domingo, 24 de agosto de 2025

O STF e a presidência, por Merval Pereira

O Globo

A atuação política de Flavio Dino quando ministro da Justiça era tamanha que muitos consideraram a sua escolha para o Supremo uma estratégia de Lula para tirá-lo da corrida presidencial

O Supremo Tribunal Federal (STF) teve sempre um papel político importante, embora hoje ele esteja mais explicitado do que nunca na definição do seu atual presidente, ministro Luis Roberto Barroso que, diversas vezes, definiu como o papel do Supremo “empurrar a história na direção certa”. Pedro Lessa foi um dos grandes defensores da supremacia da Constituição no início da República, em embates contra o governo de Floriano Peixoto. Victor Nunes Leal, autor de “Coronelismo, Enxada e Voto”, foi cassado pelo AI-5 em 1969, juntamente com os colegas Hermes Lima, ex-chanceler e Evandro Lins e Silva, grande jurista, defensor dos direitos humanos.

Nos tempos atuais, Joaquim Barbosa, o primeiro ministro negro do Supremo, relator do Mensalão (2005–2012), teve tanto destaque político que foi cogitado a candidato à presidência da República. Dos ministros do Supremo, dois chegaram à presidência da República: José Linhares assumiu interinamente em 1945, após a deposição de Getúlio Vargas, para garantir a transição democrática e convocar eleições. Epitácio Pessoa disputou a sucessão de Delfim Moreira, vice-presidente da República que assumira a presidência devido ao falecimento do presidente eleito Rodrigues Alves.

Foi indicado candidato a presidente quando representava o Brasil na Conferência de Versalhes, na França, e derrotou Rui Barbosa, vencendo as eleições sem nem ter saído da França. Retornou ao país já eleito. Recente pesquisa da Atlas Intel mostrou que o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo sobre a tentativa de golpe de Estado e de outros tão polêmicos como o das fake news, é dos mais bem avaliados membros do Supremo hoje, com 49% de aprovação. Mas a polarização faz com que tenha também 51% de desaprovação. Moraes é o principal alvo na disputa do governo americano, pois Trump colocou a liberação do ex-presidente Jair Bolsonaro como mais importante na sua disputa com o Brasil do que as tarifas comerciais.

Esse protagonismo já fez com que amigos de Moraes - nada indica que ele esteja por trás da manobra- encomendassem pesquisas de opinião sobre ele. O resultado não foi dos mais animadores diante de outros candidatos à presidência da República já colocados. Outro ministro do Supremo que os meios políticos consideram candidato potencial à presidência da República em 2026 é Flávio Dino, nomeado recentemente pelo presidente Lula. Originalmente do Partido Comunista Brasileiro (PCB), sob cuja legenda governou o Maranhão, Dino transferiu-se para o Partido Socialista Brasileiro (PSB) no que foi considerada maneira de amenizar sua imagem pública nacional.

Sua atuação política quando ministro da Justiça era tamanha que muitos consideraram a sua escolha para o Supremo uma estratégia de Lula para tirá-lo da corrida presidencial. Consequência de um temor do PT de que Dino se destacasse tanto que tornasse inviável outro candidato que não ele na esquerda para substituir Lula, caso ele não possa se candidatar em 2026, por questões de idade e saúde. As últimas decisões de Dino, de combate ao uso descontrolado das emendas parlamentares até a mais recente, de definir que a Lei Magnistsky não pode ser aplicada em território nacional, com o objetivo de defender a soberania do país diante dos ataques do presidente americano Donald Trump, são consideradas ações para se popularizar.

O atual presidente do Supremo, em fim de mandato, Luis Roberto Barroso, ao assumir o cargo dois anos atrás, era apontado como um possível candidato à presidência devido à sua atuação ampla em diversos setores da sociedade. Seu discurso de posse foi considerado um verdadeiro programa de governo, mas sua atuação à frente da Corte foi conturbada devido a frequentes crises políticas entre o Judiciário e o Legislativo. Hoje, a discussão sobre ele limita-se a saber se, ao deixar antecipadamente o mandato do STF, o que parece provável, será designado embaixador em Paris, ou se voltará a advogar.

 

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