O Estado de S. Paulo
O ganho de produtividade também é uma questão
política e seria bom se todo cidadão o entendesse dessa forma
Enfiado num atoleiro há pelo menos 12 anos, o Brasil só voltará a ser uma economia dinâmica se investir muito mais em capacidade produtiva, cuidar menos de fantasias diplomáticas, valorizar os interesses prosaicos e fizer do governo, mais uma vez, um instrumento de modernização do País. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ter ambições mais amplas, mas fará um trabalho respeitável se concentrar seu empenho em tornar mais eficiente a economia brasileira. Depois de um avanço de 1,4% no primeiro trimestre, a produção perdeu impulso e pode ter aumentado apenas 0,3% no período de abril a junho, segundo o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), uma prévia do PIB elaborada pelo Banco Central.
Nesse ritmo, o País dificilmente fará mais do
que materializar o crescimento de 2,21% indicado no último boletim Focus, uma
síntese de projeções do mercado. As funções do governo e as ambições de
empresários, financistas e trabalhadores envolvem, no entanto, muito mais do
que a expansão estimada para o ano presente e para os dois ou três seguintes. É
perfeitamente razoável, no caso de uma economia emergente, ambicionar um ritmo
de avanço maior do que o realizado pelos países mais avançados. É preciso
correr para diminuir as diferenças entre volumes de produção, níveis de consumo
e perspectivas de emprego e de padrões de vida.
Para conseguir esse avanço é preciso poupar e
investir em capacidade produtiva. Poupança e investimento dependem tanto do
governo quanto do setor privado. Para investir mais em transporte, energia, saneamento,
saúde, educação básica e formação de mão de obra, o governo tem de selecionar
seus gastos, planejar e programar suas atividades e cuidar da eficiência do
setor público. Se suas contas forem bem administradas, o setor público será
menos pesado, deixará mais crédito para empresas e consumidores e a economia
funcionará com juros mais assimiláveis. O empresariado poderá investir mais em
capacidade produtiva e o potencial de crescimento econômico será ampliado.
No Brasil, um cenário com esse conjunto de
condições é apenas uma abstração desejável. O equilíbrio das contas públicas é
um objetivo permanente e raramente efetivado. Sempre carente de financiamento
para fechar suas contas, o Tesouro compete com empresários e consumidores. Isso
dificulta a redução de juros e atrapalha tanto o consumo quanto o investimento
produtivo.
O Executivo tenta, às vezes, pressionar o
Banco Central para reduzir os juros e desemperrar a economia. Mas o órgão,
normalmente, cumpre sua função, nada além disso, quando aperta a política
monetária para conter o efeito inflacionário da gastança pública e do
desarranjo orçamentário. Jogos semelhantes de pressão sobre o Banco Central são
realizados por um governo de esquerda no Brasil e por um de direita nos Estados
Unidos.
Assim como a aritmética, a moeda é
indiferente à coloração partidária dos governos. Apesar disso, as consequências
do desarranjo monetário podem ser menos visíveis, ou até neutralizadas em
parte, em economias com ampla intervenção governamental. Mas essa intervenção,
para funcionar, tem de envolver mais do que moeda e preços. Quando isso ocorre,
a perda de liberdade afeta mais do que a escolha entre um sorvete e uma fatia
de bolo ou entre uma sorveteria popular e uma chique.
Longe de cenários desse tipo, os brasileiros
têm de viver e enfrentar os problemas econômicos em condições políticas e
sociais mais encontráveis em sociedades abertas. Em sociedades desse tipo, os
preços são determinados por um complicado sistema de preferências e decisões de
empresários, consumidores e agentes públicos. Não só os gastos de quem prefere
este ou aquele tipo de sorvete interferem no valor final encontrado no varejo.
A gestão das finanças públicas também afeta as condições gerais dos mercados,
variações de preços setoriais e a precificação final de cada item. Esse amplo
quadro inclui as decisões políticas dos eleitores e das autoridades.
Não há como tratar as condições de
crescimento da produção, de abertura de empregos e de geração de condições de
consumo como fatos “meramente” econômicos e mensuráveis apenas por critérios
técnicos. O atoleiro enfrentado pelo Brasil há pelo menos 12 anos – alguns
analistas levariam a análise bem mais longe – é um fato político, produzido por
decisões e arranjos políticos. O ganho de produtividade necessário para livrar
o País desse atoleiro também é, portanto, uma questão política e seria bom se
todo cidadão o entendesse dessa forma.
O País cresceu menos de 2% em seis dos dez
anos entre 2015 e 2024. O crescimento igualou ou superou 3% em apenas quatro. A
maior taxa, 4,8%, ocorreu em 2021, em parte como compensação do desastre do ano
anterior, quando o valor produzido encolheu 3,3%. Em nenhum outro período o
resultado sequer bateu em 4%. Para crescer é preciso investir em meios de
produção e em mão de obra. Neste século, raramente o valor investido igualou ou
superou 18% do Produto Interno Bruto (PIB), barreira ultrapassada, em vários
emergentes. No primeiro trimestre essa taxa bateu, no Brasil, em 17,8%.
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