sábado, 13 de setembro de 2025

Tarcísio e a radicalização. Por Rodrigo Zeidan

Folha de S. Paulo

Governador do maior estado ataca abertamente a principal instituição do Judiciário

A radicalização do discurso do governador de São Paulo está longe de acabar. O assassinato de Charlie Kirk provavelmente vai tornar sua radicalização ainda mais palatável politicamente. A eleição de Trump mostrou que o extremismo inflama os apoiadores mais tresloucados sem quase nenhum custo.

Políticos, como quaisquer investidores, estimam risco e retorno em tomadas de decisão. Posição política arriscada? Menor chance de que um político vá defendê-la. É por isso, por exemplo, que estadista de esquerda com aspirações nacionais não defende publicamente o direito ao aborto. Uma parte, mesmo que considerável, da base de apoio se importa com o assunto, mas há alto grau de rejeição entre indecisos e outros eleitores. O custo é alto para pouco benefício pragmático.

No passado, posições radicais geravam asco em grande parte do eleitorado. Por isso surgiu "Lulinha Paz e Amor", slogan da campanha do PT em 2002. Lula foi bem-sucedido em vender imagem de político pronto a compromissos, sem os extremismos que marcaram as malfadadas campanhas de 1989, 1994 e 1998.

Hoje é o oposto. Gritar mais alto é estratégia legítima, algo que uma democracia não deveria aceitar. No passado, qualquer pequeno escândalo acabava com uma carreira política. Trump mudou as regras. Ele segue a estratégia de Steve Bannon de inundar a mídia ("flood the zone") com falas extremistas diárias para que os oponentes estejam sempre reagindo; enquanto criticam uma fala, já tem outra dominando o noticiário. Não há espaço para ninguém mais aparecer.

É o caminho que Tarcísio parece abrir para sua candidatura. No passado, seu discurso contra as instituições afundaria sua candidatura. Mas a polarização política é a nova realidade. Assim, quando o governador faz discurso de extrema direita, inflama seus seguidores mais radicais sem perder os moderados. Esse tipo virulento de plataforma não é mais contido pelos custos de se perder votos dos moderados.

Essa radicalização veio no momento de maior impacto possível, logo antes do julgamento do ex-presidente. Ao se colocar a favor de uma absurda anistia (não deveria haver nem anistia nem clemência), o cálculo político é claro: pegar os eleitores do bolsonarismo sem perder indecisos. Abandonar a estratégia moderada é cálculo. Pelo menos, é mais transparente para os eleitores. Os empresários não gostaram do discurso de Tarcísio, mas devem saber que com ele vai ser mais do mesmo; a economia jogada para escanteio em favor de agenda ideológica retrógrada e desmonte institucional.

Não vivemos tempos normais. O governador do maior estado abertamente ataca a principal instituição do Judiciário. Isso destrói a confiança de investidores, jogando a economia no buraco sem nada bom em troca, a não ser a chance de ele ganhar uma eleição. Mas é aí que mora o problema. Quando é conveniente, a extrema direita segue as regras. Quando não, tenta mudá-las. É assim no caso do golpe: se desse certo, tudo bem. Deu errado? "Claro que seguimos as regras", afirmam de cara lavada os participantes. Dissimulação pura.

Se os moderados não acordarem, a polarização vai piorar. E os extremos não se importam se acabar em guerra civil. Mas o resto do país deveria. Pelo bem de todos.

 

 

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