Valor Econômico
Posições climáticas opõem Donald Trump e Kamala Harris e podem afetar o planeta
”A eleição dos Estados Unidos é tão importante para o destino do mundo que todos no planeta deveriam votar”, disse um ambientalista há oito anos em tom de piada e desespero. Em novembro de 2016 o republicano Donald Trump derrotaria a democrata Hillary Clinton e seguiu o script de quem se referia à mudança do clima como uma farsa - “a hoax, em suas palavras. O 45th presidente dos EUA saiu do Acordo de Paris, apoiou o setor de carvão, tornou irrelevante a poderosa agência ambiental americana, a EPA, tratou com desdém ONU, organismos multilaterais e negociações climáticas, e fez seguidores em outras partes tão ou mais irresponsáveis. Trump, à frente do país que é o maior emissor histórico de gases-estufa e hoje vem depois só da China, atrasou o mundo em um tema em que os seres vivos só têm perdas.
A crise do clima volta a ser tema na campanha
americana agora com mais prioridade, estratégia e ataques. A anedota do
parágrafo anterior é muito atual, mas perdeu a graça.
A realidade não é divertida. O domingo 21 de
julho foi o dia mais quente já registrado no mundo desde, pelo menos, 1940. O
serviço de mudança climática europeu Copernicus divulgou que naquele domingo a
Terra viveu seu dia mais quente com temperatura média global diária de 17,09°C.
Para quem não se emociona com médias, há episódios que ilustram o que está
acontecendo: um incêndio de grandes proporções ameaçava Atenas na semana
passada; Palm Springs, na Califórnia, registrou 51°C em 5 de julho e mais de 50
milhões de pessoas nos EUA ficaram sob alerta diante do calor brutal que matou
gente; ao menos 1.300 peregrinos morreram de calor indo à Meca em junho.
Pouco antes e mais perto de seu umbigo, Trump
reuniu 20 lobistas do petróleo em seu resort em Palm Beach, na Flórida. Era 11
de abril. Segundo o “Washington Post”, o ex-presidente disse a eles que
deveriam doar US$ 1 bilhão à sua campanha porque, reeleito, reverteria regras
ambientais que prejudicavam o setor. O “New York Times” apurou que havia no
jantar executivos da ExxonMobil, da EQT Corporation e do American Petroleum
Institute.
Trump prometeu eliminar as regras climáticas
de Joe Biden destinadas a acelerar a transição energética. Disse ainda que
abriria mais terras públicas para exploração de petróleo e gás.
O barão do petróleo Harold Hamm, fundador da
Continental Resources (uma das dez maiores produtoras independentes de petróleo
dos EUA) e próximo a Trump, começou a telefonar a seus pares para convencê-los
a abrirem suas carteiras. “Temos que fazer isso porque é a eleição mais
importante de nossa vida”, repetia o bilionário, segundo o Post. Trump deve
participar de mais eventos sobre petróleo e gás este ano. Em seu discurso na
convenção republicana, o homem deu o recado ao repetir o bordão “drill, baby, drill”.
A vice-presidente e candidata democrata,
Kamala Harris, por seu turno, é feita de outra farinha. Tem marcos em sua
trajetória política de preocupação com o ambiente. Entre 2011 e 2017, quando
era procuradora-geral da Califórnia, processou a Chevron e a BP em casos de
contaminação por combustível. Como senadora apoiou o Green New Deal e como
vice-presidente deu o voto de desempate para o Inflation Reduction Act, o maior
investimento climático da história dos EUA, promovido pelo presidente Biden. A
lei injeta mais de US$ 370 bilhões ao longo de dez anos em energia eólica e
solar, carros elétricos e baterias e foi criada para ajudar o país a se afastar
dos combustíveis fósseis.
A Reuters diz, contudo, que Kamala tem sido
ambígua em suas posições na área de energia. No passado ela se opôs ao fracking
em terras federais, posição que teria revisto. Na Pensilvânia, Estado disputado
por Kamala e Trump, ela ganhou o apoio dos sindicatos. A região é a segunda
maior produtora de gás natural do país. Biden suspendeu as novas licenças de
exportação de gás natural liquefeito em 2024 e não se sabe o que Kamala pensa a
respeito.
Os democratas apostam que as posições
climáticas de Kamala atrairão o eleitorado jovem. As entidades das juventudes,
contudo, ainda não declararam seu apoio.
Enquanto isso, a agência Bloomberg relata que
em Phoenix, no Arizona, o calor é desafio constante e que em 2023, depois de a
cidade registrar 31 dias seguidos com mais de 43°C, a escola Paideia comprou
coletes de resfriamento carregados com sacos de gelo para professores usarem
nos intervalos. As “cooling vests” são até estilosas, a julgar pelas imagens
disponíveis. Na Austrália surgiram neste verão “cooling hubs”, tendas com
ventiladores para abrigar moradores em situação de rua. Em Miami e em Tóquio já
existem “cooling centers” - espaços públicos fechados com muito ar-condicionado
e cadeiras para as pessoas se refugiarem nos dias muito quentes.
O calor já afeta a rotina e os horários de
trabalho em todo lado. Em Roma muitas empresas concedem dias de home office a
funcionários para poupá-los das altas temperaturas das ruas. A empresa Urbaser,
de Madri, proibiu a varredura de vias públicas quando a temperatura for
superior a 39°C e atrasou o horário dos turnos da tarde das 14h30 para as 17h.
Sindicatos na Itália e na Grécia demandam novas regras que protejam os
trabalhadores.
Tudo isso sem mencionar aqui no Brasil, onde
os incêndios queimam o Pantanal, a seca avança no semiárido e no Centro Oeste e
começa precoce na Amazônia, ameaçando ser mais grave do que a de 2023.
Nenhum comentário:
Postar um comentário