Brexit representa uma ameaça à difícil paz entre as duas Irlandas: Editorial | O Globo

Pelo fato de a Irlanda do Norte ser do Reino Unido, a separação força a volta da fronteira física

A impressão de que os responsáveis pelo projeto do Brexit pouco ou nada pensaram nas implicações práticas da separação entre a Grã-Bretanha e a União Europeia se fortalece sempre que se analisa algum aspecto concreto do divórcio.

Por exemplo, o caso de incontáveis cadeias de suprimento que interligam linhas de produção instaladas em território britânico com fornecedores europeus do continente. E vice-versa.

A saída britânica do bloco — sob pressões essencialmente xenófobas — poderá se traduzir em barreiras tarifárias, sinônimo de aumento de custos em exportação e importação, que se traduzirá em perda de competitividade no mundo, em recessão e inflação. O próprio Banco da Inglaterra, BC britânico, não é otimista em seus relatórios.

Há, ainda, o caso da República da Irlanda e da Irlanda do Norte, separadas durante as últimas três décadas do século XX por um forte conflito entre católicos e protestantes, que militarizou a fronteira, com intervenção militar inglesa.

A paz foi negociada pelo premier britânico Tony Blair, com apoio do então presidente americano Bill Clinton. Há 20 anos, não há barreiras entre elas. O que sedimentou a paz, criou e fortaleceu negócios. Com o Brexit, porém, há o perigo da volta da fronteira física.

A Irlanda do Norte é parte do Reino Unido e, portanto, irá junto no Brexit, caso de fato ocorra a separação. Assim, provavelmente acabará o livre trânsito com a República da Irlanda, um golpe forte na cultura da paz que vem sendo sedimentada há duas décadas.

Reportagens feitas na região relatam sérias dificuldades que agropecuaristas e fábricas enfrentarão com a volta ao passado da segregação. Mais um motivo para um recuo britânico no Brexit.