Enquanto a presidente afastada Dilma Rousseff insiste em negar qualquer crime de responsabilidade, técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) pedem a rejeição do balanço federal de 2015, apontando evidências de graves irregularidades. O parecer será avaliado pelos ministros da Corte a partir do dia 15. As contas de 2014 foram rejeitadas por unanimidade com base em evidências muito parecidas com as do novo relatório. Será dado um prazo à defesa para apresentação de seus argumentos. Será surpresa se o plenário do tribunal se deixar convencer pelas alegações a favor da presidente afastada. As violações cometidas, segundo os técnicos, na gestão fiscal do ano passado são essencialmente um prosseguimento das infrações à Lei de Responsabilidade Fiscal praticadas em 2014.
O processo de impeachment é baseado, formalmente, na acusação de irregularidades ocorridas em 2015, mas a separação entre os fatos de 2014 e os do ano passado é artificial. A desordem nas finanças públicas acumulou-se ao longo do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. A contabilidade criativa e as operações de maquiagem agravaram os problemas causados pela gastança e por muitos erros políticos, tornando cada vez mais difícil uma administração regular. As pedaladas de 2014 foram um desdobramento dessa história, assim como as de 2015.
Os técnicos do TCU chamam a atenção, em seu relatório, para o atraso de transferências de R$ 40,2 bilhões aos bancos públicos, no primeiro semestre do ano passado. Esse montante superou o de todo o ano anterior, quando os atrasos chegaram a R$ 37,5 bilhões. Esses dados eliminariam qualquer dúvida, se ainda houvesse alguma, quanto ao crime de responsabilidade.
Ao retardar por longo tempo os pagamentos, o governo efetivamente se financiou com recursos dos bancos federais. Afinal, instituições financeiras controladas pela União desembolsaram o dinheiro necessário para a realização dos programas oficiais e só foram compensadas com muito atraso. Não há como negar, em casos como esses, a ocorrência efetiva de operações de crédito.
A corrida do Executivo, nos últimos dias de 2015, para cobrir os débitos com os bancos já havia sido suficiente para caracterizar as pedaladas. Naquela altura, os fatos já eram bastante claros para quem quisesse entendê-los. A análise agora apresentada pelos técnicos do TCU simplesmente reforça a convicção sobre os crimes cometidos no ano passado.
Os técnicos também chamam a atenção, em seu relatório, para a edição irregular de seis decretos de autorização de créditos suplementares. Esses decretos foram editados antes da mudança, com aprovação do Congresso, da meta de superávit primário definida para 2015 na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Faltava, portanto, comprovar que o aumento de despesas seria compatível com o resultado pretendido para as contas públicas. Também nesse caso, segundo a avaliação da equipe técnica, houve infração à lei.
Toda a gestão da presidente Dilma Rousseff, incluído o primeiro ano do segundo mandato, foi marcada pelo desprezo às normas de responsabilidade fiscal e de uso eficiente do dinheiro público. A desordem das contas públicas, agravada em 2015, foi a razão principal apontada pelas três maiores agências de classificação de risco, quando rebaixaram o crédito soberano do Brasil ao grau especulativo.
Não se pode cassar o mandato de um governante apenas por incompetência, têm dito críticos do processo de impeachment. O argumento seria mais digno de atenção, agora, se o desastre das contas públicas brasileiras fosse apenas efeito de uma notável incompetência. Mas a história é mais complicada: à incapacidade administrativa acrescentou-se, no caso da presidente Dilma Rousseff, uma indisfarçável e repetida agressão à lei. Essa agressão foi caracterizada pelas pedaladas e pela edição de decretos irregulares. Houve, sim, crime de responsabilidade, uma figura prevista na Constituição, e esta é a base do processo de impeachment.
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