Há um clima de "o Brasil mudou" no ar. Tem sido comum ouvir e ler
que foi "histórica" a decisão do Supremo Tribunal Federal de condenar
réus do mensalão.
São inegáveis os avanços institucionais nos últimos anos. O STF trilha o
mesmo caminho. Mas, como sou treinado para ser cético, tendo a achar exagerada
a euforia geral sobre o julgamento do mensalão. Vejo tudo como parte de um
processo civilizatório lento e irregular, embora com saldo positivo.
O mensalão e crimes correlatos têm como gênese duas razões principais.
Primeiro, a certeza quase certa (que existia) de impunidade. Segundo, e mais
importante, o caldo de cultura em vigor dentro do Congresso e dos meios
políticos para que muita gente corrompa e seja corrompida.
Absolutamente nada foi feito para atacar a segunda razão do surgimento do
mensalão. Ao contrário. A miríade de partidos políticos só faz aumentar. Basta
lembrar que no início do governo Lula, em 2003, existiam apenas 25 das atuais
30 legendas. Muitas dessas agremiações vivem penduradas nas tetas do dinheiro
público. Não têm votos, só que aparecem na TV e no rádio (tudo pago com verbas
estatais) e ganham um naco generoso do Fundo Partidário.
Na área dos costumes políticos há poucas boas notícias. Na semana passada,
enquanto o STF castigava os mensaleiros, a Câmara oficializava a "semana
de deputado": agora o trabalho é obrigatório só às terças, quartas e
quintas. Nos outros dias, as Excelências folgam e recebem do mesmo jeito. De
quebra, engavetaram a proposta que eliminaria o 14º e o 15º salários para os
congressistas.
É bom que o STF esteja condenando mensaleiros. Mas o Brasil continua
basicamente igual. É tudo parte de um processo que levará décadas para
amadurecer. Vai depender muito de como votarão os eleitores. Aliás, os
brasileiros nas urnas têm dado um recado ambíguo: a maioria não está nem aí
para o mensalão.
Fonte: Folha de S. Paulo
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