sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Levy cobra de Dilma discurso por superávit e fica no cargo

• Ministro adia viagem para se reunir com presidente e exigir fim de ‘sinais trocados’ na política fiscal

Levy se reúne com Dilma e obtém aval para manter meta de superávit em 2016

• Apesar de presidente ter dito na véspera que ministro não estava 'isolado', titular da Fazenda relata incômodo com 'sinais trocados' na condução da política fiscal, ouve Planalto garantir sua permanência e recebe apoio para reverter déficit orçamentário

Tânia Monteiro, Vera Rosa, Adriana Fernandes, Isadora Peron e João Villaverde - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff pôs em prática ontem uma operação concreta de apoio ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Os dois se reuniram ontem, no Palácio do Planalto, e o governo anunciou que Levy permanece no cargo, após o compromisso com a manutenção da meta de superávit para 2016 ter sido reafirmado pela presidente e pelo ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante.

O ministro da Fazenda também mostrou-se incomodado com o que chama de "sinais trocados" na condução da política fiscal. Para ele, a equipe econômica "precisa ter uma cara só", sem contradições, numa referência às "trombadas" com Nelson Barbosa, seu colega do Planejamento.

No encontro, a presidente deixou claro que o governo vai alterar a peça do Orçamento, enviada na segunda-feira ao Congresso e que prevê um déficit de R$ 30,5 bilhões. Esse é exatamente o desejo de Levy, que espera "consolidar" uma proposta orçamentária que indique, por meio de corte de gastos e eventuais aumentos de arrecadação, que a meta de superávit de 0,7% do PIB do ano que vem será atingida.

Ao fim do encontro, após Levy ter recebido o endosso de Dilma a suas queixas, coube a Mercadante falar com os jornalistas em nome do governo. Segundo ele, "Levy fica" porque "tem compromissos com o Brasil".

Desde o início da manhã, Dilma trocou inúmeros telefonemas com Levy. Apesar de ter ouvido uma defesa enfática a seu favor no dia anterior, o ministro continuava dando sinais de que ainda não se sentia completamente confortável para continuar no comando da condução da economia do País.

Com a subida da temperatura, Dilma convocou uma reunião de última hora com Barbosa e Mercadante para convencer Levy a se manter no cargo. O ministro da Fazenda, então, adiou de ontem para hoje a viagem para a reunião do G-20 na Turquia e aproveitou o encontro para apresentar suas condições: quer ver se transformar em prática o apoio dado pela presidente na quarta-feira, quando Dilma negou "isolamento" do titular da Fazenda.

Apoio. O ministro Edinho Silva (Comunicação Social) também foi escalado para assegurar em público a permanência de Levy. Segundo ele, "erra feio" quem aposta no desgaste do colega. "Levy fica porque nunca saiu. Sempre ficou."

Mercadante afirmou que os ministros do Planejamento e da Fazenda estão "totalmente alinhados" e que Levy "está na equipe, ajuda muito e vai continuar ajudando".

Segundo o titular da Casa Civil, "num momento de instabilidade, há uma aliança entre os mal-informados e os mal-intencionados, gente especulando e tentado ganhar dinheiro com a turbulência".

Mercado. As especulações e divergências em torno do rombo no Orçamento levaram à percepção no mercado financeiro de que Levy, considerado uma "âncora" positiva no governo, tinha se enfraquecido. O dólar disparou, atingindo ontem a máxima de R$ 3,81.

A operação "segura Levy" começou ainda anteontem, quando o ministro se queixou com o vice-presidente Michel Temer. Levy voltou a encontrar o peemedebista ontem, e logo em seguida senadores do partido deram declarações de apoio ao ministro da Fazenda.

Levy pediu socorro até ao ex-chefe, o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, que se reuniu com Dilma na manhã de quarta-feira e relatou a preocupação com os "sinais trocados" que estavam sendo transmitidos ao mercado e ao setor produtivo.

Trabuco reafirmou que Levy insistia na importância de deixar claro que o governo não desistiu da meta de superávit. Este era um ponto fundamental para dar sustentação a Levy.

Presidente precisa saber o que exigir de seu ministro

• De nada vão adiantar palavras de apoio a Joaquim Levy, se não houver uma coordenação de ações pela presidente Dilma Rousseff

Adriana Fernandes e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

Tem tudo para ter fôlego curto a operação "abafa crise" na equipe econômica comandada hoje pelo Palácio Planalto. A reunião da Junta Orçamentária diminui emergencialmente a pressão (com reflexos na Bolsa e no câmbio), mas de nada vão adiantar palavras de apoio ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se não houver uma coordenação de ações pela presidente da República, Dilma Rousseff.

A percepção de fragilidade que tanto incomoda o ministro da Fazenda por conta de divergências sobre os rumos que estão sendo tomados até agora na política fiscal não vai mudar simplesmente porque a presidente colocou numa sala Levy ao lado dos ministros Nelson Barbosa (Planejamento) e Aloizio Mercadante (Casa Civil).

É sobre a direção a ser tomada daqui para frente que reside o destino do ministro. Ou ele mostra para o mercado que realmente está sendo ouvido pela presidente, com suas ideias sendo implementadas, ou vai perder de vez as condições de permanecer no cargo.

Levy não pode ver a condução da política fiscal - que é do Ministério da Fazenda - ser transferida de fato para o Planejamento, como foi a sensação transmitida aos políticos e aos agentes econômicos nas últimas semanas. A presidente tem que controlar o tiroteio que parte dos seus auxiliares, pelo menos.

O PT assiste à "fritura" do titular da Fazenda na espreita de tentar impor ao governo uma mudança na política econômica, se possível, comandada por Barbosa. Um novo ato com o slogan "Fora Levy!" deve ocorrer no próximo fim de semana com a presença de integrantes da cúpula do partido.

Na semana que vem, senadores do partido prometem deflagrar ação para pedir apoio do governo a propostas que preveem a cobrança de imposto de renda em lucros e dividendos de empresas e revogar a dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio. Um importante "petista-torcedor" avalia que Levy já "perdeu o timing de sair". É um exagero retórico, mas Dilma tem de saber o que quer do seu ministro, sob pena de ele virar uma peça decorativa, dentro de um governo cada vez mais fraco e confuso.

Governador do Rio desiste de apresentar orçamento deficitário para 2016

• Pezão foi alertado de que enviar previsão de gastos maior que de receita iria ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal

Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

RIO - Depois de se reunir com os presidentes da Assembleia Legislativa e dos tribunais de Justiça e de Contas do Estado e com o chefe do Ministério Público Estadual, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) desistiu da hipótese de mandar para o Legislativo orçamento deficitário para 2016, como fez a presidente Dilma Rousseff (PT) no âmbito federal.

Pezão foi alertado de que enviar previsão de gastos maior que de receita iria ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O governador, no entanto, repetiu que, por enquanto, as contas de 2016 ainda não fecham e terá que buscar recursos por meio de venda de imóveis, empréstimos e cobranças da dívida ativa do Estado.

Segundo Pezão, o orçamento total a ser enviado à Assembleia Legislativa no dia 30 de setembro vai prever despesas de R$ 62 bilhões. Por enquanto a receita corrente líquida prevista é de R$ 53 bilhões - a princípio haveria um déficit de R$ 9 bilhões, portanto.

Pezão ressaltou, no entanto, que esses números ainda não estão fechados e serão revistos até o último dia do mês. Na quarta-feira, 2, Pezão havia estimado o déficit em R$ 11 bilhões.

"Não vou apresentar orçamento (de 2016) negativo, mas tenho que apresentar receitas novas, que virão da venda de ativos, de empréstimos, de recursos que estamos buscando. Vamos mandar um orçamento equilibrado, que pretendo fechar em zero a zero (receitas iguais a despesas)", afirmou o governador após a reunião.

Segundo Pezão, uma das maiores preocupações do orçamento estadual é a Previdência. Em 2105 serão pagos R$ 15 bilhões em aposentadorias e pensões. No ano que vem esse valor deve chegar a R$ 16 bilhões ou R$ 17 bilhões. O governador diz que será preciso buscar recursos em outras fontes além do fundo previdenciário.

"Tem um rombo de R$ 11 bilhões da Previdência. Esse é um problema geral no País", afirmou Pezão.

Para fechar as contas de 2015, o governo do Estado ainda procura receitas que devem somar R$ 2,5 bilhões, valor atual do déficit estadual.

PT emula Collor e pede o uso de verde-amarelo aos militantes

Por Antonio Perez - Valor Econômico

SÃO PAULO - O PT pediu a seus militantes que deixem de lado o tradicional figurino vermelho e ostentem o verde-amarelo em manifestação no dia 7 de Setembro, em "defesa" da presidente Dilma Rousseff, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e "contra o golpe".

O pedido foi feito em nota divulgada ontem no site oficial do partido, sob o título "PT convoca a militância para defender a democracia no 7 de setembro". "A convocação é do diretório nacional do PT. O governo não tem participação nenhuma nisso", disse ao Valor Wilmar Lacerda, membro da direção nacional do PT.

Lacerda rechaçou comparações com o episódio de agosto de 1992, às vésperas do impeachment de Fernando Collor, quando o ex-presidente também pediu que "todo o Brasil" fosse às ruas com as cores da bandeira nacional para mostrar que apenas uma "minoria" apoiava sua destituição. Em vez de atender o apelo, multidões foram às ruas vestidas de preto, engrossando o movimento pela saída do presidente. "Isso aconteceu há muitos anos, num passado em que lutamos pelo impeachment. Agora, não é coisa do governo. Nós vamos comemorar a independência do Brasil", disse.

PT convoca militantes a usarem verde e amarelo no 7 de setembro
O PT pede a seus militantes que deixem de lado o tradicional figurino vermelho e se cubram de verde-amarelo para manifestações, no 7 de setembro, em "defesa" da presidente Dilma Rousseff, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e "contra o golpe". O pedido para que os petistas saíam às ruas com as cores da bandeira apareceu em nota divulgada ontem no site oficial do partido. A legenda acusa opositores que pedem o impeachment da presidente de golpistas.

Wilmar Lacerda, integrante da direção nacional do PT, ressalta que, apesar de pregar a defesa de Dilma, a ideia da manifestação não partiu do Palácio do Planalto. "O governo não teve nenhuma participação. A convocação é do diretório nacional do PT", disse Lacerda ao Valor

Na nota do partido, Lacerda pede que aos militantes participem do Grito dos Excluídos, manifestação organizada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tradicionalmente nos dias 7 de setembro. "Será um momento para apoiar o governo, apoiar Dilma e Lula, defender a democracia e povo Brasileiro, e dizer não ao golpe", afirma nota.

Segundo Lacerda, não há constrangimento no fato de o verde-amarelo predominar nas manifestações recentes contra o governo e o PT. Em 15 de março, 12 de abril e 16 de agosto deste ano, milhares de pessoas foram às ruas com camisetas da seleção brasileira de futebol e bandeiras do Brasil para pedir o impeachment da presidente.

"Não vejo nenhum problema em petistas e movimentos sociais vestirem as cores do Brasil na comemoração da independência. Ou o verde-amarelo não é a cor do povo brasileiro? As cores da bandeira do Brasil não pertencem à oposição", afirmou Lacerda, acrescentando que "quem quiser pode levar a bandeira do PT, da Dilma e do Lula com cores vermelhas".

Lacerda também rechaçou a comparação com o episódio em que o então presidente Fernando Collor, em agosto de 1992, pediu que "todo o Brasil" fosse às ruas com as cores da bandeira para mostrar que apenas uma "minoria" apoiava o impeachment. Em vez de atender o apelo do presidente, as pessoas saíram às ruas vestidas de preto, engrossando a campanha pelo seu afastamento.

Para Lacerda, é "absolutamente" impossível estabelecer uma relação entre as manifestações contra Collor e a convocação do PT em um momento de fragilidade da presidente Dilma Rousseff. "Isso aconteceu há muitos anos, num passado em que lutamos pelo impeachment. Agora, não é coisa do governo. Nós vamos comemorar a independência do Brasil", disse.

Para não repetir Collor, PT desiste de apelo

PT recua sobre ir às ruas de verde e amarelo

• Pela internet, direção nacional conclamava para o dia 7; cores têm sido usadas em protestos contra o governo

Sérgio Roxo - O Globo

Após convocar militantes a irem às ruas de verde e amarelo no Sete de Setembro em defesa do governo, o PT recuou com medo do efeito Collor. - SÃO PAULO- Menos de 24 horas depois de convocar os militantes para ir às ruas vestidos de verde e amarelo no Dia da Independência, na próxima segunda- feira, em defesa da presidente Dilma Rousseff e do ex- presidente Lula, o PT recuou e desistiu da ideia. Em agosto de 1992, o ex- presidente Fernando Collor pediu ao povo para ir às ruas com as cores da bandeira brasileira, em apoio ao seu governo. O pedido inspirou o protesto dos caras- pintadas, que foram às ruas de preto.

Um texto publicado no site do partido no final da tarde de quarta- feira dizia: “A direção nacional do partido está mobilizando a militância em todo o país de verde e amarelo em defesa da democracia, de Dilma, Lula e contra o golpe”. A convocação foi destacada durante o dia de ontem na página principal do site do partido. O presidente do nacional da legenda, Rui Falcão, chegou a republicar em sua conta no Twitter um chamamento feito pela liderança do PT no Senado para que os militantes aderissem ao uso do verde e amarelo no 7 de setembro.

Depois de O GLOBO questionar o vice- presidente do PT, Alberto Cantalice, responsável pela comunicação da legenda na internet, sobre a publicação, o partido alterou o texto.

— Esse é um movimento que está sendo feito pelo PT de Brasília — afirmou Cantalice, negando participação da direção nacional da legenda na mobilização, ao contrário do que estava escrito no texto publicado no site.

No começo da noite de ontem, o trecho do texto foi alterado para: “A direção nacional do partido está mobilizando a militância em todo o país a ir às ruas com as bandeiras do Brasil e do PT, em defesa da democracia”.

— Resolvemos mudar para não parecer que estamos querendo confusão — justificou Cantalice.
O verde e amarelo tem sido usado pelos participantes de manifestações contra o governo federal. Neste ano, já foram três grandes protestos, que aconteceram nos dias 15 de março, 12 de abril e 16 de agosto.

Dilma participará das atividades do dia 7
O Revoltados Online, um dos movimentos que têm participado os atos contra Dilma, programou um protesto para o dia 7 em Brasília com o objetivo de constranger a presidente durante o desfile do Dia da Independência. Mas mesmo correndo o risco de ser vaiada, Dilma já decidiu participar, como fez nos outros anos, do desfile. O governo aposta que a maioria do público será formado por famílias interessadas em assistir ao desfile e à apresentação da esquadrilha da fumaça.

De acordo com o vice- presidente do PT, o objetivo do partido é apenas convocar os militantes para participarem da 21 ª edição do Grito dos Excluídos, manifestação organizada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil ( CNBB) com apoio de outros movimentos sociais, que acontece tradicionalmente no dia 7 de setembro.

— Não queremos fazer nenhum confronto ou medição de força. O que existe é uma convocação para engrossar as manifestações do Grito dos Excluídos — disse Cantalice.

‘ Mais claro, impossível’, diz delator

Empreiteiro diz ter pago propina diretamente na conta do PT

  • Pagamento era exigido mesmo quando não havia cartel, afirma Pessoa

Cleide Carvalho, Tiago Dantas e Renato Onofre – O Globo

Dono da UTC Engenharia e agora delator da Lava- Jato, Ricardo Pessoa disse, em depoimento, que fazia depósitos diretamente na conta do PT. E que os recursos repassados oficialmente eram desviados da Petrobras no esquema do escândalo de propina. - SÃO PAULO- O empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia, afirmou em depoimento à Justiça ter depositado dinheiro de propina da Petrobras diretamente na conta do Partido dos Trabalhadores ( PT). Esses pagamentos, segundo Pessoa, eram feitos depois que o diretor de Serviços, Renato Duque, o encaminhava a João Vaccari Neto, então tesoureiro do partido. Outra parte da propina era paga ao gerente Pedro Barusco, subordinado a Duque.

O juiz Sérgio Moro quis saber se ficava claro que a contribuição oficial ao PT era mesmo parte do acerto de propina.

— Mais claro impossível! Eu depositava oficialmente na conta do Partido dos Trabalhadores. Nunca paguei nada ao Duque, estava pagando a Vaccari — afirmou o empresário.

O executivo disse ainda que o esquema de propina começou por volta de 2005. Pessoa disse que o primeiro a pedir propina foi o então deputado José Janene, do PP. Em seguida, segundo ele, a Diretoria de Serviços da Petrobras passou a fazer o mesmo, e o primeiro contato foi feito por Barusco. Pessoa explicou que a propina tinha de ser paga mesmo quando não havia qualquer ação de cartel ou acerto prévio entre as empresas para vencer licitações. Tão logo fechava o contrato, recebia a cobrança.

— Independentemente de ter “pacto de não agressão” ou arranjo entre empresas, eu era procurado para pagar. Tem contrato que não tinha arranjo e tivemos que pagar — afirmou.

O Ministério Público Federal quis saber se todas as empresas contratadas pela Petrobras pagavam a propina. Pessoa explicou que o pagamento era considerado “regra do jogo” para as empresas, que, segundo ele, ficavam receosas de enfrentar dificuldades para levar adiante os contratos.

— Sempre fui solicitado e tive que comparecer firmemente com esses pagamentos.

Pessoa confirmou ter feito pagamento de propinas em duas obras das quais a UTC participou ao lado da Odebrecht: na refinaria Presidente Getulio Vargas, no Paraná ( Repar), e no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro ( Comperj). Disse que o negociador da Odebrecht era o executivo Márcio Faria.

— Na Repar ficamos encarregados de pagar à Diretoria de Abastecimento, e a Odebrecht, de resolver o problema da Diretoria de Serviços. No Comperj, ficamos encarregados de pagar a Vaccari e a Barusco. Na Diretoria de Abastecimento ficou a cargo de Márcio resolver o que fazer — contou Pessoa, explicando que o valor da propina era pactuado entre todos os participantes do consórcio.

Eduardo Leite, ex- vice- presidente da Camargo Corrêa, que também depôs anteontem, disse que a empreiteira pagou propina “em todos os contratos”.

— Todas as empresas prestadoras de serviços junto à Petrobras tinham a obrigação desse pagamento. Isso era comentado no mercado — afirmou.

Procurado, o PT informou que todas as doações foram recebidas legalmente e declaradas à Justiça Eleitoral.

Câmara deve reincluir financiamento de empresas

Por Raphael Di Cunto e Thiago Resende - Valor Econômico

BRASÍLIA - A Câmara deve retomar a versão aprovada pelos deputados para o projeto de reforma política e reincluir a autorização para o financiamento de empresas para campanhas eleitorais, retirado pelo Senado na noite de quarta-feira por 36 votos a 31, avaliam líderes partidários ouvidos pelo Valor. Na Câmara, os defensores das doações privadas formaram ampla maioria.

Os deputados acreditam que a votação mais importante ocorrerá quando a proposta de emenda constitucional (PEC) da reforma política for analisada no Senado. O que os senadores votaram na quarta foi um projeto de lei. A PEC era desde o começo a forma como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), esperava validar o financiamento privado. Para o texto ser promulgado é preciso que seja exatamente igual nas duas Casas.

As doações de empresas são questionadas no Supremo Tribunal Federal (STF), com placar favorável à proibição, mas o processo foi suspenso por pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, em 2014. A PEC, já aprovada na Câmara, incluiria o tema na Constituição e derrubaria o processo no Judiciário.

Mas, para isso, é preciso do voto de pelo menos 49 senadores de 80 possíveis - resultado impossível se os 36 que foram contra o financiamento privado não mudarem o voto. "Sequer há quórum no Senado para aprovar o financiamento de campanha em projeto infraconstitucional [com maioria simples], então o Senado também deve desfazer a PEC", disse a líder do PCdoB, Jandira Feghali (RJ).

Sem a PEC, "não muda nada", afirmou Cunha. "Vai ficar a legislação como está, sem alteração", disse. Mas o PCdoB e outros partidos favoráveis ao financiamento público vão pressionar Gilmar Mendes a devolver o processo para conclusão do julgamento, o que poderia proibir que empresas doem para as campanhas políticas.

Os deputados ainda analisam o texto aprovado pelos senadores e que não teve a redação final votada devido ao grande número de emendas, mas já se debruçaram sobre outros pontos que devem cair: o fim do domicílio eleitoral e a abertura de uma janela para troca de partido a cada dois anos.

"É inconstitucional tratar a janela e o financiamento por projeto de lei. Essa é a minha avaliação e de todos os especialistas com quem conversei. Se a interpretação sobre esses temas foi do STF, não pode mudar por lei infraconstitucional", disse o relator na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Para ele, a tendência é desfazer a maior parte das mudanças feitas pelos senadores frente ao aprovado na Câmara, mas ainda avaliará com os líderes na próxima semana. O projeto será a prioridade a partir de terça-feira, disse Cunha.

Uma alteração que encontra algum respaldo na Câmara é reduzir a restrição para debates na TV e rádio para candidatos majoritários. Na versão dos deputados, as emissoras têm que convidar apenas os candidatos de siglas com mais de nove deputados federais. Para quem tiver menos, como o PSOL, seria facultativo.

Os senadores deram prazo de adaptação à regra, que só valeria a partir de 2022. Antes, seriam necessários quatro deputados. "Apesar de não concordar com nada que sai da boca do [deputado estadual pelo Rio de Janeiro] Marcelo Freixo [PSOL], acho ruim tirar um cara desses dos debates", diz o vice-líder da oposição, deputado Arthur Neto (PSDB-AM). (Colaborou Vandson Lima)

PMDB no Senado equilibra-se entre Serra e PT

Por Maria Cristina Fernandes – Valor Econômico

SÃO PAULO - A aprovação da emenda que proíbe o financiamento empresarial às campanhas eleitorais é um trailer do filme que uma trinca de senadores pemedebistas quer tornar atração permanente da temporada.

A reforma política foi a estreia, no plenário do Senado do trio Renan Calheiros, Romero Jucá e Eunício Oliveira que tenta se firmar como avalista do governo no PMDB desde que o vice-presidente Michel Temer afastou-se da articulação política. O tema não poderia ter sido mais adequado. Estão em jogo as regras de sobrevivência dos atores da política.

Os senadores jogaram juntos na aprovação do substitutivo que contraria os principais pontos da reforma aprovada na Câmara sob a liderança e manobras do presidente da Casa, Eduardo Cunha.

O substitutivo não pretendia confrontar tão radicalmente as regras aprovadas pelos deputados. O relatório preparado pelo mais habilidoso deles, Romero Jucá, contemplava o financiamento empresarial. A sessão já havia sido aberta quando Jucá anunciou que havia passado a endossar uma sub-emenda, destinada a suprimir o financiamento empresarial e acatar unicamente as doações de pessoas físicas, tanto para candidatos quanto para partidos.

Havia recebido o aval do presidente da Casa e do líder do PMDB. Renan e Eunício agiram para garantir que pelo menos metade do partido fechassem com a proposta liderada por PT e PSOL.

O resultado foi apertado. Além dos dois partidos, a proposta teve o apoio unânime apenas do PSB e do PCdoB. Os demais votos foram colhidos no PDT, PP, PSD e PPS. Entre os partidos que fecharam questão a favor do financiamento empresarial, PSDB e DEM foram os únicos que conseguiram a unanimidade dos votos de seus senadores.

A trinca fechou com o PT sem trancar completamente as portas para o PSDB do senador José Serra que conseguiu emplacar a liberação do domicílio eleitoral.

Senador pelo Amapá, que abrigou durante dois mandatos um forasteiro, o ex-presidente José Sarney, Randolfe Rodrigues (PSOL) desgostou-se com a medida por temer que os Estados menores sejam mais afetados.

A proposta é talhada para abrir ainda mais o jogo numa conjuntura ditada pela incerteza. Se a Lava-jato ventar a favor de aventureiros não serão as fronteiras estaduais que irão barrá-los.
Ainda que apertado, o placar de 36 votos deixou num dos mais experientes analistas políticos de Brasília, Antônio Augusto de Queiroz, do Diap, a certeza de que a tentativa de Cunha de constitucionalizar o financiamento empresarial encontrou uma barreira definitiva no Senado. Com a aproximação do líder do PMDB na Câmara, o deputado Leonardo Picciani, do governo, o presidente daquela Casa terá dificuldades redobradas em reverter a decisão do Senado.

A trinca Jucá, Renan e Eunício demonstra serviço no momento em que a reforma administrativa pode vir a abrir janelas de oportunidades, como a de um vistoso Ministério da Infraestrutura.

Jogam na permanência da presidente Dilma Rousseff, com ou sem Joaquim Levy. E buscam converter a parcela do PIB que se engraça com uma nova coalizão de poder a ser firmada em torno de Temer com o apoio de um PSDB que tenta dar mais sinais de unidade.

A entronizar um governo com força política para fazer mudanças tributárias e regulatórias substantivas, na medida para ressuscitar lideranças natimortas da esquerda, seria preferível deixar como está. Terão que fazer concessões, como na votação de ontem, mas com um impostinho aqui e outro acolá, esperam moldar este governo à imagem e semelhança de seus interesses.

Oposição lançará movimento pró-impeachment na Câmara

• Grupo contará com deputados de PSDB, DEM, PPS, Solidariedade, PSC e até PMDB, e produzirá um site e material gráfico com defesa de afastamento da presidente Dilma Rousseff

Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA – Partidos da oposição e até integrantes da base aliada pretendem lançar na próxima semana um movimento pró-impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados.

O grupo contará com deputados de PSDB, DEM, PPS, Solidariedade, PSC e até PMDB, que integra a base de sustentação do governo. A ideia inicial era montar uma frente parlamentar. No entanto, como isso exige assinaturas, os parlamentares preferiram criar um movimento para preservar quem não quer se expor e para evitar cooptação de membros por parte do governo.

A ideia amadureceu em encontro realizado na semana passada na casa do deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e o martelo foi batido nesta quinta-feira, 3. Um integrante do PSDB disse que o movimento terá site e produzirá material gráfico. A intenção é criar um canal de diálogo mais amplo com os movimentos de rua que defendem a saída da presidente Dilma.

Os integrantes do movimento ainda não sabem qual será o embasamento jurídico que utilizarão, mas já há conversas com o jurista Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT, que apresentou pedido de impeachment à Câmara nesta semana.

Na peça apresentada, Bicudo cita as “pedaladas fiscais”, a Operação Lava Jato e a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, pela Petrobrás para afirmar que Dilma cometeu crime de responsabilidade. O jurista também lembra que o vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, solicitou à Procuradoria-Geral da República apuração sobre eventuais crimes eleitorais.

Eu depositava oficialmente numa conta do PT, diz delator sobre propina

• Ricardo Pessoa, dono da UTC, declarou à Justiça Federal que Renato Duque, então diretor de Serviços da Petrobrás, lhe pediu ‘contribuições políticas’ para o partido; ele depôs como testemunha no processo contra executivos da Odebrecht

Por Ricardo Brandt, Julia Affonso, Mateus Coutinho e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

CURITIBA - O dono da UTC Engenharia Ricardo Pessoa afirmou em depoimento na quarta-feira, 2, na Justiça Federal em Curitiba, que o ex-diretor de Serviços Renato Duque o encaminhava ao ex-tesoureiro do PT João Vaccari para pagamento de propina. O delator afirmou que fez depósitos oficiais em contas do partido. Pessoa é um dos principais delatores da Lava Jato e ainda não teve sua delação premiada tornada pública.

Este foi o primeiro depoimento público do delator. Ricardo Pessoa, no entanto, não aparece nas imagens da audiência na Justiça Federal. Desde o início dos processos da Lava Jato, os depoimentos são gravados em vídeo e áudio. A defesa de Ricardo Pessoa pediu para que seu rosto não fosse mostrado. Durante a audiência, o juiz Sérgio Moro, que conduz as ações da Lava Jato, instruiu o delator para que ele não citasse políticos com foro privilegiado durante o depoimento.

Pessoa disse que seu primeiro contato na Diretoria de Serviços da Petrobrás foi Pedro Barusco, então gerente de Engenharia e braço-direito de Renato Duque. “Depois, o próprio Duque me procurou e começou a dizer que eu tinha que fazer contribuições políticas que essas contribuições teriam que ir através do Vaccari.”

O juiz Sérgio Moro perguntou “Essas contribuições eram como parte do acerto de propina?”.
“Sim, como parte, mais claro impossível”, respondeu o empreiteiro. “Eu depositava oficialmente numa conta do Partido dos Trabalhadores.”

O juiz insistiu. “Essa contribuição vinha do acerto de propinas para a Diretoria de Serviços?”

O empreiteiro respondeu. “Sim, para mim eu estava pagando a Vaccari, a mesma coisa.”

O delator falou à Justiça como testemunha de acusação no processo em que são réus o presidente da Odebrecht, Marcelo Bahia Odebrecht, e executivos ligados ao grupo.

Presidente da UTC Engenharia, ele é apontado pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal como o presidente do ‘clube vip’ das empreiteiras que se apossaram de contratos bilionários da Petrobrás entre 2004 e 2014. Questionado pelo Ministério Público Federal se havia feito pagamento de propina a funcionários da estatal, o delator confirmou.

“Sim. Eu paguei para o Pedro Barusco (ex-gerente executivo da Petrobrás). Renato Duque sempre me encaminhou para o senhor João Vaccari. Eu nunca dei propina na mão dos senhor Renato Duque. Era sempre encaminhado o assunto para o senhor João Vaccari”, afirmou Ricardo Pessoa.

PT, PMDB e PP são suspeitos de lotear diretorias da Petrobrás para arrecadar entre 1% e 3% de propina em grandes contratos, mediante fraudes em licitações e conluio de agentes públicos com empreiteiras organizadas em cartel. O esquema instalado na estatal foi desbaratado pela força-tarefa da Lava Jato.

Ricardo Pessoa contou que os valores-base para pagamento de propina era de 1% para a Diretoria de Serviços, comandada por Duque, e para a Diretoria de Abastecimento, liderada por Paulo Roberto Costa, primeiro delator da Lava Jato. “A referência inicial era para a Diretoria de Serviços 1%, para a Diretoria de Abastecimento 1%. Mas isso era só referência. Caberia a negociação depois de cada um. Eu, por exemplo sempre negociei o máximo que eu pude.”

Pessoa foi preso em novembro de 2014, na Operação Juízo Final, etapa da Lava Jato que derrubou o braço empresarial do esquema de propinas na estatal. O delator foi para regime domiciliar em março deste ano.

Arminio diz que escândalo é paralisante

Por Cristian Klein e Renata Batista – Valor Econômico

RIO - Um processo muito positivo que investiga um gigantesco escândalo de corrupção na Petrobras, mas que tem gerado efeitos paralisantes na cadeia produtiva e até no Congresso. Foi assim que o ex-presidente do Banco Central, Arminio Fraga, descreveu a Operação Lava-Jato durante seminário internacional sobre o sistema financeiro de países emergentes, realizado ontem na Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio.

"Acho que há muito a ser limpo na Lava-Jato. É muito, muito positivo. Mas também tem um efeito paralisante em grandes contratos no país e teve e vai ter um efeito paralisante, por um tempo, no próprio Congresso. Porque há muita gente lá que agora está provavelmente pensando mais em ficar fora da cadeia do que em qualquer outra coisa", disse.

Arminio afirmou ainda que a corrupção no Brasil não se trata mais apenas do "bom e velho padrão em que as pessoas ficam ricas, roubando". "Vai além disso, é um esquema de corrupção politicamente conectado e organizado para alimentar o poder político. É uma ameaça real para a qualidade da democracia", criticou.

Durante a apresentação, Armínio fez críticas ao governo e afirmou que a responsabilidade fiscal está "suspensa". Na conversa com os jornalistas, porém, disse que o país "não tem vocação suicida" e encontrará um caminho. Questionado se há luz no fim do túnel, respondeu: "No momento, não. Tem alguma luz, para não exagerar, mas ainda em um quadro muito difícil. Ela está longe", completou.

Antes da palestra, questionado pelo Valor sobre a possibilidade de o Banco Central elevar até o fim do ano a taxa básica de juros, a Selic, - em resposta à possível pressão inflacionária por causa da desvalorização do real - Arminio disse que o Copom acabara de mantê-la em 14,25%, na véspera. Analistas preveem que o BC poderá elevar mais a Selic até o fim do ano, mas Arminio afirmou que prefere não comentar sobre juro, especialmente no curto prazo.

O ex-presidente do BC, no entanto, defendeu que a instituição se concentre na meta de inflação para definir a taxa de juros, sem arriscar qual seria o patamar adequado ao atual cenário.

Arminio evitou comentar as especulações a respeito da saída de Joaquim Levy do Ministério da Fazenda. E disse que caberá aos políticos liderar as soluções para a atual crise econômica.

Líder da equipe econômica do senador Aécio Neves (PSDB-MG), na corrida presidencial do ano passado, Arminio criticou o inchaço dos quadros de funcionários do Estado, o aparelhamento partidário das instituições no país e o forte peso estatal no sistema financeiro brasileiro.

Merval Pereira - A Porta Giratória

O Globo

É muito conhecida entre os que já fizeram parte de governos, qualquer governo, a Síndrome da Porta Giratória, que acomete a todos que decidem deixar suas funções. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, parece ser o mais proeminente caso na atualidade, mesmo que se confirme a informação de que Alexandre Tombini também está em busca de novo emprego na iniciativa privada e, portanto, prestes a também enfrentar a temível Porta Giratória.

Tal Porta parece engolir as pessoas para dentro de governos com facilidade, mas se transforma em um obstáculo quase intransponível quando as mesmas pessoas querem sair por espontânea vontade. Se entrar de mau jeito na Porta, você pode se machucar.

Sair de um governo atirando, arrombando a Porta, só pode ser uma boa escolha quando o aspirante a dissidente não se importa de ficar marcado pelo governo que denunciou. Por mais fraco que seja, um governo tem recursos inesgotáveis para retaliar, e especialmente no setor financeiro não é saudável estar em oposição explícita.

Sair de comum acordo é uma admissão de fracasso que não interessa a nenhum executivo carregar. E assim o tempo vai passando sem que as condições ideais se formem para uma saída que seja ao mesmo tempo a reafirmação de suas convicções e a garantia de que sua vida depois da Porta Giratória seguirá seu rumo sem grandes turbulências.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chegou ao segundo governo Dilma vindo diretamente de campanhas presidenciais de oposição. Flertou com Marina Silva, esteve mais ligado a Aécio Neves, oferecendo seus préstimos a Arminio Fraga, que seria o futuro ministro da Fazenda de um governo tucano.

O destino o levou, através do Bradesco, ao governo petista, que, tudo indicava, pretendia dar um cavalo de pau na “nova matriz econômica” implantada por Guido Mantega para colocar “a casa em ordem”, como gosta de repetir para irritação de petistas ligados ao antigo regime.

Oito meses após a posse, estamos, na melhor das hipóteses, na estaca zero, embora haja quem considere que retrocedemos em vários pontos. A reação da própria Dilma, que se recusa a cortar gastos e a reduzir sua equipe ministerial ao tamanho razoável, tentando apenas tirar o status de ministério do Banco Central ou do Gabinete de Segurança Institucional, é sinal de que ela está só esperando um momento para seguir em frente com suas visões econômicas desastrosas.

O ministro Joaquim Levy faz das tripas coração para se desdobra entre o que seria ideal fazer para colocar as contas em equilíbrio e o que é possível fazer num governo em que os sinais são contraditórios.

Agora mesmo, pelo Facebook, Rui Falcão, o presidente do PT, teoricamente o maior partido de apoio ao governo, convoca a militância do partido para uma conferência no sábado em Belo Horizonte, um dos poucos estados em que o PT está no governo, em “defesa da democracia e por uma nova política econômica”, isto é, contra a política de Levy e com saudades da “nova matriz econômica” que nos trouxe até esta situação de quase calamidade.

A Frente Brasil Popular reunirá militantes de uma salada de siglas, como Central Única dos Trabalhadores ( CUT), Central dos Trabalhadores do Brasil ( CTB), Movimento dos Sem Terra ( MST) e União Nacional dos Estudantes ( UNE), além de partidos da base aliada: PT, PCdoB, PSB e PDT.

O objetivo, na definição da CUT, é “criticar e fazer ações de massa contra todas as medidas de política econômica e ajuste fiscal que retirem direitos dos trabalhadores e que impeçam o desenvolvimento com distribuição de renda”.

A Porta Giratória está à frente de Joaquim Levy. Ontem ele quase se atreveu a enfrentá- la, mas ganhou um fôlego. Será que dá para enfrentar o fim de semana?

Eliane Cantanhêde - São dois pra lá, dois pra cá

- O Estado de S. Paulo

Vamos começar por onde paramos na sexta-feira da semana passada, sobre a fragilidade do ministro tido e havido como o “mais forte” do governo, Joaquim Levy: “Ele vai suportar a pressão? Se não, como Dilma vai resistir sem Temer na política e sem Levy na economia? Com o desarticulador Aloizio Mercadante negociando com o Congresso e o gastador Nelson Barbosa cuidando do ajuste fiscal?”.

Todas essas perguntas não só ficaram sem resposta como vêm se aprofundando em diferentes línguas, desnorteando o mercado e criando sobressalto nas pobres vítimas chamadas agora a pagar, via impostos, os erros gritantes que vêm do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. Segundo ela, funciona assim nos governos e nas famílias: se gastaram demais, há um desequilíbrio e é preciso chamar todo mundo para discutir saídas. Só que a indagação obrigatória para abrir qualquer discussão é: quem gastou demais? E por que, para que, com o quê?

Quem tem mais responsabilidade tem de pagar mais, certo? E não é exatamente isso que ocorre no governo Dilma. Foi a presidente quem meteu os pés pelas mãos, descuidou das receitas, saiu gastando à vontade, principalmente quando disputava a reeleição – deve ter sido mera coincidência... –, e desandou as contas sabe-se lá por quantos e quantos anos. Então, ela criou o déficit, não admite cortar na própria carne e quer que o resto da “família” pague a conta. Ou seja: eu, você, eles, nós todos.

No meio disso, há um Joaquim Levy que parece sem pai nem mãe. O “pai” era o vice-presidente Michel Temer, que tentou adotá-lo no início do segundo mandato, quando viu que ele estava sendo sabotado pelo PT, dentro e fora do governo. Veio daí o famoso jantar que Temer ofereceu no Palácio do Jaburu para Levy, o olheiro Aloizio Mercadante e toda a cúpula do PMDB: Sarney, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes pemedebistas nas duas Casas, os ministros do partido. Quem não tem PT caça com PMDB.

A aliança tácita Temer-Levy funcionou bem durante um tempo, até Temer perceber que Levy não era o único alvo dos petistas, inclusive dos ministros petistas e até do próprio Mercadante. Eram os dois. Temer é um político, sabe a hora de pular fora. Levy é um técnico, ainda está aprendendo, a duras penas.

Dilma, que já foi “mãe do PAC”, que ninguém mais sabe, ninguém mais viu, agora tem de embalar o seu Mateus, cada vez mais sozinho, mais desanimado, mais desiludido. Para efeitos externos, ela responde em entrevistas que Levy não está desgastado, não. E internamente? De derrota em derrota, o ministro continua se ressentindo de falta de apoio.

De duas, uma: ou a presidente só defende Levy de boca para fora, ou tenta defendê-lo de fato, mas não tem força para dar voz de comando no seu partido e nos militantes da Casa Civil e do Planejamento. Em qualquer hipótese, a expectativa é que Levy continue sofrendo uma pressão diária, inclusive via “recados” na imprensa. Quando a coisa vai por aí, não para mais.

Para piorar, ele cometeu um erro político crasso, típico de quem não é do ramo: deu um chá de cadeira de quase três horas em meia centena de empresários que pretendiam lhe emprestar apoio. Paulo Skaf (Fiesp), que liderava o grupo, tomou as dores e virou um inimigo frontal do ministro, que era para ser tão forte e está tão fraco. Dilma perdeu Temer na coordenação política e corre o sério risco de perder Levy na condução da economia, o que seria um desastre.

Para confirmar a gravidade da situação, ontem foi um dia de “são dois pra lá, dois pra cá”: Levy adiou a ida ao G20 para uma lavação de roupa suja no Planalto, enquanto Temer foi confraternizar em São Paulo justamente com a socialite de um dos movimentos “Fora Dilma”. Voltando à pergunta original: sem Temer e sem Levy, o que sobra?

Foto. A ONU morre mais um pouco junto com o pequeno Aylan.

Hélio Schwartsman - Vitória de Dilma

- Folha de S. Paulo

É do matemático Alfred North Whitehead a afirmação de que toda a filosofia ocidental não passa de notas de rodapé a Platão. Se quisermos exagerar só um pouquinho mais, podemos dizer que a própria vida não passa de variações em torno das histórias e mitos gregos. Dilma Rousseff não é exceção.

Ela parece seguir os passos de Pirro 1º, rei do Épiro, primo de Alexandre, o Grande, que se envolveu num bom número das batalhas na parte europeia do Mediterrâneo no século 3º a.C. Foi numa delas, a de Ásculo, em 279 a.C., que derrotou os romanos, mas com tamanhas baixas –ele perdeu a maior parte de suas forças, bem como seus principais comandantes e amigos mais íntimos– que teria exclamado ao fim do embate: "Outra vitória igual a esta será o meu fim!". Pirro acabaria expulso da península Itálica, mas conquistou seu lugar na história ao emprestar seu nome à expressão "vitória de Pirro".

Dilma venceu a eleição do ano passado, mas é só agora que o preço vai ficando claro. Para não tomar medidas impopulares, ela prolongou para além do limite da responsabilidade uma política econômica fracassada, comprometendo assim a saúde financeira do setor público.

Pior, durante a campanha ela não apenas mentiu sobre a real situação do país e sobre as perspectivas para o futuro como, após a vitória, se apressou a adotar as medidas econômicas que acusara seus adversários de planejar. As insinceridades lhe custaram muitos pontos de popularidade, além dos aliados à esquerda.

Com as finanças públicas e o prestígio pessoal combalidos, viu-se sem recursos para seguir comprando o apoio da chamada base aliada, que agora flerta com a possibilidade de dar o golpe de misericórdia e assumir diretamente o trono, o que precipitou o país numa crise política para a qual não se vislumbra saída fácil.

Outra vitória igual a esta e será o fim do Brasil, é a frase que resume os últimos anos de nossa história.

César Felício - A fronteira da antipolitica

• Competição majoritária ainda é para poucos

- Valor Econômico

A vontade de inovar está em alta na cena paulistana, em tempo de rejeição aos palanques tradicionais. Abrem-se as portas para o espetáculo, e daí surgem nomes na corrida eleitoral de 2016 como o do apresentador José Luiz Datena e o deputado-pastor Marcos Feliciano, que, embora veterano de dois mandatos eleitorais, é muito mais um personagem do que um político.

O fenômeno não é novo, que o diga a incursão de Silvio Santos na eleição presidencial de 1989, e nem adstrito a São Paulo ou Brasil, como mostra o caso atual de Donald Trump nos Estados Unidos. Raramente é bem sucedido.

O poder é uma fortaleza para o petista Fernando Haddad desidratar as candidaturas de Marta Suplicy (PMDB) e Celso Russomanno (PRB), que precisam de aliados encastelados na administração municipal para se viabilizarem. Haddad conta com a ajuda tácita do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) e de toda a cúpula tucana nesta tarefa.

Sem candidato mas com um grande eixo organizador de alianças no Palácio dos Bandeirantes, o PSDB só pode entrar para valer no jogo de 2016 caso cristalize em torno de si o antipetismo. Para isso é necessário desestimular quem pretende navegar na seara da antipolítica.

Datena já foi advertido por tucanos do quanto teria a perder, em termos de prestígio, caso embarque na aventura. Estar em uma campanha eleitoral é enfrentar uma desconstrução de imagem.

No universo da rejeição aos políticos tradicionais, Feliciano alimenta-se de outras fontes. A mistura entre o púlpito e as urnas é um edifício mais sólido que o das celebridades, ainda que insuficiente para ganhar uma eleição majoritária.

"O radical no Brasil vai ocupar um nicho. Para ir além é preciso estabelecer pontes", comenta o ex-deputado e bispo Robson Rodovalho, da Igreja Sara Nossa Terra, de Brasília. Rodovalho é líder do Conselho Nacional de Pastores (Concepab), uma das entidades que tenta estabelecer cooperação entre as Igrejas para montar uma frente política e eleitoral interpartidária.

O setor pretende plantar no Brasil em 2016 uma série de candidatos que estarão "em defesa da vida e da família", mas sem grandes expectativas de sucesso nos principais colégios eleitorais. O principal foco é o segundo turno, em que pretende trabalhar contra a reeleição daqueles que, na visão dos pastores, não são confiáveis. Um dos casos é precisamente o de Fernando Haddad. Embora tenham conseguido retirar do plano municipal de educação pontos que eram do interesse de gays, lésbicas e simpatizantes, Haddad passou a ser visto como uma ameaça.

Nas disputas majoritárias, prevalece no setor o realismo, dado precedentes como as incursões de Marcelo Crivella no Rio e do Pastor Everaldo na eleição presidencial do ano passado. O caso de 2014, lembra Rodovalho, deixou patente a dificuldade de se direcionar uma onda, um clima social, para o interesse específico de uma candidatura. "O Pastor Everaldo era o candidato do segmento, mas quem levou o voto evangélico foi a Marina, sem nunca ter representado a nossa plataforma. Nós não nos opusemos, porque sentimos que não podíamos ficar contra a corrente", afirma.

A antipolítica pode fazer barulho nas eleições municipais, mas o foco principal de quem se beneficia com a tendência é a eleição proporcional, ingresso para o palco onde a política se expressa de um modo sem disfarces.

Na Câmara dos Deputados sob a presidência de Eduardo Cunha, as igrejas evangélicas limparam a pauta. Todos os temas estratégicos para o segmento foram tocados pela nova legislatura, todas as propostas antipáticas ao setor foram barradas e a Câmara pode ser um instrumento para rever decisões do Supremo Tribunal Federal que desagradaram o conservadorismo, como o da união civil entre pessoas do mesmo sexo. Se o consumo de maconha for descriminalizado pelo STF, poderá voltar a ser proscrito no Legislativo.

Talvez a conquista mais expressiva tenha sido obtida no início de junho, quando, em um "jabuti" dentro da Medida Provisória 668, foi aprovada a isenção tributária para a ajuda de custo recebida por religiosos.

A inovação, negociada pessoalmente por Rodovalho e outros líderes evangélicos com Cunha, representou uma liberação de encargos tributários na casa de centenas de milhões de reais. O benefício foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff.

Não é o único vínculo construído pela debilitada presidente com o setor. Com grandes investimentos em mídia, as igrejas são sensíveis à publicidade oficial. Dilma foi a primeira presidente a criar um espaço cativo no ministério para o PRB, indissociavelmente vinculado à Igreja Universal do Reino de Deus.

A vinculação de Cunha com a igreja em que o bispo de Brasília pontifica é histórica. Foi na Sara Nossa Terra onde o presidente da Câmara inicialmente se vinculou no mundo evangélico. Mas o poder de fogo da Assembleia de Deus, ministério de Madureira, falou alto e fez com que Cunha transitasse de uma denominação para outra, estabelecendo uma parceria que chamou atenção de Rodrigo Janot.

Em sua acusação contra o presidente da Câmara, Janot lembrou-se da doação de R$ 250 mil que o operador Julio Camargo fez para a igreja, a pedido de Cunha, na versão do delator.

Cunha é o evangélico com mais poder no país, mas na linha de frente da Operação Lava-Jato há um procurador, Deltan Dallagnol, seguidor da Igreja Batista. O integrante da força-tarefa apresentou o decálogo contra a corrupção produzido pelo Ministério Público no Seminário Teológico Batista no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, há pouco mais de um mês. O evento foi divulgado com destaque no jornal mantido pela Convenção Batista Brasileira.

O ocaso de Cunha, algo que ainda não está posto, não enfraquece o segmento evangélico, assim como não enfraquecerá o PMDB. Tratam-se de frentes suficientemente heterogêneas e divididas para gerarem permanentes peças de reposição.

Alberto Carlos Almeida - Os poderes em outro compasso

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Desde fevereiro tenho chamado a atenção nesta coluna para os resultados deletérios do conflito entre a presidência da Câmara, ocupada por Eduardo Cunha, e a Presidência da República, exercida por Dilma Rousseff. O conflito entre esses dois poderes da República foi um tema recorrente.

Logo depois do Carnaval, referindo-me a várias derrotas sofridas pelo governo na Câmara, escrevi: "A eleição de Cunha para a presidência da Câmara representa uma derrota significativa para o governo. Trata-se da 'mãe de todas as derrotas' que se seguiram, e já foram várias. Há duas comissões parlamentares, no âmbito da Câmara, que são de grande importância para o processo legislativo, em particular quando o governo Dilma terá que aprovar novas medidas econômicas, que são uma inflexão na comparação com a política macroeconômica adotada no primeiro mandato. Tais comissões são a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a Comissão de Finanças e Tributação (CFT). Os parlamentares que estarão à frente das duas comissões são figuras de confiança de Cunha e, portanto, não necessariamente irão defender a posição do governo".

Na mesma coluna já chamava atenção para a necessidade de o governo negociar e ceder, com a finalidade de alcançar um processo legislativo mais amigável, que tivesse como resultado tanto a aprovação de matérias de interesse do governo quanto a rejeição de pautas que o prejudicassem. Quanto a isso, afirmei: "É possível que a "mãe de todas as derrotas" não tenha sido a vitória de Cunha para a presidência da Câmara, mas sim o fato de o governo não ter entrado em campo em 2015 no que diz respeito às negociações entre Poder Executivo e Legislativo. Trata-se de um apagão político. A metáfora com o 7 a 1 do Brasil e Alemanha é perfeita. A diferença é que uma partida de futebol é imensamente mais curta do que um mandato presidencial. Recuperar-se de um apagão político é muito mais factível do que de um apagão futebolístico".

É bem interessante que a primeira semana de setembro marque uma mudança no padrão de relacionamento entre Cunha e Dilma. Não sabemos ainda se essa mudança veio para ficar, mas é fato que, ao menos nesta semana, ela aconteceu. Em primeiro lugar, o próprio Cunha já vinha dando sinais de que recuava de sua postura pública mais beligerante contra o governo. Isso ocorreu de maneira mais intensa após a votação em primeiro turno da emenda constitucional que, entre outras coisas, vinculava os salários da Advocacia Geral da União aos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Cunha foi duramente criticado por ter colocado essa matéria em votação. Desde então, ele mudou.

Para muitos, surpreende que Dilma e Cunha tenham se reaproximado. Pois bem, nesta semana, Dilma convidou Cunha para conversar e ele foi. Após o encontro, Dilma declarou que precisava ter um canal direto de relacionamento com o presidente da Câmara. Cunha, por sua vez, afirmou que tinha um relacionamento institucional com a Presidência da República. Agosto, mês do desgosto, terminou. Ambos começam setembro desarmados.

Aliás, o tema do desgosto em agosto esteve presente nesta coluna. Tive a oportunidade de afirmar: "Todo conflito é desgastante, ainda mais quando é público, contínuo, crescente e contra o governo. Há muitos indícios de que agosto será um mês de conflito crescente entre Cunha e o governo. Conflitos crescentes são insustentáveis no longo prazo. A tendência é que em algum momento, em função de um desfecho qualquer, o conflito diminua".

Ainda que a eventual denúncia contra Cunha nada tenha a ver com ações do Poder Executivo, o resultado de um conflito crescente pode ser o enfraquecimento político dele em função do que será divulgado pela imprensa quando a denúncia for formalizada. Tal enfraquecimento poderá resultar no afastamento de Cunha de suas funções. Há também uma segunda possibilidade, a de que Cunha vença a queda de braço e coloque em votação, com sucesso, a abertura do processo de impeachment de Dilma. A probabilidade de que isso ocorra, no momento, é baixa. Por fim, uma terceira possibilidade é que o conflito retorne aos mesmos níveis do semestre passado. Nesse caso, Cunha permaneceria forte e em seu cargo, mas abandonaria a atual posição política de oposição radical ao governo.

Também escrevi: "Os eleitores, trabalhadores, empresários, habitantes de São Paulo, nordestinos, aqueles que votaram em Dilma em 2014, os que votaram em Aécio, os eleitores de Marina, a sociedade de um modo geral nada têm a ver com a atual escalada de conflitos. Todos perdemos, e muito. O que queremos é uma redução do conflito da forma menos traumática possível. Esperamos que nossos líderes sejam capazes de viabilizar - para nosso gosto, em agosto - uma saída dessa natureza".

Como se vê agora, ninguém suporta conflito demais. Nem Cunha. Aliás, registrei também nesta coluna a estranheza em relação ao comportamento político do presidente da Câmara. Referindo-me à sua beligerância pública, disse: "O que mais surpreende na reação de Cunha é que ela não está de acordo com a tradição pemedebista de fazer política. O PMDB é um partido de raposas. Como se sabe, a adjetivação de raposa aplicada à política tem a ver com esperteza, habilidade, dissimulação. Por favor, não façam julgamento de valor. Essas características podem não ser úteis em outros mundos profissionais, mas no mundo da política, são. A raposa caça sorrateiramente. Ela se aproxima da presa sem que a presa perceba. Só assim consegue atingir seu objetivo. Os políticos, em muitas situações, não revelam suas verdadeiras preferências e objetivos, esta é a condição, com frequência, para alcançá-los. Cunha vem fazendo o oposto disso".

Pelo visto, ao menos nesta primeira semana de setembro, Cunha passou a agir mais como raposa.

Na última coluna, há exatamente duas semanas, afirmei que o centro da crise política era um só: a natureza oposicionista da atuação de Cunha à frente da Câmara dos Deputados. Muitos observadores da política ignoram o imenso poder, tanto do presidente da Câmara quanto do presidente do Senado. Eles controlam a agenda legislativa. Cabe a eles decidir o que vai ser votado e quando. Iniciativas legislativas que estavam paradas na Câmara há mais de 20 anos foram votadas agora, simplesmente porque Cunha assim quis. Portanto, Dilma tem muito a ganhar, caso haja uma aproximação com Cunha. Foi justamente o que disse em outra coluna recente: "Grande parte da atual crise política tem a ver tanto com o relacionamento entre o Poder Executivo e o PMDB, quanto com o fato de o atual presidente da Câmara, aquele que tem o controle da agenda legislativa de uma das casas do Parlamento, ter sido escolhido pelos seus pares para o cargo ao derrotar, em fevereiro, o candidato apoiado pelo governo. Atender às demandas do PMDB e acomodar-se com Cunha aliviaria em muito a atual crise".

Não é que a entrada de setembro pode ser o início dessa acomodação?

Obviamente, é imensa minha felicidade ao notar que previsões feitas neste espaço desde fevereiro estão acontecendo. Entre tais previsões estão a baixa probabilidade do impeachment e a maior probabilidade de que Dilma e Cunha acabassem por se acomodar. É verdade que tal acomodação é uma obra inacabada, ou apenas está no início. O fato é que ambos perceberam, com a ajuda de outros atores, como os grandes empresários, deputados e senadores, que o conflito exacerbado e prolongado não era bom para ninguém. Como disse, brigar demais é cansativo.

Dilma e Cunha têm um grande desafio pela frente: equacionar o déficit do orçamento. Trata-se, por um lado, de uma chance para que ambos se aproximem e, por outro, de uma dificuldade neste início de reaproximação. Cabe aqui o batido chavão de que é na crise que surgem as grandes oportunidades. Oxalá Dilma e Cunha as aproveitem.
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Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de “A Cabeça do Brasileiro” e “O Dedo na Ferida: Menos Imposto. Mais Consumo”

Maria Alice Setubal - Sobre crise, conhecimento e diálogo

• A construção de uma Agenda Brasil deveria, ao contrário do que está posto, ter como um dos seus eixos a educação e os valores da democracia

- Folha de S. Paulo

Sem adentrar no julgamento das posições em jogo no atual debate sobre a crise política e econômica, que atinge todos os Poderes, não podemos deixar de destacar, de um lado, a superficialidade das discussões e o imediatismo das soluções propostas e, de outro, os radicalismos e manifestações de ódio expressas nos cartazes das ruas e, especialmente, nas postagens veiculadas nas redes sociais.

A busca por entender o momento e o processo que está em construção nos leva a refletir sobre quais valores estão em movimento nesse cenário, em que prevalece a intolerância, o preconceito e a ignorância sobre o funcionamento de nosso sistema político e jurídico, assim como a falta de diálogo e de respeito ao outro e a uma visão de vida comum do espaço público.

Como educadora, não posso deixar de questionar sobre a educação que queremos para o país. Priorizamos a educação no discurso. Temos, porém, pouca efetividade e continuidade de políticas que impactem a qualidade e que garantam o direito de todas as crianças e jovens.

A precariedade da qualidade da educação expressa pelos resultados das avaliações nacionais e internacionais, entre outros indicadores, e a demanda por uma mão de obra qualificada, como reflexo dos baixos índices de produtividade, têm levado diferentes grupos, organizações e empresas a intervir no debate e na proposição de soluções.

Em um país da dimensão do Brasil e com dívidas históricas, as soluções não são fáceis. Não há uma saída única que atinja todas as regiões e modalidades de ensino.

Ao analisarmos o modelo de desenvolvimento brasileiro, no entanto, valorizamos em demasia o consumo em detrimento do conhecimento, pensamos mais em alcançar melhores resultados nas avaliações do que oferecer um conhecimento humanístico e científico capaz de formar as novas gerações para os desafios do século 21.

Pensamos mais no diploma como um passaporte para o trabalho do que na importância desse saber como emancipação e aquisição de capacidades que possam significar maior autonomia e liberdade.

Somos uma democracia muito jovem, estamos aprendendo e experimentando formas de agir. Crises podem abrir novas oportunidades se refletirmos mais profundamente sobre que país queremos. Para isso, a conclusão das investigações ora em curso da Operação Lava Jato, com a punição dos culpados, é oportunidade de uma mudança cultural de fundo, como disse Marina Silva.

Precisamos abrir espaço para uma nova atitude de governos, Parlamentos, empresas, instituições e cidadãos e cidadãs de modo a recuperarmos a confiança nas instituições e nas pessoas públicas e, portanto, em nós mesmos.

Nesse sentido, construir uma Agenda Brasil deveria, ao contrário do que está posto, ter como um dos eixos centrais a educação e os valores da democracia, mas não de uma forma pontual e marginal. Precisamos de amplo diálogo entre setores representativos da sociedade e governo, Legislativo e Judiciário.

A saída da crise em que estamos imersos não será simples e nem rápida. No caso da educação, já temos uma lei em vigor, o Plano Nacional de Educação, que fornece um mapa das ações prioritárias. A partir daí há muito a aprofundar e debater, sobre o foco das políticas, e como formulá-las e implementá-las.

Nosso atraso na educação é latente e não podemos, mais uma vez, abrir mão de inserir a educação no centro de uma agenda que pense o país no médio e no longo prazo.

Precisamos pensar em como formar cidadãos que contribuam, por meio de seus conhecimentos, para a construção de um país mais justo, respeitem a nossa diversidade cultural e ambiental, alcancem melhores índices de produtividade e construam uma participação qualificada no espaço público.
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Maria Alice Setubal, a Neca, doutora em psicologia da educação pela PUC-SP, é presidente dos conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária - Cenpec e da Fundação Tide Setubal. Foi assessora de Marina Silva, candidata à Presidência em 2014

Um estranho no ninho – Editorial / O Estado de S. Paulo

A incapacidade do governo de administrar suas contas, dramatizada pela apresentação ao Congresso Nacional do Orçamento para 2016 com a previsão de um inédito déficit na casa dos R$ 30,5 bilhões, coloca em xeque a posição do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que defendia a missão que lhe foi atribuída – basicamente, o corte de despesas –, mas trombou com a tendência oposta, patrocinada pelo lulopetismo, de manter a gastança e procurar o equilíbrio orçamentário por meio do aumento de impostos. “Prestigiado” pela presidente Dilma Rousseff, Levy está a cada dia mais fraco no governo, a ponto de haver especulações sobre o quanto mais ele suportará, ou será suportado, nas condições em que se encontra. De modo cada vez mais ostensivo, o PT defende a saída do ministro.

Joaquim Levy, no entanto, não pode se queixar. Quando aceitou o surpreendente convite de Dilma para assumir o comando da equipe econômica, sabia perfeitamente – ou deveria saber – no que estava se metendo. Seja porque acreditou nas garantias que, meio em desespero de causa, a chefe do governo lhe ofereceu de que teria suficiente autonomia para colocar as contas do governo em ordem; seja porque cedeu à tentação de correr riscos pelos 15 minutos de fama de que desfrutaria como titular da Fazenda; seja por puro e ingênuo patriotismo, o fato é que Joaquim Levy fez uma aposta que tinha tudo para dar errado por uma simples e óbvia razão: sempre foi e jamais deixará de ser um estranho no ninho, num governo que, antes de ser do Brasil, é do PT e está aparelhado prioritariamente para consolidar o projeto de poder do partido.

Hoje está claro que, ao recrutá-lo para a espinhosa missão de promover o ajuste fiscal num governo populista – que por princípio e vocação é chegado à gastança –, Dilma pretendia, provavelmente mais do que qualquer outra coisa, fazer média com os agentes econômicos internos e externos dos quais dependem as oscilações do fluxo de investimentos na combalida economia brasileira. E esse é certamente o motivo que fará sempre a presidente pensar duas vezes antes de entregar a cabeça de Levy aos petistas e aliados que a exigem sob o argumento de que austeridade fiscal é pretexto das elites perversas para oprimir o povo.

O impasse orçamentário que expôs a incompetência política e técnica do governo Dilma é o resultado do antigo conflito entre administradores públicos “desenvolvimentistas” e “fiscalistas”. É claro que os primeiros não são, necessariamente, gastadores irresponsáveis nem os outros, tecnocratas insensíveis para quem equilíbrio fiscal é mais importante do que o bem-estar social. Esse dissídio não passa – quando estão envolvidos administradores que sabem que o equilíbrio das contas públicas é precondição indispensável para o cumprimento de metas governamentais – de divergência quanto à dosagem adequada dos remédios fiscais a serem prescritos, divididos em duas categorias: os que afetam a despesa e os que interferem na receita.

O populismo petista, no entanto – apoiado por facções ideológicas que preconizam um estatismo tornado obsoleto pela conquista de direitos sociais pela via democrática e pela economia globalizada –, privilegia o imediatismo de intervenções governamentais pontuais no campo social, que não produzem os mesmos efeitos duradouros de programas de inclusão voltados para a efetiva inserção dos cidadãos marginalizados na vida econômica do País, mas oferecem aos donos do poder enormes benefícios eleitorais. O PT estará sempre, portanto, praticando a gastança para atender a suas prioridades eleitorais e não conhece outra forma de alcançar o equilíbrio orçamentário senão o aumento da carga tributária. Só não dirá que essa carga é sempre mais pesada para quem tem menor poder aquisitivo.

Diante dessa situação surreal – o partido da presidente da República e as entidades e organizações sociais que a apoiam são contra o reajuste fiscal que ela propõe sem convicção nenhuma –, Joaquim Levy está cada vez mais exposto ao tiroteio a ponto de até líderes empresariais com ambições eleitorais passarem a atacá-lo. Afinal, resta-lhe apenas o papel de fiador de uma política fiscal que não consegue implementar.

Aumenta responsabilidade do governo e do Congresso – Editorial / O Globo

• Com o fim de um ciclo de elevação dos juros, o controle da inflação e a retomada do crescimento passam a depender da escolha da forma de financiar o déficit orçamentário

Acusado de leniente no enfrentamento da inflação no primeiro governo Dilma, o Banco Central de Alexandre Tombini, depois de longa passividade, voltaria a elevar a taxa básica de juros (Selic) em outubro do ano passado, enquanto o PT ainda comemorava o segundo mandato da presidente.

Foram mais seis elevações consecutivas até a reunião do Conselho de Política Monetária desta semana, quando a diretoria do BC decidiu manter em 14,25% a Selic. Sem dúvida, uma taxa elevada, porém condizente com uma inflação que, no primeiro mandato da presidente, foi deixada, de forma temerária, muito próxima do limite superior da meta (6,50%). E que se aproxima da fronteira, mais perigosa ainda, dos dois dígitos.

Analistas consideram que, na tentativa de combater a imagem de letargia diante de uma inflação muito alta, mais ainda num país onde subsistem vários mecanismos de indexação, o BC se viu obrigado a ir mais fundo do que certamente gostaria na subida das taxas.

O manejo dos juros é forte instrumento de controle da demanda, com vistas à atenuação da alta de preços, aceleração ou frenagem da expansão da economia. Sendo que no Brasil, por distorções do mercado de crédito, independentemente de quem esteja no BC, a dosagem tenha de ser sempre mais forte que em economias menos reguladas.

Com cerca de 40% do crédito compostos por financiamentos subsidiados (BNDES, Agricultura, Habitação etc), as elevações da taxa básica precisam ser mais fortes, para surtir o mesmo efeito, do que se a parcela dos créditos subsidiados fosse menor.

A decisão do Copom faz sentido, dados a recessão e mesmo o aumento do custo da própria dívida (cada ponto percentual a mais na Selic significa R$ 20 bilhões de acréscimo na conta anual dos juros). Mas novo ciclo de altas terá de ser aberto se a inflação não ceder, o que em parte depende da restauração de alguma confiança no futuro por parte dos mercados.

O encerramento do ciclo de altas da Selic aumenta, portanto, a responsabilidade do governo e do Congresso no manejo do déficit orçamentário previsto para 2016. Pior será se o núcleo petista do governo vencer o choque de opiniões sobre o que fazer, com a tese de privilegiar a fórmula da ampliação de receitas, com mais impostos (CPMF) e/ou recalibragem de gravames já existentes. Este último recurso, já em uso.

Com uma carga tributária na estratosfera (37% do PIB), investimentos serão retardados e, com eles, postergado o início da retomada do crescimento.

Bem como haverá repasses aos preços com o aumento de impostos, portanto gerando mais inflação, não bastassem os efeitos inflacionários nos preços das desvalorizações cambiais. Cresceria, então, o risco de juros ainda mais altos. Seria o pior cenário.

Desajuste fiscal – Editorial / Folha de S. Paulo

• Presidente barrou medidas populistas do Congresso, mas legisladores, em atitude irresponsável, agora pretendem derrubar os vetos

Por um triz, o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) escapou de mais um grave revés no Congresso Nacional. Em sessão realizada na quarta-feira (2), analisava-se o veto do Poder Executivo a iniciativas parlamentares que implicam aumento dos gastos públicos.

A expressão "aumento dos gastos públicos" soa, todavia, como fórmula polida para o que, numa aliança oportunista entre partidos de oposição e da esfacelada base governista, representa verdadeira orgia de irresponsabilidade fiscal.

Chegava-se perto do quórum para iniciar a votação: faltavam apenas quatro senadores, dos 41 necessários, e já eram 263 os deputados, sendo exigidos 257.

Em sintonia, raríssima hoje em dia, com as prioridades do Planalto, o deputado que presidia a sessão, Waldir Maranhão (PP-MA), encerrou os trabalhos antes que o quórum estivesse alcançado.

A atitude foi compreensivelmente criticada pela oposição. Menos, entretanto, pelo caráter de manobra que evidentemente tinha, e mais pelo que trazia de frustração aos intuitos, nos quais se irmanam representantes do PSDB, do PMDB de Eduardo Cunha e tantos mais, de tornar irrespirável o ambiente econômico do país.

Não é outro, com efeito, o sentido da chamada "pauta-bomba" em curso no Legislativo brasileiro. Entre as medidas vetadas pela presidente da República, agora em reexame no Congresso, encontram-se exemplos da mais alarmante desconsideração pela realidade financeira do país.

O reajuste médio de 59,5% para os servidores do Judiciário, vetado por Dilma depois de alegremente aprovado no Congresso, acarreta despesas calculadas em R$ 25,7 bilhões nos próximos quatro anos. Por si só, ainda que dispersa ao longo desse período, a cifra se aproxima dos R$ 30,5 bilhões que deram ao Orçamento de 2015 seu inédito caráter deficitário.

Há mais, contudo. Outros R$ 9 bilhões por ano teriam de ser gastos com a aplicação dos critérios de reajuste do salário mínimo à Previdência. Um novo modelo de cálculo previdenciário, em descompasso absoluto com uma expectativa de vida que se elevou consideravelmente, quer impor gastos de R$ 40 bilhões nos próximos dez anos.

O momento não se presta a molecagens desse tipo. O país vive uma crise financeira de gravíssimas proporções, e não escapa de ninguém a percepção de que, tanto pelos inúmeros erros do Executivo quanto pela inconsequência do Congresso, todos –até mesmo os próprios políticos– arriscam-se a pagar altíssimo preço.

O Legislativo tem agido, até agora, como fator de crise e turbulência. É hora de alterar o rumo.

Governo precisa decidir o que quer na economia – Editorial / Valor Econômico

O governo continua a se mover para mais perto do abismo. Nos últimos dias o dólar ganhou dinamismo próprio e o alento às cotações vem das cogitações a céu aberto de que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que conta com a confiança dos mercados, pode deixar o governo.

A presidente Dilma Rousseff perdeu a popularidade e hoje é a pior avaliada mandatária entre os que dirigiram o país pós-redemocratização. Perdeu também a capacidade de coordenação política, o apoio de sua base parlamentar e a boa vontade do Congresso. Perdeu ainda o controle sobre as contas públicas - a entrega de um Orçamento com déficit primário é só dos reflexos disso. E, seja por ações próprias ou de sua entourage, que só tem colecionado derrotas, arrisca-se a perder quem foi escolhido por ela para ser o guia da política econômica do governo.

O fracasso da política econômica no primeiro mandato da presidente foi retumbante. Os pilares do equilíbrio foram abalados. O câmbio flutuante serviu para garantir por bom tempo valorização cambial excessiva, o que ainda manteve precariamente outro pilar de pé, o regime de metas para a inflação. A inflação no ano deve fechar este ano em torno de 9%, com viés de alta. O terceiro pilar foi destruído de forma preocupante e pode causar um desastre - não há mais superávits primários. Inéditos em quase década em meio, os déficits chegaram em 2014, devem permanecer em 2015 e o Orçamento de 2016 prevê explicitamente um buraco de 0,3% do PIB.

A presidente Dilma destruiu uma política que deu certo e, para indicar que corrigiria erros e consertaria os estragos já feitos, nomeou para a Fazenda o ex-secretário do Tesouro do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi escolhido. Além do prestígio que carrega como homem público e executivo no setor privado, Levy tornou-se o norte das expectativas de recuperação da economia. Recebeu apoio por seu diagnóstico simples e correto dos problemas. A saraivada de estímulos ao consumo produziu inflação, recessão e começou a arruinar as contas públicas. O primeiro capítulo do ajuste teria de ser fiscal, com corte de gastos e a volta dos superávits.

Cortar gastos com juros em alta e a economia em rápida desaceleração é receita indigesta que, se aplicada com afinco, poderia trazer resultados rapidamente, permitindo com a que a economia iniciasse trajetória de recuperação. O remédio foi inicialmente aceito pelo Planalto, mas nada avançou como deveria a partir daí.

Levy tinha uma ideia imprecisa do pavoroso buraco das contas públicas que encontrou - e não estava sozinho nisso - e das dificuldades que encontraria diante do agravamento da crise política, na qual o governo perdeu a capacidade de iniciativa. Alguns de seus revezes, porém, não podem ser atribuídos ao círculo palaciano, mas à resistência de um Congresso rebelado, que lhe desfigurou e retardou as medidas do ajuste fiscal.

O ministro da Fazenda, por vontade própria, não desistiria tão facilmente da intenção de obter uma economia de 1,13% do PIB, trocando-a pelos 0,13% do PIB, como aconteceu em julho. Diante do descalabro encontrado, porém, o recuo foi aceitável, até porque economistas e analistas de mercado também duvidavam da viabilidade de se atingir a meta original.

O afastamento da ameaça imediata do impeachment e a pressões decorrentes da piora contínua da economia podem ter mudado as intenções da presidente. Mal iniciado o ajuste mal iniciado, a meta fiscal foi de novo abandonada, um tributo ruim como a CPMF foi retirado da cartola para tapar os rombos e voltou logo para a gaveta diante do repúdio geral, até aparecer o inédito Orçamento com déficit e mais despesas. Bancos oficiais voltaram a apoiar setores escolhidos da economia - prática que Levy criticara - e a ideia da necessidade de políticas anticíclicas voltaram a frequentar o Planalto.

Os indícios de que as ideias de Levy estão sendo abandonadas foram claramente vistos fora de Brasília. Outra percepção, que reforça a importância de Levy no governo, é a de que não há outra opção de política saudável disponível no governo. Com o agravamento da crise econômica, a forte deterioração da dívida pública e um cenário externo turbulento, o risco da saída de Levy é o de ter um governo sem rumo, empurrando o país de volta à instabilidade econômica, que se imaginava sepultada para sempre.

Nara Leão - Odeon

Paulo Mendes Campos - Três Coisas

Não consigo entender
O tempo
A morte
Teu olhar

O tempo é muito comprido
A morte não tem sentido
Teu olhar me põe perdido

Não consigo medir
O tempo
A morte
Teu olhar

O tempo, quando é que cessa?
A morte, quando começa?
Teu olhar, quando se expressa?

Muito medo tenho
Do tempo
Da morte
De teu olhar

O tempo levanta o muro.

A morte será o escuro?

Em teu olhar me procuro.



Paulo Mendes Campos, in 'Antologia Poética'