sábado, 21 de março de 2015

Limites do governo nas medidas anticorrupção - Editorial / O Globo

• O Planalto se preocupa em salvar empresas envolvidas no petrolão e ainda sofre o constrangimento do fato de o partido da presidente ser o grande protagonista no escândalo

Ainda sob o impacto das manifestações durante o dia de domingo e do som de panelas à noite em algumas capitais enquanto ministros tentavam, na TV, responder aos protestos, o governo da presidente Dilma apresentou na quarta-feira um pacote anticorrupção. Nele, ingredientes requentados e alguma coisa nova, mas atrasada no calendário do combate aos “malfeitos”. Entende-se a sofreguidão do Planalto em dar resposta às ruas. Mas anunciar medidas apenas pelo impacto publicitário delas não leva a muito longe.

O histórico dos governos do PT no ramo da melhoria do arcabouço legal da repressão à corrupção não é brilhante, e mostra que eles costumam mais reagir a fatos do que se antecipar a eles. E mesmo assim, anunciado o pacote, propostas ficam pelo caminho, até vir o próximo escândalo. Em 2005, depois de denunciado o mensalão, o presidente Lula e sua ministra-chefe da Casa Silva, Dilma Rousseff, foram juntos à apresentação de um desses pacotes. Pois no anúncio de quarta-feira foi incluído um item de 2005, o da tipificação do crime de enriquecimento ilícito. Ficara pelo caminho, e agora foi pedido regime de urgência para sua tramitação no Congresso. Algo emblemático.

Para aumentar o peso do conjunto de propostas, incluiu-se nele a regulamentação da Lei Anticorrupção, de 2013, já feita por estados e municípios. A União deixou o assunto para depois.

É da natureza dos pacotes abrigar até mesmo boas iniciativas. Caso da criminalização do caixa dois na política e da exigência de ficha limpa para todos os servidores públicos.

O governo transita com cuidado nesse terreno. Além do fato de o partido da presidente ser o grande protagonista nos escândalos, ela se preocupa com que as punições no petrolão não inviabilizem as empreiteiras cúmplices do esquema que assaltou a Petrobras. É uma cirurgia difícil, pois há o risco de beneficiar acionistas corruptores em nome da sobrevivência da pessoa jurídica. A filosofia do Proer (saneamento de bancos) é a indicada, embora o mercado financeiro seja diferente: a instituição é mantida, mas o acionista responde pelo prejuízo. Melhor alternativa seriam soluções de mercado: compra de empresas condenadas por outras, mesmo estrangeiras. E por que não?

A arma mais eficaz contra a corrupção tem sido a ação da Justiça, MP e PF. Não atrapalhá-los já é grande ajuda. Os dirigentes petistas até costumam se vangloriar da ação da PF, mesmo que a instituição, típica de Estado, tenha razoável margem de autonomia.

Não há grande área de manobra para o Planalto. Tanto que a iniciativa de órgãos do Executivo na assinatura de delações com empresas causa preocupação no MP, que teme que elas se satisfaçam com acertos na área administrativa e não colaborem nos processos penais do petrolão. É ruim para a imagem do Planalto tentar proteger companhias com longa experiência no convívio com poderosos.

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