- O Estado de S. Paulo
O peixe morre pela boca — diz antigo ditado popular. Todas as culturas e todas as línguas têm advertências assim contra linguarudos. Só em português, há mais de trinta: “falar é prata, calar é ouro”; “em boca fechada não entra mosca…”
Na semana passada, o agora ex-ministro da Educação Cid Gomes provou dessa lógica por ter declarado na quarta-feira que “no Congresso, há 300 ou 400 achacadores”.
Nem sempre a lógica prevalece. Em 1993, o então candidato à Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva disse quase a mesma coisa. Disse que “no Congresso há 300 picaretas”. E, no entanto, a fala de Lula continua lembrada, sem contestação e sem consequência, nem para ele nem para os picaretas.
Quinta-feira, nas raras vezes em que quebrou o silêncio na CPI que investiga a corrupção, o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque citou passagem do livro do Eclesiastes: “Existe uma hora de falar e uma hora de calar”. Mas ele próprio não vem conseguindo evitar os efeitos da abertura de outras bocas, as daqueles que optaram pelos benefícios da denúncia premiada.
Em 1994, o então ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Rubens Ricupero, foi surpreendido ao confessar inadvertidamente, com os microfones do sinal da antena parabólica ligados, que “o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”. Teve de pagar o sincericídio com a demissão, consequência então inevitável, mas, decididamente, não merecida.
Em 2005, a então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, repeliu o pacote de ajuste do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, com uma frase que saiu em todos os jornais: “Esse ajuste é rudimentar”. Quem pagou pelos pecados foi Palocci, e não Dilma.
Há 22 dias, o atual ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou diante de todos os microfones que a política de desonerações colocada em marcha no governo anterior da presidente Dilma, pelo então ministro Guido Mantega, “aplicou um negócio que era muito grosseiro, uma brincadeira que nos custa R$ 25 bilhões por ano”. Embora a diferença semântica entre os adjetivos “rudimentar” e “grosseiro” seja desprezível, Levy foi repreendido pela presidente. Ela afirmou publicamente que o ministro Joaquim Levy fora “infeliz”.
Mas eis que nada como um dia após o outro. Na segunda-feira, a própria presidente Dilma pareceu dar razão ao ministro Levy quando reconheceu que o governo pode ter “errado na dose” na política econômica.
E nessa última quinta-feira, foi a vez do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, dar razão ao ministro Levy: “Desoneramos demais os impostos, além do que podíamos”. Nem a presidente Dilma nem ninguém rebateu que Mercadante foi infeliz, como Levy fora duas semanas antes.
Declarações de autoridades às vezes têm força política, outras, não têm. E por quê? Comunicação é isso. Prevalece não o que se diz, mas o que o outro entende. Além do que, “a política é como nuvem”, dizia em 1968 o então chanceler Magalhães Pinto; “você olha e está de um jeito; olha de novo, e já está de outro”.
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