O Estado de S. Paulo
Todo investimento envolve risco, mas a
decisão positiva é facilitada quando a política indica perspectivas de
crescimento e de previsibilidade
Com 8,4 milhões de famintos e 39,7 milhões sujeitos à insegurança alimentar, o Brasil integrou o Mapa da Fome no triênio encerrado em 2023, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Nesse período, a desnutrição crônica assombrou 3,9% da população brasileira e o País superou com folga a marca necessária (2,5%) para estar nesse mapa. Listada entre as 10 ou 12 maiores do mundo, a economia brasileira se destaca também como grande e eficiente produtora e exportadora de alimentos. Não falta comida, mas o dinheiro é curto para a maioria das famílias e fica ainda mais curto com a alta dos preços. Além disso, há o risco persistente de inflação bem acima do centro da meta, fixado em 3%. Esse risco é associado à insegurança gerada no Palácio do Planalto.
Para levar comida para casa, o brasileiro
gastou em junho 4,71% mais do que um ano antes, segundo o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE). Em 12 meses o custo de alimentação e bebidas
subiu mais que o conjunto dos preços ao consumidor (4,23%), de acordo com os
dados oficiais.
O desarranjo dos preços é em parte explicável
por excesso de chuva em algumas áreas e escassez em outras. O quadro
internacional, o dólar em alta e a insegurança nos mercados também são fatores
importantes. Uma das principais fontes de insegurança é o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, com promessas de gastança e resistência à ideia de
austeridade. De vez em quando ele tenta corrigir o discurso e alinhar-se ao
ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Não tem sido convincente, no entanto, e
por isso persiste o temor de um desacerto prolongado nas contas federais.
A incerteza sobre a evolução das finanças
públicas dificulta a redução de juros. A taxa básica, determinada pelo Banco
Central (BC), deve permanecer em 10,5% até o fim do ano, segundo projeção do
mercado, e diminuir lentamente no próximo ano. Dinheiro caro é um desestímulo
ao investimento produtivo. As estimativas de crescimento econômico neste ano
têm subido e indicam 2,15%, uma taxa ainda medíocre. Mas a expectativa para os
próximos anos permanece em torno de 2%, em forte contraste com o entusiasmado falatório
do presidente da República.
Se os fatos confirmarem essa projeção, o bom
aumento do emprego observado a partir do ano passado dificilmente se manterá. A
oferta de vagas urbanas poderá crescer, mas em atividades pouco dinâmicas e de
baixa remuneração. A retomada e a modernização do setor industrial serão
prejudicadas. O País investirá muito menos que o necessário para fortalecer a
capacidade produtiva. O dinamismo continuará concentrado na agropecuária e, em
menor grau, nos serviços.
De acordo com o Fundo Monetário Internacional
(FMI), o Brasil deve terminar 2024 com investimento físico – em máquinas,
equipamentos e obras – equivalente a 15,9% do
Produto Interno Bruto (PIB). Estará na 20.ª
posição na lista de países considerados. Não há expansão relevante do potencial
produtivo quando se investe pouco. Uma economia como a brasileira deveria
investir pelo menos 20% do PIB para manter um crescimento próximo de 4% ao ano,
segundo as estimativas correntes. Em 2029, calculam os economistas do FMI, a
taxa de investimento poderá ser de apenas 15,4%.
Juros altos são apenas um dos entraves à
decisão de investir. Não basta dispor de crédito barato. Para aplicar dinheiro
no potencial produtivo, o empresário precisa de boas expectativas quanto à
evolução dos negócios. Confiança é um componente essencial desse quadro. Para
confiar, o investidor precisa receber sinais adequados do governo. Todo
investimento envolve risco, mas a decisão positiva é facilitada quando a
política indica perspectivas de crescimento e de previsibilidade.
A equipe econômica pode transmitir sinais
positivos, mas é necessário mais que isso para estimular os agentes privados.
Se as palavras e atitudes do chefe de governo ocasionarem alguma insegurança, o
esforço dos ministros e técnicos poderá ser perdido.
Nenhum plano bem desenhado produzirá os
efeitos necessários, se o presidente da República apontar para outra direção.
No Brasil, neste momento, nenhuma pessoa sensata apostará em crescimento seguro
sem um claro programa de arrumação das contas públicas. Essa arrumação poderá
demandar mais que um ano, mas uma promessa clara e confiável poderá produzir
bons efeitos no mercado. O presidente Lula dificulta esse processo, quando
deixa entrever alguma dúvida quanto aos propósitos de seus ministros.
Governar envolve definição de prioridades e o
presidente sabe disso. Sabe, mas nem sempre age de acordo com esse
conhecimento. Com inquietante frequência, cede a impulsos e a velhas
inclinações partidárias e ideológicas, esquecendo ou negligenciando sua experiência.
Uma clara prioridade para o País, neste momento, é construir as condições
fiscais para uma nova etapa de modernização e expansão da economia. Dessas
condições dependerá a segurança necessária a um desenvolvimento duradouro.
Menos petismo e mais atenção aos ministros da Fazenda e do Planejamento podem
ajudar muito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário