias que foram fechadas na Europa e nos Estados Unidos. Na China, na Índia e no Oriente Médio a capacidade de refino está aumentando. Mais distantes do Brasil, que costuma comprar no golfo do México, ficará mais cara a importação. O preço para o consumidor, portanto, saltou de US$ 130 ou US$ 140 para a casa dos US$ 180 o barril.

O fato de ter-se quebrado um tabu, ao discutir-se a privatização da Petrobras, é um aspecto que anima os técnicos. Foi assim com as empresas, por exemplo, de energia. Demorou um par de décadas para se chegar à capitalização da Eletrobras, recém-concluída. Ou seja, no caso da Petrobras foi dado o primeiro passo e, se Jair Bolsonaro for reeleito, a venda da estatal será viabilizada e deverá ser fatiada, asseguram fontes da área econômica.

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