“A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. (Artigo 16 da Constituição Federal)
A chamada lei da ficha limpa (Lei Complementar 135/2010) foi submetida ao STF, ontem, não no conjunto, mas no que toca a sua vigência e aplicação retroativa.
Não vamos gastar teclas nos posicionando sobre o mérito da lei, progressista e moralizadora da vida pública, embora contenha questões polêmicas, como a que foi decidida ontem, e, seguramente outras, tais como a aplicação sem o direito de ampla defesa (proibição de candidaturas por colegiado de juízes de instâncias inferiores ou de conselhos profissionais já implicam em inelegibilidade). Com certeza, o STF ainda será provocado e terá de decidir sobre a constitucionalidade dessas e de outras questões que estão na LC 135/2010.
A decisão – por maioria – do STF foi que a lei não pode ser aplicada, a não ser a partir de sua promulgação (princípio da anualidade) e só vale para as próximas eleições, a partir de 2012.
O fundamento da decisão foi o artigo 16 da Constituição brasileira, que determina não ser possível alterações no processo eleitoral, depois de iniciado.
A surpresa não foi a decisão da maioria (6 votos) do plenário do STF, mas os votos da minoria (5 votos), todos, rigorosamente todos, baseados não no entendimento da aplicação do artigo 16 da Constituição, mas na correção da lei da ficha limpa e nos benefícios que ela acarreta para a vida política.
Aqui nós temos duas questões de princípio. A primeira é que a Constituição é a baliza para as decisões do STF. Este órgão não tem o poder de fazer a Constituição, muito menos de alterá-la. Deve simplesmente interpretá-la e aplicá-la. O artigo 16 tem redação cristalina, que não permite qualquer outra interpretação, a não ser a da anualidade das alterações no processo eleitoral.
O segundo princípio é da retroatividade das penas. “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação .... “, reza o artigo 16. Não é possível qualquer outra interpretação. A expressão “entrará em vigor” não contém dúvidas sobre sua aplicabilidade não retroativa, tão somente “para frente”., durante sua vigência É um princípio jurídico consagrado que lei alguma pode ter aplicação retroativa, ou seja, não pode punir crimes que não eram crimes, antes de promulgadas. Do contrário, teremos a insegurança jurídica e a subordinação das minorias a casuísmos ao sabor dos ventos. Estará decretada a desigualdade jurídica.
A Lei da Ficha Limpa, ou qualquer outra, por sua justiça e legitimidade, não pode colidir com a lei máxima, a Constituição. Para ela – e qualquer outra - passar por cima do artigo 16 e do princípio da retroatividade, a Constituição teria de ser reformada, por uma Assembléia Constituinte ou por uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), esta aprovada em dois turnos no Senado e na Câmara, em cada uma por 2/3 dos parlamentares. Isso é o que diz a Constituição.
A questão política
Agora vamos entrar na questão política.
A lei da ficha limpa foi de iniciativa popular, de 1,6 milhão de eleitores e apoiada praticamente por toda a opinião pública. Foi aprovada às pressas e por praticamente unanimidade, depois de iniciado o processo eleitoral de 2010, para já valer nele e com efeitos retroativos.
Os parlamentares não sabiam que sua aplicação imediata e retroativa era inconstitucional? É óbvio que sim. Mas quem iria contra uma a vigência imediata de uma lei que tinha e tem amplo apoio da sociedade? Seria louco, em plena caça de votos? O mesmo aconteceu com o STE, o Supremo Tribunal Eleitoral. Quis posar na foto, de moralizador, em um contexto de omissão do processo político real, quando Lula e Dilma faziam letra morta da legislação eleitoral, que proíbe campanhas eleitorais antes da proclamação dos candidatos e do início do processo eleitoral e também do uso que faziam de recursos públicos, impunes.
As inconstitucionalidades operam no sentido contrário das chamadas “intenções do legislador”. Escancaram as portas para os políticos acusados de ser ficha-suja fugirem de suas penalidades. É simples. Recorrem ao STE ou ao Supremo, nas questões que estão previstas na Constituição. Obtêm liminares e quando o mérito da ação for julgado, têm seus direitos eleitorais restituídos. O STE pode até negar a liminar, mas quando ela chega ao Supremo, não há como ser negada, devido ao princípio constitucional do direito de ampla defesa.
Nesse imbróglio, misturam-se limpos e sujos e a lei vai para a lata do lixo.
A saída não é simples. A OAB, partidos, ou parlamentares deveriam arguir a constitucionalidade da lei. O Supremo, de uma vez por todas, separaria o joio do trigo. Os artigos porventura vetados, por inconstitucionalidade, poderiam voltar ao Congresso, para retificação ou substituição, sempre de acordo com os preceitos constitucionais.
Quem topa correr o risco de ser acusado por setores da opinião pública como sendo a favor dos fichas-sujas, se tentar corrigir e aprimorar a lei?
De fato e de direito, a lei da ficha-limpa, tal como está, subiu no telhado, para prejuízo, em muitos aspectos, da democracia.
FONTE: BLOG PITACOS
A chamada lei da ficha limpa (Lei Complementar 135/2010) foi submetida ao STF, ontem, não no conjunto, mas no que toca a sua vigência e aplicação retroativa.
Não vamos gastar teclas nos posicionando sobre o mérito da lei, progressista e moralizadora da vida pública, embora contenha questões polêmicas, como a que foi decidida ontem, e, seguramente outras, tais como a aplicação sem o direito de ampla defesa (proibição de candidaturas por colegiado de juízes de instâncias inferiores ou de conselhos profissionais já implicam em inelegibilidade). Com certeza, o STF ainda será provocado e terá de decidir sobre a constitucionalidade dessas e de outras questões que estão na LC 135/2010.
A decisão – por maioria – do STF foi que a lei não pode ser aplicada, a não ser a partir de sua promulgação (princípio da anualidade) e só vale para as próximas eleições, a partir de 2012.
O fundamento da decisão foi o artigo 16 da Constituição brasileira, que determina não ser possível alterações no processo eleitoral, depois de iniciado.
A surpresa não foi a decisão da maioria (6 votos) do plenário do STF, mas os votos da minoria (5 votos), todos, rigorosamente todos, baseados não no entendimento da aplicação do artigo 16 da Constituição, mas na correção da lei da ficha limpa e nos benefícios que ela acarreta para a vida política.
Aqui nós temos duas questões de princípio. A primeira é que a Constituição é a baliza para as decisões do STF. Este órgão não tem o poder de fazer a Constituição, muito menos de alterá-la. Deve simplesmente interpretá-la e aplicá-la. O artigo 16 tem redação cristalina, que não permite qualquer outra interpretação, a não ser a da anualidade das alterações no processo eleitoral.
O segundo princípio é da retroatividade das penas. “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação .... “, reza o artigo 16. Não é possível qualquer outra interpretação. A expressão “entrará em vigor” não contém dúvidas sobre sua aplicabilidade não retroativa, tão somente “para frente”., durante sua vigência É um princípio jurídico consagrado que lei alguma pode ter aplicação retroativa, ou seja, não pode punir crimes que não eram crimes, antes de promulgadas. Do contrário, teremos a insegurança jurídica e a subordinação das minorias a casuísmos ao sabor dos ventos. Estará decretada a desigualdade jurídica.
A Lei da Ficha Limpa, ou qualquer outra, por sua justiça e legitimidade, não pode colidir com a lei máxima, a Constituição. Para ela – e qualquer outra - passar por cima do artigo 16 e do princípio da retroatividade, a Constituição teria de ser reformada, por uma Assembléia Constituinte ou por uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), esta aprovada em dois turnos no Senado e na Câmara, em cada uma por 2/3 dos parlamentares. Isso é o que diz a Constituição.
A questão política
Agora vamos entrar na questão política.
A lei da ficha limpa foi de iniciativa popular, de 1,6 milhão de eleitores e apoiada praticamente por toda a opinião pública. Foi aprovada às pressas e por praticamente unanimidade, depois de iniciado o processo eleitoral de 2010, para já valer nele e com efeitos retroativos.
Os parlamentares não sabiam que sua aplicação imediata e retroativa era inconstitucional? É óbvio que sim. Mas quem iria contra uma a vigência imediata de uma lei que tinha e tem amplo apoio da sociedade? Seria louco, em plena caça de votos? O mesmo aconteceu com o STE, o Supremo Tribunal Eleitoral. Quis posar na foto, de moralizador, em um contexto de omissão do processo político real, quando Lula e Dilma faziam letra morta da legislação eleitoral, que proíbe campanhas eleitorais antes da proclamação dos candidatos e do início do processo eleitoral e também do uso que faziam de recursos públicos, impunes.
As inconstitucionalidades operam no sentido contrário das chamadas “intenções do legislador”. Escancaram as portas para os políticos acusados de ser ficha-suja fugirem de suas penalidades. É simples. Recorrem ao STE ou ao Supremo, nas questões que estão previstas na Constituição. Obtêm liminares e quando o mérito da ação for julgado, têm seus direitos eleitorais restituídos. O STE pode até negar a liminar, mas quando ela chega ao Supremo, não há como ser negada, devido ao princípio constitucional do direito de ampla defesa.
Nesse imbróglio, misturam-se limpos e sujos e a lei vai para a lata do lixo.
A saída não é simples. A OAB, partidos, ou parlamentares deveriam arguir a constitucionalidade da lei. O Supremo, de uma vez por todas, separaria o joio do trigo. Os artigos porventura vetados, por inconstitucionalidade, poderiam voltar ao Congresso, para retificação ou substituição, sempre de acordo com os preceitos constitucionais.
Quem topa correr o risco de ser acusado por setores da opinião pública como sendo a favor dos fichas-sujas, se tentar corrigir e aprimorar a lei?
De fato e de direito, a lei da ficha-limpa, tal como está, subiu no telhado, para prejuízo, em muitos aspectos, da democracia.
FONTE: BLOG PITACOS
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