segunda-feira, 2 de junho de 2014

Opinião do dia: Dora Kramer

Qual a diferença entre os saques, invasões, depredações e bloqueios patrocinados pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra sob o olhar complacente do governo do PT e os saques, invasões, depredações e bloqueios que o governo do PT promete reprimir com firmeza para evitar a "baderna" (palavra da presidente) durante a Copa do Mundo?

Dora Kramer: O custo da transigência, O Estado de S. Paulo, 1 de junho de 2014

Petrobras contrata quase dez vezes mais terceirizados do que concursados

• Quadro da estatal tem 80% de terceirizados, inclusive em funções de concursados

Alexandre Rodrigues – O Globo

RIO — Ao defender a gestão da Petrobras no embate com a oposição nas CPIs abertas no Congresso, o governo cita a realização de 18 concursos públicos desde 2003, que fizeram dobrar o quadro de efetivos da estatal nos mandatos de Lula e Dilma. Os número de concursados saltou de 40 mil para 86 mil. No entanto, a participação desses concursados no total da força de trabalho da Petrobras caiu pela metade nos últimos 12 anos. Isso porque, no mesmo período, houve uma explosão na contratação de terceirizados, que saltaram de 49 mil para 360 mil, um crescimento de mais de 630%. Nos últimos 12 anos, entraram “pela janela” dez vezes mais contratados indiretamente do que o total de concursados efetivados. Em 2002, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), os concursados já eram minoria: 45% dos empregados. Hoje, eles são apenas 20% do quadro de trabalhadores da Petrobras. A contratação de terceirizados — que hoje ocupam 80% do quadro — não é ilegal, mas é proibida para as chamadas atividades-fim, relacionadas ao negócio principal da empresa, que são reservadas aos concursados, como determina o no artigo 37 da Constituição. São cargos como os de engenheiro, geólogo, economista, administrador, contador e até advogado, listados no plano de carreiras da estatal.

Hoje, para cada funcionário de carreira há quatro terceirizados trabalhando em diferentes áreas da companhia e de suas subsidiárias, de áreas administrativas a plataformas de produção de petróleo no mar. Essa relação ficará ainda mais desfavorável para os concursados a partir deste mês, quando começam a deixar a Petrobras os 8.300 funcionários efetivos que aderiram ao programa de demissão voluntária criado pela presidente da empresa, Graça Foster, para economizar cerca de R$ 13 bilhões até 2018. Ela indicou que pretende repor apenas 60% das vagas dos demissionários.

Uso de terceirizados é alvo de 30 ações judiciais
A ocupação de vagas como estas por terceirizados é alvo de pelo menos 30 ações judiciais propostas por sindicatos e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) desde a década passada. Em 2006, a estatal fez um acordo para regularizar a situação até 2010, que não foi cumprido. Os profissionais são admitidos como prestadores de serviços, contratados por empresas que, por sua vez, são contratadas pela Petrobras por projetos de, em média, quatro anos. Em tese, prestadores de serviços nem deveriam trabalhar nas dependências da Petrobras. Muito menos ter como chefes funcionários efetivos. Segundo o MPT, a empresa só deveria recorrer à contratação indireta para atividades complementares, como manutenção, vigilância, comunicação.

Segundo a estatal, as empresas terceirizadas montam suas equipes sem subordinação à Petrobras, mas de acordo com o projeto contratado. Não é o que dizem funcionários ouvidos pelo GLOBO sob a condição do anonimato. Eles reconhecem que a prática não é nova na estatal, mas vem aumentado nos últimos anos, levantando dúvidas sobre os critérios de escolha dos profissionais. Indicações até de parentes dos altos executivos e de políticos são comentadas nos corredores.

Listas telefônicas da estatal obtidas pelo GLOBO mostram as equipes das gerências formadas tanto por funcionários efetivos quanto por terceirizados, que podem ser identificados pelo nome da empresa contratante no endereço de email. Na Gerência Executiva de Programas de Investimentos da Diretoria de Gás e Energia, por exemplo, o gerente executivo, os cinco gerentes gerais e os 19 gerentes são concursados. Mas entre seus subordinados, efetivos e terceirizados se misturam. Na gerência de Energia, 21 dos 31 profissionais são terceirizados em posições como engenheiro, técnico em elétrica ou contabilista, também ocupadas por concursados.

— Fiscalizar plataforma em alto-mar, por exemplo, é uma atividade de alto risco que só deveria ser exercida por concursados, que têm melhor treinamento. Mas as plataformas estão cheias de terceirizados — diz o procurador do Trabalho Marcelo Fernandes da Silva, que há dez anos investiga a escalada das contratações indiretas na empresa. — A prestação de um serviço deve ser feita de forma autônoma ou sob liderança das empresas contratadas. Se o profissional está subordinado a um gerente da Petrobras, não é prestação de serviço. É mera intermediação de mão de obra.

A existência de concursados e terceirizados trabalhando lado a lado é a principal evidência encontrada pelos procuradores do trabalho e por uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) realizada em 2010. Os auditores apontaram a dificuldade de diferenciar prestadores de serviço de caráter temporário dos terceirizados com funções permanentes, iguais às dos concursados. Foram encontrados funcionários com mais de 20 anos na Petrobras com contratos indiretos. Isso só é possível porque eles mudam de empresa a cada fim de contrato, num sinal de que gerentes da Petrobras fazem indicações para as prestadoras.

A demanda crescente leva a estatal a firmar contratos bilionários com várias intermediárias. Uma das maiores é a Hope RH, que aparece na lista de supostos beneficiários do esquema investigado pela Polícia Federal na Operação Lava-Jato. A empresa aparecia em documentos do ex-diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, apreendidos quando ele foi preso. A Hope nega ter relações com ele.

Enquanto a terceirização cresce, a Petrobras deixa de convocar boa parte dos aprovados em seleções nos últimos anos, levando muitos à Justiça para prorrogar a validade de concursos e garantir a contratação. O MPT estima que mais da metade dos selecionados ainda não tenha sido chamada. A empresa disse já ter contratado 32.221 aprovados desde 2003, mas não informou o total de vagas oferecidas nos editais. O número de funcionários próprios subiu mais do que isso por causa da incorporação de funcionários de empresas adquiridas no Brasil e no exterior, como usinas termelétricas.

Terceirização causou racha entre sindicatos
Segundo a Petrobras, a estimativa de Graça de repor apenas 60% das vagas dos demissionários voluntários, feita em conversa com investidores, ainda é preliminar. Mesmo assim, o plano foi criticado pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), representação sindical filiada à Central Única dos Trabalhadores (CUT). Líderes da FUP se reuniram com Graça na ultima sexta-feira para pedir reposição de 100% das vagas, mas ela não se comprometeu.

Emanuel Cancella, dirigente do Sindipetro-RJ, órgão dissidente da FUP, diz que as terceirizações foram um dos motivos do racha entre os sindicatos do setor no governo Lula. Ex-dirigentes da FUP chegaram a assumir a gerência de recursos humanos, mas não frearam as contratações indiretas:

— Essa foi uma das razões para a nossa saída da FUP. Em vez de acabar com a terceirização, os sindicalistas indicados pelo PT na Petrobras fizeram pior do que no governo anterior. Vangloriam-se dos concursos, mas mudaram o plano de cargos e fizeram a terceirização crescer avassaladoramente.

Em nota ao GLOBO, a Petrobras afirmou que, entre os 360 mil funcionários contabilizados como terceirizados, cerca de 165 mil trabalham em obras com claro caráter temporário e afirmou que o grande número de prestadores de serviço se justifica pelo aumento do volume de investimentos da companhia, cuja média anual cresceu dez vezes na última década. O plano de investimentos de 2014 a 2018 vai aplicar US$ 220 bilhões na exploração do pré-sal e na conclusão de refinarias atrasadas, entre outros programas, para aumentar a produção de petróleo e de derivados. O GLOBO tentou contato com representantes da FUP, mas não obteve retorno.

Ex-diretor da Petrobras piora situação da estatal em entrevista

• Paulo Roberto Costa diz que refinaria em PE foi feita com ‘conta de padeiro’

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA e RIO - A convocação do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa nas CPIs que investigam desvios na estatal ganhou força depois que ele — que ficou 59 dias presos por sua ligação com o doleiro Alberto Youssef — disse hoje em entrevista à “Folha de S. Paulo” que a obra da refinaria Abreu e Lima, em construção em Pernambuco, foi feita com base em uma “conta de padeiro”. Na entrevista, ele afirmou que o orçamento inicial da obra, de US$ 2,5 bilhões, foi feito sem embasamento técnico e que a “Petrobras errou”. No final, essa refinaria, que deve ficar pronta em 2015, sairá por US$ 18,5 bilhões.

O relator da CPI Mista da Petrobras, deputado Marco Maia (PT-RS), afirmou hoje que Paulo Roberto da Costa será um dos primeiros a ser convocados para depor e dar explicações sobre sua atuação na empresa. Representante do PT, Maia disse que será “lamentável” se a declaração de Costa for verdadeira.

O ex-diretor da estatal foi preso por conta da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Na entrevista, Costa negou que tenha havido superfaturamento nas obras. Segundo ele, a Petrobras decidiu construir a refinaria sem um projeto definido. Ele, que confirmou ter sido indicado pelo PP na estatal, também criticou as apurações do Tribunal de Contas da União (TCU), que segundo ele, tratou das obras, onde passarão tranques de 100 mil toneladas, com os mesmos critérios das estradas, por onde passam, no máximo, caminhões com 30 toneladas.

— É lamentável que um investimento deste tamanho tenha sido tratado de forma tão informal e sem tratamento técnico. Mas só saberemos se isso é verdade no curso da investigação. Ele deverá ser um dos primeiros a ser convocado. — disse Marco Maia, por mensagem.

O presidente das duas CPIs da Petrobras (do Senado e a Mista), senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), disse que já há requerimentos pedindo que ele seja ouvido. A CPI Mista da Petrobras se reúne amanhã, pela primeira vez, para discutir o plano de trabalho.

— Existem requerimentos para convocação de Paulo Roberto — disse Vital do Rêgo.

A oposição decidiu centrar fogo na investigação sobre a refinaria de Pernambuco:

— É inconcebível isso. Padeiro não erra nem conta. Se errasse, as padarias quebravam. A declaração aponta erro de oito vezes a estimativa original. Isso reforça a necessidade de abrir a caixa-preta da Petrobras — disse o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (DEM-PE).

Antonio Imbassahy (BA), líder do PSDB na Câmara, ressaltou que a presidente Dilma Rousseff sabia dos detalhes desta obra:

— Essa declaração chega a ser chocante.

Procurado pelo GLOBO, a Petrobras não comentou a entrevista. Costa também não deu entrevistas. (Colaboraram: Henrique Gomes Batista e Mônica Tavares)

Protesto - Pressão popular

• Manifestantes aproveitam a presença da presidente na cidade para criticar contra os gastos do governo para a realização do Mundial do futebol. Em clima de campanha, Dilma afaga o PMDB fluminense

- Correio Braziliense

A menos de duas semanas do início da Copa do Mundo, a presidente Dilma Rousseff segue percorrendo o país, mas por onde passa se depara com protestos. Ela inaugurou ontem, no Rio de Janeiro, a Transcarioca, uma via exclusiva para ônibus BRT que liga o Aeroporto Internacional do Galeão à Barra da Tijuca. Ela percorreu rapidamente o trajeto, enfeitado com bandeiras e adereços nas cores verde e amarela. Ao longo do caminho, Dilma foi blindada por uma segurança reforçada por militares, por isso não teve contato com os manifestantes que protestavam contra os gastos públicos para a realização do torneio da Fifa no Brasil. No trajeto, a presidente parou em Madureira, próximo ao morro da Serrinha, onde, dentro de um ônibus, fez discurso.

Em ritmo de campanha, Dilma repetiu o discurso em defesa dos investimentos do governo federal para a realização do evento internacional. Segundo ela, as obras de transporte e mobilidade urbana são um legado para os brasileiros e não para os turistas que visitarão o país. "Diziam que a Copa do Mundo não tinha legado nenhum. Eu, pessoalmente, acho que nenhum legado é da Copa do Mundo, todos os legados são do povo brasileiro. Por exemplo, nós não estamos fazendo aeroportos para a Copa do Mundo. Nós estamos fazendo aeroportos para todos os brasileiros. Por acaso, vai ser usado na Copa do Mundo", discursou.

Dilma fez questão de enaltecer a parceria dos governo federal com o Executivo do Rio de Janeiro e a prefeitura da capital fluminense. Ela elogiou o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), que será candidato ao governo fluminense e poderá ter como adversário o senador Lindbergh Farias (PT). "Na Rocinha, eu fui indicada pelo presidente Lula como mãe do PAC. E o presidente Lula, na mesma oportunidade, indicou o Pezão como pai do PAC no Rio de Janeiro. Eu quero dar uma salva de palmas também para o Pezão", disse a presidente, que, por onde passava, era recebida ao som de baterias de escolas de samba.

Cercada por uma plateia de convidados e trabalhadores da obra, Dilma apontou a importância do BRT, que, segundo ela, é uma variante do metrô. "Os ônibus parecem trens. São trens sob rodas. Percorrem uma via especial", frisou a presidente, ressaltando a rapidez do BRT, embora o transporte ainda não esteja 100% implantado.

Remuneração
Os trabalhadores que estavam na plateia receberam R$ 140 para ir ao evento, segundo o jornal Folha de S.Paulo. O valor é maior que o de um dia normal de trabalho de cada operário, por ter acrescido 50% de hora extra em função de a inauguração ter sido em um domingo.

Mais cedo, Dilma inaugurou o terminal 2 do aeroporto do Galeão, cuja obra permanece inacabada. Somente a área de embarque internacional está pronta. Depois de passar o dia no Rio, a presidente voltou para Brasília. Embalada pelo momento pré-eleitoral, Dilma passou todo o fim de semana longe do Palácio da Alvorada. No sábado, esteve em São Paulo, onde também enfrentou protestos e discursou em defesa da Copa do Mundo no Brasil.

No sábado à noite, músicos e o público do festival João Rock, em Ribeirão Preto — que reuniu mais de 30 mil pessoas — protestaram contra Dilma e a Fifa. Foram muitas vaias e xingamentos. Durante o show da banda O Rappa, o vocalista Falcão usou a palavra para criticar a Copa do Mundo. Ele lembrou que as eleições acontecerão logo depois do Mundial e que "a gente não pode se esquecer disso". "Eu jamais falaria isso, mas vocês veem que o desabafo é meu, é de vocês, é nosso, é de todo mundo", afirmou Falcão, antes de ressalvar que gosta de futebol, mas que é preciso ser honesto.

Dilma inaugura obras inacabadas no Rio

• Expansão no aeroporto do Galeão, corredor de ônibus BRT Transcarioca e conjunto habitacional estão incompletos

• Presidente afirma que Copa deixará legado de obras e pede hospitalidade para os turistas que chegarão

Diana Brito, Pedro Soares – Folha de S. Paulo

RIO - Numa série de eventos com clima de campanha e trilha de samba, além de protestos pontuais de professores e servidores federais, a presidente Dilma Rousseff passou o domingo (1º) no Rio de Janeiro para inaugurar três obras, nenhuma delas finalizada.

A primeira visita foi ao aeroporto Tom Jobim (Galeão), onde Dilma inaugurou a expansão do terminal 2, num trajeto cercado por tapumes.

Dilma disse que os aeroportos "eram" algo para a elite e criticou quem os compara a "grandes rodoviárias". Disse ainda que as obras nos terminais são para "o povo", que merece algo "de qualidade".

Na sequência, a presidente pegou o ônibus inaugural do BRT Transcarioca, corredor exclusivo que ligará o Galeão à Barra da Tijuca, na zona oeste, e que é a única obra de mobilidade do Rio para a Copa --apenas 22 das 47 estações previstas entrarão em operação nesta semana.

Ao inaugurar o BRT, Dilma disse que a Copa deixará "um legado" de obras e pediu hospitalidade para os turistas que vêm para os jogos.

"Na mala deles não cabe o BRT, o aeroporto do Galeão. Não cabe o estádio do Maracanã [todas obras financiadas pelo governo federal]. Agora, cabe o gesto de carinho, de afeto, de bem receber", disse a presidente na estação de Madureira (zona norte).

R$ 140, café e almoço
Da cerimônia participaram 150 trabalhadores da obra, com bandeiras do Brasil. Alguns disseram à Folha ter recebido das empreiteiras da obra o valor de uma diária de trabalho dominical (R$ 140) para participar do ato, além de café da manhã e almoço.

Nenhum operário quis se identificar. Procuradas, as responsáveis pela obra (Andrade Gutierrez, Carioca e OAS) não foram localizadas.

À tarde, Dilma inaugurou parte do conjunto habitacional da antiga fábrica da CCPL, em Manguinhos, Benfica (zona norte).

Enquanto a presidente entregava 564 unidades habitacionais --outras 164 ainda não estão concluídas--, cerca de cem servidores federais das áreas de saúde e educação, além de integrantes da Frente Internacional dos Sem-Teto, protestavam na entrada por melhorias no trabalho.

A comitiva da presidente, no entanto, só passou de carro em meio à manifestação na porta do conjunto.

Dilma inaugura importantes obras incompletas no Rio

• Presidente entrega BRT Transcarioca e reforma de aeroporto incompletos e sem data de conclusão

Luiz Ernesto Magalhães e Alexandre Rodrigues – O Globo

RIO — Às vésperas da Copa do Mundo, a presidente Dilma Rousseff inaugurou ontem no Rio duas das mais importantes obras prometidas para o Mundial: a ampliação do terminal 2 do Aeroporto Internacional Tom Jobim e o BRT Transcarioca (Barra-Galeão). Ambas, no entanto, ainda estão inacabadas, sem data para conclusão, embora constassem do programa de compromissos do governo brasileiro para o evento.

No aeroporto, Dilma Rousseff visitou o setor 2 de desembarque e descerrou uma placa alusiva à inauguração. Na verdade, o trecho que ela visitou já estava aberto ao público desde janeiro. Os tapumes, decorados com fotos do Rio, escondiam as escadas rolantes paradas que dão acesso ao piso inferior. Apenas as obras do embarque da zona restrita a autoridades e três esteiras de bagagem foram concluídas.

A reforma do Tom Jobim é parte de um plano de revitalização com custo de R$ 355 milhões, iniciado em 2008. Também não foram concluídas as obras do terminal 1, entregues apenas no setor A, por causa de uma sucessão de atrasos. Dados disponíveis no Portal da Transparência da Copa — site mantido pela União — confirmam que as datas não foram cumpridas. As obras nas pistas e nos pátios foram finalizadas em março deste ano, com cinco meses de atraso. O prazo original para as intervenções no terminal visitado pela presidente era abril de 2011. Já no terminal 1, a data prevista inicialmente era setembro de 2012.

Aeroporto como Rodoviária
Em Madureira, Dilma Rousseff afirmou que as obras de infraestrutura que estão sendo feitas não são para a Copa, mas para o Brasil:

— Diziam que a Copa não teria legado e inauguramos o terminal 2 do Galeão. Não estamos inaugurando aeroporto para a Copa, mas sim para todos os brasileiros. Antigamente, avião era transporte de elite. Era. Passamos de 33 milhões de passageiros/ano para 133 milhões de passageiros/ano, porque muita gente que não podia passou a poder viajar de avião. Acusam a gente de transformar aeroporto em uma grande rodoviária. Mas isso não tem mal nenhum Nós transformamos o aeroporto numa grande rodoviária, porque não tem mal nenhum em rodoviária. É um aeroporto de qualidade, porque o povo brasileiro merece o que há de melhor — disse Dilma.

A presidente também circulou por várias estações do corredor do BRT Transcarioca (Barra-Galeão) que ainda estão sem data para ser abertas porque o prazo original previsto para a conclusão dos projetos não foi cumprido. Ainda segundo o Portal da Transparência, o BRT deveria estar concluído em fevereiro de 2013. Das 47 estações planejadas, apenas 22 estarão em operação durante a Copa e, mesmo assim, em horários predeterminados. A implantação do sistema precisa ser gradual para o usuário se acostumar às mudanças, já que o Transcarioca prevê alterações de itinerários e cortes de linhas de ônibus que devem ser implantados em pelo menos três meses.

A presidente fez elogios ao corredor viário:

— O BRT é um presente para o Rio de Janeiro. Só as coisas grandes deste país deram samba. Não adianta dizer que há 49 anos atrás alguém pensou. O que importa é que alguém realizou.

Na maioria das estações, no entanto, os equipamentos de bilhetagem eletrônica e sinalização que são fornecidos pelo Rio Ônibus sequer foram instalados. Do Tom Jobim até Madureira, a presidente passou por 20 estações. Destas, apenas as duas que atendem ao aeroporto e a Vicente de Carvalho serão abertas ao público na próxima quarta-feira, num serviço semiexpresso até o Terminal Alvorada, na Barra, das 5h às 23h. Hoje, entram em operação, fora do horário do rush (das 10h às 15h), as estações entre Alvorada e Largo do Tanque (Jacarepaguá). A estação inaugurada com samba em Madureira, que fará conexão com a rede ferroviária, ainda não tem data para abrir.

E mesmo antes da entrada em operação já há previsão de mais obras. Na última sexta-feira, a prefeitura abriu licitação de R$ 3 milhões para construir uma nova passarela de pedestres que ligará duas estações da Taquara próximo a conjuntos habitacionais.. O pedido foi feito por moradores da região ao subprefeito da Barra, Alex Costa. A nova passarela deve ficar pronta no início de 2015.

Atrasos no cronograma
O município havia prometido entregar para a inauguração ao menos a infraestrutura do corredor viário prevista no projeto. Mas o relógio venceu a corrida contra o tempo em alguns trechos do BRT. No Terminal do Fundão, os operários conseguiram concluir apenas no sábado a implantação da infraestrutura da estação, mas os vidros não foram instalados. Ao longo de várias estações da Zona Norte, era possível ver entulho acumulado. Ontem, em Madureira, na Avenida Ministro Edgard Romero, defeitos na pista do BRT eram reparados a duas horas da chegada de Dilma.

A prefeitura argumenta que o objetivo foi atingido, pois o turista que desembarcar no Tom Jobim poderá chegar ao Maracanã ou à Zona Sul fazendo baldeação na estação do Metrô em Vicente de Carvalho. Ontem, o prefeito Eduardo Paes fazia referência a um atraso de três meses na conclusão do projeto. E lembrou que o conceito do BRT Transcarioca surgiu em 1965, num plano urbanístico desenvolvido na gestão do ex-governador Carlos Lacerda.

— O que são três meses para quem esperou 49 anos?— disse o prefeito.

Ainda em Madureira, a presidente Dilma Rouseff assinou convênio para um empréstimo de R$ 2,7 bilhões do BNDES à prefeitura do Rio. Os recursos serão usados para concluir projetos de mobilidade urbana dos Jogos Olímpicos de 2016, incluindo o lote zero do Transoeste (Alvorada—Jardim Oceânico), a interligação do BRT Transolímpico com o BRT Transbrasil; as obras de duplicação da Avendia Salvador Allende; de ampliação do Elevado do Joá; de construção da ciclovia da Avenida Niemeyer; de interligação do túnel da via expressa do Porto com o mergulhão da Praça Quinze, no Centro; e de urbanização do entorno do Engenhão. A prefeitura entrará com R$ 301 milhões.

Ao fim do evento, cerca de 50 manifestantes se concentraram em frente à Estação de Madureira. Eles protestaram contra os gastos da Copa. Junto ao grupo, estavam representantes do Sindicato Estadual dos Professores, que aproveitaram para reivindicar verbas para a educação.

Em Manguinhos, na Zona Norte, a presidente também inaugurou um conjunto habitacional construído no terreno da antiga fábrica da CCPL. As chaves que ela entregou aos moradores eram simbólicas, já que os 564 apartamentos, prontos desde março, só serão ocupados a partir do dia 9. Ainda faltam equipamentos de combate a incêndio e o certificado de habite-se, que a Secretaria estadual de Obras espera para esta semana. O conjunto é na verdade a primeira fase do projeto original de 25 blocos, com custo total de R$ 110 milhões.

Apoio a atos pacíficos contra Copa chega a 57%

• Pesquisa do Instituto Gerp mostra que, apesar de aprovar as manifestações, morador do estado condena protestos que interditam as ruas ou usam violência

Maria Luisa Barros – O DIA

Rio - Cariocas não gostam de sinal fechado e muito menos de ficar horas presos no trânsito. Pesquisa do Instituto Gerp, encomendada pelo DIA , e aplicada em 870 pessoas do estado, entre os dias 23 e 29 de maio, revela que 57% dos entrevistados são a favor das manifestações pacíficas contra a Copa do Mundo.

Só 26% desaprovam os protestos. Mas, mesmo vendo com bons olhos as reivindicações nas ruas, os moradores do estado tiram o corpo fora de protestos que passam dos limites e prejudicam o direito de ir e vir. Questionados sobre a interrupção do trânsito em dias de manifestações, 64% condenaram o fechamento de vias, ainda que feito pacificamente pelos defensores de boas causas.

A enquete também mostrou que a população do estado não aprova a violência, seja ela praticada pela polícia ou por grupos de ativistas políticos. Quando os atos vêm acompanhados de depredações ao patrimônio e vandalismo, o percentual de pessoas contrárias aos movimentos é ainda maior. Do total, 71% condenam a violência praticada pelos manifestantes.

Na avaliação da socióloga Sílvia Ramos, coordenadora do Centro de Estudo de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, a despeito de muita gente achar que os protestos perderam sua força, a pesquisa constata exatamente o inverso.“A sociedade é a favor das manifestações. Mas o uso da violência acabou por afastar a maioria das ruas. O que se percebe é que as pessoas defendem o direito de participar dos atos, mas desde que não atrapalhem a sua vida”, analisa a cientista social.

É o caso de Cíntia Silvestre Batalha, dona de uma barraca de lanches na Quinta da Boa Vista, que apoia os atos, mas não a violência. No ano passado, durante a Copa das Confedereções, ela desmaiou ao ser atingida por uma bomba de gás lacrimogêneo. “Não tenho nada contra a manifestação, mas fui parar no Hospital Souza Aguiar por causa disso. Perdi o resto do meu dia de trabalho”, lamenta.

Meses depois, outra manifestação fez com que a ambulante se atrasasse duas horas para o outro trabalho como operadora de telemarketing. E ela ainda não conseguiu chegar a tempo de buscar a filha na creche. “Tive que assinar um termo me comprometendo a não fazer mais isso. Só que não tive culpa. Não tenho nada contra os protestos, mas já fui muito prejudicada. E ainda estou preocupada porque estou proibida de trabalhar na minha barraca nos dias que tiver jogos da Copa do Mundo, no Maracanã. Esse dinheiro que eu não vou ganhar vai me fazer falta”, afirma a ambulante.

Gorjeta fraca
Perder dinheiro é um assunto que o jornaleiro Derisvaldo Alves Pereira conhece de perto. Desde o ano passado, quando as manifestações começaram a tomar conta das ruas, ele vem contabilizando prejuízos por ter que fechar mais cedo sempre que a Cinelândia, onde tem uma banca há nove anos, vira palco de manifestações. “Normalmente, fecho às 22h, mas, agora, se sei que vai ter manifestação, fecho às 18h, antes que comece o quebra-quebra. Estou com os vidros da minha banca quebrados até hoje. O povo tem todo o direito de fazer reinvidicações, mas não precisa destruir o patrimônio público ou particular", acredita Pereira.

Garçom de um dos bares mais famosos da cidade, o Amarelinho, Raimundo Ferreira Barros, do alto de seus 30 anos servindo os clientes do endereço, também viu a sua renda cair por conta das manifestações. “As pessoas sentam aqui, mas, se veem algum movimento nesse sentido, já pedem a conta e vão embora. Quando clientes gastam pouco, nossa gorjeta fica pequena. Estou ganhando uns 40% menos. Gosto de manifestação pacífica, mas como houve muita baderna, o pessoal tem medo e prefere ir para casa cedo”, diz Barros.

Consulta popular contraria promessa de Dilma feita durante campanha

• Oposição quer votar anulação do decreto esta semana

Eduardo Barreto e Cristiane Jungblut – O Globo

BRASÍLIA - O decreto assinado pela presidente Dilma Rousseff que cria mecanismos de participação social, publicado na segunda-feira e questionado pela oposição, não estava previsto nas diretrizes do governo, divulgadas quando Dilma ainda era candidata ao Planalto. O primeiro dos “13 compromissos programáticos de Dilma Rousseff”, que sugere o fortalecimento da democracia, não trata da expansão de conselhos consultivos por dentro da máquina estatal. Pelo contrário, só cita o “incentivo à participação popular” para a realização de uma reforma política, que ainda assim se daria em “amplo diálogo entre a sociedade e suas organizações por meio do Congresso Nacional”. E é justamente o Congresso que fica enfraquecido e sobreposto, segundo críticos do decreto, que também afirmam que os conselhos que já existem sofrem aparelhamento político.

Ex-presidente Conselho Nacional de Saúde (CNS), Francisco Batista Júnior participou de conselhos municipais e estaduais, além do CNS, que presidiu por quatro anos e onde foi membro da mesa diretora por sete anos. Ele nega que o decreto 8243/2014, que cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS), engesse o governo, mas cita como empecilhos o aparelhamento político e falhas de execução:

— Não cabe o discurso de engessamento de governo. Mas o fato de haver a política não significa necessariamente que as coisas devem acontecer de acordo como preconiza a política, o texto original. O SUS é política de Estado, tem uma legislação que é talvez a mais avançada do mundo. No entanto, o SUS é uma colcha de retalhos — afirmou Batista, que se diz desiludido e criticou o aparelhamento político do CNS desde a gestão de Alexandre Padilha à frente do Ministério da Saúde.

Mário Scheffer, professor da USP e ex-conselheiro do CNS por cinco anos, lembra que já há conselhos em quase todas as instâncias. Ele defende que o mais adequado seria valorizá-los, em vez de propor a criação de outros. Scheffer critica o aparelhamento político desses colegiados.

— Não faltam conselhos, eles existem em quase todas as instâncias. O Conselho Nacional de Saúde existe desde 1990, mas não é respeitado. Esses conselhos foram cooptados, encurralados pelo governo. Não cumprem o papel de fiscalizar e propor alternativas. São espaços onde o governo exerce muita influência, são subservientes à agenda do governo e formados por corporações e pessoas majoritariamente alinhadas a ele. Acho adequado criar novas formas, mas é preciso olhar para o que já existe, e o que vemos é o aparelhamento. Me parece ser somente uma questão de retórica. Não me parece ter sido isso que os movimentos sociais pediram — disse Scheffer.

Oposição quer votar anulação do decreto
Parlamentares do governo e da oposição se desentendem sobre o decreto de Dilma Rousseff. A deputada Maria do Rosário (PT-RS), ex-ministra dos Direitos Humanos, elogia a iniciativa. Ela nega que o cidadão que não é sindicalizado ou filiado a ONGs ficará alijado do processo de decisão, e fala que a PNPS destrava amarras burocráticas.

— A atuação do Estado brasileiro é toda permeada pela interação entre Estado e sociedade civil. Considero uma medida muito importante. Os conselhos populares já estão consolidados. Só o Brasil tem esse sistema nacional de participação. Muitos países nos visitam por isso — afirmou Rosário.

O líder do DEM na Câmara, deputado Mendonça Filho (PE), disse que vai insistir com o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (RN), para que inclua na pauta desta semana, a do esforço concentrado antes da Copa, o Projeto de Decreto Legislativo que revoga o decreto de Dilma, que cria uma superestrutura de consulta popular dentro do governo federal.

Para o presidente nacional do DEM, senador José Agripino Maia (RN), o decreto da presidente Dilma lembra as ações do ex-presidente venezuelano Hugo Chávez.

— É uma atitude demagógica, pré-eleitoral — disse Maia.

O líder do PT na Câmara, deputado Vicentinho (SP), defendeu o decreto de Dilma. Para ele, esse tipo de conselho popular fazem parte da democracia.

— Essa iniciativa do DEM de querer derrubar o decreto da presidente Dilma é contra os movimentos populares. O decreto fortalece o direito de todos participarem, o que é natural na democracia — disse Vicentinho, ex-presidente da CUT.

O líder do PSDB na Câmara, deputado Antonio Imbassahy (BA), criticou ontem o decreto e defendeu a revogação.

— É a atitude de um governo que está sem rumo. Esse tipo de medida está fora de sintonia com o que a sociedade deseja — disse Imbassahy.

Oposição quer reverter criação de conselhos

• Decreto editado pela presidente Dilma Rousseff na semana passada prevê consultas populares antes de se tornarem políticas públicas

Tânia Monteiro e Laís Alegretti - O Estado de S. Paulo

Os principais partidos da oposição se movimentam para tentar suspender o decreto editado pela presidente Dilma Rousseff que obriga os órgãos do governo a promover consultas populares, por meio de nove conselhos, sobre grandes temas, antes que propostas legais venham a ser adotadas e se transformem em políticas públicas.

O líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA) já determinou que sua assessoria verifique se há “vício de inconstitucionalidade” no decreto. Na avaliação dele, o Planalto “percebeu a possibilidade de derrota nas eleições de outubro e quer aparelhar ainda mais os órgãos para que os petistas continuem a ter influência, em caso de derrota, e dificultem as ações do novo governo”.

Na sexta-feira, 30, o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), apresentou projeto de decreto legislativo para revogar o decreto presidencial. Ele afirmou que vai pedir às demais lideranças partidárias apoio para a aprovação do regime de urgências para que o decreto seja derrubado “o mais rápido possível”. “A instância que o cidadão tem para ser ouvido é o Congresso e não um conselho aparelhado pelo atual governo e o PT. Isso é uma usurpação do poder do Legislativo pelo Executivo”, afirmou Mendonça Filho.

Já Bazileu Margarido, coordenador executivo da Rede Sustentabilidade, projeto incorporado ao PSB do presidenciável Eduardo Campos, criticou o momento escolhido para o governo editar o decreto. “É uma discussão importante, mas o governo teve três anos e meio para tomar essas medidas importantes”, apontou Margarido. “Agora isso gera algum desconforto e alguma desconfiança de que essa seja uma atitude mais eleitoreira do que realmente um aperfeiçoamento das instituições públicas e da democracia.”

Para o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP), a medida do governo é ilegal. “Um decreto não pode inovar, ele tem apenas que regulamentar o que uma lei determina, e não tem lei sobre isso”, argumentou.

Falta de apoio nos Estados preocupa PSB de Campos

• Partido só tem candidato a governador com boas chances em Pernambuco

• Em São Paulo e Minas, opções são candidatura frágil ou aliança com tucanos, que preferem Aécio para presidente

Ranier Bragon – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Terceiro colocado na corrida ao Palácio do Planalto, Eduardo Campos (PSB) enfrenta problemas para colocar de pé seus palanques nos principais Estados do país, reflexo do que integrantes de sua própria equipe classificam como dificuldades de um partido "nanico em estrutura".

A lamentação foi feita a portas fechadas numa reunião da coordenação da campanha de Campos com a bancada de deputados federais na quarta-feira (28), acompanhada em parte pela Folha.

Candidaturas robustas a governos estaduais são um trunfo importante para os candidatos a presidente, ao lado do tempo para fazer propaganda na televisão e da capacidade de arrecadação de dinheiro para a campanha.

Campos ainda patina em dois desses quesitos. O tempo reservado para sua candidatura na propaganda eleitoral no rádio e na televisão deverá ser o menor entre os três principais presidenciáveis --pouco mais de 2 minutos em cada bloco de 25 minutos.

Nos Estados, muitas campanhas apresentam fragilidade, há candidaturas indefinidas e em alguns casos Campos pode ser obrigado a pegar carona com candidatos a governador que estão comprometidos com o apoio a seus rivais na corrida presidencial.

Nos dez maiores Estados brasileiros, que reúnem 75% da população do país, o único em que o PSB tem um candidato com ares de favorito é Pernambuco, reduto de Campos, que governou o Estado de 2007 até abril deste ano.

Lá, o presidenciável patrocina a candidatura de seu ex-secretário da Fazenda, Paulo Câmara, numa tentativa de reeditar o sucesso obtido nas eleições municipais de 2012, quando levou à vitória, na disputa pela Prefeitura do Recife, outro ex-secretário de seu governo, Geraldo Júlio.

Em São Paulo e Minas Gerais, as opções de Campos são lançar um candidato próprio, e com baixíssimas chances de vitória, ou unir-se às candidaturas tucanas, que na corrida presidencial tendem a privilegiar o apoio ao senador Aécio Neves (PSDB-MG).

A divisão de palanques com Aécio deverá se repetir também nos Estados do Paraná, Pará e Maranhão.
No Rio de Janeiro, Campos deverá se escorar no palanque do deputado federal Miro Teixeira, do Pros, partido recém-criado que está fechado com a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT).

Na Bahia, a senadora Lídice da Mata (PSB) terá a tarefa de superar o até agora favorito Paulo Souto (DEM) e o candidato do governador Jaques Wagner (PT), Rui Costa.

"Não adianta inventar palanques. A realidade é que temos um candidato que quer unir o país e pode fazer composições, desde que com coerência", afirma o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), pré-candidato ao Senado.

Marina
Nomes fortes para o Senado são uma das maneiras de tentar driblar as fragilidades nos palanques estaduais. Além de Albuquerque, outras apostas são o ex-atacante Romário, no Rio, e a ex-corregedora nacional de Justiça Eliana Calmon, na Bahia.

Mas a principal expectativa é obter a transferência de votos da ex-senadora Marina Silva, que recebeu 19,6 milhões na eleição presidencial de 2010 e foi escalada para ser vice na chapa de Campos.

"Ninguém menospreza a importância das estruturas nos Estados, mas em uma eleição de mudança, temos que recorrer a formas não convencionais", afirma o coordenador da campanha de Campos, Carlos Siqueira.

Para ele, o PSB poderá contar com a internet e o apoio de movimentos sociais para enfrentar essas dificuldades.

Campos busca raízes para firmar perfil nordestino

• Pré-candidato do PSB visita cidade natal do avô e vai ao santuário de Padre Cícero para conquistar votos na região que mais apoia PT

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

Dona Almina, irmã do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, esperava em casa a visita de um parente. A poucas quadras dali, o sobrinho-neto e pré-candidato do PSB à Presidência, Eduardo Campos, inaugurava a nova sede da sigla em Crato, uma das principais cidades da região do Cariri. Além da volta às raízes, o passeio do presidenciável tem o objetivo estratégico de firmá-lo como o representante da Região Nordeste na eleição presidencial.

Durante o fim de semana que passou no Ceará, Campos visitou quatro cidades e dividiu o tempo entre compromissos políticos e familiares. Aos 89 anos, Dona Almina acompanhou animada a maioria deles, mas fez questão de que ele desse uma passadinha na casa da família, onde Arraes viveu na juventude. Embora tenha feito carreira política em Pernambuco, o avô de Campos nasceu em Araripe, próxima a Crato, para onde se mudou quando menino.

Foi nessas raízes familiares que Campos apostou para recuperar a força política que perdeu no Ceará após a saída dos irmãos Gomes do PSB no ano passado. Ao migrarem para o PROS para apoiar a candidatura da presidente Dilma Rousseff à reeleição, o atual governador cearense, Cid Gomes, e seu irmão Ciro atraíram deputados, prefeitos e vereadores que estavam no PSB.

O presidenciável também aproveitou a passagem pela região para fazer uma visita à estátua de Padre Cícero, programa considerado obrigatório na agenda de todo político em época de campanha. Em 2010, no entanto, a sua pré-candidata a vice, Marina Silva, que disputava a Presidência pelo PV, foi a Juazeiro do Norte, mas não ao santuário. Alegou que era evangélica e que não iria fazer “proselitismo religioso” para se eleger.

Recepção. Campos desembarcou no Ceará no sábado, 31, à tarde e fez questão de começar o périplo pela cidade natal do avô. Em Araripe, foi recepcionado no teatro que leva o nome de Arraes por parentes, políticos e populares.

Durante a cerimônia, uma parente distante foi empossada presidente do PSB municipal. Olga Maria Loyola admite que, mesmo na terra de Arraes, Campos ainda é bastante desconhecido, mas prometeu fazer campanha de porta em porta para mudar essa situação.

O comportamento dos eleitores da pequena Araripe, que tem pouco mais de 20 mil habitantes, pode ser visto como um exemplo do desafio que Campos terá no Nordeste. No primeiro turno das eleições de 2010, Dilma obteve quase 85% dos votos no município, contra 12% de José Serra (PSDB). Marina foi a opção de pouco mais de 3% dos araripenses.

Consciente da vantagem da candidata petista na região, Campos repetiu em diversas ocasiões que Dilma abandonou o Nordeste e prometeu que, se for eleito, vai ser o presidente que mais vai fazer pelos nordestinos.

“O Nordeste não teve dela (Dilma) a atenção que deu a ela. Mas a gente sabe muito bem que o povo que bota é o mesmo que tira”, afirmou Campos ontem durante almoço com lideranças do PSB.

As promessas do pré-candidato não ficaram somente na seara política. Acompanhado da mulher Renata e dos cinco filhos, Campos prometeu voltar a Crato em agosto, para a festa de 90 anos de Dona Almina. A tia-avó retribuiu a gentileza. Disse que, se o sobrinho-neto for eleito presidente da República, vai a Brasília assistir à cerimônia de posse. “Se eu ainda estiver viva, não é mesmo?”, brincou.

Estadão Corpora entrevista Aécio Neves (PSDB)

O Estado de S. Paulo Pré-candidato do PSDB à Presidência, o senador e ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves será entrevistado nesta segunda-feira, 2, na série “Cafés da Manhã Estadão Corpora”. A série reúne lideranças empresariais para discutir questões estruturais da economia brasileira com os candidatos das eleições presidenciais e as suas propostas para o [...]

Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

Pré-candidato do PSDB à Presidência, o senador e ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves será entrevistado nesta segunda-feira, 2, na série “Cafés da Manhã Estadão Corpora”. A série reúne lideranças empresariais para discutir questões estruturais da economia brasileira com os candidatos das eleições presidenciais e as suas propostas para o próximo governo.

Até o fim da tarde de sexta, 425 empresários haviam confirmado presença.

A série de debates é promovida pelo Estado em parceria com a Agência Corpora Reputação Corporativa. Na segunda passada, o convidado foi o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB).

Convidada, a presidente Dilma Rousseff, que tentará a reeleição, informou por meio de sua assessoria de imprensa que não pretende participar.

A Agência Corpora Reputação Corporativa foi criada há um ano por Luiz Lara, Dalton Pastore e José Victor Oliva, especialistas em comunicação, com o objetivo de trabalhar em favor da reputação de corporações ou setores, identificando cenários de atuação e expectativas da sociedade para agregar valores por meio de diferentes formas de expressão.

De olho nos votos dos inelegíveis

• Integrantes do TSE avaliam que a votação recebida por candidatos barrados pela Lei da Ficha Limpa poderá ser válida para cálculo do coeficiente eleitoral

Diego Abreu – Correio Braziliense

Nas eleições de 5 de outubro, os fichas sujas que desafiarem a Justiça Eleitoral e concorrerem amparados por recursos aparecerão no resultado final com a votação zerada. Os votos que receberem, no entanto, poderão ser contabilizados para o partido, na avaliação de integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Há ministros que defendem que, mesmo o candidato sendo considerado inelegível, o voto deve ir para a legenda, o que levaria a sigla a fazer mais deputados federais e distritais (ou estaduais), por força da regra do quociente eleitoral, graças a políticos com o status de inelegíveis.

O presidente do TSE, José Antonio Dias Toffoli, disse esperar que tal situação não aconteça durante as eleições. As mais recentes decisões apontaram no sentido de que os votos dados a candidatos que concorrem "sub judice" — quando a candidatura é negada, e o político concorre amparado por um recurso — não são contabilizados para o partido. A exceção ocorre quando o político conseguir reverter sua situação, junto à Justiça Eleitoral, depois das eleições.

No entanto, como a composição do TSE está 100% modificada em relação ao pleito de 2010, o próprio presidente da Corte admite que possa haver mudanças de entendimento, assim que o tribunal julgar o primeiro recurso relativo ao tema. Devido às constantes mudanças de interpretação da regra, Toffoli chegou a dizer, três dias depois de tomar posse no comando do tribunal, que "se no dia da eleição o político está sub judice o voto vai para a legenda". O ministro observou que o fato de a pessoa ser inelegível não deixa o protocolo da Justiça Eleitoral fechado para ela.

"O ideal é que a legenda não pudesse aproveitar esse voto, mas é sempre possível haver mudanças. Acho que cada vez mais a tendência é de o partido não poder ser beneficiado por alguém que seja inelegível, mas a questão poderá ser debatida a partir de casos concretos", declarou Toffoli ao Correio.

Disputa em 2012
Entre os integrantes do TSE, há divergência quanto ao aproveitamento de votos de fichas sujas pelas legendas. O ministro substituto do TSE Admar Gonzaga avalia que os votos recebidos por deputados que concorrem sem o registro deferido devem ir para o partido. "Na hora em que o candidato é votado, o eleitor vota primeiro no partido, pois o número dele é composto pelo número do partido seguido de outros dois ou três", destacou Gonzaga. Ele considera que possa haver mudanças no entendimento da Corte Eleitoral. "Direito não é uma ciência exata, está em constante aperfeiçoamento, às vezes há retrocessos e às vezes há avanços", frisou.

O ex-presidente do TSE Marco Aurélio Mello, que deixou de integrar o tribunal no mês passado, também considera que os votos, independentemente de o candidato estar ou não elegível, devem ir para o partido nas eleições proporcionais. "Sempre sustentei que quando o eleitor sufraga um número, os dois primeiros algarismos são da legenda, embora muitos eleitores votem no candidato e nem sabem para qual legenda votou. É o sistema proporcional. A inelegibilidade alcança o candidato, não o partido", destacou.

Duas decisões recentes do TSE relativas às eleições municipais, porém, vão no sentido do que interpreta o ministro Dias Toffoli. Uma delas aponta que "o cômputo dos votos atribuídos a candidatos cujos registros estejam sub judice no dia da eleição ao respectivo partido político fica condicionado ao deferimento desses registros". Outra ressalta que "os votos obtidos por candidato, cujo registro encontrava-se deferido na data do pleito eleitoral, não são anulados, mas contados a favor da legenda pela qual o parlamentar posteriormente cassado se candidatou".

Para o ministro Henrique Neves, o entendimento adotado nas eleições municipais prevalecerá, de modo a impedir que partidos se beneficiem de votos de candidatos fichas sujas, que, por vezes, são lançados porque têm grande poder de conquistar grande apoio nas urnas. Neves resumiu sua opinião em relação ao tema: "Se o candidato tem o registro indeferido, mas resolve participar das eleições, esse voto não conta para ninguém. Mas se ele concorreu com o registro deferido e teve uma inelegibilidade posterior, ele perde os votos, mas os votos vão para a legenda."

"Na hora em que o candidato é votado, o eleitor vota primeiro no partido, pois o número dele é composto pelo número do partido seguido de outros dois ou três"(Admar Gonzaga, ministro substituto do TSE)

As regras
Confira o que estabelece a Lei da Ficha Limpa e quem fica impedido de se candidatar:

» Condenados por órgão colegiado. A inelegibilidade é de oito anos contados a partir do término do cumprimento da pena, descontado o período entre a condenação por órgão colegiado e a sentença definitiva

» Aqueles que renunciaram ao mandato eletivo para escapar da cassação. A inelegibilidade é de oito anos contados da data em que terminaria o mandato

» Os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargo público rejeitadas. Oito anos de inelegibilidade

» Trabalhadores excluídos do exercício da profissão, por decisão do órgão profissional competente. Oito anos de inelegibilidade

» Os que forem demitidos do serviço público em decorrência de processo administrativo ou judicial. Inelegibilidade de oito anos após a decisão

» Pessoas físicas e dirigentes de pessoas jurídicas responsáveis por doações eleitorais consideradas ilegais por órgão colegiado da Justiça Eleitoral. Oito anos de inelegibilidade após a decisão

» Magistrados e membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente. Inelegibilidade de oito anos

Aécio Neves: Tragédia nacional

- Folha de S. Paulo

A grave crise de segurança em curso é um fantasma que assombra o povo brasileiro, atingindo especialmente os mais pobres. São cidadãos de baixa renda e moradores das periferias urbanas as maiores vítimas, embora o medo atinja todas as classes sociais.

O recorde histórico dos homicídios, revelado pelo último Mapa da Violência, mostra com toda a crueza a omissão e o descompromisso do atual governo com esta tragédia. São 56 mil vidas perdidas por assassinatos no Brasil por ano --cerca de 10% de todos os homicídios registrados no planeta.

A outra face dramática da violência aponta a ocorrência de cerca de 50 mil estupros no mesmo período, mas o número real pode ser ainda muito maior, em função da subnotificação.

E há ainda a tragédia diária das mortes no trânsito, impactada pelo aumento do número de veículos sem uma estrutura de mobilidade adequada.

A taxa por 100 mil habitantes em 2002 era de 19,1, e passamos para 23,7. Em números absolutos, o salto foi de 33.288 mortos em 2002 para 46.051.

Todo este quadro confirma o que venho afirmando reiteradamente: o Brasil não possui uma política nacional de segurança pública. Na prática, o governo federal limita-se a justificar a sua omissão com o discurso de que segurança pública é responsabilidade dos Estados, adensando a ideia de uma federação anêmica e pouco solidária.

No plano das atribuições federais, as fronteiras permanecem abertas ao tráfico. O problema das drogas segue em ritmo ascendente, sem falar do sucateamento da Polícia Federal, envolvida em uma crise sem precedentes.

A ausência de prioridade revela-se nos números: nos últimos três anos, apenas 35% do orçamento federal para a área de segurança foi executado.

Apesar do grave problema da superlotação carcerária, nesse mesmo período, ínfimos 11% dos recursos do Fundo Penitenciário foram liberados. Do total de gastos do setor, só 13% saem dos cofres da União.

Brasil afora, a realidade se repete, gerada por um regime concentrador e pela dependência de recursos em relação ao poder central: contingentes insuficientes das forças de segurança, baixa remuneração, pouca integração do trabalho policial, defasagem tecnológica e quase nenhum esforço para o compartilhamento de responsabilidades.

Transformar esta realidade vai nos exigir uma profunda mudança de modelo.

A União tem que assumir o papel coordenador de uma política de Estado nesta área, com o fim do contingenciamento dos recursos públicos e liderança para fazer as reformas necessárias, como a do Código de Processo Penal, que se arrasta por anos e serve à reincidência e a impunidade.

Solidariedade entre entes federados é a palavra-chave quando se fala em segurança pública.

Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat: Para jamais esquecer

“Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista” Dom Helder

- O Globo

“Prova de amor maior não há, do que dar a vida pelo irmão”, cantaram emocionadas centenas de pessoas que lotavam na noite do dia 27 de maio de 1969 a Matriz do Espinheiro, no Recife.

No altar, 40 padres celebravam missa liderados por dom Hélder Câmara, arcebispo de Recife e Olinda. Um pouco abaixo do altar, dentro de um modesto caixão, jazia o corpo do padre Antonio Henrique Pereira Neto, 28 anos.

Na véspera, depois de sair perto da meia noite de reuniões em casas de duas famílias no bairro de Parnamirim, padre Henrique, assessor de dom Hélder e responsável pela Pastoral da Juventude da arquidiocese, foi sequestrado por quatro ou cinco homens que o levaram numa Rural Willis para uma área deserta a 30 quilômetros do centro da cidade. Ali seria martirizado.

A perícia do corpo concluiu que Henrique, padre há três anos, fora amarrado com uma corda e arrastado. Uma faca ou coisa parecida feriu-lhe o rosto várias vezes. A violência sofrida por ele concentrou-se na cabeça.

Ela foi chutada. A corda enlaçada em seu pescoço acabou por asfixiá-lo. Por último, deram-lhe três tiros na cabeça - um deles na garganta.

Tamanha demonstração de ódio tinha um endereço certo, e o padre não passou apenas de um meio para alcançá-lo.

O alvo indireto do crime, um dos mais bárbaros da ditadura de 1964, foi dom Hélder, amigo pessoal do então Papa Paulo VI, apontado pelo regime como um perigoso comunista. Em Paris, no ano seguinte, dom Hélder denunciaria torturas a presos políticos no Brasil.

O Palácio dos Manguinhos, onde ele despachava, havia sido pichado com mensagens assinadas pelo Comando de Caça aos Comunistas.

Ocorrera o mesmo com a parte dos fundos da igreja das Fronteiras, onde dom Hélder morava. Assim como com o Juvenato Dom Vital, local de reuniões dele com seus pares nordestinos.

Um homem arrependido já confessara a dom Hélder que fora contratado para matá-lo.

“Querem que eu me proteja”, pregou o arcebispo na missa que antecedeu no dia seguinte a saída do cortejo que levaria a pé o corpo de Henrique para ser enterrado no cemitério da Várzea.

“Querem que eu não ande só à noite, e que não durma só. Mas quem disse que eu ando só? Andam e dormem comigo o Pai, o Filho e o Espírito Santo”. Entre oito mil e 10 mil pessoas seguiram o caixão.

De vez em quando, policiais irrompiam no meio delas para fazer prisões. Prenderam o ex-ministro da Agricultura do governo João Goulart, o deputado Oswaldo Lima Filho.

Prenderam Paulo Cavalcanti, um dos cabeças do Partido Comunista Brasileiro em Pernambuco. Prenderam estudantes que carregavam uma faixa onde se lia: “Os militares mataram padre Henrique”.

O cemitério estava cercado por policiais militares. Depois do enterro, temendo o pior, dom Hélder pediu à multidão que fosse embora sem se manifestar. E se pôs, sozinho, diante da tropa, a acenar para as pessoas com um lenço branco.

Foram longos minutos de silêncio e de medo até que todos se dispersaram. Censurada, a imprensa nada publicou sobre a morte e o enterro do corpo do padre.

Na semana passada, a Comissão da Verdade, seção de Pernambuco, concluiu que a morte de padre Henrique foi um crime político.

Participaram dele estudantes de direita e investigadores da polícia civil sob o comando de Bartolomeu Gibson, na época Chefe de Investigações da Secretaria de Segurança Pública de Pernambuco.

Dos criminosos, restam dois vivos. A Lei da Anistia impede que sejam punidos.

José Roberto de Toledo: Com frieza, mas na torcida

- O Estado de S. Paulo

Quase nenhuma bandeira nas janelas. Poucas ruas enfeitadas. Raras camisetas amarelas. O que os olhos não veem tampouco os pesquisadores sentem. Pois é uma verdade estatística: a maior parte dos brasileiros está fria em relação à Copa. Ao Ibope, 39% dos moradores do país do futebol responderam que se fosse possível medir em graus seu envolvimento com o Mundial, a temperatura estaria entre "fria", "muito fria' e "gelada".

Só 30% disseram que seu termômetro está "quente", "muito quente" ou "fervendo". O resto está "morno". Ou estava até outro dia. A pesquisa - inédita até agora - foi concluída em 19 de maio. O que explica essa frente fria futebolística?

Talvez esteja acontecendo o que os pesquisadores chamam de "espiral do silêncio". Virou politicamente incorreto torcer pela Copa, pelo Brasil. Aí poucos vestem a camisa, ninguém se manifesta, com medo do patrulhamento. Há eleitores que são assim, só revelam seu candidato ao anonimato da urna eletrônica. Será que a Copa virou uma espécie de Maluf?

Como diz a CEO do Ibope, Marcia Cavallari, talvez ao primeiro grito de gol do Brasil tudo mude. E a torcida reprimida exploda de uma vez só. Ou até antes, na forma de um golaço tecnológico, quando o mundo vislumbrar um paraplégico andar e dar o chute inicial da Copa no Itaquerão - graças a um exoesqueleto de 70 kg acoplado ao próprio cérebro, projetado e construído pelo cientista brasileiro Miguel Nicolelis.

Mas antes de esquentar, o Brasil esfriou. À medida que a Copa foi se aproximando, o envolvimento foi diminuindo em vez de aumentar. Em 2011, o Ibope perguntou a mesma coisa aos brasileiros. O termômetro estava bem mais aquecido do que agora: 37% se diziam entre o "quente" e o "fervendo", contra apenas 24% de frios e gelados. Estes eram a exceção.

Hoje são a regra. Em quase todos os segmentos sociais, a frieza prepondera. Está acima da média entre as mulheres (44%), entre quem tem mais de 35 anos (42%), entre quem fez faculdade (40%), no Sudeste (44%) e no Sul (43%).

Nenhuma característica demográfica é mais determinante, porém, para a temperatura do torcedor em relação à Copa do que sua intenção de voto. Quem está frio vota na oposição, quem está quente, no governo. Outra prova de que o Fla x Flu político-partidário divide o país do futebol em relação à Copa.

Dos que declaram voto em Dilma Rousseff (PT), 42% dizem que seu envolvimento com a Copa está quente, muito quente ou fervendo. Só 23% deles estão frios, muito frios ou gelados.

Já entre os eleitores de Aécio Neves (PSDB), a divisão é inversa: 27% a 42%. Entre os de Eduardo Campos (PSB), mais ainda: só 25% de quentes, contra 46% de frios. A frieza aumenta entre os eleitores dos nanicos (61%), entre quem declara voto branco/nulo (62%), e chega a incríveis 69% entre os poucos que pretendem votar no pastor Everaldo (PSC). É, a Copa virou uma coisa dos diabos. Mas não faz muito tempo.

Apenas três meses atrás, a proporção de sentimentos negativos e positivos em relação ao Mundial de futebol estava praticamente empatada na população. Em fevereiro, 53% se referiam à Copa como "desperdício", "preocupação", "decepção", "vergonha", "medo" e "ansiedade". E 47% usavam palavras como "alegria", "orgulho", "esperança", "otimismo" e "brasilidade".

Hoje, os sentimentos negativos são maioria: 60%. Mas é cedo para dizer como a torcida vai se sentir após a bola rolar.

Será que 20 black blocs serão capazes de estragar a festa de milhões? Afinal, 51% apoiam a Copa no Brasil. E, apesar da frieza, há mais brasileiros prevendo o sucesso (36%) do que o fracasso (31%) da competição. A grande maioria (71%) torce para que tudo corra bem. Se der zebra, a culpa é dos outros: 22% acham que as pessoas estão torcendo para que dê tudo errado, mas só metade deles admite que está mesmo. Vai que dá certo, né...

Valdo Cruz: Filha pródiga

- Folha de S. Paulo

Eleição presidencial sem candidato paulista de peso e com dois fortes oponentes mineiros --a petista Dilma e o tucano Aécio-- é uma novidade. Faz de Minas, segundo colégio eleitoral do país, palco estratégico da guerra nacional.

Andando por Belo Horizonte nos últimos dias, fica claro que a petista Dilma sofre forte rejeição em sua terra, muito acima do imaginado --dado captado por pesquisas e checado no contato direto com os mineiros.

Surtiu efeito a estratégia tucana de colar na presidente a imagem de uma mineira que abandonou sua terrinha. E só agora, na véspera da eleição, volta para casa para ser perdoada pelos seus conterrâneos.

Em BH, na sexta-feira (30), Dilma desfiou uma série de ações que destinou a Minas para tentar mostrar que não é uma mineira ingrata. Enquanto isso, cartazes eram colados nas ruas tachando-a de mentirosa, de prometer obras e não cumprir.

Como em tudo na política, os dois lados têm sua parcela de razão e seu naco de pinóquio na história. Só que Dilma levou a pior. A seu favor, terá um candidato forte na disputa pelo governo mineiro. O petista Fernando Pimentel está na frente das pesquisas e vai trabalhar para reduzir a rejeição ao nome da amiga.

Mas pode ter de conviver com a repetição, talvez em dose menor, de um fenômeno presente em eleições anteriores. Nas ruas, há quem diga que pode votar em Aécio para presidente e Pimentel para governador.

Em Minas, por sinal, é engraçado assistir a comerciais do candidato tucano Pimenta da Veiga ao governo. É mais um pedido de voto para presidente do que para governador. Tática montada sob encomenda para turbinar Aécio em seu Estado.

Enfim, como disse Lula em BH, ao lado de Dilma e Pimentel, a presidente terá de ser, cada vez mais, paz e amor para apagar a imagem de raivosa que grudaram nela. Em Minas, terá de se esforçar ainda mais para provar que seu sangue é mais mineiro do que gaúcho.

Ferreira Gullar: A Copa custou caro mesmo?

• O governo do PT deve estar perplexo diante do que pode ocorrer e, quem sabe, lamentando sediar o torneio

- Folha de S. Paulo, caderno Ilustrada

Não há nenhum exagero em afirmar que o que pode acontecer, no Brasil, durante a próxima Copa do Mundo, é imprevisível. De fato, tudo pode acontecer, desde greves de transportes até tumultos na proximidade dos estádios, dificultando o acesso do público ou mesmo provocando a desistência daqueles que preferirem não pôr em risco sua integridade física.

Espero que nada disso aconteça, que o propósito dos vândalos não se realize, e o povo possa assistir aos jogos com relativa tranquilidade. É, sinceramente, o que desejo, mas, se é o que vai acontecer, não sei nem ninguém sabe.

O governo do PT deve estar perplexo diante do que poderá ocorrer e, quem sabe, lamentando a jogada de Lula de trazer a Copa para o Brasil a qualquer preço. E não apenas isso: alcançado esse objetivo, inventou de fazê-la em 12 capitais, em vez das oito previstas pela Fifa. Claro, sua megalomania e seu projeto de poder não deixariam por menos.

O resultado foi o que se está vendo: estádios caríssimos, em cidades onde o público de futebol é escasso e que, passada a Copa, estarão sem a necessária utilização. O estádio de Brasília é um exemplo disso: custou mais de R$ 1 bilhão e dificilmente terá público para encher a casa após a Copa.

Isso sem falar no fato de que alguns desses estádios não estarão prontos e acabados, como era de se esperar, já que nenhum outro país dispôs de tanto tempo para se preparar para a Copa.

Resultado da falta de seriedade com que são assumidas as tarefas importantes no Brasil de hoje, cujos cargos técnicos são ocupados por companheiros de partido sem competência para efetivamente exercê-los. Além disso, há ainda a corrupção, em função da qual as obras nunca terminam no prazo para que o seu custo possa ser duplicado, triplicado, quadruplicado.

Uma vergonha, no final das contas. Por isso mesmo têm razão os que saem às ruas para protestar contra a dinheirama despendida com as reformas e a construção de novos estádios para a Copa do Mundo. Afirmam que, em vez de gastar bilhões de reais nessas obras, o governo deveria gastá-los com a educação, a saúde e a infraestrutura.

Acuado, lançou mão de um argumento aparentemente irrefutável. Mandou um alto funcionário seu declarar que, comparado com os recursos que o governo destina à educação, os gastos com a Copa do Mundo são insignificantes. Segundo ele, enquanto as despesas com o evento esportivo chegaram a R$ 25,8 bilhões, para a educação foram destinados mais de 280 bilhões. Não há, portanto, do que reclamar.

Sim, aparentemente, não há. Sucede, porém, que não é essa a questão, ninguém disse que o governo gastou mais dinheiro com a Copa do que com a educação. O que se diz é que, num país onde a qualidade do ensino é lamentável, não tem cabimento gastar bilhões para construir estádios de futebol.

Se é mesmo verdade que o governo federal destina aquela quantia à educação e, ainda assim, o ensino público é de péssima qualidade, das duas uma: ou essa quantia de reais não é ainda suficiente para atender as necessidades do ensino público, ou parte dela foi desviada da finalidade educativa a que se destinava.

O que é inegável -porque está todos os dias na imprensa e na televisão- é a precariedade da rede escolar, com escolas ameaçando desabar e salas de aula infiltradas pela chuva. Isso sem falar nos casos em que nem escola existe, quando as aulas são dadas em choupanas ou telheiros por professoras que ganham um salário miserável, ou não ganham nada.

É certo que nem tudo isso é responsabilidade do Ministério da Educação, mas tampouco pode ignorá-lo. Já os professores ganham tão mal que são obrigados a ensinar em vários colégios, quando não mudam de profissão para poder sustentar a família.

De qualquer modo, o que se sabe é que os professores ganham mal e que os alunos concluem o ensino fundamental mal sabendo ler e escrever. Essa é uma das razões por que a presidente Dilma Rousseff tem sido vaiada quando aparece em público em diferentes regiões do país. Por isso mesmo, duvido que ela compareça ao jogo inaugural da Copa, quando o Brasil enfrentará a Croácia.

Marco Aurélio Nogueira: Estátua, pra que te quero?

• Bustos servem para que se lembre que as pessoas importam. Mas não mais que isso

- O Estado de S. Paulo, caderno Aliás

Se preciso fosse algum fato novo para destacar o prestígio e a fama de que goza Lula no mundo, o escultor chinês Yuan Xikun resolveu a questão. É dele a estátua em bronze do ex-presidente que integra exposição em exibição no National Mall, ao lado da Casa Branca, em Washington. A versão original da peça está no Jardim das Esculturas da Amizade Internacional em Beijing. Exposta nos EUA, tornou-se parte de uma política dedicada a facilitar o diálogo entre a China e o continente americano.

A homenagem veio cercada de pompa e circunstância: as pessoas retratadas foram escolhidas entre aquelas que deram contribuições extraordinárias para a sociedade. Ao lado de Lula estão, entre outros, Abraham Lincoln (Estados Unidos), Bolívar (Venezuela), Tupac Amarú (Peru), Gabriel García Márquez (Colômbia), Jose Martí (Cuba) e San Martín? (Argentina). Lula é o único vivo e o primeiro presidente do Brasil a ter uma estátua na capital dos Estados Unidos, o que amplificou ainda mais o fato.

Somado às seguidas homenagens e às três dezenas de títulos honoris causa recebidos por Lula (o mais recente dele, mês passado, na Universidade de Salamanca, Espanha), o fato foi interpretado, por seus incontáveis admiradores, como prova irrefutável de que o complexo de vira-latas é mesmo coisa de oposicionistas impatrióticos.

Nem tanto ao mar nem tanto à terra. É preciso contextualizar o fato. O clima eleitoral e as oscilações esperadas de Dilma têm feito aumentar a torcida para que Lula entre na disputa presidencial. Se uma pena cair no chão, haverá estrondo: tudo serve para que os tambores anunciem a volta do líder.
Ter um busto em Washington e diplomas universitários pelo mundo é um reconhecimento a Lula e a seu papel político. Tem a ver com isso, não com qualquer homenagem à grandeza da Pátria brasileira.

Tem a ver também com relações internacionais e comércio exterior, num ambiente em que China e Brasil são parceiros estratégicos. Nesse patamar, a iniciativa de Xikun está orientada pelo realismo que preside as relações entre os Estados, não por um particular empenho artístico. No mínimo por isso, deveria ser assimilada como menos ardor e sem instrumentalização política.

A trajetória de Lula está inscrita na história nacional, não deveríamos ter de nos lembrar disso a toda hora. Ele enfrentou e venceu preconceitos de parte ponderável das elites brasileiras, mostrou que lideranças vindas “de baixo” também podem governar. Deu a volta por cima e passou a ser respeitado e até mesmo seguido pelas mesmas elites que o hostilizaram antes. Foi eleito e reeleito democraticamente e seus governos representaram uma importante inflexão no processo político.

Não se trata, porém, de um herói, no sentido em que Max Weber, por exemplo, usou a expressão: alguém que conquista o direito de mexer nas engrenagens do destino. Lula tem sido um político inteligente, com grande capacidade de persuasão, astúcia e disposição para conversar, fato que o converteu em figura chave das principais articulações que impulsionaram o capitalismo brasileiro na última década e meia.

Mas não é um “Libertador”, por mais que se queira pintá-lo assim. Nunca vestiu o figurino de um chefe bolivariano à testa de uma democracia popular ou de uma obra de “salvação nacional”. Não representa um movimento ou partido de esquerda, ideia que nunca frequentou seu vocabulário ou sua cultura política. Não é sequer um “mito”, como dizia o revolucionário Sorel na sua busca incansável do fator que poderia imprimir um componente mágico e magnético à história.

Nesse mundo louco em que vivemos, repleto de memes, ícones e ídolos que se revezam no imaginário popular, simbolicamente congestionado mas pobre de utopias e significados densos, um busto pode ajudar a que se faça um verão. Se a grande massa brasileira pudesse vê-lo, certamente sentiria orgulho, ainda que talvez torcesse o nariz para a feiura da peça. Bustos, afinal, servem para que se lembre que as pessoas importam. Mostram que arte e política continuam tão abraçadas como sempre estiveram, prestando serviços para o poder e para as relações entre os povos. Mas não fazem muito mais que isso.

Bustos, estátuas e memoriais são coisas que nós, brasileiros, não cultivamos nem cultuamos. Passamos por eles, olhamos e seguimos em frente, tratando-os como detalhes da paisagem. Não somos como os norte-coreanos, que chegam a celebrar casamentos pungentes no sopé da gigantesca estátua de Kim Il-sung (que, morto há 20 anos, ainda é oficialmente o Presidente da Coreia do Norte), diante da qual se deve passar em posição de respeito profundo e sem dar as costas.

No Brasil, os poucos que merecem alguma atenção popular - como Joaquim Nabuco, no Recife - associam-se a personagens que tiveram inserção ativa em episódios históricos emblemáticos. Nem Getúlio Vargas, nosso mais importante estadista, mereceu algo semelhante. O herói de nossa gente é Macunaíma, de quem Mario de Andrade disse não ter nenhum caráter... Gostamos mais de ruas, praças e avenidas para prestar homenagens. Ou nem.

*Marco Aurélio Nogueira é professor titular de Teoria Política e Coordenador do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp

Renato Janine Ribeiro: O presidencialismo de coalizão

• Melhor resolver problemas atuais do que criar novos

-Valor Econômico

Tornou-se praxe, no Brasil, acusar o presidencialismo de coalizão de todos os males da vida política e até social. Ele é responsabilizado pelas negociações que dão sobrevida a políticos fisiológicos, em troca de seu apoio no Congresso. O último a criticar esse modelo político foi Eduardo Campos, no "Roda Viva" da semana passada. Só que mudá-lo pode trazer novos problemas, em vez de vantagens.

O que é presidencialismo de coalizão? É a união de um presidente eleito com a maioria absoluta dos votos válidos - no primeiro ou segundo turno, e que por isso mesmo é fortemente representativo - e de um Congresso escolhido junto com o primeiro turno presidencial, no qual nenhum partido tem a maioria - no Brasil nem mais de 20% - dos assentos na Câmara. Negociar é inevitável. O partido ou coligação presidencial nem sempre obtém a maioria parlamentar. Assim, se um candidato com pretensões a se eleger faz, em sua campanha, alianças já duvidosas em busca de tempo no horário eleitoral, uma vez eleito fará alianças ainda mais complacentes, para ter a base legal e orçamentária de seu governo.

Mas como mudar essa situação? O único meio seria assegurar que o partido ou coligação do presidente eleito atinja maioria absoluta nas duas Casas do Congresso sozinho, sem precisar de negociações posteriores a sua eleição. Isso é viável? Se sim, a que preço?

Primeira dificuldade: o Senado se renova parcialmente - um terço este ano, dois terços daqui a quatro. Mesmo que o presidente se eleja com uma avalanche de sufrágios, não basta para mudar a maioria no Senado. E essa Casa existe, justamente, para isso: para evitar que maiorias, digamos, "circunstanciais" façam barba, cabelo e bigode. É uma Casa conservadora, que deveria retardar a aprovação de medidas muito radicais - o que, aliás, nem sempre faz, tanto que, em 1997, votou a reeleição sem dificuldades. (Lembro esse episódio porque foi uma de nossas maiores mudanças institucionais da era republicana, rompendo uma tradição que parecia cláusula pétrea no presidencialismo latino-americano - por sinal, o único presidencialismo consistente fora dos Estados Unidos).

Segunda e mais imediata: para ter maioria em qualquer das Casas, será preciso reduzir brutalmente nosso sistema partidário. O pluripartidarismo, outra tradição brasileira importante, teria que ceder a vez ao bipartidarismo. A ditadura militar tentou isso, de 1965 em diante, até com recursos baixos como as cassações e as sublegendas, mas sem êxito. Finalmente, em 1982, cedeu à realidade. Se a vontade brasileira de não se encarcerar num modelo de apenas duas opções resistiu à censura, à tortura, à ditadura, será ela vencida por uma lei eleitoral? Essa lei eleitoral passará no Congresso, expressará a vontade popular? Duvido.

É certo que a arte da governabilidade passa, mais vezes sim do que não, pelo recurso de converter uma minoria de votos na sociedade em maioria absoluta no Parlamento - com sorte, converter uma maioria relativa (mas não absoluta) em metade mais um. Na França, isso se obtém, desde a redução do mandato presidencial aos mesmos cinco anos do parlamentar, por um truque curioso: o presidente da República se elege, e em seguida dissolve a Câmara que, eleita um mês depois dele, lhe dá uma maioria quase esmagadora. Isso liquida a oposição. Queremos isso? É quase o mesmo que governar sem Parlamento.

Na Itália, é pior. Desde 2005, uma lei conhecida como Porcellum (literalmente, "porcaria") dá 54% das cadeiras na Câmara ao partido ou coligação mais votado. O codinome dado pelo cientista político Giovanni Sartori à lei, e que pegou junto ao povo, já diz tudo. A invenção é da direita. Mas em 2013, com 32% dos votos, a centro-esquerda levou 54% da Câmara, enquanto a direita de Berlusconi, com um por cento a menos, obteve 20% das cadeiras.

Mesmo a eventual adoção do voto distrital entre nós - outro sistema do qual não temos experiência no Brasil em regime democrático, tendo vigido apenas no Império e na República Velha - não criará uma maioria absoluta, se continuarmos tendo mais que dois polos políticos. Ou seja, para acabar com o presidencialismo de coalizão, precisaríamos reduzir à margem de erro tudo o que for terceira via, terceiro partido, onde só ficarão os que não receiam ser minoria, os que abrem mão do projeto de governar o país porque preferem usar a tribuna para pregar uma causa - por sinal, muitas vezes digna: verde ou socialista.

Veja-se o problema. Os dois partidos que há 20 anos disputam a hegemonia no país, e que talvez continuem essa disputa, nasceram em ruptura com o quadro político vigente. O PT era "diferente de tudo o que estava aí". Conseguiria crescer num sistema bipartidário? O PSDB era uma dissidência do PMDB. Teria lugar num sistema tal? Improvável. Renovações seriam difíceis. Por isso, o Rede ou o PSB: sem chance.

Penso que a soma de um Poder Executivo disputado em termos mais ou menos bipartidários, mas flexíveis (no qual podem despontar Marina ou Eduardo), e de um Legislativo pluripartidário expressa melhor a complexidade de nossa vida social e política.

Agora, se o problema é a corrupção, podemos enfrentá-la com outras armas, sem destruir este delicado arcabouço político: abolir o financiamento de campanhas por empresas (que, ao contrário de pessoas físicas, não são eleitores nem podem ser presas por crime eleitoral), aumentar a fiscalização, agilizar os julgamentos na Justiça Eleitoral, reduzir os candidatos que cada partido pode lançar ao Legislativo, entre outras medidas. Melhor identificar e resolver os problemas que existem, do que criar novos.

Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo.