quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Vera Magalhães: Velho Bolsonaro volta depois das 7 ondas

O Globo

Tão logo os brasileiros pulem as sete ondinhas e façam seus desejos para um 2022 que promete ser ainda mais duro que o último biênio, Jair Bolsonaro já terá rasgado a fantasia de moderado que Michel Temer lhe vestiu e estará de volta à velha forma conspiracionista, atirando contra tudo e todos. Desta vez com o cartão de crédito dos gastos populistas e eleitoreiros na mão e com limite alto.

Aos poucos, o presidente já vai se despindo do figurino que lhe causa desconforto, o que respeita as instituições e o contraditório.

Faz isso ao mesmo tempo que cerca sua base mais ideologizada à custa de bravatas e de promessas de benefícios financeiros ou empresariais.

A nova investida se dá junto aos policiais federais, num momento em que há muitas imbricações de interesses da sua família e dos seus sob responsabilidade da PF.

O prometido reajuste geral a servidores no ano eleitoral começou justamente pelos policiais. Veio na forma que também já se tornou usual no método bolsonarista: apenas avisando a Paulo Guedes que ele se vire para arrumar o dinheiro.

Bernardo Mello Franco: Lula favorito na eleição da fome

O Globo

O Ipec informa: Lula entrará no ano eleitoral como franco favorito para voltar ao Planalto. O ex-presidente lidera a disputa com 48% das intenções de voto. Todos os outros candidatos somam 38%.

Dez meses são uma eternidade na política, o que significa que o cenário pode mudar bastante até outubro de 2022. Mas o retrato mostrado pela pesquisa é inequívoco: se a eleição fosse hoje, o petista venceria no primeiro turno.

Lula registra os melhores índices entre os eleitores mais pobres (57%) e menos escolarizados (55%). São os grupos que mais sofrem com o retorno da fome e o aumento da inflação, duas marcas registradas do atual governo.

Em setembro, o Ipec constatou que fome e pobreza voltaram à lista dos temas que mais preocupam os brasileiros. Isso não ocorria desde 2002. Não por acaso, o ano em que o petista se elegeu pela primeira vez.

Elio Gaspari: O Fies saqueou a bolsa da Viúva

O Globo

O professor Mário Henrique Simonsen ensinava: se for bem enunciado, o problema mais difícil do mundo um dia será resolvido. Mal enunciado, o problema mais fácil do mundo jamais será resolvido.

Lula e Bolsonaro meteram-se na discussão do calote do Fundo de Financiamento Estudantil, o Fies. Na teoria, ele custearia as anuidades de jovens universitários que cursavam a rede privada de ensino. Na prática, desde 2011 virou um mecanismo que permitiu a transferência do risco da inadimplência para a conta da Viúva. Atendeu 3,4 milhões de jovens e tem a receber R$ 123 bilhões, ervanário superior ao déficit da União neste ano. Desse valor, R$ 27,9 bilhões foram contabilizados como ajustes para perdas.

Lula promete anistiar os devedores. Bolsonaro rebate: “Por que não fez lá atrás, pô? Está aí de sacanagem”. Noves fora a linguagem, quem abriu a porteira não foi Lula, mas Dilma Rousseff. O capitão correu atrás e agora oferece uma renegociação dessas dívidas. Está no seu terceiro ano de governo e ainda não apresentou um programa que faça sentido. Há pouco, mimou as universidades privadas, aninhando-as no ProUni.

Fernando Exman: O capitão na batalha das expectativas

Valor Econômico

Aliados queriam ver mais ousadia de um BC independente

A redução do poder de compra do brasileiro em 2022, ano eleitoral, ocupa um lugar central no rol de preocupações de auxiliares do presidente Jair Bolsonaro.

É o que explica, pelo menos em parte, recente esforço para o lançamento de uma série de medidas voltadas às famílias mais pobres. O pacote vai além do Auxílio Brasil, programa social que sucede o Bolsa Família com um valor inicial de R$ 400 já a partir de dezembro, antes do Natal, e para um número maior de beneficiários. O governo já sinalizou que o ticket médio deve subir para R$ 415.

Parlamentares aliados e auxiliares de Bolsonaro apontavam há meses que a alta dos preços dos alimentos poderia condenar o programa a já nascer desatualizado. Consideram, também, que o Banco Central (BC) poderia ter sido mais conservador nos últimos meses, a fim de construir as condições necessárias para a redução da Selic a tempo de viabilizar uma reativação da economia mais rápida no ano que vem.

Daniel Rittner: O que a eleição para o TCU deixou de contar

Valor Econômico

Órgão estaria deixando papel fiscalizador para assumir uma postura mais consultiva em relação ao Executivo

A eleição para a vaga recém-aberta no Tribunal de Contas da União (TCU) ignorou um debate que provoca cada vez mais aflições no governo e na iniciativa privada: por acaso o órgão de controle tem atuado não apenas como “watchdog” (que supervisiona a obediência às regras e à lei), mas assumido excessivamente as funções de “sheepdog” (conselheiro que guia políticas públicas e ações governamentais por meio da expedição de comandos)?

O tribunal já mexeu na taxa de retorno dos leilões de energia, multou diretores da Antaq por considerar que eles não regularam adequadamente a cobrança de uma tarifa por terminais portuários, entrou nos acordos de leniência com empreiteiras da Lava-Jato, travou a liquidação da estatal dos semicondutores (Ceitec), mandou os bancos públicos devolverem R$ 199 bilhões ao Tesouro. Suas decisões - não se discute se certas ou erradas - têm feito surgir uma safra de textos acadêmicos e análises sobre o raio de atuação do TCU.

Armando Castelar Pinheiro*: 2022: dosando o pessimismo

Valor Econômico

O antídoto mais eficaz é ter alguma clareza sobre o que esperar a partir de 2023

“Um dos principais trabalhos do cérebro é prever o futuro. (...) Algumas pessoas têm cérebros que são mais rápidos para detectar o perigo. Mesmo em situações ambíguas ou neutras, essas pessoas tendem a pensar, “algo ruim vai acontecer aqui”. Estas pessoas são as primeiras a preparar-se para o pior cenário, as primeiras a esperar um mau resultado. Em outras palavras, são pessimistas”.

Extrai esta citação do excelente livro de Elizabeth Blackburn e Elissa Epel, “The Telomere Effect: Living Younger, Healthier, Longer”. Ela me fez pensar se a maioria de nós, analistas da cena econômica, está olhando corretamente as perspectivas da economia brasileira em 2022, ou se nós nos tornamos, por variadas razões, pessimistas. Afinal de contas, às vezes parece difícil aceitar que estamos caminhando para um cenário tão ruim como o que temos hoje, sem a expectativa de que se faça algo para melhorá-lo.

Zeina Latif: De improviso em improviso

O Globo

O foco principal da política pública deve ser formação e requalificação de pessoas, dada a baixa qualidade da mão de obra e os avanços da tecnologia

É muito difícil ser empresário no Brasil. Recentemente ouvi de uma autoridade estrangeira que, se um CEO de multinacional sobrevive ao Brasil, está apto a conduzir a operação em qualquer outro país.

As empresas enfrentam muitos empecilhos — reduzido capital humano, infraestrutura e marcos jurídicos complexos e pouco previsíveis — que encarecem a produção e, assim, prejudicam o investimento e a inovação. A carga tributária elevada e a instabilidade econômica são sérios agravantes.

Como resultado, muitos buscam junto ao governo tratamento diferenciado, por meio de regimes especiais e isenções tributárias. São atalhos que podem até ajudar alguns no curto prazo, mas cobram preço elevado para a sociedade ao longo do tempo. Nem todos os pleitos dos empresários são justificáveis.

Fábio Alves: Os riscos de 2022

O Estado de S. Paulo

Os investidores vão encarar um 2022 que pode resultar em desfecho ainda mais extremo para o Brasil

Ressabiados por um ano em que a inflação e os juros subiram bem mais do que o previsto e a forte recuperação da economia, após o pior momento da pandemia de covid, minguou com rapidez, os investidores vão encarar um 2022 que pode resultar em desfecho ainda mais extremo para o Brasil.

Estariam os investidores precificando corretamente os riscos para a economia brasileira em 2022? Basicamente, são dois os maiores riscos domésticos e eles estão relacionados: o fiscal e o político. Para o primeiro, o mercado está relativamente otimista – ou será pura leniência? Para o segundo, a visibilidade é baixa.

Vinicius Torres Freire: Está lá um PIB estendido no chão

Folha de S. Paulo

Com economia no vermelho, arrocho de juros vai piorar e zumbis, enchem as ruas

Na então Grande Recessão do começo dos anos 1980, a gente via pessoas acampadas na rua, sob tendas de sacos pretos de lixo. O Brasil era como sempre pobre, mas não se tinha notícia daquilo, de crise tão longa e dos despejados pela crise expondo as nossas vergonhas cruéis até nas praças de bairros ricos.

Até então, ainda modernizávamos a pobreza, a desigualdade e outras opressões. Nem a ditadura militar era tão reacionária e cretina quanto essa gente que ora ocupa Brasília.

Mas o Brasil progrediu e o mundo nunca esteve tão bem de vida desde o Neolítico, como dizem os doutores Pangloss do capital. Agora, miseráveis vivem em pequenas barracas de camping e instalam centrais de lixo reciclável em praças e esquinas dos "bairros de bem". Houve progresso, né: em vez de sacos plásticos, tendas de armar e carroças de lixo com música.

No centro da cidade, os miseráveis são mais tradicionais. As "pessoas em situação de rua", como diz o eufemismo correto, deitam sobre papelão, envoltas em trapos que passam por cobertas. Muitos se aglomeram diante de centros de caridade que dão alguma comida ou roupa. Depois perambulam às centenas pelas redondezas da praça da Sé ou sob viadutos próximos da avenida Paulista.

Hélio Schwartsman: Bolsonaro, o pesadelo não acabou

Folha de S. Paulo

A capacidade de destruição da atual gestão ainda é considerável e exige que organizemos nossas defesas

Não é porque Jair Bolsonaro parou de atacar diuturnamente o Supremo Tribunal Federal e outras instituições que seu governo se tornou menos nefasto. Ainda que com menos estardalhaço, ele permanece altamente destrutivo.

No campo da economia, o país retrocedeu várias décadas com PEC dos Precatórios, que permitirá ao governo e seus cúmplices do centrão expropriar recursos privados cujo recebimento já havia sido determinado pela Justiça. Para usar um rótulo caro aos bolsonaristas, a medida recende um "comunismo" com o qual as gestões petistas nem sequer ousaram flertar. O pior é que teria sido perfeitamente possível criar um bom mecanismo de auxílio emergencial, que é mais do que necessário, sem incorrer nesse tipo de violação às regras do jogo. Bastaria ter revisto algum dos muitos programas e subsídios pouco eficazes que o Estado brasileiro distribui à farta.

Bruno Boghossian: Aras vai com Bolsonaro até o fim

Folha de S. Paulo

Em 2022, país terá procurador-geral que dá conforto ao presidente para praticar desmandos

Assim que Augusto Aras tomou posse, Jair Bolsonaro definiu a relação entre os dois como "um amor à primeira vista". O procurador-geral fez questão de retribuir a declaração: prometeu uma atuação alinhada à "cultura judaico-cristã", brindou o presidente com tolerância máxima e chegou a chamar de "festa cívica" os atos golpistas de 7 de setembro.

A tabelinha continua firme. Na segunda (13), Aras pediu que o STF cancele um inquérito contra Bolsonaro pela falsa associação feita por ele entre vacinas contra a Covid e o HIV. O procurador já havia tentado barrar o caso em novembro, elencando 14 motivos para não investigar o presidente. Agora, ele diz que o inquérito não é necessário porque já existe uma ação na corte sobre o caso.

Mariliz Pereira Jorge: A canalhice bolsonarista

Folha de S. Paulo

Para eles, quem ficava em casa em 2020 e agora voltou a participar de atividades sociais é hipócrita

A canalhice bolsonarista se renova a cada semana. Não basta o boicote ao uso de máscara e à vacinação, essa corja que apoia Jair Bolsonaro se tornou especialista em manipular fatos, para constranger cidadãos que sempre seguiram as recomendações de autoridades sanitárias ao longo da pandemia da Covid-19.

A moda entre a milícia que bajula o presidente é ressuscitar posts de formadores de opinião, com a bandeira do "fique em casa", levantada durante os meses mais dramáticos, e confrontá-los em razão de seu comportamento atual: sair, viajar, frequentar bares e festas. Ainda há riscos? Sim. Mas a realidade é diferente da de um ano atrás.

Famosos que participaram da festa de uma youtuber sofreram ataques. Acontece o mesmo com políticos de oposição em momentos de lazer. Um deputado da bancada evangélica compartilhou uma foto em que esta colunista estava em Copacabana. Eram 5h30, praia vazia. Nem os bandidos cariocas tinham acordado.

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS:

PEC precária

Folha de S. Paulo

Revelação tardia de votantes é novo dano à imagem

É raríssimo encontrar motivos nobres na relutância de autoridades em prestar esclarecimentos básicos à sociedade. Um detalhamento da votação da PEC do Calote, a muito custo obtido da Câmara dos Deputados, vai confirmando a regra.

Só na segunda (13) esta Folha conseguiu que a Casa legislativa presidida por Arthur Lira (PP-AL) fornecesse a lista de oito deputados que participaram em condições excepcionais da análise em primeiro turno do texto, ocorrida há mais de um mês.

Graças a um ato da cúpula da Câmara, esses parlamentares puderam votar a distância, sem registro de presença no plenário, por estarem viajando em missão oficial. Com quatro apoios no grupo, a PEC passou com 312 votos —exatamente quatro acima do mínimo necessário.

Enfim divulgada, depois de um pedido com base na Lei de Acesso à Informação e da publicação de uma reportagem que relatava a resistência de Lira, a lista de imediato mostrou problemas. Um dos deputados relacionados não estava em viagem oficial naquela data; outro estava em Brasília e presente no plenário.

Os meandros do caso demandam mais apuração, mas desde já fica claro que o governismo empenhou energia, verbas e manobras regimentais para uma vitória milimétrica —e precária, dado que a PEC passou por alterações no Senado que voltam agora ao exame dos deputados.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade: Procura da Poesia

Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.

Música | Elba Ramalho e Raimundo Fagner: Festa

 

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Cristovam Buarque* - "contrarrevolução"

Correio Braziliense

O Brasil atravessa uma contrarrevolução: retrocessos no padrão civilizatório. A eleição de um ministro evangélico para o Supremo Tribunal Federal poderia ser sinal de avanço se o novo ministro tivesse dito que sua escolha era vitória da República laica ao quebrar o predomínio histórico do catolicismo. Mas a comemoração em função de sua denominação religiosa indica passo atrás no que deveria ser um passo à frente.

Quebrar o quase monopólio católico seria um avanço, dividir o Supremo por religião é atraso. Ainda mais se o novo ministro servir para compor aliança contra as outras denominações que compõem o imaginário religioso brasileiro: as matrizes africanas, o judaísmo, o islamismo, o budismo e o pensamento ateu. Um ministro evangélico não ameaça conquistas, mas reconhecer que se fez ministro por ser "terrivelmente evangélico", e não por ser "terrivelmente jurista" pode indicar parte de uma contrarrevolução em marcha.

Merval Pereira - Guerra de narrativas

O Globo

A verdade, como definiu o austríaco Karl Popper, é inalcançável, o mais perto que se chegue dela é insuficiente. Mas é possível saber quando se apresenta o falso. Outro dia, Ruy Castro escreveu sobre a mudança no sentido das palavras nos dias de hoje, e a mais política delas é “narrativa”, que ganhou a conotação de uma versão falsa sobre determinado assunto. Pois estamos em meio a uma guerra de narrativas na disputa presidencial, que se tornará cada vez mais acirrada à medida que a campanha eleitoral acelere.

Os três candidatos que aparecem à frente nas pesquisas de opinião —Lula, Bolsonaro e Sergio Moro — estão envolvidos nos mesmos episódios históricos que serão determinantes na decisão do eleitor, e as narrativas se sucedem, às vezes coincidentes entre dois deles, para tentar desmoralizar o adversário, às vezes disparatadas entre si.

Carlos Andreazza - O pouso alegre dos Pachecos

O Globo

Deu neste GLOBO, no último sábado, em reportagem de Patrik Camporez: “Retomada da execução do orçamento secreto privilegia aliados do governo e do Congresso”.

Era só o que a cúpula do Parlamento e o Planalto, mas sobretudo a dupla Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, buscavam com, respectivamente, o ato e o decreto que propuseram ao Supremo, ambos com a declarada — e falsa — intenção de dar transparência às emendas do relator: garantir a circulação discricionária dos dinheiros já empenhados no Orçamento de 2021 e assegurar que a máquina do orçamento secreto gire no ano eleitoral de 2022. Conseguiram, os senhores do orçamento público.

Com todos os olhares presos ao debate sobre transparência no manejo desses recursos orçamentários, transparência prometida para futuro vago, e dificultada relativamente ao passado, afinal formalizado o conceito público da meia transparência, passou despercebida a dimensão autocrática da emenda do relator, que distribui bilhões ao arrepio da equitatividade — para uns, porque votam comigo, e não para os outros.

Míriam Leitão - A truculência do ataque à imprensa

O Globo

Não é normal nem aceitável que um brutamontes, ostentando uma arma no coldre, ameace bater em jornalistas porque eles estão tentando entrevistar o presidente da República. Não é normal nem aceitável que uma repórter seja agarrada pelo pescoço por um segurança presidencial, naquele golpe chamado “mata-leão”. São servidores com salários pagos com os nossos impostos e só estão em torno de Jair Bolsonaro em atos de campanha antecipada porque ele exerce a Presidência. Proteger o presidente não é o mesmo que atacar os jornalistas. E os seguranças têm essa liberdade porque são estimulados pela violência do próprio presidente da República.

Vai começar um ano tenso, em que Bolsonaro vai escalar as agressões, porque ele é assim e porque ele está em desvantagem nas intenções de voto. Já sabemos que usará a encenação de valentia contra repórteres desarmados para animar os seus seguidores mais destemperados.

Zuenir Ventura - As agressões e os prêmios

O Globo

Equipes da TV Aratu, afiliada do SBT, e da TV Bahia, afiliada da Globo, foram agredidas por seguranças e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro neste domingo em Itamaraju, no sul da Bahia, região fortemente atingida pelas chuvas da última semana. O repórter Chico Lopes, da TV Aratu, levou tapa de um funcionário da segurança do presidente. Enquanto ele ameaçava os jornalistas, um apoiador de Bolsonaro furtou o microfone da repórter Camila Marinho, da TV Bahia. Em defesa da colega, Chico reagiu e foi ofendido pelo homem, que, contido por pessoas próximas, seguiu, de longe, proferindo ameaças e ofensas. Bolsonaro chegou a pedir calma ao segurança.

O que há de novo nessas cenas, que repetem um pouco os encontros do presidente com jornalistas — basta lembrar a recente visita a Roma —, é o emprego pela primeira vez do mata-leão, um tipo de estrangulamento usado nas artes marciais japonesas que consiste em imobilizar o oponente pelas costas. Camila Marinho chegou a sofrer o golpe.

Alvaro Costa e Silva – Os reis do garimpo

Folha de S. Paulo

Governo promove farra do garimpo de ouro na Amazônia

Para quem já admitiu que "o garimpo é um vício, está no sangue", o compadre Grota deve ser um herói, merecedor de ocupar a galeria dos maiorais, ao lado do ditador Augusto Pinochet, do torturador Brilhante Ustra e do Major Curió, também torturador e líder garimpeiro.

Compadre Grota é o nome de guerra de Heverton Soares, um dos narcotraficantes —o outro é Silvio Berri Júnior, ex-piloto de avião de Fernandinho Beira-Mar— apontados pela Polícia Federal como chefes de organizações criminosas no Pará e que ganharam do governo o direito de explorar uma área de mais de 810 hectares de garimpo de ouro.

Cristina Serra - Três meninos do Brasil

Folha de S. Paulo

Um país que não protege suas crianças, como as de Belford Roxo, morre com elas

Eles se chamavam Lucas, Alexandre e Fernando Henrique, tinham entre 8 e 11 anos de idade, moravam em Belford Roxo, Baixada Fluminense. No fim de 2020, saíram de casa para jogar bola. Nunca mais voltaram. Quase um ano depois, a polícia informa que eles foram torturados e assassinados por terem furtado dois passarinhos do tio de um traficante.

A história dos três meninos é de um grau tão desmedido de barbárie que é até difícil pensar e escrever sobre ela. Porque dói pensar sobre o Brasil em que Lucas, Alexandre e Fernando Henrique viviam. A brutalidade interrompeu a vida deles num cruzamento entre miséria, desigualdade, violência, crime, abandono, indiferença e tudo o mais que compõe o cenário onde parte da sociedade brasileira, majoritariamente pobre e negra, é largada aos deus-dará. "E se Deus não dá?", pergunta a canção de Chico Buarque.

Robert L. Funk* - O Chile e o problema da nova esquerda

O Estado de S. Paulo.

Uma análise da plataforma eleitoral de Gabriel Boric revela poucos indícios de radicalismo

No calor do debate eleitoral, é comum escutar opositores do candidato presidencial chileno Gabriel Boric acusá-lo de ser “controlado pelos comunistas”. Alguns dizem que, apesar de gostar de Boric pessoalmente, “o problema é quem está em seu entorno”. Esses comentários ressoam uma antiga antipatia contra o Partido Comunista do Chile, permitindo que oponentes classifiquem Boric como um político de extrema esquerda e definam a eleição como uma batalha entre dois extremos.

O curioso dessa dinâmica é que ela tenta colar em Boric políticas e atitudes que claramente não lhe pertencem. Como representante de uma nova esquerda no Chile, Boric tem criticado há muito a centro-esquerda que governou o país por grande parte das três últimas décadas, acusando os políticos desse campo de serem tímidos demais e “neoliberais”. Mas, ao mesmo tempo, Boric também tem se mostrado disposto a questionar a implícita atitude de superioridade moral que emerge de sua geração.

“Há realmente uma impressão na minha geração”, afirmou ele, em 2017, “de que a história começou em 2011. A Frente Ampla deve ter cuidado para manter a política no campo da política, não da moral.”

Como resultado, Boric tem se oposto com frequência a posições que o Partido Comunista sustenta (ou vice-versa) – como a oposição de Boric aos regimes venezuelano, cubano e nicaraguense ou seu apoio ao pacto multipartidário que colocou em marcha a atual Assembleia Constituinte no Chile.

Eliane Cantanhêde - Eleição de 2022 será campeonato de rejeições

O Estado de S. Paulo.

A eleição de 2022 não será para construir horizontes, será para destruir adversários

Foi-se o tempo em que os brasileiros discutiam quem consideravam o melhor candidato, mais experiente, preparado, confiável, honesto e, só de quebra, davam uma estocada nos que não gostavam de jeito nenhum. Agora, os eleitores só criticam, atacam, quando não odeiam. A eleição de 2022 será um campeonato de rejeições.

Esse movimento começou, ou se intensificou, em junho de 2013, com os protestos espontâneos contra tudo e contra todos, embalados pela internet e ao largo dos partidos políticos. A negação da política deu no que deu, mas só piora.

Novas pesquisas deverão confirmar, nesta semana, altos índices de rejeição. O presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, teve 59% e foi o campeão nesse quesito no Datafolha de setembro. Tudo é possível, mas é difícil um candidato com esse índice vencer no final.

Ana Carla Abrão - O Brasil não merece a insistência em erros

O Estado de S. Paulo.

O Brasil não merece insistir nos mesmos erros, estejam eles à direita ou à esquerda

Não é de hoje que o Brasil decepciona. Já se vão décadas. Mesmo em períodos em que alguns acreditavam que estávamos a brilhar, embalados pela ilusão do pré-sal e pelo boom dos preços das commodities, falhamos. Desperdiçamos a oportunidade de avançar e nos afundamos na corrupção. Comparados aos nossos pares emergentes, cuja renda per capita cresceu 5,12% entre 2003 e 2011, comemoramos 2,94% de crescimento sem olhar para o lado e ver que o mundo também crescia e, de forma acelerada, nos deixava para trás. Entre 2012 e 2021 a diferença se consolida com a retração de 0,54% do PIB per capita frente aos 3,28% de crescimento nos nossos pares.

Nesse período, apesar do sucesso dos programas de transferência de renda no Brasil, em particular do Bolsa Família, a redução da pobreza foi muito mais intensa nos outros países emergentes, em particular na China, que retirou mais de meio bilhão de chineses da miséria. Nos números da desigualdade, a queda quase contínua que se observa desde o pósreal foi revertida a partir de 2014. Daí em diante só se agravou, com a pá de cal sendo a pandemia, que tornou mais pobres os pobres. Devolvemos o que levamos décadas para, a duras penas, melhorar.

Andrea Jubé - De Médici para Alckmin: apressa-te lentamente

Valor Econômico

Getúlio também ganhou apelido de “chuchu” na eleição

A paciência é uma virtude para poucos. Exercida com sabedoria, pode converter-se em arte, como os afrescos de Giorgio Vasari no Palazzo Vecchio, em Florença.

No século XVI, o duque Cosme I de Médici encomendou a Vasari um mural que representasse seu modo de agir e pensar como governante. O resultado foram tartarugas com velas enfunadas pelo vento sobre suas carapaças.

Os insólitos desenhos estão acompanhados de uma inscrição latina: “festina lente”, atribuída ao imperador Augusto. A tradução é uma contradição: apressa-te lentamente.

A tartaruga simboliza a lentidão e as velas ao vento, a velocidade. Na concepção do duque florentino, esse paradoxo é uma aula de política: o governante deve pensar e refletir antes de agir.

Fabio Graner - Custo do trabalhador está muito baixo no Brasil

Valor Econômico

Pandemia agravou trajetória que já era de queda no país

Mesmo com recuperação neste ano, a mão de obra brasileira ainda está com um custo bem barato em termos históricos. Calculado pelo Banco Central, o chamado Custo Unitário do Trabalho (CUT) fechou outubro em 90,6 pontos. A alta é de 26,3% em 2021, mas está bem abaixo da média histórica (110,1 pontos) e também do período entre 2015 e a pandemia (118,4 pontos), quando esse indicador já teve um ajuste relevante para baixo.

O CUT é um dos elementos de análise do ambiente para as empresas em um país. Seu movimento reflete uma combinação de fatores. Um dos motivos para o indicador seguir abaixo dos seus níveis históricos é a taxa de câmbio, pois ele é calculado em relação ao dólar. A outra razão é a perda de renda de boa parte dos trabalhadores que segue em curso, mesmo parcialmente dissipada neste ano com o arrefecimento da pandemia.

Maria Clara R. M. do Prado - Taxa de câmbio e eleição

Valor Econômico

O ambiente de recessão tende a bater de novo à porta, sendo que agora em um quadro eleitoral que promete emoções

Há consenso de que o país deve vivenciar em 2022 uma das mais tumultuadas eleições majoritárias dos últimos tempos. No cenário político que já se advinha confuso, o preço mais importante a ser acompanhado, com potencial de comprometer ainda mais os fundamentos da economia brasileira, será a taxa de câmbio.

Como qualquer outro preço que se forma a partir das forças do mercado, o valor do real face ao valor das demais moedas fortes, aquelas que detêm o inabalável poder da conversibilidade, tende a seguir em processo de forte desvalorização. Já em princípio, estará contaminado pelo aumento da inflação interna que por sua vez carrega as expectativas da deterioração fiscal em uma fase complicada de interrupção das cadeias de suprimento, além dos altos custos de produção provocados em boa parte, justamente, pela perda do poder de troca cambial do real desde o início da pandemia.

O que pensa a mídia - Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Passaporte forçado

Folha de S. Paulo

Medida contra a Covid é correta, mas vem do STF em meio a tensão com Bolsonaro

Jair Bolsonaro esperneou a fim de evitar que seu governo exigisse certificado de vacinação de viajantes que pretendam entrar no Brasil. Vociferou contra o dito passaporte, que chamou de "coleira", e mais uma vez contestou os benefícios da imunização contra a Covid-19.

Dedicou-se, como de hábito, a atacar princípios de razão, prudência e boa administração. Acabou sendo vencido duas vezes.

Pressionado pelos próprios ministros, permitiu a edição de uma portaria que exige testes negativos e certificados de vacinação de quem viaje para o Brasil por via aérea ou terrestre. Na falta do documento de imunização, quem pretenda entrar no país por aeroportos terá de se submeter a uma quarentena de cinco dias.

Os viajantes devem, além do mais, apresentar uma declaração escrita de que concordam com essas e outras políticas sanitárias. A portaria entraria em pleno vigor no sábado (11). Seus efeitos foram suspensos devido ao ataque de hackers a sites do Ministério da Saúde, o que impossibilitou o acesso aos certificados de vacinação.

De todo modo, era evidente a insuficiência da decisão, pois não se esclareceu como os turistas seriam triados nem como a quarentena seria cumprida e fiscalizada.

Poesia | Fernando Pessoa - Ode marítima

Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,
Olho pró lado da barra, olho pró Indefinido,
Olho e contenta-me ver,
Pequeno, negro e claro, um paquete entrando.
Vem muito longe, nítido, clássico à sua maneira.
Deixa no ar distante atrás de si a orla vã do seu fumo.
Vem entrando, e a manhã entra com ele, e no rio,
Aqui, acolá, acorda a vida marítima,
Erguem-se velas, avançam rebocadores,
Surgem barcos pequenos detrás dos navios que estão no porto.
Há uma vaga brisa.
Mas a minh’alma está com o que vejo menos.
Com o paquete que entra,
Porque ele está com a Distância, com a Manhã,
Com o sentido marítimo desta Hora,
Com a doçura dolorosa que sobe em mim como uma náusea,
Como um começar a enjoar, mas no espírito.

Olho de longe o paquete, com uma grande independência de alma,
E dentro de mim um volante começa a girar, lentamente.

Os paquetes que entram de manhã na barra
Trazem aos meus olhos consigo
O mistério alegre e triste de quem chega e parte.
Trazem memórias de cais afastados e doutros momentos
Doutro modo da mesma humanidade noutros pontos.
Todo o atracar, todo o largar de navio,
É — sinto-o em mim como o meu sangue —
Inconscientemente simbólico, terrivelmente
Ameaçador de significações metafísicas
Que perturbam em mim quem eu fui…

Ah, todo o cais é uma saudade de pedra!
E quando o navio larga do cais
E se repara de repente que se abriu um espaço
Entre o cais e o navio,
Vem-me, não sei porquê, uma angústia recente,
Uma névoa de sentimentos de tristeza
Que brilha ao sol das minhas angústias relvadas
Como a primeira janela onde a madrugada bate,
E me envolve com uma recordação duma outra pessoa
Que fosse misteriosamente minha.

Música - Oh Bela - Capiba - Orquestra e Coro RCA Victor

 

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Marcus André Melo – ‘Postos Ipirangas' em outras democracias?

Folha de S. Paulo

Possíveis ministros da Fazenda tornam-se ativos nas campanhas eleitorais

Moro anunciou Pastore como conselheiro para assuntos econômicos; Doria entronizou Meirelles no mesmo papel. Guedes vem cumprindo o papel de posto Ipiranga de Bolsonaro. Economistas garantidores da credibilidade de governos. Existe este papel em outros países?

Mark Hallerberg (Hertie) e Joachim Wehner (LSE) investigaram a seleção de titulares de Ministérios da Fazenda e dos Bancos Centrais em 40 democracias. A base de dados contém informação sobre 427 chefes de governo, 537 ministros da Fazenda e 212 presidentes de Banco Centrais, e se estende por 50 anos.

A base revela surpresas: muitos ministros da Fazenda não são economistas. Gordon Brown, titular da pasta sob Tony Blair, era formado em história. Este padrão é mais frequente sob o parlamentarismo —sobretudo em governos de coalizão— no qual o gabinete é formado por parlamentares. Um quarto dos ocupantes da pasta possuía titulo de PhD em economia. Mas no Chile, na Polônia e no México, todos o possuíam; na Espanha, na Grécia e em Portugal, eram mais de 2/3. Quanto mais estável e rica a democracia, maior a probabilidade de não economistas e executivos financeiros no cargo.

Celso Rocha de Barros – A chapa Lula / Alckmin: precisa?

Folha de S. Paulo

Ter um vice como Alckmin ajudará a retomada de políticas progressistas

Na coluna de 7 de novembro, escrevi que acho uma boa ideia a chapa Lula/Alckmin para a eleição presidencial de 2022. Na época, não tinha muita expectativa de que a aliança de fato acontecesse. Talvez eu tenha perdido a capacidade de reconhecer boas notícias, ou talvez tenha medo demais de um novo surto de estupidez antipolítica.

De qualquer forma, a probabilidade de que a aliança aconteça subiu muito neste último mês. No momento, o principal obstáculo parece ser a escolha do candidato para o Governo de São Paulo. É algo perfeitamente negociável entre adultos.

Catarina Rochamonte - Vacina, passaporte e bom senso

Folha de S. Paulo

As polêmicas quanto à comprovação de imunização são principalmente ideológico-culturais

O que parece uma restrição legítima da liberdade para alguns, afigura-se como cerceamento dos direitos individuais para outros; o que parece uma simples regra sanitária para uns é considerada uma aberração autoritária por outros. Nem uns nem outros precisam ser rotulados e condenados por expor sua opinião.

Há que se considerar, porém, que o interesse coletivo é prioritário em situações calamitosas como a de uma pandemia, situação na qual o indivíduo que sofre algum cerceamento de suas vontades precisa alargar sua compreensão para a necessária consideração do bem comum.

Ruy Castro - Chovendo pacas ---não o bicho

Folha de S. Paulo

Ninguém mais faz. Entrega. Ninguém mais se coloca. Posiciona-se. A língua se cafoniza

Narrativa, até há pouco, era uma narração, uma história, um conto. "Os Lusíadas", de Camões, era uma narrativa poética; "Dom Casmurro", de Machado de Assis, uma narrativa de ficção; "Os Sertões", de Euclides da Cunha, uma narrativa histórica. Mas a palavra caiu para a 2ª divisão. Narrativa é agora uma história fabricada, que se tenta impor como verdade, e assim a tratam os políticos. Quando um deles é acusado de roubar ou mentir, diz que isso é uma "narrativa". Claro que essa resposta também é uma "narrativa".

Bruno Carazza* - Para inglês ver

Valor Econômico

Agenda pública de encontros com lobistas só virá depois das eleições

Na primeira metade do século XIX, por razões humanitárias e também econômicas, a Inglaterra, então senhora do mundo, passou a exercer grande pressão política para que os nascentes Estados americanos coibissem o tráfico negreiro. Para atendê-la, em 1831 e 1850 o Império brasileiro editou leis proibindo primeiro a entrada e depois o comércio ultramarino de escravos africanos.

Sem fiscalização, contudo, as normas não surtiram resultado. Essa seria a origem da expressão “para inglês ver”, que designa iniciativas governamentais lançadas para mostrar serviço, mas que na verdade não terão efetividade alguma.

No dia em que se comemorou o Dia Internacional contra a Corrupção (9/12), o presidente Jair Bolsonaro publicou o decreto nº 10.889/2021, que institui o Sistema Eletrônico de Agendas do Poder Executivo Federal, batizado de e-Agendas. A iniciativa é boa, pois constitui mais um passo num esforço que remonta ao governo Fernando Henrique - aprimorado depois por Lula, Dilma e Temer - de tornar públicas as agendas de ministros, secretários e outras autoridades.

Sergio Lamucci - Os efeitos dos juros de dois dígitos

Valor Econômico

A forte alta da inflação mudou radicalmente o panorama para os juros, o que terá consequências importantes para a atividade econômica e para o custo da dívida pública

A economia brasileira entrou em 2021 com juros básicos de 2% ao ano e chegou a dezembro com a Selic em 9,25%. Nos primeiros meses de 2022, a taxa continuará a subir, podendo alcançar um nível próximo a 12%. A forte alta da inflação, devido a fatores externos e domésticos, mudou radicalmente o panorama para os juros, o que terá obviamente consequências importantes para a atividade econômica e para o custo da dívida pública no ano que vem - e também para os anos seguintes, caso o próximo governo não adote um programa fiscal crível, que enfrente o crescimento das despesas obrigatórias.

Luiz Carlos Mendonça de Barros* - Brasil: um país que anda para frente

Valor Econômico

País viveu nos últimos 50 anos um incrível processo de reformas estruturais tanto na economia como na estrutura social

Tenho procurado nas minhas colunas para o Valor equilibrar uma análise crítica dos problemas que enfrentamos na economia com uma visão construtiva sobre as mudanças estruturais que ocorrem há várias décadas e que têm permitido ao Brasil superar suas crises sequenciais. Nos últimos meses este exercício tem sido muito difícil pois vivemos um Zeitgeist ultra negativo principalmente entre os agentes do mercado financeiro e parte da imprensa especializada.

Tenho maturidade e experiência suficiente para entender a razão deste comportamento crítico sobre as coisas da economia. Ele está associado a uma rejeição muito forte à forma de governar do presidente Bolsonaro e, de seu “alter ego” na economia, o ministro Paulo Guedes. O então todo poderoso Posto Ipiranga parece, no momento, um fantasma acuado pelo fracasso de sua gestão da economia neste final de mandato presidencial.

Seu erro inicial foi ter criticado seus antecessores ao dizer que iria mostrar à sociedade como deve agir um ministro da Economia reformista e compromissado com o pensamento liberal. Sua afirmação que mais o desmoralizou foi a crítica radical às chamadas privatizações tucanas e a promessa de obter mais de US$ 1 trilhão em uma nova rodada de privatizações. Mas vamos deixar o ministro Paulo Guedes vagar solitário em seus domínios no Ministério da Economia em Brasília e voltar ao tema central de minha coluna de hoje.