Armado para uma guerra comercial, o presidente Donald Trump conseguiu atrair o governo chinês para uma tentativa de acordo, mas seria uma ingenuidade festejar essa trégua. Em primeiro lugar, o conflito poderá explodir a qualquer momento, porque os americanos mantêm as armas apontadas e prontas para disparar, até porque serão usadas como ferramenta de negociação, como disse o diretor do Conselho Econômico Nacional dos Estados Unidos, Larry Kudlow. Em segundo, exportações de aço e alumínio de outros países continuam sujeitas à imposição de barreiras tarifárias ou cotas nos Estados Unidos. O Brasil é um dos países ameaçados. Em terceiro, o início de um entendimento entre Washington e Pequim, anunciado como avanço importante pela Casa Branca, indica um sucesso parcial, pelo menos até agora, de uma política baseada na truculência e no desprezo a normas multilaterais.
Nem o risco de uma guerra comercial entre os Estados Unidos e vários grandes parceiros está eliminado. Enquanto se preparava a trégua entre Washington e Pequim, autoridades da União Europeia, do Japão, da Índia e da Rússia comunicaram à Organização Mundial do Comércio (OMC) a disposição de impor barreiras a exportações americanas se o governo do presidente Donald Trump mantiver limitações a suas exportações de aço e de alumínio. Essa retaliação conjunta poderá resultar num enorme conflito entre grandes economias, mesmo se houver avanço nos entendimentos entre americanos e chineses.
A participação japonesa nesse movimento é especialmente significativa. O Japão é o mais poderoso aliado dos Estados Unidos no Extremo Oriente e o governo do primeiro-ministro Shinzo Abe tem procurado aproximar-se da atual administração republicana. Mais que isso, tem suportado com paciência pressões americanas sobre comércio bilateral e política regional. O governo japonês cobra isenção de impostos e de cotas para suas exportações de aço e de alumínio e, tudo indica, rejeita a discussão de qualquer acordo.
Neste momento, o governo americano parece concentrado na busca de uma solução para os problemas comerciais com a China, sem cuidar muito das controvérsias com outros parceiros. O presidente Trump cobra dos chineses medidas para reduzir substancialmente o desequilíbrio no comércio bilateral. Para isso seria preciso, segundo cálculos americanos, cortar US$ 200 bilhões do superávit chinês.
O saldo favorável à China atingiu US$ 375 bilhões no ano passado. Autoridades de Pequim concordaram em aumentar as importações de produtos originários dos Estados Unidos, mas, pelo menos segundo as primeiras informações, descartaram metas numéricas. Além disso, rejeitaram discutir o corte de US$ 200 bilhões no saldo chinês. O governo americano também cobra mudanças na política chinesa de absorção de tecnologia, em parte realizada, segundo o representante comercial dos Estados Unidos, Robert Lighthizer, por meio de “transferências forçadas”.
Se falharem as negociações e começar a guerra comercial entre Estados Unidos e China, os chineses também poderão impor perdas consideráveis ao outro lado. Também por isso o presidente Donald Trump deu preferência à busca de um entendimento. Não estão claros, ainda, os efeitos dessa guerra para os demais participantes do comércio internacional, no curto prazo, mas os danos ao sistema global poderão ser significativos. O quadro ficará bem mais complicado se outras grandes economias entrarem no conflito, aplicando as medidas de retaliação informadas na última semana à OMC.
Por enquanto, prossegue o espetáculo da truculência. O presidente Trump forçou o governo chinês a negociar, a guerra foi suspensa por tempo indeterminado e os países com menor poder de fogo ficam à espera de novos lances. Embora o comércio com a China seja o mais problemático para os Estados Unidos, nenhum outro parceiro estará seguro enquanto o presidente Trump estiver empenhado em cumprir suas promessas de protecionismo. E o sistema internacional, é claro, continuará em risco.
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