O governo Barack Obama tem 25 dias e já acumula várias derrotas: quatro quedas no gabinete, fracasso do sonho do apoio bipartidário, um plano de resgate financeiro mal recebido no mercado e um plano de estímulo econômico que demorou muito na tramitação pelos impasses partidários. São avisos de que será um governo difícil nas áreas política e econômica.
A lua-de-mel foi breve, porque a crise econômica é profunda e o mundo político precisava, e queria, que Obama escorregasse. Ele brilhou tanto na campanha, se colocou acima de Washington, uma novidade tão alvissareira que, se cumprida, significaria derrotar uma teia enorme de interesses que está incrustada na capital federal. É assim nas capitais federais, guardadas as devidas proporções.
Obama escorregou em algumas nomeações. Prometeu um governo sem qualquer conexão com lobbistas e más práticas. Por isso a lupa foi aumentada sobre cada um dos escolhidos. Pecados e pecadilhos derrubaram nomeados e enfraqueceram o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, que entrou em campo na defensiva quando foi escalado para o ataque.
Ao perder Tom Daschle, Obama ficou sem a peça-chave para a mais importante reforma interna prometida na campanha, a da assistência à saúde. Ao perder Judd Gregg, o breve secretário do Comércio, ele ficou sem o símbolo de que seria possível fazer um governo que passasse por cima da divisão partidária. Não parece possível. A Câmara não lhe deu um único voto no pacote de estímulo, o Senado deu magros três e Gregg abandonou o cargo, dizendo que não podia ser ele mesmo e colaborar com o governo ao mesmo tempo, e foi comemorado como filho pródigo em retorno pelo Partido Republicano. Obama terá que nomear o terceiro secretário do Comércio, porque o primeiro, antes de Gregg, foi o governador do Novo México, Bill Richardson, que saiu antes de entrar por suspeitas de favorecimento de empresa.
Para o contra-ataque econômico, o presidente tinha escolhido duas armas, numa ação simultânea e definitiva esta semana. O pacote de estímulo econômico, em fase final de aprovação no Congresso, e um amplo ataque à crise de confiança no sistema financeiro, que ainda paralisa o crédito e derruba as ações dos bancos. Incrível que ainda haja espaço para cair. O Citibank já teve ação cotada a US$56, no fim de 2007, e ontem ela foi negociada a US$3,65.
Obama tem nas mãos o pacote de estímulo, aprovado ontem, com algumas escoriações, e pôs um plano financeiro na rua que não agradou. Nas primeiras horas após o anúncio, o principal colunista do "Financial Times", Martin Wolf, disse que o plano fracassaria; e o mais notado economista destes tempos de crise, Nouriel Roubini, está dizendo que não há como fugir do Plano N, de nacionalização (estatização) dos bancos. A revista "Economist" definiu-o como "tímido, incompleto e sem detalhes" e disse que a equipe econômica de Obama cometeu o erro de prometer um plano e entregar um conceito. O Dow Jones caiu 5% em três dias após o anúncio e ontem, mesmo com a aprovação do pacote, fechou em queda de 1%. O que ficou claro é que não haverá solução fácil, nem indolor, para esta crise. Geithner não conseguiria fazer um plano varinha de condão que varresse as dúvidas sobre a sustentabilidade de alguns bancos pilares do mercado financeiro americano.
Dentro dos bancos existem ativos sem liquidez, difíceis de valorizar, e eles precisam ser retirados dos ativos bons dos bancos. O plano ofereceu três fórmulas a serem usadas ao mesmo tempo: capitalização após auditoria nos bancos; fundo público e privado que compraria ativos podres; ação do Fed para destravar o mercado de outras dívidas, como cartão de crédito, de carro, estudantil. Pediu-se a Geithner mais do que ele podia dar, e ele ofereceu menos do que podia. O secretário do Tesouro disse que havia "mais risco no gradualismo do que na ação agressiva". Mas anunciou mecanismos de execução gradual.
O pior defeito do plano foi ignorar o mercado hipotecário, onde dez mil famílias ficam sem casas por dia. Essa sangria aprofunda mais o valor dos ativos dos bancos, e aprofunda a crise. O governo promete um plano para o resgate dos devedores dos imóveis na semana que vem e os grandes bancos anunciaram ontem uma suspensão das execuções de hipotecas.
Se foi um difícil início, não significa que tudo já deu errado. O governo Obama mal começou, venceu no Congresso, mantém a confiança e continua no ataque. A cobrança seria difícil, os perdedores políticos precisam de espaço, o mercado bancário está em risco de colapso. Não acabou nem o primeiro mês. Há uma longa jornada pela frente. Ela pode melhorar mais cedo.
Um painel de economistas ouvido regularmente pelo "Wall Street Journal" avaliou ontem que a recessão pode ser mais profunda, só que mais curta. A média das previsões é de uma queda de 4,6% do PIB no primeiro trimestre, outra queda de 1,5% no segundo trimestre, mas na segunda metade do ano o país teria 0,7% e 1,9% positivos. Os pessimistas, no painel, acham que a média das previsões está otimista demais e que a recessão será mais longa. Mas Obama tem espaço para trabalhar para que a maioria esteja certa.
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