quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Dino, o Xandão das emendas? - Vera Magalhães

O Globo

Insistência do ministro do STF em regular a liberação das emendas adquire um potencial de paralisia do governo

Já havia entre deputados e senadores o temor de que Flávio Dino se eternizasse como uma espécie de xerife das emendas parlamentares, mantendo a relatoria de toda e qualquer ação que ingressar no Supremo Tribunal Federal a respeito do tema e solicitando à Polícia Federal a abertura de inquéritos em série para fiscalizar a destinação dos recursos orçamentários. A nova decisão do ministro, suspendendo novamente a destinação dos recursos, reforçou essa percepção.

Emendas são foco de corrupção desde que o mundo é mundo. Com o alargamento, a partir do governo Jair Bolsonaro, do quinhão do Orçamento da União a que os congressistas têm acesso, a partir de diferentes rubricas e de expedientes de pouca transparência, as denúncias de desvios de recursos explodiram.

O golpe final de Arthur Lira: cambalacho, sigilo e deboche - Breno Pires

Revista piauí

A derradeira manobra do presidente da Câmara captura as emendas das comissões, privilegia Alagoas mais uma vez, descumpre lei e zomba das decisões do STF

Poucas vezes, talvez apenas no regime de exceção, uma autoridade nacional fez tão pouco caso de decisões do Supremo Tribunal Federal – e tripudiou sobre determinações legais. Como golpe final de seu quadriênio como presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) acaba de comandar uma operação ilegal que anula os poderes das comissões permanentes e promove desvio do destino previamente determinado para as emendas, redirecionando os recursos para o estado que o elegeu, e inaugura uma nova fase do orçamento secreto. Dessa forma, acaba de ser criado um novo mecanismo: as “emendas dos líderes”, cujo objetivo é o de sempre: esconder quem é quem nas planilhas de bilhões de reais.

O cambalacho é liderado por Lira, mas tem como cúmplices dezessete líderes partidários da Câmara, incluindo seu probabilíssimo sucessor, Hugo Motta (Republicanos-PB), e o líder do governo Lula, José Guimarães (PT-CE).

O esquema começou a ser gestado na tramitação da Lei Complementar nº 210, sancionada em 25 de novembro deste ano, quando os legisladores estabeleceram que as emendas de comissão poderiam ser indicadas pelos líderes partidários. Até aí, embora a medida não favorecesse muito a transparência, não havia irregularidades. A lei deixava claro que as trinta comissões permanentes da Câmara deveriam analisar as indicações recebidas de seus integrantes, aprovar as que coubessem e então fazer esses valores “constar de atas, que serão publicadas e encaminhadas aos órgãos executores” – ou seja, os ministérios.

Drummond em três tempos - Bernardo Mello Franco

O Globo

Em agosto de 1954, Getúlio Vargas puxou o gatilho e saiu da vida para entrar na História. Ao ouvir a notícia, Carlos Drummond de Andrade pôs papel na máquina e começou a bater a crônica do dia seguinte. “Súbito, a pessoa do presidente deixou de interessar ao debate político. As queixas contra ele desaparecem, e a paixão se cala, como vazia de seu objeto”, escreveu.

Após meditar sobre o respeito aos mortos, o poeta anotou que a carta-testamento dividia a nação “em dois grupos que guerreiam: o dos pobres e humilhados e o dos ricos e opressores”. “Entre os que, de consciência limpa, divergiam do presidente, estavam muitos dos melhores e mais puros homens do país, e não mereciam ser tratados como inimigos do povo”, protestou.

O novo ministério de Lula 3.0 – Elio Gaspari

O Globo

Com os maus ventos da economia, Lula. preencheu o vazio do período de Festas e o início do recesso com a novidade de uma reforma ministerial. Como ela acabará, não se sabe, mas começou mal.

Paulo Pimenta, o ministro-chefe da Secom, deverá ser substituído pelo marqueteiro Sidônio Palmeira. Essa mudança parte da premissa de que o governo se comunica mal. É uma meia verdade. A outra metade está na falta de ações e de criatividade que marcaram o Lula 1.0. O pacote de contenção de gastos foi envenenado por bruxarias da ekipekonômika plantando as virtudes do confisco de parte do seguro-desemprego, sem ouvir o ministro do Trabalho.

No mundo da comunicação, a única novidade, com que Pimenta nada teve a ver, foi a constatação de que as fotografias postadas pelo Planalto sofrem uma discreta manipulação. Com a ajuda de filtros, Lula aparece sempre corado e fagueiro. Seus visitantes acabam cobertos por uma velatura cinzenta. Disso resultou que Fernanda Torres e Chico Buarque ficaram com uma aura vampiresca. Malvadeza.

Pausa para DR – Zeina Latif

O Globo

Respostas são necessárias para desatar os nós, tempestivamente, por meio de discursos e ações fiscalmente responsáveis, para assim evitar a materialização das altas de juros sinalizadas

O estresse dos mercados decorre apenas do tímido pacote fiscal? Sem dúvida, ele foi o gatilho, mas há agravantes.

O contexto externo importa. O risco de uma política monetária mais restritiva nos EUA, aliado à desaceleração em curso na China, tem levado ao fortalecimento do dólar. Seu nível atual contra uma cesta de moedas de países emergentes é superior aos dos primeiros meses da pandemia, quando bateu recordes.

Claro que não é só isso. Estivéssemos nas mesmas condições internas das de dezembro de 2023, a cotação do dólar estaria na casa de R$ 5,30, e não acima de R$ 6.

A "sombra de futuro" de um Natal memorável – Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

O mundo desaprendeu e continua sendo palco de guerras sangrentas. A crise humanitária é significativa, com 76 milhões de deslocados, a maioria por causa desses

O filme Joyeux Noël (Feliz Natal), de 2005, dirigido por Christian Carion, é um auto de Natal no contexto histórico da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A coprodução reuniu cinco nações europeias (França, Alemanha, Reino Unido, Bélgica e Romênia) para uma ode à paz em quatro idiomas: francês, alemão, inglês e romeno. Diane Kriger (Anna Sorensen), Benno Fürmann (Tenente Nicolau Sprink), Guilhaume Canete (Tenente Audebert), Daniel Brühl (Hostmayer) e Gary Lewis (Padre Palmer) brilham nos papéis principais.

Em defesa da democracia, Justiça foi protagonista em 2024 - Luana Patriolino

Correio Braziliense

Judiciário lidou com questões sensíveis na política brasileira, com destaque para o avanço das investigações sobre a tentativa de golpe de Estado, com conclusão prevista para o início de 2025, e das regras de transparência das emendas parlamentares

No centro das discussões mais importantes da política brasileira, o Poder Judiciário teve, em mãos, questões essenciais para o funcionamento da democracia do país. O Supremo Tribunal Federal (STF) se debruçou em regras de transparência e rastreabilidade das emendas parlamentares, além de avançar na investigação sobre tentativa de golpe de Estado e debater a responsabilidade das plataformas digitais no combate às notícias falsas. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o desafio foi o enfrentamento do uso malicioso da inteligência artificial (IA) nas eleições municipais de 2024.

O agro e a fome: dilema brasileiro - Lea Vidigal*

Correio Braziliense

Somos uma potência na produção agrícola e alimentar convivendo com o drama da fome e dos altos preços dos alimentos. Podemos alimentar o mundo, mas devemos alimentar os brasileiros

A fome é o maior dilema brasileiro. Dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, até o fim do ano de 2023, pouco mais de 4% da população do país estava em estado de insegurança alimentar grave. Em números absolutos, 3,2 milhões de pessoas. Bem menos que os 19,1 milhões que sofreram de insegurança alimentar grave em 2020, durante a pandemia da covid-19. Ainda assim, continuamos no Mapa da Fome da ONU (2024), e o contingente de 21,6 milhões (27,6%) de brasileiros sob algum tipo de insegurança alimentar em 2023 é imenso. 

Feliz 2015, ops, 2025! - Fábio Alves

O Estado de S. Paulo

Sem correção de rumos nas contas do governo em 2025, o que aconteceu em 2015 será fichinha

O mercado brasileiro encerra 2024 sob um estresse agudo, com o governo Lula no meio de uma grave crise de credibilidade fiscal, mas o pior é que ninguém afasta o risco de 2025 ser ainda mais turbulento, numa repetição de 2015, primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff.

Naquela ocasião, o ambiente econômico se deteriorou de tal forma e velocidade que acabou contribuindo para o processo político de impeachment da ex-presidente no ano seguinte. Só para lembrar: a inflação subiu 10,67% em 2015, mas a projeção do mercado no início daquele ano era de uma alta de 6,56%. Já o PIB registrou queda de 3,8%, enquanto o consenso das projeções, no início do ano, apontava um crescimento de 0,5%. E o dólar, que fechou 2014 cotado a R$ 2,6550, encerrou 2015 a R$ 3,9601, alta de 48,9%.

Erros e ilusões na comunicação - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Presidente Lula ignora o mundo ao pedir que a Secom se restrinja a divulgação de feitos

No início do mês, Lula criticou duramente a comunicação do governo. Disse com todas as letras que "há um erro no governo na questão da comunicação" e se declarou obrigado a "fazer as correções necessárias". Esperem mudanças, portanto.

Que a comunicação governamental nunca tenha funcionado perfeitamente não é um diagnóstico difícil. A questão, contudo, é se a sua falha está nas causas que Lula aponta. Acho que não. Lula entende a comunicação governamental essencialmente como "divulgação das ações do governo". Faz, então, um cálculo simples: se sua administração está indo bem, mas uma parcela significativa dos brasileiros continua desconfiada ou insatisfeita, a informação não está chegando.

Síria, do júbilo à realidade - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Quedas de ditaduras devem ser celebradas, mas é preciso estar atento para os riscos futuros

Quedas de ditaduras geram sempre justificado júbilo para os povos libertados. O regozijo, contudo, não deve nos cegar para os perigos futuros. Não foram poucas as transições que acabaram dando lugar a ditaduras até piores que a original ou a cenários de mortífera anomia.

HTS (sigla árabe para Organização para a Libertação do Levante), o grupo que parece estar no comando da Síria, até vem dando as declarações certas. Fala em organizar eleições em breve e promete respeitar direitos de todas as facções políticas e religiosas.

A surpresa natalina de Dino para o centrão - Bruno Boghossian

Folha de S. Paulo

Ordem para investigar sistema de partilha de emendas vai incomodar líderes do Congresso

Flávio Dino preparou uma surpresa natalina para o centrão. Na segunda (23), em pleno recesso de fim de ano, o ministro do STF mandou suspender o pagamento das emendas que representam a principal moeda do balcão de negócios do grupo. Foram bloqueados mais de R$ 4 bilhões. Como brinde, a Polícia Federal deve abrir uma investigação sobre o uso político do dinheiro.

O congelamento das emendas era uma questão de tempo. O tribunal já havia suspendido os pagamentos mais de uma vez, exigindo o mínimo de transparência na distribuição da verba. Os parlamentares descumpriram quase todas as decisões da corte, muitas vezes com apoio do governo e sempre à luz do dia.

É o melhor Natal desde 2013, mas não parece - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Pesquisas indicam mal-estar, economia não explica pessimismo, que cresce

A leitora diria que o clima no país está bom? É pergunta vaga, que suscita respostas impressionistas. Mas é apenas de um jogo, um exercício mental. Desconsidere, por ora, avaliação mais objetiva sobre condições materiais de vida ou sobre o estado da política, por exemplo. Como parece o humor de seus concidadãos?

Vivemos o "melhor Natal" desde 2013. A expressão vai entre aspas porque costuma apenas descrever balanços de vendas do comércio ou de indicadores como salário médio ou renda per capita. As pessoas podem estar insatisfeitas com sua situação econômica ainda que tenham melhorado de vida. Podem ter insatisfações gerais mesmo que reconheçam melhoras na economia.

Poesia | Soneto de Natal, de Machado de Assis

 

Música | Joan Manuel Serrat - Cantares (Caminante, no hay camino)

 

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Lula sujeita a uso político as agências reguladoras

O Globo

Ao negociar escolha de diretores com Alcolumbre, ele mina a independência essencial para o sucesso do modelo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva seguiu a prática do antecessor, Jair Bolsonaro, de dar ao Congresso a prerrogativa de indicar nomes para as diretorias das agências reguladoras. Para prestigiar o senador Davi Alcolumbre (União-AP), favorito para comandar o Senado a partir de fevereiro, o governo antecipou a negociação das indicações. Há 17 vagas a preencher, e mais dez serão abertas em 2025. Com a decisão, Lula tenta melhorar o relacionamento com o Parlamento, mas os efeitos da tentativa de pacificação política serão deletérios.

As agências foram criadas na década de 90, na esteira da reforma do Estado nos governos de Fernando Henrique Cardoso. Privatizações, concessões e parcerias entre os setores público e privado exigiam independência nas instituições de regulação, tanto em relação ao governo quanto aos interesses empresariais. Dotados de mandatos fixos e não coincidentes com o calendário eleitoral, os diretores das agências têm a missão de assegurar a estabilidade nas regras em todos os mercados, sobretudo para os consumidores. Devem garantir que contratos, muitos deles de longo prazo e envolvendo cifras bilionárias, sejam cumpridos, independentemente de quem esteja no poder. Não chegou a ser surpresa que os investimentos e as chances de sucesso de políticas públicas aumentaram, desestimulando a prática de começar tudo do zero a cada quatro anos.

Esta não é uma comédia natalina – Pedro Doria

O Globo

A história de como se deu uma operação de ataque virtual maciça contra a atriz Blake Lively, revelada na edição de domingo do New York Times, ensina muito sobre como funciona a comunicação na internet. Sobre como as redes sociais são facilmente manipuláveis. Custa algum dinheiro construir o consenso a respeito de um tema, mas não é difícil. Por tabela, somos todos também presas fáceis dessa manipulação. As táticas usadas contra ela também não se limitam ao mundo do entretenimento. Fazem parte do arsenal de incontáveis grupos políticos pelo mundo.

Dino acaba com a farra de Natal - Merval Pereira

O Globo

O ministro do Supremo mostra que não tem nenhum tipo de amarras, nem mesmo com o governo

Muitos parlamentares passarão o fim de ano sem os presentes que prepararam para si próprios e para os seus. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino acabou com a festa das emendas parlamentares antes do Natal, e fez muito bem. Suas decisões não foram seguidas pelo Congresso. O Parlamento achou que podia dar um jeito, driblar as exigências de transparência, de definição clara de quem envia o dinheiro, para quem e por quê. Exatamente para evitar o que acontecia — o dinheiro ir para municípios sem destinação prévia e sem obrigação de prestação de contas —, uma farra com o dinheiro público que tinha de ser controlada.

Emendas em nova frente de conflitos - Míriam Leitão

O Globo

Decisão de Dino vai na mesma direção de todas as outras que têm buscado ao longo do tempo garantir transparência ao uso do dinheiro público

O ano estava terminando quando houve novo evento na conflagrada relação entre Congresso e Judiciário. Ontem, dia 23, antevéspera de Natal, o ministro Flávio Dino mandou suspender a execução de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissões. O problema é que parte das emendas havia sido remanejada exatamente quando o funcionamento de todas as comissões havia sido suspenso. Ao serem remanejadas, 40% delas passaram a beneficiar Alagoas, terra natal do presidente da Câmara, Arthur Lira. Esse é mais um capítulo da mesma luta travada durante o ano todo para desmontar o orçamento secreto. Ele sempre reaparece e se refaz, de outra forma, com novo nome.

Flávio Dino suspende pagamento das emendas de Arthur Lira - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A partir de 2025, as bancadas e as comissões da Câmara e do Senado deverão registrar, em ata, o nome do parlamentar que sugeriu cada emenda ao Orçamento

Estava escrito nas estrelas que as emendas do “orçamento secreto” se tornariam casos de polícia. Nas últimas semanas, várias operações de busca e apreensão e ordens de prisão foram executadas pela Polícia Federal (PF) em razão de desvios de recursos dessas emendas, por meio de obras e serviços superfaturados, com objetivo de engordar o caixa dois eleitoral e o patrimônio de políticos, servidores e empresários envolvidos. Ontem, o vice-prefeito de Lauro de Freitas, Vidigal Cafezeiro (Republicanos), e outras três pessoas foram presas por suspeita de desvio de dinheiro de emendas parlamentares.

Lula destaca respeito e harmonia entre poderes em discurso de Natal - Raphael Pati

Correio Braziliense

Presidente agradeceu às orações por cirurgia e disse que está "mais firme e forte para continuar a fazer o Brasil dar certo"

Em tradicional discurso da véspera de Natal, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), destacou a relação entre os Três Poderes e os governos estaduais e municipais. No pronunciamento realizado em cadeia nacional nesta segunda-feira (23/12), o chefe do Executivo disse que o diálogo e trabalho conjunto com outras esferas do poder público é a “base de tudo o que fazemos”.

Admirável mundo novo - Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo

Estão governo e empresas brasileiras conscientes das mudanças e preparados para defender os interesses nacionais neste novo cenário mundial?

No meio de grandes transformações na economia e na ordem internacional, estamos entrando numa nova etapa histórica pela interação de diversos fatores de grande intensidade.

Em primeiro lugar, a supremacia ocidental econômica, financeira e militar dos últimos 200 anos está sendo questionada e, na visão de muitos, está sendo reduzida. O mundo começa a se dividir em um grupo de nações ocidentais (sem definição geográfica) – EUA, Europa, Japão, Austrália e outras – e, de outro, um crescente grupo de nações, liderado pela China, tendo como base o Brics, formado por dez países, com 13 nações convidadas como associadas e mais de uma dezena pedindo para integrá-lo. A influência dos EUA, como a nação mais poderosa do mundo, parece estar em declínio, como se vê na tentativa de conter o conflito no Oriente Médio.

‘La nave va’ - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Violência, provas do golpe, crise fiscal, dólar, juros e emendas parlamentares… Feliz Natal!

As expressões que dominaram o debate e as preocupações de 2024 no Brasil vão ficar de herança para 2025: violência, tentativa de golpe, crise fiscal, juros, dólar e emendas parlamentares, que infernizam a vida dos brasileiros, azedam o humor nacional e respingam no governo, mesmo quando ele não tem nada a ver diretamente com isso.

No escândalo das emendas, pode-se até dizer que este governo (mais um…) é refém do Congresso e, simultaneamente, corréu e vítima da enxurrada de dinheiro público que sai de planilhas de Câmara e Senado, passa pelo Planalto e chega sabe-se lá onde – e se devidamente como a lei, a ordem e os princípios básicos de gestão pública mandam.

Lula brigou com o mercado e perdeu - Joel Pinheiro da Fonseca

Folha de S. Paulo

Falas contra a responsabilidade fiscal não criaram o problema, mas dificultam a solução

Até quando Lula vai brigar com "o mercado"? Diz-se que o mercado —ou seja, os investidores profissionais— é contra o presidente. Pode até ser. Óbvio que não se trata de profissionais fazendo apostas ruins intencionalmente para derrubar o governo; esse tipo de discurso beira a insanidade. Mas não me parece absurdo ver uma sensibilidade maior do mercado com Lula do que com outros atores.

Quando o Congresso aprova a prorrogação de isenção fiscal a vários setores econômicos, não me consta que os investidores tenham reagido com a mesma sensibilidade com que reagem a uma tirada do presidente.

Golpismo no Brasil segue organizado e sem pudor - Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Lição de casa bolsonarista desconsidera ou refuta investigação da PF e trata Braga Netto como herói

Cláudio Castro recebeu os jornalistas para um balanço de fim ano —como se tivesse grandes realizações a destacar. Acabou defendendo o indefensável: a política de segurança pública do Rio. Entre outras platitudes, disse que "o criminoso perdeu o medo do Estado". Poderia completar o pensamento dizendo que não há mais medo porque o criminoso muitas vezes está dentro do Estado.

Com esperança de eleger-se ao Senado em 2026, Castro engrossou o coro golpista afirmando ver "um excesso de criminalização" na prisão de Braga Netto e não encontrar "elementos claros" contra o general palaciano, investigado por participação no plano para monitorar, prender ou matar o ministro do STFAlexandre de Moraes, o presidente eleito, Lula, e o vice na chapa, Geraldo Alckmin. Formado em direito, o governador terá lido o relatório da Polícia Federal, com quase 900 páginas, ou decorou uma rápida e rasteira lição de casa bolsonarista?

Lula colhe tempestade – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Defesa verbal do ajuste não combina com ações do presidente em sentido contrário

Nem tudo o que o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) diz vale a crença na escrita. Suas profissões de fé no ajuste fiscal intercaladas com ações em sentido contrário, demonstram isso.

Daí a desconfiança com que foram recebidas suas palavras no vídeo divulgado na última sexta-feira, em texto elaborado de forma a hastear bandeiras brancas ao "mercado".

Ali o presidente deu um tempo no negacionismo, evitou a versão conspiratória do ataque especulativo ao real com vista a derrubar o governo; firmou compromisso com a estabilidade econômica, o controle da inflação e sinalizou a edição de novas medidas de contenção de gastos.

Ciência a serviço do mal - Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Quando a tecnologia é posta para explorar vulnerabilidades humanas, a regulação se faz necessária

ciência pode ser perigosa. É o que ocorre quando ela é posta para explorar vulnerabilidades de nossos cérebros e produzir os chamados estímulos supernormais.

Os dias duros do Pleistoceno, durante os quais era difícil conseguir as calorias necessárias para manter-se vivo, nos transformaram em máquinas de procurar gorduras e carboidratos e acumular as sobras na forma de tecido adiposo. Funcionou bem até que inventaram o baconzitos e o cheesecake. A proporção de obesos e diabéticos no planeta explodiu.

Memória: | (Gilvan e Graziela) Exilados voltam e passam o Natal presos

Jornal do Brasil - terça-feira, 26/12/78

Legenda: Graziela e Gilvan Cavalcanti de Melo foram liberados na Polícia Marítima às 11 horas

Exilados voltam e passam o Natal explicando por que voltaram sem passaportes

Fora do país há seis anos, absolvido em setembro último da acusação de pertencer ao PCB, o ex-funcionário do INPS Gilvan Cavalcanti Melo, chegou do Panamá com a mulher e os dois filhos, no domingo e foi preso. A Embaixada do Brasil informara que poderiam desembarcar só com a carteira de identidade, mas a polícia deteve o casal por 12 horas durante a noite de Natal, para saber porque estavam sem passaportes.

O Sr. Gilvan e D. Graziela Cavalcanti Melo passaram a noite num sofá da Delegacia de Polícia Marítima, onde foram interrogados ontem de manhã e liberados depois de preencherem um questionário mimeografado. Os filhos, Gilvan de 16 anos, paralítico, e Ana Amélia, de 12, foram dispensados pela polícia ainda no aeroporto e ficaram com parentes.

GARANTIA

Hoje, com 43 anos, o Sr. Gilvan de Cavalcanti Melo, nascido em Pernambuco, foi demitido do INPS por decreto baseado no AI-5, em 1972, sob a acusação de pertencer ao Partido Comunista Brasileiro. Logo após foi com a família para Buenos Aires, Porto Alegre e finalmente Santiago onde trabalhou na Corporação de Fomento.

Com a derrubada do Governo Allende, asilaram-se na Embaixada do Panamá, país onde o Sr. Gilvan conseguiu trabalho numa empresa de administração. Morou durante algum tempo em Cuba que lhe forneceu documento de identidade.

Ao saber de sua absolvição em processo na 2ª Auditoria da Marinha em 19 de setembro, o Sr. Gilvan consultou a Embaixada do Brasil no Panamá e recebeu a garantia de que poderia voltar normalmente apenas com a carteira de identidade brasileira emitida em 1972 se viajasse por uma empresa aérea brasileira.

A família embarcou num voo da Varig às 8,43 de domingo e chegou ao Aeroporto Internacional do Rio às 19,50. Levados para a Polícia Marítima e Aérea, o casal e os dois filhos foram informados de que teriam que prestar depoimentos, por não estarem com passaportes.

Após entendimento com os policiais, o Sr. Gilvan conseguiu que os filhos fossem liberados, enquanto ele e a mulher eram levados à sede da Polícia Marítima, na Av. Rodrigues Alves. Ali passaram a noite do Natal, recostados num sofá. O advogado Humberto Jansen chegou à delegacia às 7hs, mas só conseguiu liberar o casal, às 11h, depois que os dois prestaram depoimentos de uma hora cada um. 

No questionário tiveram que informar as condições de saída do país, como viviam e onde trabalhavam no exterior e porque voltaram. Agora o que quero fazer mesmo é assistir um jogo do meu Vasco”, disse o Sr. Gilvan.

Poesia | Organiza o Natal, de Carlos Drummond de Andrade - por Ivan Lima

 

Música | MPB4, Chico Buarque - Roda Viva

 

segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Pacote de segurança da Câmara é um equívoco grave

O Globo

Crise não será resolvida com medidas isoladas, boa parte erradas. É preciso corrigi-las ou barrá-las

No desfecho do ano legislativo, a Câmara aprovou diversos projetos para a segurança pública cujo efeito tende a ser o oposto do almejado. Entre outras iniciativas, os deputados querem atenuar punições para violência policial, enfraquecer o Estatuto do Desarmamento e prever castração química de pedófilos.

Uma das medidas mais preocupantes é o alívio para a violência policial, que guarda semelhança com a medida defendida pelo governo Jair Bolsonaro conhecida como “excludente de ilicitude”. Agora batizado Regra de Isenção da Providência Antecipada (Ripa), tem por objetivo declarado assegurar “proteção jurídica” a operações policiais e aos agentes infiltrados, invalidando “a ilicitude de certas condutas, eventualmente praticadas em função da operação”. A aplicação do dispositivo dependeria de autorização judicial prévia solicitada pelo órgão de inteligência ou segurança do agente. O secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira, diz que o projeto viola garantias e direitos fundamentais. Se for a votação no Senado, deveria ser derrubado.

Como entender o ano que passa tão rápido – Fernando Gabeira

O Globo

A oposição ganhou e não levou na Venezuela, e a ditadura de Maduro vai se tornando uma paisagem natural

Não tenho nenhuma conclusão definitiva sobre o ano que termina, exceto que passou rápido, voou como todos os outros ultimamente.

Destaco a eleição de Trump como algo que, indiretamente, marcará nossas vidas. Comemoro a queda de Bashar al-Assad na Síria, mesmo sabendo que inaugura uma era de incerteza.

Li sobre o impacto do El Niño no contexto das mudanças climáticas, mas me surpreendi com as devastadoras tempestades no Sul. Tudo o que tentamos antecipar numa sessão do Senado era quase nada diante da destruição que se aproximava.

Sofremos com os gritos sobre escombros em Gaza, mas hoje se tornaram apenas gemidos. Quase não se fala mais nisso. Foi horroroso o desfecho do processo eleitoral na Venezuela. A oposição ganhou e não levou, e a ditadura de Maduro vai se tornando uma paisagem natural. 

Para 2025, fé! – Preto Zezé

O Globo  

Nossos dirigentes precisam parar de pensar em si e buscar soluções que nos realizem. O país tem de se encontrar consigo mesmo

Escrevo este texto, após reuniões presenciais e ao vivo, a caminho de confraternizar com meu amigo Nizan Guanaes numa festa linda para poucos, com show de Caetano e Bethânia. Pedi a Nizan sugestão de um assunto para esta coluna. Ele me indicou a música “Fé!”, da nossa ídola Iza. Eu disse que já conhecia a música e veria como trazer para cá o assunto sem ser uma leitura de um Deus dominador que impõe tudo sobre todas as coisas.

Fé na saúde da Dona Fátima, minha bússola em tempos tão duros de desamor e tensões. Ela ilumina meus dias mais cinzentos e nem sabe quanto me fortalece quando sorri, com nosso senso de humor ácido e sem filtros, ou quando a admiro passando seu dedinho gordo na tela do celular, morrendo de se abrir (como se diz lá no Ceará) com os vídeos das redes sociais.

Cadáveres da anistia – Demétrio Magnoli

O Globo

STF recusou o argumento de que crimes contra a Humanidade são imperdoáveis e imprescritíveis

Flávio Dino provocou o STF a renunciar à renúncia. Quase 15 anos atrás, o tribunal reafirmou a Lei de Anistia, recusando o argumento de que crimes contra a Humanidade são imperdoáveis e imprescritíveis. De lá para cá, os juízes supremos recusam-se a ouvir até mesmo ações sobre as pessoas que foram “desaparecidas” pela ditadura militar. No seu “basta”, Dino propõe um limite: a ocultação de cadáver é um crime continuado, não um evento do passado.

A decisão de 2010 do STF invocou a intocabilidade dos “pactos que conduziram o Brasil à democracia”. Os juízes de capa preta prenderam o Brasil à chantagem militar de 1979 — ao intercâmbio da abertura política pelo perdão aos gerentes do subterrâneo. No fundo, proclamaram que a Constituição de 1988 é refém de atos jurídicos oriundos de um regime ilegal e, portanto, que à nação brasileira ficam vedados os direitos à justiça e à memória exercidos pelo Chile e pela Argentina.

Somos governados por covardes e coniventes - Bruno Carazza

Valor Econômico

Duas decisões recentes ilustram o medo das autoridades em corrigir o que todos sabem que está errado

Na próxima vez que você sair com o seu carro para um passeio com a família num domingo à tarde, imagine por alguns segundos a possibilidade de, ao virar uma esquina, serem alvejados com 257 tiros de fuzil e pistola disparados não por criminosos, mas por agentes do Estado que, supostamente, são responsáveis pela sua segurança.

A situação parece absurda, mas a probabilidade de ocorrer cresce exponencialmente se você é preto e mora nas comunidades pobres das grandes cidades. E tende a se repetir, dada a complacência com que as autoridades tratam os abusos praticados pelos militares no Brasil.

Lula agarra-se à âncora do ‘jovem chamado Galípolo’ - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Depois de desgastar Haddad com a inclusão da isenção do IR, o presidente transformou o compromisso do futuro presidente do BC com a meta de inflação como alavanca para a recuperação da credibilidade fiscal do governo

Cinco dias depois de dizer que a única coisa errada que há no Brasil é a taxa de juros, na entrevista ao “Fantástico” depois de sua alta hospitalar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva transformou o diretor de política monetária e futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, na âncora de que desesperadamente precisa para tirar o governo do atoleiro.

“Um jovem chamado Galípolo”, tratado por Lula como um “presente” para os brasileiros, foi o mesmo que comandou a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que aumentou em um ponto a taxa de juro, fixando-a em 12,25%, e sinalizou mais dois aumentos de igual monta.

Incerteza fiscal turva o cenário de crescimento para 2025 e 2026 - Sergio Lamucci

Valor Econômico

Dúvidas sobre contas públicas pressionam o câmbio, elevando inflação e exigindo juros mais altos; o resultado deve ser um crescimento mais fraco nos próximos dois anos

O Brasil caminha para terminar 2024 com um dólar na casa de R$ 6 ou um pouco mais, devendo avançar em 2025 num ciclo de alta dos juros que poderá levar a Selic, hoje em 12,25%, acima de 15% ao ano. As incertezas sobre as contas públicas, dada a resistência do governo em adotar medidas mais duras de contenção de gastos, são o principal motivo para a desvalorização do real, que tem impacto sobre a inflação e, com isso, exige juros bem mais elevados do que se projetavam há alguns meses. Depois de mostrar força em 2024 pelo terceiro ano seguido, a economia deverá perder fôlego em 2025 e 2026, num ritmo mais intenso do que o necessário se o governo de Luiz Inácio Lula da Silva não hesitasse em controlar a expansão das despesas obrigatórias.

Entrevista | Eduardo Giannetti: ‘Claramente, há uma reação exagerada do mercado financeiro’

Por Luiz Guilherme Gerbelli / O Estado de S. Paulo

Economista e filósofo diz que números fiscais do Brasil são preocupantes, mas não calamitosos; ele critica alta dos juros e ‘dominância que o mercado financeiro exerce na formação das expectativas’

O economista e filósofo Eduardo Giannetti avalia que há uma reação exagerada do mercado financeiro com os números da economia brasileira. No fim deste ano, a incerteza sobre o futuro das contas públicas do País levou o dólar para a casa de R$ 6,30 e fez os juros futuros dispararem.

“Claramente, há uma reação exagerada do mercado financeiro”, afirma. “Os indicadores fiscais brasileiros, embora preocupantes, não são calamitosos. Longe disso. Nós não estamos na beira de nenhum precipício fiscal.”

Em entrevista ao Estadão, Giannetti critica a alta dos juros ― em seu último encontro, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou a Selic em 1 ponto porcentual ― e avalia que o País enfrenta uma dominância do mercado financeiro “na formação das expectativas e no ambiente do debate público brasileiro”.

“O mercado financeiro é extremamente exigente quando se trata de pedir cortes de gasto primário, mas ele é completamente omisso quando se trata de trazer à tona o custo fiscal de um aumento extravagante de juros como esse que nós estamos vivendo no Brasil”, diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Abraçado ao espantalho da extrema direita - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Se o PT está perdendo a batalha das redes para seus adversários ideológicos, isso é tarefa para os marqueteiros do partido, não para o governo com o uso de recursos públicos

Em meio às barbeiragens de fim de ano na política econômica, avançaram nos bastidores do poder federal as maquinações para uma virada de mesa na área da comunicação do governo, escolhida para expiar a culpa pela falta de personalidade do terceiro mandato presidencial de Lula. A troca de comando na Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), atualmente nas mãos do ministro Paulo Pimenta, é dada como certa nos corredores acarpetados de Brasília. Costuma-se dizer que uma boa estratégia de marketing é capaz de vender até gelo no Ártico. O desafio, no caso do governo Lula, talvez seja um pouco maior. Já se passaram dois anos e não há grandes realizações para mostrar.