Folha de S. Paulo
Governador do maior estado ataca abertamente
a principal instituição do Judiciário
A radicalização do discurso do governador
de São
Paulo está longe de acabar. O assassinato de
Charlie Kirk provavelmente vai tornar sua radicalização ainda mais
palatável politicamente. A eleição de Trump mostrou que o extremismo inflama os
apoiadores mais tresloucados sem quase nenhum custo.
Políticos, como quaisquer investidores, estimam risco e retorno em tomadas de decisão. Posição política arriscada? Menor chance de que um político vá defendê-la. É por isso, por exemplo, que estadista de esquerda com aspirações nacionais não defende publicamente o direito ao aborto. Uma parte, mesmo que considerável, da base de apoio se importa com o assunto, mas há alto grau de rejeição entre indecisos e outros eleitores. O custo é alto para pouco benefício pragmático.
No passado, posições radicais geravam asco em
grande parte do eleitorado. Por isso surgiu "Lulinha Paz e
Amor", slogan da
campanha do PT em 2002. Lula foi bem-sucedido em vender imagem de político pronto
a compromissos, sem os extremismos que marcaram as malfadadas campanhas de
1989, 1994 e 1998.
Hoje é o oposto. Gritar mais alto é
estratégia legítima, algo que uma democracia não deveria aceitar. No passado,
qualquer pequeno escândalo acabava com uma carreira política. Trump mudou as
regras. Ele segue a estratégia de Steve
Bannon de inundar a mídia ("flood the zone") com falas extremistas diárias
para que os oponentes estejam sempre reagindo; enquanto criticam uma fala, já
tem outra dominando o noticiário. Não há espaço para ninguém mais aparecer.
É o caminho que Tarcísio parece abrir para
sua candidatura. No passado, seu discurso contra as instituições afundaria sua
candidatura. Mas a polarização política é a nova realidade. Assim, quando o
governador faz discurso de extrema direita, inflama seus seguidores mais
radicais sem perder os moderados. Esse tipo virulento de plataforma não é mais
contido pelos custos de se perder votos dos moderados.
Essa radicalização veio no momento de maior
impacto possível, logo antes do julgamento do ex-presidente. Ao se colocar a
favor de uma absurda anistia (não
deveria haver nem anistia nem clemência), o cálculo político é claro: pegar
os eleitores do bolsonarismo sem perder indecisos. Abandonar a estratégia
moderada é cálculo. Pelo menos, é mais transparente para os eleitores. Os
empresários não gostaram do discurso de Tarcísio, mas devem saber que com
ele vai ser mais do mesmo; a economia jogada para escanteio em favor de agenda
ideológica retrógrada e desmonte institucional.
Não vivemos tempos normais. O governador do
maior estado abertamente ataca a principal instituição do Judiciário. Isso
destrói a confiança de investidores, jogando a economia no buraco sem nada bom
em troca, a não ser a chance de ele ganhar uma eleição. Mas é aí que mora o
problema. Quando é conveniente, a extrema direita segue as regras. Quando não,
tenta mudá-las. É assim no caso do golpe: se desse certo, tudo bem. Deu errado?
"Claro que seguimos as regras", afirmam de cara lavada os
participantes. Dissimulação pura.
Se os moderados não acordarem, a polarização
vai piorar. E os extremos não se importam se acabar em guerra civil. Mas o
resto do país deveria. Pelo bem de todos.
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