O Globo
O ministro cortou a festa e condenou os
espetáculos
O ministro Edson Fachin assumiu a presidência
do Supremo Tribunal Federal ao seu estilo, com um discurso longo, tedioso e até
descuidado. Misturou num mesmo parágrafo seu compromisso com a liberdade de
imprensa e com o “bem-estar dos servidores”. Ainda assim, disse a que veio, com
boas notícias. Por exemplo:
— A prestação jurisdicional não é espetáculo.
Exige contenção.
Ou:
— Assumo aqui compromisso de uma gestão
austera no uso dos recursos públicos pelo Judiciário. A diretriz será a
austeridade.
Fora do mundo das palavras e promessas, Fachin resgatou a tradição de Rosa Weber e cancelou a pajelança com que lobistas festejam posses. Há registro de eventos com a presença de magistrados para provar uísques, na Europa, com patrocínio de um banco mambembe.
O Judiciário brasileiro alterna momentos de
brilho com maus hábitos de vilegiaturas, mordomias e penduricalhos. Se Fachin
persistir no exemplo, influenciando a bancada da charanga, todo mundo terá a
ganhar. Nem todos os ministros do STF formam
essa bancada, mas são eles que acabam passando a impressão de que o tribunal é
uma festa móvel, fazendo de cada feriadão um pretexto para excursões. Ministros
do Supremo fazem-se acompanhar por seguranças e, num caso, chegaram a reclamar
porque o consulado do Brasil em Nova York descuidou
de contratar escolta.
Os magistrados austeros levam uma desvantagem
quando são comparados aos juízes espetaculares. Numa corporação de 18 mil
juízes, tem-se de tudo, mas o magistrado que evita os refletores acaba vítima
da própria virtude. Sucede com os juízes algo que envenena parte da corporação
militar. Ninguém ouve quem só fala nos autos, e ouve-se quem fala de tudo, a
qualquer hora. Magistrados como Rosa Weber podem até ser a norma, mas não
chamam a atenção.
Mesmo tendo uma sucessão presidencial durante
seu período na presidência do tribunal, pode-se estimar que Fachin terá um
biênio tranquilo, sem o vandalismo do 8 de Janeiro e sem as tensões que
acompanham o processo da trama golpista.
Se o novo presidente do Supremo Tribunal
Federal viajar em avião de carreira, sem capangas, terá dado um bom exemplo.
Não passa pela cabeça de um juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos viajar
com escolta para eventos empresariais. O que o Supremo Tribunal precisa é do
exemplo de austeridade, e Fachin sempre se manteve ao largo das farofas. Esse
magistrado de 67 anos chegou ao tribunal durante o governo de Dilma Rousseff e
completou dez anos na cadeira sem as marcas do deslumbramento que viraram a
cabeça de alguns de seus pares.
Fachin vem de uma cepa de colonos gaúchos que
ajudaram a construir o Paraná. Foi estudar na
cidade grande, levando consigo apenas a passagem de ida. Pouco a ver com
carreiras de magistrados de salão.
Em seu discurso de posse, Fachin falou de
quase tudo, alternando platitudes e promessas. Se ao fim de dois anos ele tiver
deixado a marca da austeridade, terá continuado a obra de Rosa Weber, uma
presidente do tribunal que não aparecia em farofas e pouco falava.
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