O Globo
O deputado Eduardo Bolsonaro cantou a pedra
no início de julho passado, quando registrou que o post de Donald Trump
defendendo seu pai poderia vir a ser “a última ajuda vinda dos EUA”. Dias
depois, escrevia ao ex-presidente:
— Tire do cálculo o apoio dos EUA.
Estimulado pela carta ameaçadora de Trump a
Lula, o deputado havia chegado a jactar-se:
— Nós já provamos que somos mais efetivos até
do que o próprio Itamaraty.
Exagero, coisa de quem chegou aos subúrbios
do poder e acha que conquistou Washington.
O telefonema de Trump a Lula, na segunda-feira, mostrou que as relações dos Estados Unidos abrigam interesses bem mais complexos que a aventurosa expedição de Eduardo Bolsonaro a Washington. Era de jerico a ideia de que uma pressão de Trump levaria Lula a encerrar “IMEDIATAMENTE” (ênfase dele) o processo em que Bolsonaro era réu no Supremo Tribunal Federal. Ele tomou uma sentença de 27 anos e está em prisão domiciliar.
Quando o governo brasileiro acordou para o
problema, contratou a poderosa banca de advogados Arnold and Porter, com os
serviços de Thomas Shannon, embaixador dos Estados Unidos no Brasil de 2010 a
2013 e mais de 50 anos de experiência na diplomacia de Washington na América
Latina.
Em julho, Eduardo Bolsonaro parecia senhor de
um período de inexplicável tensão entre os dois países, como se fosse conduzida
por estudantes zangados. Em outubro, viu-se transformado em Cassandra, torcendo
para que o secretário de Estado, Marco Rubio, continue o serviço de salsicharia
numa relação bicentenária. Será uma crise saída do nada, para ir a lugar
nenhum, atendendo apenas aos interesses da família Bolsonaro.
Rubio tem sido um crítico da política
brasileira, e sua indicação para tratar do tema foi saudada por vozes do
governo e da oposição, como se houvesse algo de novo no fato de o presidente
delegar a seu secretário de Estado a condução de uma negociação diplomática.
Seu olho vai na direção da Venezuela e, sobretudo, de Cuba. (Registre-se que
a família de Rubio não deixou Cuba por causa de Fidel Castro, a quem detestava.
Os Rubios foram para os Estados Unidos durante o governo de Fulgencio Batista,
nos anos 1950.)
Em julho, Eduardo Bolsonaro temia que
aparecesse um projeto de “anistia light”. Em outubro, é isso que há no bufê.
Rubio poderá ser um negociador duro, soprando algumas brasas, mas ficará dentro
das quatro linhas da diplomacia. No sentido inverso, a trinca de negociadores
brasileiros poderá baixar algumas tarifas. O chanceler Mauro
Vieira, o vice-presidente Alckmin e o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, certamente conseguirão mudanças tarifárias pontuais. A crise com
Washington sairá aos poucos da esfera estudantil.
A relação de Lula com Trump e Rubio deverá passar por uma lombada em novembro, com a realização da COP30, mas será um atrito de palavras. No mais, o trem que Trump descarrilou em julho voltará aos trilhos.
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