- Zero Hora (RS)
Em 1966, a eleição do governador, que era popular e direta, passara a ser pela maioria absoluta da Assembleia. Um cidadão, aliás de bom nome, que já fora candidato e sofrera derrota aplastante e agora era ministro do governo que cassava mandatos, pretendeu renovar sua pretensão, mas a maioria absoluta da Assembleia que elegia não se mostrou favorável a ela e, mediante decisão madura, buscou personalidade que representasse algo realmente novo e renovador, fixando-se no professor Ruy Cirne Lima, que fora secretário da Fazenda, havendo-se com geral aprovação.
A maioria absoluta da Assembleia tomou a iniciativa espontânea de oferecer-lhe a candidatura, independente de qualquer condição; um pacto de honra baseado na honra. Um fato quase inimaginável, por sua limpidez e nobreza. Contudo, alguns velhos caciques apelaram ao governo federal para que transformasse a maioria em minoria e vice-versa, a despeito da infâmia desse expediente.
Em consequência, oito deputados foram cassados para que o ministro fosse eleito, e dois Atos específicos foram expedidos, à hora derradeira, impedindo sua substituição pelos suplentes e anulando antecipadamente qualquer voto dissidente. Com tudo isso, o beneficiado veio a ser "eleito" com 23 votos por uma Assembleia que tivera 55 membros... com dois brancos, 22 ausentes e oito cassados.
Como era natural, foi profunda a reação à truculenta medida. Em sinal de protesto, 22 deputados recusaram-se a comparecer à eleição previamente maculada. A partir daquele momento, ninguém poderia ter esperança, por tênue que fosse, de que alguma coisa sadia pudesse suceder. A ignomínia excedera todos os limites, especialmente porque atingira um nome da maior respeitabilidade, de uma maneira gratuita, e sem que lhe fosse imputada qualquer pecha.
Semana passada, no Memorial do Legislativo do Rio Grande do Sul, esse fato, que começou benfazejo e terminou de maneira dolorosamente lúgubre, foi lembrado por numerosa plateia, com o lançamento do livro 1966 A conciliação impossível. A candidatura de Cirne Lima ao governo do Rio Grande do Sul, sob a responsabilidade de Elmar Bones. Além de documentos, o texto é enriquecido de uma reconstituição do acontecimento, de autoria do provecto jornalista Carlos Fehlberg, testemunha dos fatos, na qualidade de respeitado e isento responsável pela seção de política do Jornal do Dia e de Zero Hora.
*Jurista, ministro aposentado do STF
Nenhum comentário:
Postar um comentário