Cálculo se refere a
apenas três de nove crimes já analisados
Ministros decidem ainda
absolver réus nos sete casos de empate. Com isso, três deles terminam sem
condenação
Na primeira sessão
dedicada à estipulação das penas de 25 condenados, os ministros do STF não
conseguiram terminar de calcular a punição do primeiro réu analisado: Marcos
Valério. Mesmo assim, já é certo que ele pegará ao menos 11 anos e oito meses,
o suficiente para colocá-lo em regime fechado de prisão. A Corte também decidiu
pela absolvição nos sete casos de empate. Com isso, os ex-deputados Paulo Rocha
e João Magno, além do ex-ministro Anderson Adauto, saem do julgamento sem
condenações, pois não foram punidos por nenhum outro crime.
Prisão à vista para
Valério
Operador do mensalão já está condenado a 11 anos e 8 meses por apenas um
terço dos crimes
Carolina Brígido, André de Souza
UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA
BRASÍLIA - Depois de considerar culpados 25 réus do mensalão e absolver 12, o
Supremo Tribunal Federal (STF) começou ontem a calcular as penas dos
condenados. Na primeira sessão dedicada à dosimetria, os ministros não
conseguiram terminar de calcular sequer a pena do primeiro réu: o operador do
esquema, Marcos Valério. Foram imputadas penas a somente três dos nove crimes
pelos quais ele foi condenado. Mesmo assim, Valério já tem sobre os ombros 11
anos e oito meses de reclusão, o suficiente para colocá-lo no regime fechado de
prisão. Ele também já foi condenado a pagamento de multa de R$ 978 mil. A cifra
foi fixada em valores da época dos ilícitos e será corrigida na época da
execução.
Em nenhum dos casos examinados Valério pegou pena mínima, mas também não
recebeu a máxima. Hoje, os ministros retomarão o cálculo das penas dele. Só no
fim, formalizarão a decisão sobre o regime de cumprimento. Pela lei brasileira,
penas de prisão superiores a oito anos devem ser cumpridas em regime
inicialmente fechado. O STF também deixou para decidir no fim se o réu
restituirá aos cofres públicos o dinheiro desviado.
Antes de começar a calcular as penas, os ministros decidiram que quem
absolveu um réu por determinado crime não pode participar da dosimetria.
Ricardo Lewandowski, revisor do processo, autor do maior número de absolvições,
concordou com a solução. Dias Toffoli discordou. Queria participar do cálculo
da pena dos réus que absolveu. O presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, e
Gilmar Mendes concordaram com Toffoli, mas a maioria venceu.
- Como é que o magistrado que absolveu pode, depois, se pronunciar sobre
agravantes ou atenuantes (da pena)? É uma contradição lógica, além de ser um
gravame para a própria consciência do magistrado - disse Lewandowski.
- Não vejo razões para quem absolveu não participar da dosimetria - afirmou
Toffoli.
Foi o relator, Joaquim Barbosa, quem decidiu começar a dosimetria pelo
chamado núcleo publicitário. Para Valério, líder do grupo, Barbosa sugeriu pena
de dois anos e 11 meses pela condenação de quadrilha - um crime para o qual o
Código Penal determina pena de um a três anos. Ele também sugeriu o pagamento
de multa, mas os colegas lembraram-lhe que não há multa prevista no Código
Penal para quadrilha.
Para chegar ao número, o relator levou em conta o grau de culpabilidade, os
antecedentes, a conduta social, a personalidade, os motivos, as circunstâncias
e as consequências do crime, bem como o comportamento da vítima. Barbosa
considerou intensa a culpa do réu, mas ponderou que Valério não tem
antecedentes criminais:
- Há ações judiciais em tramitação contra Marcos Valério, mas, enquanto o
plenário não resolver essa pendência (sobre a influência de ações não
concluídas nos antecedentes de um réu), não vejo condições de aplicar maus
antecedentes.
O ministro considerou graves os motivos e as consequências do crime, a
compra de apoio político no Congresso. As circunstâncias também, já que tudo
foi combinado com a cúpula do PT. Sobre as consequências do crime, afirmou:
- A compra de apoio político no Congresso pôs em risco o regime democrático,
a independência dos poderes e o sistema republicano, em flagrante ofensa à
Constituição.
A pena foi aumentada, ainda, porque Valério tinha posição de liderança em
relação aos sócios, que também integravam a quadrilha. Para o relator, não
houve atenuantes. O voto de Barbosa foi acompanhado por cinco ministros. Só não
participaram Lewandowski, Rosa Weber, Toffoli e Cármen Lúcia, por terem
absolvido o réu.
Pelo crime de corrupção ativa no episódio de pagamento de propina ao então
presidente da Câmara João Paulo Cunha, Barbosa fixou a pena em quatro anos e um
mês de reclusão, mais 180 dias-multa. O total ficou em R$ 432 mil. O voto foi
seguido por todos os sete ministros aptos a votar.
"Palavra emprestada da medicina"
O passo posterior foi votar as penas de Valério referentes às práticas de
peculato - que pode gerar de dois a 12 anos de prisão. O primeiro peculato
analisado foi o ocorrido na Câmara: a SMP&B embolsou dinheiro público em
troca de serviços não prestados. Barbosa fixou pena de quatro anos e oito meses
de reclusão, mais 210 dias-multa (R$ 546 mil). Para Barbosa, o motivo do crime
influenciou negativamente na fixação da pena:
- Marcos Valério pretendeu não apenas enriquecer ilicitamente, mas também
obter sua remuneração pela prática concomitante de outros crimes em proveito do
PT.
Barbosa disse que o dinheiro desviado, quase R$ 1 milhão, também influenciou
na pena.
- Considero que quanto mais alto o desvio, mais reprovável a conduta e mais
grave as consequências para o bem jurídico protegido - afirmou, recebendo o
apoio de sete ministros. Lewandowski e Toffoli tinham absolvido e não votaram.
Os ministros não concluíram a votação sobre corrupção ativa por Valério ter
subornado o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato em
troca da liberação de R$ 73,8 milhões do fundo Visanet para a SMP&B.
Barbosa fixou a pena em quatro anos e oito meses, mais o pagamento de 210
dias-multa (R$ 504 mil).
Foi a primeira vez que Lewandowski divergiu do relator. Ele propôs três
anos, um mês e dez dias de reclusão, mais R$ 108 mil. Houve discussão.
- A palavra dosimetria é interessante, ela é emprestada da Medicina, é como
a dose de um remédio. Esse remédio não pode ser menor ou maior que o
necessário, tem que ser na dose certa - argumentou Lewandowski.
- E não pode ser barateado também - respondeu Barbosa.
Fonte: O Globo
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