Folha de S. Paulo
A atração fatal por retrocessos na lei e nos
costumes é ainda muito presente nos altos escalões da República
Determinados episódios da cena brasileira
expressam a existência de indiscutível vocação para o atraso em setores
representativos da República.
No momento assistimos a dois deles: a proposta de revogar a prerrogativa do Supremo Tribunal Federal de abrir ações contra parlamentares sem autorização do Congresso e a construção de área vip no aeroporto de Brasília para afastar ministros do Tribunal Superior do Trabalho do alcance de pessoas "inconvenientes". Falam dos cidadãos sem toga.
Como se vê, o gosto por costumes obsoletos
não é exclusividade de um Poder, dado que no Executivo o primeiro escalão conta
com a regalia de voos da Força Aérea Brasileira.
Salas exclusivas já estão à disposição de
integrantes do STF e
do Superior Tribunal de Justiça. Os privilégios incluem acesso às aeronaves sem
o desconforto das filas de embarque.
Esse tipo de tratamento remete ao conceito de
gente diferenciada que, por isso, deve ser protegida de presumidas grosserias
de passageiros em sua maioria desprovidos do sustento de dinheiro público. Por
essa visão, é lícito supor que deputados e senadores em breve reivindiquem o
benefício da prudente distância de seus eleitores.
Deles já se encontram bastante distanciados,
conforme recente pesquisa Datafolha em que 78%
dos consultados consideram que os congressistas dão prioridade à defesa dos
próprios interesses. E aqui chegamos a outro exemplo de atração pelo
retrocesso.
Os parlamentares querem voltar a submeter
ações contra eles no Supremo ao aval prévio do Congresso, como acontecia até
2001. Na ocasião, a regra foi modificada devido às reiteradas recusas de
aberturas de inquéritos e a consequente impunidade travestida de imunidade.
Então, eis que temos posta a ideia de se
impor uma regressão de quase um quarto de século à prática corretiva daquela
distorção de ordem corporativa, para fazer exatamente o que a ampla maioria dos
representados condena em seus representantes: o propósito de legislar à luz de
causas próprias.
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