Valor Econômico
O que importa, na verdade, não é apenas a taxa no fim do ciclo de corte, e sim toda a trajetória de queda de juros
Membros do Comitê de Política Monetária
(Copom) do Banco Central disseram nos últimos dias que, se o colegiado for mais
devagar na baixa da Selic, poderá chegar mais longe no ciclo de distensão. Isso
significa que dentro de duas reuniões, em junho, a Selic cai só 0,25 ponto
percentual?
Não necessariamente. O cenário central é uma
baixa de 0,5 ponto, que só não foi sinalizada porque as incertezas aumentaram,
e há risco de baixar menos. A teoria do “menos é mais” parece ter a intenção de
mostrar que, se o BC reduzir o ritmo de cortes para 0,25 ponto, a taxa no fim
do ciclo não será maior. Para combater a inflação, o que importa é o juro
médio, que pode subir se o ritmo de cortes for menor, para uma mesma taxa no
fim da distensão.
No seu ciclo de comunicação da última reunião - incluindo comunicado, ata do Copom, Relatório de Inflação, entrevistas e pronunciamentos ao mercado financeiro - todo esforço foi direcionado para deixar viva a possibilidade de um corte de juros de 0,5 ponto percentual em junho.
O Banco Central manteve o seu cenário básico
e deu sinais indiretos de que, nele, estava contemplado um corte de 0,5 ponto.
Despertando incredulidade em muitos, disse que as incertezas que encurtaram a
sua sinalização futura para os juros a apenas uma reunião também incluem riscos
positivos, e não apenas negativos. Também procurou minimizar a força da
dissidência do Copom que, conforme a ata da última reunião, defende a
desaceleração no ritmo de corte de juros se a incerteza se prolongar até junho.
O mercado pode até não concordar com a
sinalização do Copom, mas não a pode ignorar, porque o Banco Central tem um bom
domínio da taxa de juros de curto prazo. Assim, a hipótese de queda de 0,5
ponto está no jogo.
Mas como juntar isso com a comunicação verbal
mais recente sobre andar mais devagar com os juros para chegar mais longe? O
presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tocou no assunto na
entrevista do Relatório de Inflação. “Houve um questionamento [na reunião de
março do Copom] de qual é o ritmo [de cortes na Selic], ou qual é o caminho,
que nos levaria mais longe com maior certeza”, informou.
Em cada reunião, o Copom costuma analisar
várias trajetórias diferentes de cortes na taxa Selic para um mesmo cenário
básico. Explicando melhor: primeiro, o Banco Central traça um cenário básico
para projetar a inflação, incluindo a sua opinião sobre, por exemplo, o preço
dos alimentos, o grau de aperto no mercado de trabalho e os juros americanos.
Depois, roda algumas vezes o modelo de projeção, alimentando com diferentes
trajetórias de queda da taxa Selic. O resultado disso são várias projeções de
inflação para diferentes trajetórias da Selic, usando o mesmo cenário.
O público externo só conhece uma dessas
projeções, divulgada após cada reunião do Copom, que leva em conta a trajetória
de queda da Selic prevista pelos analistas econômicos no boletim Focus. Pela
mais recente, a inflação ficaria em 3,2% em 2025, ano em que o Copom se propõe
a cumprir a meta de 3%, caso a Selic saia dos atuais 10,75% ao ano e chegue a
9% no fim deste ano e 8,5% no ano que vem. Essa não é visão do Copom para o
juro. É, na verdade, uma projeção condicionada ao que o mercado prevê para a Selic.
É útil para saber se a trajetória mediana prevista pelos economistas permite ou
não cumprir a meta de inflação.
Mas o que importa, na verdade, não é apenas a
taxa no fim do ciclo de corte de juros, e sim toda a trajetória de queda de
juro. O modelo de projeção do Copom usa a média da taxa Selic prevista pelo
mercado nos próximos 12 meses. O Focus projetava, antes da última reunião do
Copom, quedas de juros de 0,5 ponto em maio, junho e julho. Em setembro, a taxa
ficaria parada e, em novembro, seria reduzida em 0,25 ponto, para 9%. A Selic
ficaria estável na última reunião deste ano, e depois voltaria a cair 0,25 ponto
na segunda e na quarta reuniões de 2025, chegando a 8,5%.
O que o Copom fez na última reunião,
aparentemente, foi analisar diferentes trajetórias de corte de juros, o que
inclui diferentes ritmos e diferentes taxas terminais. Quando mais devagar o
Copom cortar os juros, mais altos serão os juros médios ao longo dessa
trajetória. Quanto maior o juro médio, menor a inflação projetada, e mais perto
da meta. Isso permite que, em tese, o Copom chegue a uma taxa mais baixa ao fim
do ciclo, caso vá mais devagar.
Alguns analistas vêm chamando a atenção, nas
últimas semanas, que a projeção condicional de inflação não permite chegar a
uma taxa de 9% ao fim do ciclo. Normalmente, esse cálculo simples é útil para
checar até onde a Selic pode cair. Atualmente, essa regra de bolso perde um
pouco a validade.
Primeiro porque na ponta o modelo já usa uma
taxa abaixo de 9% nas suas projeções, já que ele é alimentado pelos próximos 12
meses (a Selic média do Focus usada no modelo no primeiro trimestre de 2025 é
de 8,92%, segundo o Relatório de Inflação).
O mais importante é que os membros do Copom
estão chamando a atenção sobre como a trajetória de cortes de juros pode levar
a uma taxa menor ao fim do ciclo. A conta que o mercado deveria fazer é o
quanto um ritmo mais lento afeta as projeções de inflação. Pode não ser muito,
mas a direção é clara: um ritmo menor não significa juro maior no fim do ciclo.
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