domingo, 24 de agosto de 2025

Momento com EUA requer prudência, por Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Donald Trump quer projetar poder militar com justificativa aceitável para os eleitores

O cancelamento de exercícios militares conjuntos entre Brasil e EUA e a mobilização de uma força de resposta rápida americana no Caribe introduzem uma nova dimensão na crise entre os dois países.

O Comando Militar do Sul desmarcou há um mês um exercício entre o Comando Espacial e a Força Aérea Brasileira. Na semana passada, o Ministério da Defesa cancelou a tradicional Operação Formosa, em Goiás, e deve fazer o mesmo com a Core, na caatinga.

A justificativa é a falta de verbas, mas o cálculo político foi retirar os convites antes de receber um “não” dos americanos. As relações entre os militares dos dois países continuam boas, mas o ambiente político aponta para um afastamento.

O deslocamento de três navios para perto da costa venezuelana, acompanhados de submarino de propulsão nuclear e aviões de patrulha marítima P8A Poseidon, tende a aprofundar o distanciamento na esfera militar.

Os três destróieres podem ser equipados com o sistema de combate Aegis, capaz de interceptar aeronaves e projéteis balísticos, e com mísseis de cruzeiro Tomahawk. Os P-8 podem se engajar em ataques a submarinos. A Venezuela tem dois submarinos de fabricação alemã, que embora datem dos anos 70 são considerados o principal ativo de sua marinha.

O grupo de assalto anfíbio liderado pelo USS Iwo Jima, com mais dois navios e a 22.ª Unidade Expedicionária de Fuzileiros Navais, também foi destacado, mas teve de retornar à base na Virgínia por causa do furacão Erin. A missão oficial é conter o narcotráfico. Especula-se que o objetivo seja intervir na Venezuela. Na verdade, uma força-tarefa dessa dimensão é grande demais para combater avionetas e submersíveis de transporte de drogas e pequena demais para invadir o país.

Perguntei ao Pentágono como uma força de resposta rápida poderia combater o narcotráfico, e me disseram para perguntar à Casa Branca – deixando clara a natureza política da operação. Donald Trump quer projetar poder militar, com uma justificativa aceitável para os eleitores – o combate ao crime –, em vez do engajamento em mudanças de regime e conflitos distantes, que prometeu abandonar.

O secretário de Defesa, Pete Hegseth, tem forte militância no movimento trumpista. O conselheiro do Departamento de Estado, Ricardo Pita, migrou em 2007 da Venezuela para os EUA aos 14 anos, e abomina o regime chavista. Pita está envolvido na crise com o Brasil. A China tenta vender armas ao País, cujo arsenal hoje é interoperável com a Otan. O momento requer prudência.

 

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