segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Humberto Saccomandi - A um ano das eleições nos EUA, Trump lidera em Estados decisivos, mas cenário é complexo

Valor Econômico

Mas há muitas incertezas para as eleições marcadas para 5 de novembro do próximo ano, e o cenário político é possivelmente um dos mais complexos da história do país

Daqui a um ano, em 5 de novembro de 2024, os EUA vão escolher o seu próximo presidente e renovar parte do Congresso. As pesquisas continuam a sugerir uma disputa acirrada entre o democrata Joe Biden e o republicano Donald Trump, numa repetição da eleição de 2020. Mas há muitas incertezas, e o cenário político é possivelmente um dos mais complexos da história do país. Para o resto do mundo, é uma espera difícil, pois envolve se preparar para políticas antagônicas nos EUA.

As pesquisas de intenção de voto vêm mostrando um empate técnico entre Biden e Trump no voto popular. Mas pesquisas divulgadas neste domingo (05) pelo jornal “The New York Times” mostram o republicano à frente -- com uma vantagem de 4 a 7 pontos percentuais, pouco acima da situação de empate técnico -- em vários daqueles Estados indecisos, que decidem a eleição nos EUA. Trump lidera hoje na Geórgia, Pensilvânia, em Michigan, Nevada e no Arizona, Estados nos quais Biden venceu em 2020 e que foram decisivos para a sua eleição. O mapa eleitoral, neste momento, não está favorável ao democrata.

As primárias (o processo de prévias partidárias) que definirão os candidatos dos dois principais partidos americanos começam em janeiro. Nunca um candidato que, no início de novembro, tinha a vantagem que Biden e Trump têm hoje perdeu as primárias sucessivas.

Apesar de a maioria dos americanos achar que Biden não deveria se candidatar, pela sua idade avançada (80 anos), ele lidera com ampla vantagem (tem em torno de 72% das intenções de voto) as pesquisas para a escolha do candidato presidencial democrata. A não ser que ele desista ou que algum problema de saúde prejudique gravemente a sua imagem, as primárias (prévias partidárias) democratas não deverão trazer surpresas.

Trump também lidera com folga (em torno de 59% das intenções de voto) a corrida pela candidatura presidencial republicana, mas o partido atravessa um momento de intensa disputa interna, e alguns movimentos estão ocorrendo. Mike Pence, que foi vice-presidente de Trump, não conseguiu fazer sua candidatura decolar e desistiu da disputa, sugerindo que a consolidação em uns poucos candidatos já começou.

Pesquisas começam a mostrar um avanço de Nikki Haley, que aparece em terceiro lugar na disputa republicana, com pouco mais de 8% na média das pesquisas do site Real Clear Politics. Ela declaradamente tenta se posicionar como a alternativa anti-Trump no partido. Por ser menos conhecida que o segundo colocado, o governador da Flórida, Ron DeSantis, sua candidatura parece ter mais margem para crescer. Ainda assim, superar Trump parece uma missão quase impossível.

Mas há fatores hoje difíceis de avaliar e que podem influenciar tanto as primárias republicanas como as eleições. Trump, primeiro ex-presidente do EUA indiciado criminalmente, é réu em quatro processos que estão em andamento. Ele será alvo de depoimentos de pessoas que lhe eram aliadas, como ex-assessores, advogados e autoridades locais do seu próprio Partido Republicano. Poderá ser condenado (em primeira instância). É improvável que essa intensa propaganda negativa nos próximos meses não respingue e prejudique a sua candidatura, apesar de até agora isso não ter ocorrido.

Há ainda os riscos associados à enorme crise interna no Partido Republicano. Em outubro, os republicanos se digladiaram por semanas para escolher o novo presidente da Câmara dos Deputados, depois que o presidente anterior foi destituído (pela primeira na história) após perder o apoio da ala mais à direita do partido. Foram semanas de uma disputa fratricida, que evidenciou que um partido rachado entre republicanos mais tradicionais e uma ala de extrema direita muito aguerrida, ligada a Trump. Essa disputa está a pleno vapor, e o seu custo para o partido e para Trump ainda não está claro. O risco mais grave seria o de perder apoio entre os eleitores independentes.

Para o presidente Biden, além da questão da sua idade, o maior risco é de uma desaceleração forte ou até de uma recessão na economia americana. Um ano atrás, muitos economistas previam que os EUA estariam agora em recessão. Mas a economia se mostrou até agora resiliente à alta de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano).

Mas o fato de muitas previsões terem errado não quer dizer que a recessão não ocorrerá. Dados recentes, como o de criação de empregos, parecem mostrar já alguma desaceleração. Se será o pouso suave da economia pretendido, pelo Fed e pela Casa Branca, ou uma queda mais abrupta, fará toda a diferença para Biden.

Apesar da boa situação econômica atual, com desemprego em 3,9%, um nível historicamente baixo, a percepção que muitos americanos têm da economia é ruim. Biden terá um ano para tentar convencer os americanos de que eles estão errados, mas uma desaceleração forte ou recessão tornaria essa missão quase impossível.

Há ainda o impacto imponderável, por enquanto, das crises globais, especialmente as guerras na Ucrânia e entre Israel e palestinos. Um agravamento desses conflitos poderia elevar mais os preços do petróleo, o que seria ruim para Biden. Por outro lado, é uma incógnita se os americanos vão confiar em colocar o incendiário Trump para guiar o país em meio a dois conflitos graves.

O resto do mundo, inclusive o Brasil, acompanha com ansiedade a campanha eleitoral americana. Biden e Trump personificam dois modelos antagônicos, com políticas econômicas e externas muito diferentes. Os aliados europeus, por exemplo, temem que Trump possa até retirar os EUA da Otan (a aliança militar ocidental) e acabar com o apoio à Ucrânia na guerra com a Rússia. O republicano promete também mais protecionismo comercial, com aumento das tarifas de importação dos EUA.

 

 

 

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